SESSÃO N.° 13 DE 12 DE FEVEREIRO DE 1896 125
Póde votar-se afoitamente, porque quem não é com a sociedade, é contra a sociedade. A missão do governo é defendel-a; cumpra o orador essa missão, cumpra-a o governo, cumpram-n’a todos sinceramente, com inteiro desassombro e com a mais absoluta convicção de que cumprem o seu dever como homens, e; sobretudo, o sen dever como bons cidadãos.
(O discurso de s. exa. será publicado na integra, quando haja revisto as notas tachygraphicas.)
O sr. Conde de Thomar: — Pedi a palavra, sr. presidente, para responder ao meu nobre amigo o sr. Sequeira Pinto.
S. exa. começou o seu discurso por me dirigir phrases amaveis, como aliás é seu costume, e que eu muito lhe agradeço, sobre tudo as que diziam respeito á memoria de meu pae.
Não foram para mim uma surpreza as gentis referencias do digno par, estou costumado a ellas, pois de ha muito nos conhecemos, da idade dos sete ou oito annos talvez.
S. exa. muito amavelmente se referiu a umas observações feitas por mim a um codigo estrangeiro.
Ora eu, que não sou jurisconsulto, e que me reconheço incompetente para tratar de assumptos d’esta natureza, devo dizer ao digno par que unicamente alludi á parte do projecto que se refere á imprensa, e disse que a emenda que tinha mandado para a mesa era a copia fiel do que estava na lei franceza, e nunca tive a pretensão de me embrenhar na apreciação dos codigos. Deixo isso para os jurisconsultos.
Ao que s. exa. me não respondeu é se a retroactividade do artigo 5.° abrange todos aquelles que estão nos calabouços do governo civil, mesmo os que não se provar terem attentado contra a propriedade ou individuos, servindo-se de materias explosivas.
Certamente foi esquecimento do illustre relator do projecto, pois estou convencido de que se não fôra isso s. exa. me havia já dado resposta satisfactoria.
Emquanto ás referencias do sr. presidente do conselho, com respeito á policia, permitta-me s. exa. que o diga, foram a confirmação do que eu disse no principie da discussão.
S. exa. tem todas as penalidades estabelecidas pela lei de 1892, para o caso em questão e que s. exa. nos leu.
Ora, é exactamente o que temos estado a discutir e que vem confirmar a minha opinião: que a policia e tribunaes de Lisboa estão armados com os meios necessarios sem que haja necessidade da approvação do projecto e do augmento de policia.
S. exa. citou alguns capitules de um livro que eu não conheço.
Se eu desejasse entrar neste caminho bastava ler a opinião do nosso excellente e pacifico collega, o sr. Antonio de Serpa do trecho de um livro que s. exa. publicou sobre este assumpto e que diz, por exemplo:
«O anarchismo theorico, sympathico emquanto respeitador em absoluto da liberdade humana, tem o capital defeito de julgar immediata e praticamente realisavel o ideal.
«Não é pela violencia nem pela perseguição que a idéa anarchista poderá ser debelada.
«Para combater efficazmente as suas tendencias revolucionarias, e todas as que resultem do antagonismo e do odio das classes, é essencial que o progresso moral acompanhe na sociedade o progresso material e o progresso scientifico. A violencia póde e deve empregar-se contra a violencia e não contra a idéa. = Antonio de Serpa.»
Isto são opiniões de um ou de outro escriptor, o que não quer dizer que o sr. Antonio de Serpa, distincto escriptor, estadista e economista, seja um anarchista pelo facto de ter escripto um livro sobre anarchismo. Pelo projecto em discussão póde ser mettido na cadeia.
Póde alguem dizer onde acaba o socialismo e onde começa o anarchismo?
De certo que não! É pois necessario separar a theoria da pratica, e é exactamente o que se não consegue pelo projecto em discussão.
Terminando, declaro que approvo o projecto em discussão na sua generalidade, mas estimaria muito que o governo inserisse no projecto a sumuladas observações apresentadas pelo digno par sr. Marçal Pacheco, porque isso dava logar a melhor interpretação do projecto e o tornava mais acceitavel.
O sr. Conde de Lagoaça: — Diz que, comquanto a prelecção sobre anarchismo feita pelo sr. presidente do conselho tivesse sido brilhante, s. exa. não respondera á sua pergunta.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro):— Responde que a retroactividade do projecto é só relativa aos recentes attentados anarchistas.
O sr. Presidente: — V. exa. está satisfeito com as explicações dadas pelo sr. presidente do conselho?
(Gesto affirmativo do sr. conde de Lagoaça.)
Está esgotada a inscripção. Vae votar-se o projecto.
O sr. Marçal Pacheco: — Peço a palavra.
O sr. Presidente: — Tem o digno par a palavra.
O sr. Marçal Pacheco: — Sr. presidente, o sr. ministro da justiça, na resposta que fez o favor de dar ás minhas considerações, e em deferimento1 á minha solicitação, fez algumas declarações que, se bem as entendi, foram as seguintes: primeira, que os intuitos d’este projecto não eram nem incriminar, nem punir os direitos imprescriptiveis do pensamento humano, uma vez que não exista exteriorisação criminosa; segunda, que a incriminação estabelecida no artigo 4.°, a respeito da imprensa, não abrange senão a narrativa dos attentados anarchistas ou a dos debates judiciaes sobre este assumpto; terceira, que a retroactividade estabelecida no artigo 5.°, não vae alem dos actos e factos recentes, e que não comprehende nem abrange a imprensa.
Em vista d’estas honradas declarações do sr. ministro da justiça, corroboradas pelas do sr. presidente do conselho, declarações que devem considerar-se como a interpretação authentica de algumas disposições do projecto em discussão, peço a v. exa. que consulte a camara sobre se ella permitte que retire a moção que mandei para a mesa.
(O orador não reviu estas notas.)
O sr. Presidente: — Os dignos pares que consentem que o sr. Marçal Pacheco retire a sua proposta tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Presidente: - Estão sobre a mesa tres propostas do sr. conde de Thomar, sendo uma dellas de adiamento ao projecto.
Tem a palavra o sr. conde de Thomar.
O sr. Conde de Thomar: —Se o sr. ministro da justiça acceita e confirma a doutrina exposta nos tres pontos que foram lidos pelo digno par o sr. Marçal Pacheco e faz as declarações n’este sentido, eu não tenho duvida de retirar as minhas propostas.
O sr. Presidente: — V. exa. tem uma proposta de adiamento, mas tambem estão sobre a mesa mais duas moções de s. exa., uma de emenda, e outra de additamento. Pergunto, s. exa. pede para retirar as tres ou só a do adiamento?
O sr. Conde de Thomar: — Pedirei licença para retirar as tres propostas se o sr. ministro da justiça declarar que acceita a doutrina das declarações feitas pelo digno par o sr. Marçal Pacheco.
O sr. Ministro da Justiça (Azevedo Castello Branco):— Pedi a palavra para declarar que confirmo completamente as declarações feitas ha pouco em resposta ás observações que foram, produzidas pelo digno par o sr. Marçal Pacheco.
O sr. Presidente: — Os dignos pares que consentem