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184 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

seus trouxeram diante de Christo uma mulher adultera,; para ser lapidada na conformidade da lei. Christo disse-lhes: Aquelle de entre vós que estiver sem peccado que lhe atire a primeira pedra. E isto o que dizemos aos escribas e phariseus, queremos dizer aos partidos da opposição. A culpa é toda vossa, se não fossem os precedentes, se não fossem os vossos exemplos, nunca este governo teria tal audacia. Não venhaes distinguir as circunstancias, discutir os casos, allegar o mais e o menos. Não é na importancia ou nas circunstancias do acto, é na preterição das formulas e na postergação da lei, quando esta postergação é consciente e manifesta."

Sr. presidente, assim reflectiu uma auctoridade, insuspeita para o digno par, o sr. Hintze Ribeiro, e admittindo por hypothese, repito, que toda a culpa é d'este governo, eu ainda responderei aos oradores contrarios: Abyssus, abyssum invocat.

Não estou tratando directamente do incidente levantado, porém tenho direito de fallar n'este ponto particular, fazer estes reparos, e não devo prescindir d'elles. A vossa historia dil-a o .sr. ministro da fazenda no seu relatorio; em dez annos subiram os vossos emprestimos a réis 80.000:000$000, e os encargos da divida augmentaram tambem do 5.000:000$000 réis por anno! De vós ficou uma lei de recrutamento, que annos antes o sr. Fontes, na parte relativa á remissão dos recrutas a dinheiro, appelidava uma grande immoralidade. Imposto de sangue, incidindo todo sobre o pobre, que não, póde pagar a remissão a dinheiro, e ha de dar ainda o substituto do rico, que se desonerou do mais pesado dos impostos, só porque tinha dinheiro! (Apoiados.)

Sr. presidente, é tempo de entrar no assumpto principal do debate. O sr. Luciano de Castro veiu a esta camara participar a mudança que tinha havido no ministerio, e disse que lhe parecia que deviamos ser parcos e reservados nas considerações referentes ao lastimoso incidente da camara dos srs. deputados. Esta observação tão correcta do nobre presidente do conselho motivou protestos, da opposição, e eu declaro a v. exa. que não os comprehendo, nem os entendo.

O sr. Luciano de Castro como ministro póde tomar parte nos nossos debates, porque a constituição auctorisa a sua intervenção; mas póde igualmente tratar esta materia ca qualidade de par do reino; s. exa. tem direito de discutir e do votar. Diversas são as obrigações do poder executivo e do legislativo; os ministros prestam conta á camara dos seus actos, nós nada temos que affirmar n'este momento, unicamente ouvir a narração do triste incidente., reservando cautelosamente a nossa opinião de juizes.

Temos direito para discutir tudo! Respondo; tudo a sei tempo e hora, não hoje. Invoca-se o artigo 1:020.° da novissima reforma judiciaria para se saber o que é flagrante delicto. Não o invoquem agora, antes procurem na reforma o artigo 1:144.°, que diz por esta fórma:

"Findas as allegações, o juiz, sob pena de nullidade, resumirá o facto, fazendo d'elle e de todas as circunstancias um relatorio simples e claro; apontará, com rigorosa imparcialidade as principaes provas, assim a favor, como contra o réu; e depois proporá os quesitos!"

Sr. - presidente, este artigo, que é para os tribunaes ordinarios, indica a norma do nosso procedimento; depois, das allegações é que devemos discutir, com imparcialidade, apontando as provas a favor e contra o réu.

O sr. Hintze Ribeiro disse, e o argumento fez grande impressão na camara, que deviamos ter em vista o artigo 3.° do ultimo acto addicional, que diz: "nenhum par póde ser preso por auctoridade alguma, salvo por ordem da sua respectiva camara, menos em flagrante delicto, a que corresponde a pena mais elevada da escala penal".

