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N.º 13

SESSÃO DE 8 DE FEVEREIRO DE 1892

Presidencia do exmo. sr. Antonio Telles Vasconcellos Pimentel

Secretarios - os exmos. srs.

Conde d'Avila
Rodrigo Affonso Pequito

SUMMARIO

Leitura e approvação- da acta.- O digno par o sr. Barbosa du Bocage faz varias considerações sobre a venda das colonias. - O digno par o sr. Camara Leme pergunta por uns documentos. - Os dignos pares o sr. marquez de Pomares e o sr. Holbeche fazem declarações de voto.- O digno par o sr. Julio de Vilhena dá explicações sobre actos do seu ministerio.-O digno par o sr. conde do Bomfim manda para a mesa uma interpellação e um requerimento. São lidos. - É levantada a sessão e designada a ordem do dia.

Ás duas horas é quarenta minutos da tarde, achando-se presentes 20 dignos pares, abriu-se a sessão.

O sr. Presidente: - Convido para occupar o logar de segundo secretario o digno par o sr. Rodrigo Pequito.

Foi lida e approvada a acta da ultima sessão.

Não houve correspondencia.

O sr. Conde d'Avila (primeiro secretario): - Communica que o digno par o sr. Luiz de Lencastre o encarregara de participar que não podia comparecer á sessão por incommodo de saude.

O sr. Barbosa du Bocage: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.

O sr. Barbosa du Bocage: - Sr. presidente, um jornal de Lisboa publicou hontem uma correspondencia de Paris, na qual se encontra um trecho que foi transcripto de um jornal de Londres.

Desejo dar conhecimento delle á camara acompanhando-o de algumas considerações. Diz o Daily Graphic:

"... Não ha duvida que a Gran-Bretanha compraria de boa vontade as possessões (portuguezas) da Africa oriental, visto que ellas formam a saída natural para o commercio da Mashona. No anno passado a questão foi debatida entre os dois governos e julgâmos que as negociações foram apenas adiadas com receio dos "chauvinistas lusitanos."

Já vê por conseguinte v. exa. e a camara que o jornal de Londres affirma que ha um anno o governo portuguez entabolára negociações com o governo britannico para a venda das possessões portuguezas de Moçambique, e que sómente desistira de adiantar essas negociações em consequencia de receiar o chauvinismo portuguez.

Sr. presidente, o ministerio que ha um anno occupava aquellas cadeiras, é o ministerio que subiu ao poder em l8 de outubro de 1890, e do qual eu tive a honra de fazer parte; corre-me por isso o dever de declarar aqui, cabal e peremptoriamente que a asserção do jornal de Londres é inexacta e porventura calumniosa.

O governo que subiu ao poder em 13 de outubro de 1890 foi ali chamado principalmente para resolver o conflicto com a Inglaterra; não para vender colonias; foi chamado ao poder para sustentar os direitos de Portugal sobre as nossas possessões de Moçambique, e para dirimir o conflicto existente com a Inglaterra do modo que fosse mais decoroso para o nosso paiz.

O governo que occupou aquellas cadeiras desde 1890 até maio do anno passado, tomou a seu cargo a missão que lhe fôra confiada, e os homens que o compozeram, podem affirmar, sem receio de contradição, que empregaram todos os seus esforços para se desempenharem do encargo que lhes fora commettido e tem a consciencia tranquilla e segura de que lograram resolver o conflicto com a Inglaterra pela unica maneira por que podia ser resolvido e de um modo completamente decoroso para o paiz.

O governo de que eu tive a honra de fazer parte, nunca estabeleceu negociações n'esse sentido, nunca se occupou da venda de qualquer possessão, nunca deu esse encargo, nem official nem officiosamente a ninguem, e nunca lhe passou, sequer, pela idéa, occupar-se d'esse assumpto.

Aquella asserção do Daily Graphic, por consequencia é completamente falsa.

Eu poderia limitar aqui as minhas considerações, mas desejo ir um pouco mais longe.

Hoje, completamente desligado de todos os partidos, sem ter logar em nenhuma parcialidade das que dividem a nossa politica, desejo declarar que sou completamente opposto á idéa de vender as nossas colonias. (Apoiados.)

Essa questão trazida, ou ao parlamento ou ao publico, parece-me inopportuna.

Eu sei que se vê na venda das nossas colonias um novo elixir, mas considero esse tão pernicioso, como o outro que algumas corporações financeiras acclamaram como salvador e que por fim nos veiu trazer a situação dolorosa e extremamente difficil em que nos encontrâmos.

