122 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
peita aos crimes contra a honra, diffamação, calumnia e injuria, estão precisamente incriminados os actos de responsabilidade crime, quando não houver publicidade, e tendo essa doutrina ha muitas dezenas de annos sido acceita e executada pelos tribunaes judiciaes sem a menor reclamação, de certo são infundadas as duvidas que se apresentam, e não é só esta doutrina penal em Portugal, mas sim em todos os codigos das nações cultas, como em poucos momentos se póde verificar pela leitura de qualquer commentario á legislação penal.
Respondo igualmente ao digno par o sr. conde de Thomar que a proposta apresentada, desde que pelos meios legaes seja convertida em lei, obriga como qualquer outro diploma e apenas com a restricção de que trata o artigo 5.°
Sr. presidente, o effeito da retroactividade, a que se refere o digno par, é excepção ao direito commum, é mesmo a sua revogação, mas adoptada por ser imposta pelas circumstancias e factos recentemente dados.
Sr. presidente, o digno par a quem tenho a honra de responder procurou tornar saliente a differença entre as disposições do actual projecto e as que se encontram em vigor hoje em França pelos diplomas- publicados em 1893 e 1894.
Permitta-me o digno par que não é facil encontrar severidade de pena na applicação de factos criminosos praticados em Portugal, quando já foram riscadas do nosso codigo as duas penas mais graves «a pena ultima e a pena perpetua», que ainda vigoram no paiz a cuja legislação o digno par se referiu.
Sr. presidente, diversas propostas foram mandadas para a mesa e importariam ellas o adiamento da discussão. Na qualidade de relator do projecto declaro a v. exa. e á camara que não posso acceitar as mesmas propostas, visto que o projecto que se discute não é de natureza restricta á repressão, mas principalmente tende a prevenir a repetição de novos attentados, e assim por sua natureza inadiavel.
Sr. presidente, referiu-se o digno par o sr. conde de Thomar ao augmento de policia apresentado pelo governo; esta é uma questão puramente administrativa e que mais respeita ás respectivas commissões que assignaram o parecer, e desde que nenhuma duvida se offereceu e o governo, declarou que, como complemento das medidas propostas, era indispensavel para a sua execução o augmento da força policial, a commissão de legislação, no interesse da causa publica, approvou similhante providencia.
Parece-me ter satisfeito aos desejos do digno par o sr. conde de Thomar, respondendo por completo ás suas perguntas; se houve ommissão s. exa. me indicará qualquer outra explicação que deseje.
O sr. Conde da Azarujinha (para um requerimento):— Requeiro a v. exa., sr. presidente, que se digne consultar a camara sobre se concorda em que seja prorogada a sessão até se votar o projecto que se discute.
O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o requerimento que acaba de fazer o digno par o sr. conde da Azarujinha, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Presidente: — Em vista da resolução da camara, está prorogada a sessão.
Vae dar-se conta de uma mensagem.
Foi lida uma mensagem vinda da outra camara, incluindo a proposição de lei que tem por fim considerar cursos superiores, e equiparando-os para todos os effeitos aos demais cursos superiores das outras escolas do reino, o antigo curso superior do commercio, creado por lei de 6 de março de 1884, o curso superior do commercio, decretado em 30 de dezembro de 1886 e o actual curso completo do segundo grau ou superior dos institutos indusdustriaes e commerciaes de Lisboa e Porto.
Foi enviada ás commissões de instrucção publica e de commercio e artes.
O sr. Presidente: — Continua a discussão, e tem a palavra o digno par o sr. conde de Lagoaça.
O sr. Conde de Lagoaça: — Sr. presidente, é realmente extraordinaria a pressa que o governo tem de votar todos os projectos, prorogando todos os dias as sessões. Não posso perceber qual a rasão de ordem publica que obrigue o governo a ter hoje votado, e não amanhã, o projecto de lei que está em discussão.
O governo lá terá as suas rasões, mas eu não as percebo.
O illustre relator da commissão e meu prezado amigo, declarou que vota este projecto, porque elle se funda em uma questão de ordem publica; e que em questões de ordem publica está sempre ao lado do governo.
Tambem eu estou com o meu illustre collega.
As questões de ordem publica estão sempre muito superiores a todas as outras; prevalecem sempre ás questões de partido e de interesse particular. Isso é evidente; mas d’ahi a dar a um governo tudo quanto elle vier pedir, sob pretexto de manter a ordem publica, vae uma grande distancia.
Reservo-me os direitos de apreciação e de critica, para ver se os meios que elle pede, a fim de manter a ordem publica, são realmente acceitaveis e necessarios.
O illustre relator fez d’isto uma questão de confiança. Ora, se s. exa. tem toda a confiança no governo, e lhe dá os trezentos policias pedidos neste projecto, eu é que não tenho n’elle confiança alguma, e portanto não voto sem primeiro ver bem do que se trata e o que se pede.
As explicações do nobre ministro da justiça não me convenceram absolutamente nada. Devo dizer que foram honradas, como honrado é o seu caracter.
Para dizer a verdade, s. exa. é o ministro meu favorito do actual ministerio. Se s. exa. se conservasse sempre na sua cadeira, para manter todas as declarações terminantes e honradas que fez hoje á camara, talvez eu não tivesse grandes desejos de o abandonar. Mas se ámanhã ha uma crise ministerial, e os seus collegas o põem fóra, e ficam os ministros que não são meus favoritos, os que saltam por cima de todas as leis, que infringem à constituição do estado e atacam as liberdades publicas, lá posso eu tambem ser condemnado a ir para a Africa, só por estar conversando sobre anarchistas n’um logar qualquer.
É o que se deduz do artigo 1.° combinado com o artigo 2.° d’esta lei.
(Leu.)
E diz o illustre relator da commissão, respondendo ao sr. conde de Thomar, que nesta lei não ha exagero de pena, que na lei franceza ha mais severidade! Não ha exagero de pena e por uma simples conversa, por uma simples carta, póde ser um cidadão sequestrado pela policia, mettido na cadeia durante seis mezes e em seguida posto á disposição do governo, e quem sabe se condemnado a degredo por toda a vida!
Eu, sr. presidente, suppuz que me coubesse mais cedo a palavra, e como a hora vae adiantada não me alongarei na exposição das rasões que tenho para não approvar este projecto.
Já antes de mim fallou o digno par sr. Marçal Pacheco, o qual, com a sua palavra sempre habil, expõe tão bem e tão lucidamente todas as questões de que se occupa; fallou tambem o meu amigo e collega o sr. conde de Thomar; o assumpto está esgotado, o governo com pressa de que o projecto se vote, a camara fatigada, a sessão prorogada, portanto, limitarei o mais possivel as minhas considerações.
Esta lei, diz o sr. ministro da justiça, tem por fim incriminar actos que não estavam comprehendidos na legislação penal; deu-lhe origem o attentado que se praticou em casa de um sub-delegado de saude.
Disse tambem s. exa.: esta lei não é de repressão, é mais para prevenir do que para reprimir attentados