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SESSÃO N.° 13 DE 12 DE FEVEREIRO DE 1896 123

D’aquella ordem. Vou, em curtas palavras, demonstrar que ella não reprime nem previne, e que, pelo contrario, não faz mais do que vir augmentar o perigo social.

O que é certo é que a lei se deve considerar lei de excepção, feita expressamente por causa de um attentado.

E de passagem direi que sinto immensa pena de não ter assistido a essa diligencia policial que o sr. presidente do conselho nos contou, por que queria ver a cara da policia, cara que deveria ser de admiração e espanto.

Mas, pergunto eu, como é castigado o criminoso? Segundo as leis communs vae os seis mezes para a cadeia, ficando depois á disposição do governo?

Se os srs. ministros teem tanta coragem e tanto amor á ordem publica, tivessem inventado outra lei mais repressiva.

Eu queria uma lei para castigar severamente aquelles que commettessem attentados tão monstruosos, como o que foi praticado na rua do Duque de Bragança, e não para vir atacar as liberdades publicas.

Agora direi ao nobre ministro da justiça que a lei não reprime nem previne, e s. exa., que é muito conhecedor da materia, sabe-o perfeitamente.

Sr. presidente, eu não venho aqui defender o anarchismo, sou contra elle e muito principalmente, quando se manifesta por actos brutaes, irracionaes, sem logica, que mais parecem de loucura do que outra cousa.

Haja as maiores repressões, e até se quizerem a pena de morte, porque eu estou prompto a votal-a. Se me apontarem um homem que tenha tentado por meio de uma bomba causar a morte ou alguma outra desgraça a qualquer pessoa, eu sou o primeiro a concordar em que se lhe deve cortar a cabeça. Por consequencia, para taes casos todo o rigor é pouco.

(Interrupção a meia voz que se não percebeu.)

O caso recente succedido em casa do sr. dr. Joyce foi que deu logar a esta lei na qual se não inventou nada de util e efficaz, mas apenas o governo aproveitou a occasião, para com uma serie de disposições, atacar as liberdades publicas.

A policia tem creado com carinho os chamados anarchistas, que, estou convencido, em Portugal não estão organisados como noutros paizes e ser anarchista n’este paiz é mais um modo de vida, um officio, do que uma seita. Elles sabem perfeitamente que, chegando ao governo civil são logo empregados, e a prova está no que disse o sr. presidente do conselho: que os nove anarchistas que foram presos estavam todos empregados em obras do estado. Um, sei eu, que foi para o ministerio das obras publicas ganhando 700 réis, mas não os querendo receber por achar pouco, no governo civil disseram-lhe que os fosse recebendo, porque depois lhe arranjaria um pretexto para que elle recebesse mais 500 réis.

A policia tinha-os na mão, como se disse.

Elles reunem-se em toda a parte. Chegou a haver uma reunião no pateo do governo civil que durou quarenta minutos e a policia embasbacada a ouvir os oradores.

Por occasião da morte de Carnot houve uma reunião de anarchistas num vapor que alugaram para os levar a Villa Franca, mas não poderam desembarcar porque o Tejo trazia muita agua. Voltaram então rio abaixo e no proprio vapor realisaram a sua assembléa.

Que bella occasião para se fazer com que o vapor seguisse o destino conveniente!

O sr. ministro da justiça sabe que, como se costuma dizer, o segredo é a alma do negocio, pois é tambem a arma do anarchisrno, a mola real sobre que gira todo aquelle complicado systema que constitue uma escola com caracter mais ou menos scientifico.

Não me é difficil demonstral-o.

Pela historia dos attentados praticados lá fóra, verá v. exa. que digo a verdade.

Quando os anarchistas fizeram ir pelos ares o restaurant Very, a policia andava vigiando cuidadosamente este estabelecimento.

Desconfiara-se de Vaillant e para a imprensa tinham sido mandados os signaes caracteristicos d’este anarchista.

Um dia entrou no restaurante um homem em quem o creado reconheceu os signaes dados pela policia; foi immediatamente participal-o e Vaillant foi preso ali mesmo. É sabido que a policia franceza é muito perspicaz, e principalmente a policia secreta está muito bem organisada.

Para evitar que o restaurante soffresse algum damno ou attentado, foi minuciosamente e rigorosamente vigiado, como já disse. Mas no dia em que Vaillant estava para responder nos tribunaes foi pelos ares o restaurante sem que a policia o evitasse, estando já prevenida. O dono do restaurante morreu e outro homem que estava almoçando. Outro attentado tambem depois se deu no commissariado de policia, morrendo todas as pessoas que lá estavam.

Eu não venho para aqui advogar os anarchistas porque posso ser levado para a cadeia.

Ora, d’aqui se vê o perigo que ha quando aquella seita se organise.

O que faz o governo com este projecto? A lei de hoje póde vir a ser para os anarchistas portuguezes os seus proprios estatutos.

Não digam nada lá fóra do que se passa cá dentro, porque se disserem vão para a cadeia e depois para a Africa, e podem lá ficar por toda a vida.

Se forem agarrados, não importa, cá ficam outros para os vingar.

Esta é que é a theoria dos anarchistas. Quando elles se resolvem a vir cá para fóra, não ha nada que possa impedil-os; haja vista o assassinato de Carnot, praticado diante da força publica e na propria carruagem do presidente.

Por consequencia, sr. presidente, do que eu discordo é dos meios de que o governo entende que se deve servir para evitar os attentados anarchistas.

Concordo na punição dos attentados, mas não em que esta lei seja conducente a prevenil-os.

Quanto a dever-se assegurar a existencia da ordem social, estou de accordo.

Pelo que respeita á questão da rectroactividade, já o sr. ministro da justiça explicou o sentido em que se estabeleceu aqui esse principio: s. exa. mostrou que não quer applicar a retroactividade senão aos ultimos acontecimentos. Mas como é que s. exa. poderá assegurar que outros a não appliquem a factos anteriores a esses? E mesmo sobre os ultimos factos, devia ser só a respeito dos attentados materiaes em si, porque eu tenho, por exemplo, aqui o Correio da noite de hontem, que discorre sobre o anarchismo, e pergunto se esta lei se póde applicar tambem ao respectivo artigo do jornal.

O sr. ministro da justiça diz-me, de certo: — eu não applico — e eu acredito-o; mas vem outro ministro da justiça e diz: — pois eu applico, quem disse que não applicava foi o sr. Antonio d’Azevedo.

Ora, isto é que convem evitar, para se não deixar o arbitrio nas mãos de todos aquelles que porventura possam ter espirito vingativo.

Isto, como aqui está, significa a continuação da dictadura, mesmo com o parlamento aberto.

Portanto, eu, que approvo a repressão, o castigo dos attentados violentos e odiosos, não desejo, ao mesmo tempo, que se possa fazer soffrer quem não deve.

Sr. presidente, a abolição da pena de morte é incontestavelmente uma das paginas mais gloriosas da nossa historia, mas para estes casos eu não teria duvida em a votar.

Eu acredito que o sr. ministro da justiça não dará a al-