No meu entender, a nossa situação não se resolve com elixires, mas sim com o accordo de todas as vontades, com a união de todos os que se interessam realmente pelo bem do nosso paiz; pelo muito juizo, pela muita reflexão e pela sujeição completa e verdadeira de todos os sacrificios que forem necessarios, o que aliás não passa de um dever nosso, especialmente n'esta occasião.

Só assim, sr. presidente, nós poderemos sustentar a nossa integridade e manter no convivio das potencias uma posição condigna das nossas tradições.

O sr. D. Luiz da camara Leme:- Sr. presidente, tomo a liberdade de perguntar a v. exa. se já chegaram á mesa uns documentos importantes que pedi ha dias para me serem remettidos pelo ministerio da fazenda; no caso de não terem vindo pedia a v. exa. que tivesse a bondade de instar novamente pela sua remessa, pois me são necessarios para a discussão de um assumpto que deve realisar-se brevemente.

Sinto não ver presente nenhum membro do governo, especialmente o sr. ministro da fazenda que um motivo justificado o impede de vir ao parlamento, porque desejava pedir-lhe algumas explicações sobre um negocio a que me referi outro dia de um certo adiantamento feito á companhia do caminho de ferro de Ambaca.

Não sei a quem pertence esta responsabilidade, se ao ministerio da fazenda, se ao ministerio da marinha da situação transacta; se estivesse presente o sr. ministro da marinha far-lhe-ia agora algumas perguntas a este respeito.

Desejava tambem referir-me a um outro assumpto, a um levantamento de 4:000 contos de réis da caixa geral de depositos, onde o governo não tem ingerencia alguma

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e que só por auctorisação do poder judicial póde ser levantado.

Corre isto no publico; os jornaes têem-se occupado do assumpto, e era bom que se d'esse explicações a tal respeito.

Como não está representado o governo, nada mais digo, limitando-me a renovar perante v. exa. o pedido de instar pelos documentos que requeri.

O sr. Presidente: - Os documentos ainda não vieram. Vae-se instar por elles e, logo que cheguem, serão remettidos ao digno par.

O sr. Marguez de Pomares: - Por incommodo de saude não tenho podido assistir a algumas sessões; assim o communico a v. exa. declarando tambem que, se assistisse áquella em que se votou o parecer da commissão de legislação sobre o processo do digno par o sr. Mendonça Cortez, teria approvado as conclusões do mesmo parecer.

Rogo a v. exa. faça exarar na acta esta minha declaração.

O sr. Presidente: - Far-se-ha menção na acta da declaração do digno par.

O sr. Holbeche: - Pedi a palavra para fazer igual declaração á do sr. conde de Pomares.

Tambem por incommodo de saude não tenho assistido a algumas sessões, e approvaria o parecer relativo ao sr. Cortez, se estivesse presente no acto da suai votação.

Igualmente peço se tome nota d'esta declaração.

O sr. Presidente: - Serão satisfeitos os desejos do digno par.

O sr. Julio de Vilhena: - Como o digno par o sr. D. Luiz da Camara Leme alludiu a uma operação financeira realisada com a companhia dos caminhos de ferro de Ambaca, eu agradeço a s. exa. o ter trazido, essa questão ao parlamento e dar-me assim ensejo a poder determinar a minha responsabilidade pessoal ou solidaria não só n'este assumpto, como em outros muito importantes que occupam a attenção do paiz, e de que se falla no relatorio do sr. ministro da fazenda.

Entendo que a responsabilidade individual consiste na pratica de um acto privativo do ministro em relação ao assumpto de que se trata e a responsabilidade solidaria na approvação d'esse acto em conselho de ministros, embora não tenha tido n'elle o ministro uma interferencia especial.

Postos estes principios, e em harmonia com elles, vou declarar quaes as minhas responsabilidades;

Nenhuma responsabilidade, nem individual nem solidaria tenho em relação aos adiantamentos feitos a bancos e companhias, desde o syndicato de Salamanca até á companhia do norte e leste.

Com respeito á questão da companhia do caminho de ferro de Ambaca, se é certo que esse assumpto pertence ao ministerio ida marinha, isto não quer dizer que todas as operações relativas a essa linha ferrea possam pertencer á responsabilidade do ministro d'aquella pasta.

Desconheço completamente o facto a que me refiro, e affirmo que elle não foi levado a conselho de ministros.

Já que estou com a palavra, não posso deixar de me referir a um outro assumpto, a questão da mala real.

Na questão da mala real eu tenho alguma, responsabilidade, e vou dizer quaes são os termos precisos d'essa responsabilidade.

