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128 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

observações produzidas pelo digno par o sr. Marçal Pacheco. Para que não haja, porém, a minima duvida a respeito do assumpto, julgo conveniente expor o seguinte:

O digno par concluiu do meu discurso que, peie projecto, não se pretendia lesar os direitos imprescriptiveis do pensamento humano. Estou absolutamente de accordo.

Disse mais, que unicamente era possivel a exteriorisação criminal d’esse mesmo pensamento.

Estas expressões não as ouvi eu durante o discurso de s. exa., nem tambem as usei; mas devo francamente declarar que são acceitaveis, desde que se diga que essa exteriorisação criminosa é aquella a que a lei nos seus termos precisamente se refere, alludindo á perigosa propaganda do anarchismo.

E livre a todos manifestar o seu pensamento por palavras ou por escripto, uma vez que cada um seja responsavel pelos abusos que praticar, e que estejam incriminados em qualquer disposição penal.

Ora, a recente lei incrimina a expressão do pensamento quando elle tenda a provocar, por qualquer fórma, directa ou indirectamente, attentado quer contra as pessoas, quer contra a propriedade, ou ataquem a existencia da ordem social, ou sejam conducentes aos mesmos effeitos.

Portanto, a exteriorisação criminal está definida nos termos explicites da lei.

Eu não posso, nem devo reproduzir os argumentos que adduzi ha poucos dias, para demonstrar o sentido da lei; mas ainda formularei um exemplo. É indubitavel que o direito de propriedade privada, a sua constituição e transmissibilidade póde discutir-se e impugnar-se até á legitimidade d’aquelle direito; mas se alguem, pretendendo acabar com a propriedade particular, aconselhar o roubo, o incendio, a destruição, como sendo os meios mais idoneos para attingir aquelle fim, evidente é que se incorre na incriminação da lei, porque commette um abuso da expressão do pensamento, propalando idéas perigosas e instigadoras de attentados.

Nas leis estrangeiras, referentes ao anarchismo, ha disposições analogas, porque a criminalidade que se intenta combater tem um caracter especifico, que se manifesta pela mesma fórma, com iguaes tendencias nos diversos paizes.

Entendida pela fórma exposta a phrase de que se serviu o digno par sr. Marçal Pacheco, não ha discordancia essencial entre ella e as explicações que dei sobre o artigo 1.° da lei.

Precaver-se a sociedade contra os perigos da propaganda de idéas subversivas é o pensamento da lei; mas nunca o de coarctar a expressão do pensamento por qualquer fórma, quando se não tenha em vista accender as paixões das massas ignorantes, arrastando-as pela palavra ou por escripto á pratica de actos contrarios á moral ou ao legitimo interesse publico.

Se eu tivesse attentado bem na segunda conclusão tirada do meu discurso pelo digno par, teria dito que o artigo 4.° da lei não prohibe á imprensa só as narrativas dos attentados; refere se ás diligencias e inqueritos policiaes, e a outros factos que, relacionados com o anarchismo, podem concorrer para o seu desenvolvimento, ou para os seus actos, e n’este ponto não posso deixar de alludir á publicação de uns artigos n’um periodico em que se referia o modo de preparar as bombas explosivas de que os anarchistas se servem.

Referindo-me á retroactividade, declarei, e confirmo agora essa declaração, de que aquella não se entendia com os abusos da imprensa, praticados antes da vigencia da lei; mas que se referia apenas aos attentados e outras manifestações perigosas de anarchismo dos ultimos dias, não podendo em caso algum a retroactividade ir alem do periodo fixado na lei commum para a prescripção, segundo a natureza dos factos incriminados.

Creio que estas explicações devem tranquillisar o espirito do digno par o sr. conde de Thomar, e que serão sufficientes para dissipar quaesquer duvidas a que porventura desse origem a declaração que fiz no fim da ultima sessão.

O sr. Presidente: — As explicações dadas pelo sr. ministro da justiça serão incluidas no seu discurso, que ha de ser publicado no Diario das sessões d’esta camara, e essas explicações ficam constituindo uma fonte de interpretação doutrinal da lei.

Se o digno par se satisfaz com as declarações feitas pelo sr. ministro da justiça e publicadas no Diario da respectiva sessão, não ha necessidade de se fazer qualquer alteração na acta. Se, porém, s. exa. deseja que se consignem na acta as declarações do nobre ministro da justiça, então terá de reformar ou de completar a sua proposta com as mesmas declarações, e requerer que eu consulte a camara sobre se auctorisa que se faça a competente alteração na acta.

O sr. Marçal Pacheco: — Sr. presidente, a camara comprehende que, depois das considerações feitas pelo digno par o sr. conde de Thomar, e pelo sr. ministro da justiça sobre o incidente passado n’esta casa na ultima sessão, eu não posso conservar-me silencioso, e, por isso, vou dizer poucas palavras, que poderão servir, se não de commentario, ao menos de illucidação sobre o que se está passando.

V. exa., sr. presidente, sabe que eu fiz algumas observações relativas ao projecto que se discutiu aqui na ultima sessão, e pedi ao sr. ministro da justiça alguns esclarecimentos positivos sobre a doutrina de alguns artigos que me pareciam pouco explicitos e claros.

N’esta conformidade, accedendo ao meu pedido, o nobre ministro da justiça fez no seu discurso algumas declarações, as quaes, em parte, foram depois corroboradas pelo illustre presidente do conselho; e eu, antes de findar a sessão, e só no interesse de que não ficassem duvidas sobre o sentido das disposições que votavamos, li um resumo que fizera, e no qual me pareceu haver consubstanciado o pensamento do sr. ministro da justiça, acrescentando que poderia assim ficar estabelecida uma interpretação authentica da lei, se s. exa. nada oppozesse á fórma por que eu tinha consubstanciado as suas declarações.

O sr. ministro da justiça nada oppoz, e as suas declarações, assim consubstanciadas, foram incluidas no logar competente das notas tachygraphicas, que eu depois recebi em minha casa, não tendo eu n’ellas alterado cousa alguma.

Certo é que não mandei nada para a mesa nem requeri que as minhas declarações fossem transcriptas ou consignadas na acta; mas, nem por isso, deixa de ser exacta a narrativa que estou fazendo do que occorreu na ultima sessão.

Tambem claro é que se a mim e ao digno par, o sr. conde de Thomar, não tivesse parecido que o nobre ministro achara que d’aquella fórma o seu pensamento estava exactamente consubstanciado, não teriamos nós retirado as nossas moções de ordem, que haviamos enviado para a mesa.

E para contraprova da verdade de tudo quanto estou affirmando, eis-aqui o que foi colhido na mesa dos tachygraphos, e vem nas notas tachygraphicas, que não foram por mim nem revistas nem alteradas.

(Leu.)

Não tive nada que alterar no que eu havia escripto e lido, e apenas nas notas tachygraphicas puz a observação de que as não revira.

É evidente que eu poderia não ter reproduzido exactamente, não as palavras, mas o pensamento do nobre ministro, como evidente é que s. exa. poderia não ter ouvido exactamente o que eu li; mas, a verdade é que s. exa. boje disse se, em parte, me parece não destoar da inter-