Acrescentou s. exa. que, estabelecendo a hypothese de ser par do reino o não deputado, convinha ler o artigo 4.°, e que este determina: "se algum par ou deputado

for accusado ou pronunciado, o juiz, suspendendo todo o ulterior procedimento, dará conta á sua respectiva camara, a qual decidirá se o par ou deputado deve ser suspenso, e se o processo deve seguir no intervallo das sessões ou depois de findas as funcções do accusado ou indiciado".

A conclusão da leitura d'estes dois artigos, é que, tratando-se de par do reino, a camara tem de tomar conhecimento do processo antes do julgamento,, e aqui está um caso em que não haverá aquelle silencio, aquella completa reserva, recommendada pelo governo e pelos seus amigos.

Sr. presidente, o argumento do digno par não colhe, n'este caso a discussão previa é obrigatoria, a camara dos pares tem de dar licença...

O sr. Barjona de Freitas: - O digno par confunde o artigo 4.° com o artigo 27.° da carta constitucional; o artigo 27.° da carta foi substituido, esse é que dizia que a camara devia decidir se o processo devia continuar.

O Orador: - Peço perdão ao digno par; reconheço que disse mal, dizendo que a camara tinha de dar licença, a camara, decide, pelo artigo 4.°, se o par deve ser suspenso, e se o processo deve seguir no intervallo das sessões ou depois de findas as funcções do accusado. ou indiciado; mas este erro meu não destróe o argumento; é facto que a camara tem de tomar conhecimento, e depois tem de se constituir em tribunal. Não o nego, mas o que prova esta observação do digno par, o sr. Hintze Ribeiro? Nada, a meu ver.

A camara, n'este caso, tratando-se de um dos seus membros, é obrigada, fatalmente, a intervir n'um acto anterior ao processo, deve-o fazer com a maior reserva;, porém, sendo um deputado, não é da sua attribuição satisfazer ao que dispõe, o artigo 4.°, pertence isto á outra camara; nós só temos, então de exercer as funcções de juizes. N'estas circumstancias a lei nada ordena; para que discutir antecipadamente o flagrante delicto e a pena que lhe ha de ser applicada?

Isso só ha de resolver o tribunal, e mal procedemos, tratando-o já.

Pergunto, se aqui se votasse, como corolario de tudo quanto está dito, uma moção, negando o flagrante delicto, declarando que o artigo 1.° dos artigos de guerra da armada de 1799 não póde ser applicado, e antes o artigo 19.° ou 62.°, e se depois a camara dos senhores deputados, considerando o flagrante delicto, e o artigo 1.° dos artigos de guerra de 1799, suspendesse o deputado, ordenando o seguimento, do processo, pergunto,, não resultaria d'aqui um conflicto gravissimo entre as duas camarás? Ninguem o ha de negar.

Sr. presidente, houve outro argumento, produzido no notabilissimo discurso da sr. Hintze Ribeiro, a que eu devo responder largamente, pois teve uma grande importancia no animo da assembléa. Refiro-me ao caso occorrido em 1833 com o conde da Taipa.

Ou eu, com o mau espirito acanhado, não comprehendi os documentos, ou este, que foi produzido, sendo examinado em todas as suas partes, e nas outras provas, que lhe são connexas, apresenta uma demonstração, diversa das reflexões feitas pelo illustre orador da opposição.

Sr. presidente, em 7 de dezembro de 1833, os duques de Palmella e Terceira, os marquezes de Fronteira, Ponte de Lima, Loulé e Santa Iria, os condes de Lumiar, Ficalho e Paraty, todos pares do reino, fizeram um requerimento ao Imperador, rogando a Sua Magestade que mantivesse a immunidade da camara dos pares, e se dignasse mandar-lhes declarar se os artigos da carta, que garantem a inviolabilidade dos pares, se achavam suspensos pelo decreto de 10 de julho de 1832, pelo motivo de ter sido intimada uma ordem de prisão, assignada por um dos ministros criminaes da capital, ao conde da Taipa, par do reino, facto que envolvia manifesta infracção do artigo 26.° da carta constitucional, visto não se apresentar caso de