Ha aqui tres pontos a considerar: o primeiro é o desconto de tres recibos na importancia de tres prestações mensaes; o segundo e um adiantamento de 120 contos de réis, e o terceiro um adiantamento de 120 contos de réis garantido por uma escriptura.

Com relação ao segundo e ao terceiro facto não tenho responsabilidade individual nem collectiva, quero dizer, não tenho responsabilidade no adiantamento de 120 contos de réis, nem responsabilidade no adiantamento de 700 contos de réis a que se refere uma escriptura que foi ultimamente lavrada.

Este ultimo adiantamento fez-se sem que eu tivesse conhecimento da escriptura. Fallou-se, é verdade, em conselho de ministros d'esta ultima operação, mas, a respeito d'ella não se tomou nenhuma deliberação.

Qual é, pois, a minha responsabilidade na questão da mala real?

A minha responsabilidade está no seguinte:

Em 3 de junho do anno passado entrou no ministerio da marinha o seguinte officio do ministerio da fazenda, remettendo por copia um outro da mala real, que pedia para lhe serem descontados na caixa geral de depositos tres recibos do seu subsidio mensal:

"Illmo. e exmo. sr.- S. exa. o sr. ministro da fazenda encarrega-me de remetter a v. exa. a adjunta copia do officio, recebido hoje da mala real portugueza, para descontar na caixa geral de depositos tres recibos do seu subsidio mensal (viagens de maio, junho e julho) a fim de que v. exa. se digne saber de s. exa. o ministro da marinha o que se lhe offerecer sobre o assumpto.

"Deus guarde a v. exa. Direcção geral da thesouraria, 3 de junho de 1891.-Illmo. e exmo. sr. conselheiro director geral do ultramar. = Luiz Perestrello de Vasconcellos."

Sobre esto officio lavrei o despacho, de que não tinha duvida em conceder o subsidio, desde que elle se achasse vencido, nos termos do contrato.

Eis o teor d'esse despacho:

"Em resposta ao officio da direcção geral da thesouraria, declare-se que este ministerio não tem duvida em entregar directamente a caixa geral de depositos os subsidios de que se trata, desde que se achem vencidos, nos termos do contrato em vigor.

"4 de junho de 1891.= Vilhena."

De accordo com este meu despacho respondeu-se ao ministerio da fazenda no seguinte officio, por mim revisto:

"Illmo. e exmo. sr.- Em resposta ao officio de v. exa. de 3 do corrente mez, encarrega-me s. exa. o ministro e secretario d'estado dos negocios da marinha e ultramar, por seu despacho de 4 do corrente mez, de dizer a v. exa. que este ministerio não tem duvida em entregar directamente á caixa geral de depositos os subsidios da empreza da mala real portugueza dos mezes de maio, junho e julho, desde que se achem vencidos nos termos do contrato com a mesma empreza, e legalmente liquidados.

"Deus guarde a v. exa. Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 6 de junho de 1891.- Illmo. e exmo. sr. director geral da thesouraria do ministerio da fazenda. = Francisco Joaquim da Costa e Silva.

São, pois, tres factos distinctos, e sobre cada um d'elles aqui tem v. exa. qual a minha responsabilidade.

Em relação ao desconto dos tres recibos, relativos aos mezes de maio, junho e julho, creio que procedi como devia, porque tendo-se-me dito do ministerio da fazenda que se tinham descontado esses tres recibos, eu respondi que entregaria as respectivas prestações á medida que se fossem vencendo.

Por consequencia, durante a minha gerencia, não se fez adiantamentos alguns pelo ministerio da marinha.

E deve notar-se que eu entregava as referidas prestações em troca dos recibos, quer me fossem estes apresentados pela caixa geral de depositos, quer por um particular, pela simples rasão de que não tinha direito de conserval-as em meu poder depois de vencidas.

São estas as minhas responsabilidades em todos estes assumptos, que estão preoccupando a opinião publica.

Sr. presidente, se eu faço estas declarações não é com o intuito de me eximir a responsabilidades, porque respondo inteiramente pelos meus actos; mas é porque acho conveniente que todos os homens publicos venham, no momento em que se liquidam responsabilidades, dizer quaes são as que lhes competem para se poder fallar desassombradamente.

O digno par prestou-me pessoalmente um grandissimo

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serviço, porque amigos meus se têem dirigido a mim, fazendo-me perguntas com referencia aos adiantamentos á companhia do caminho de ferro de Ambaca e á empreza da mala real. Como estas duas emprezas dependem do minis terio da marinha é o publico não distingue bem o que são operações de thesouraria do ministerio da fazenda e o que depende dos outros ministerios, não admira que se façam taes perguntas.

Não só com relação aos mencionados assumptos, mas a todos os que são dependentes da minha pasta, estou sempre prompto em qualquer occasião a dar completas, amplas e cabaes explicações.

O que eu asseguro á camara é que não adiantei cousa alguma a ninguem durante os ultimos tempos da minha gerencia do ministerio da marinha.

Ha uma empreza que fez os estudos do caminho de ferro do Chire; com relação a ella cheguei a praticar o acto barbaro de não attender a uma sua pretensão, porque julguei que, nas circumstancias em que se encontrava o paiz, eu não podia despender a quantia de que se tratava, sem fazer uma tal ou qual perturbação na economia do orçamento.

Sr. presidente, eu não quero para mim privilegios de virtude nem diploma de honestidade que não preciso se me passem, mas nas circumstancias em que estamos, gravissimas, porque na minha opinião não se trata de uma crise financeira nem economica, mas de uma crise social, não desejo que a minha voz fique afogada debaixo do peso de uma suspeição qualquer. Estimo liquidar responsabilidades para ter a minha palavra livre e dizer ao paiz a minha opinião.

Repito, as circumstancias são gravissimas, a onda não póde parar onde nj5s quizermos, póde chegar mais longe, póde subverter as instituições que temos obrigação de conservar e é isso que eu hei de combater e contrariar quanto poder.

Por ora não digo mais nada.

Se qualquer dos meus illustres collegas deseja alguns esclarecimentos sobre qualquer assumpto, creia que não me contraria absolutamente nada; não fará senão dispensar-me um favor a que eu corresponderei agradecendo e dando as explicações que me forem pedidas.

O sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto.

O sr. Conde do Bomfim: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - Tem o digno par a palavra.

O sr. Conde do Bomfim - Sente não ver representado o governo, porque desejava chamar a sua attenção para alguns assumptos importantes.

Entretanto communica que deseja interpellar o sr. ministro da guerra sobre os effectivos do exercito, relacionados com a segurança interna e externa do paiz; sobre o tempo de serviço nas. fileiras para a arma de cavallaria, sobre as necessidades da escola pratica de artilheria, e sobre diversos assumptos referentes a um tempo á organisação militar e á questão financeira.

O sr. Presidente: - Acho que o mais regular é v. exa. escrever a sua nota de interpellação o mandal-a para a mesa.

O sr. Conde do Bomfim: - Vou então escrevel-a.

(Pausa.)

Mando para a mesa a minha nota de interpellação e mais um requerimento.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a nota de interpellação enviada para a mesa pelo digno par.

Leu-se. É do teor seguinte:

Nota de interpellação ao sr. ministro da guerra

Sobre os effectivos do exercito, relacionados com a segurança interna e externa do paiz; tempo de duração nas fileiras para a arma de cavallaria; necessidade da escola pratica de artilheria, e diversos assumptos communs com a organisação militar e questão financeira.

Sala das sessões da camara dos dignos pares. = O par do reino, Conde do Bomfim.

O sr. Presidente: - Vae ser remettida ao sr. ministro da guerra, e logo que s. exa. se declare habilitado, será dada para ordem do dia.

Vae ler-se o requerimento.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro o ultimo relatorio da escola pratica de cavallario. = Conde do Bomfim.

Mandou-se expedir.

O sr. Presidente: - Como já não ha nenhum digno par inscripto, vou levantar a sessão. A seguinte será na sexta feira, 12 do corrente; a ordem do dia será apresentação de pareceres.

Está levantada a sessão.

Eram tres horas e quinze minutos da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 8 de fevereiro de 1892

Exmos. srs. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel; Marquez de Pomares; Condes: d'Avila, do Bomfim, de Carnide, de Lagoaça, de Linhares, de Paraty; Visconde de Sousa Fonseca; Antonio Candido, Serpa Pimentel, Cau da Costa, Augusto Cunha, Bazilio Cabral, Bernardino Machado, Palmeirim, Sequeira Pinto, Hintze Ribeiro, Jeronymo Pimentel, Holbeche, Bandeira Coelho, Ferraz de Pontes, Ponte Horta, Mexia Salema, Bocage, Julio de Vilhena, Camara Leme, Bivar, Vaz Preto, Mathias de Carvalho, Rodrigo Pequito, Sebastião Calheiros, Thomás Ribeiro.

O redactor = F. Alves Pereira.

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