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126 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do parecer n.° IS relativo ao projecto que tem por fim estabelecer as bases para a reforma da contabilidade publica.

O Sr. Teixeira de Sousa:- Volto ao assumpto, não porque julgue que o projecto tenha viabilidade e, sendo, como é, mau, haja necessidade de combatê- lo, mas pelo motivo de ter sido chamado ao debate pela intervenção do Sr. Espregueira.

O projecto não corresponde ás intenções com que foi trazido ao Parlamento ; é uma manta de retalhos; mal serzidos, em que as disposições de uns para outros artigos contrastam com a cores mal combinadas que ferem avista do observador.

Pouco, pois, me demorarei nas considerações que vou fazer, falando apenas o tempo necessario para mostrar que o Digno Par Sr. Mello e Sousa, com a sua reconhecida competencia no assumpto, saber e intelligencia, tem perdido o seu precioso tempo na defesa de uma obra que, como se apresenta, está irremediavelmente condemnada. Nem as phantasias, em materia de factos, trazidas aqui por outros oradores da concentração, conseguiram modificar a doença grave de que o projecto enferma.

Eu fazendo a historia da reforma do Tribunal de Contas, realizada pela lei de 30 de abril de 1898, mostrei como a discussão parlamentar destruia a mais salutar disposição da proposta de lei, que obriga a visto previo do tribunal, para inquirir da legalidade do pagamento, de todas as ordens de pagamento, certas e incertas, relativas a operações de thesouraria. A conveniencia de restringir as operações d'esta natureza é que tem feito a opinião para se reformar a contabilidade publica, attribuindo se injustamente ao Tribunal de Contas uma responsabilidade que não tem. (Apoiados).

Na verdade, a discussão, parlamentar introduziu na proposta de lei um additamento, dispensando, em casos urgentes, o visto previo do tribunal ás ordens em questão, adiando-o para um prazo de trabalhos depois das ordens pagas. Facil me foi mostrar que este visto posthumo se reduzia a um simples registo do que em operação de thesouraria se houvesse feito legal ou illegalmente.

Foi referindo-me a esta circumstancia que o Digno Par Sr. Espregueira entendeu dever vir dizer que todas as ordens de pagamento por operações de thesouraria iam ao visto do tribunal; e, tendo-lhe eu observado que esse registo era posthumo, o Sr. Espregueira afirmara que era previo, e que provava isso com uma carta que tinha do Sr. director geral da thesouraria. Recorda se a Camara do episodio da carta que o Sr. Espregueira não leu, a despeito das instantes solicitações que eu e outros collegas fizeram para que fosse lida. É que a carta não podia fazer tal prova. Eu bem o sabia; mas, como desejo sempre ter verdade e probidade na minha argumentação e nas afirmações de facto, fui no dia i mine da to ao Tribunal de Contas e lá reconheci a absoluta inexactidão do que o Sr. Espregueira affirmara. (Apoiado ).

Custa me falar assim; mas tratando de um facto contraditado, um dos dois, eu ou o Sr. Espregueira., tem de passar por inexacto, e então vá a pedra a quem toca.

E não foi mais exacto o Sr. Espregueira quando referiu a intervenção do Tribunal de Contas no que diz respeito ao serviço da divida fundada.

Eu, tambem, como já o havia feito o Digno Par Sr. Moraes de Carvalho, demonstrei que o projecto tinha sido tão precipitadamente elaborado que alterava o convenio com os credores da divida externa, o que era faltar á fé dos contratos e que podia arrastar para o paiz numerosas dificuldades e desgostos. O Digno Par Sr. Mello o Sousa não o entendeu assim, sustentando que estavamos no nosso direito de fazer o que se projectava, e que isso não alterava em nada o que constava do convenio com os credores.

Não é assim. O convenio, feito em execução da lei de 14 de maio de 1902, fixou que os thesoureiros das alfandegas entregarão directa e immediatamente á Junta de Credito Publico as quantias necessarias para o serviço da divida externa; estabeleceu ainda que durante a vigencia do convenio, isto é, até 75 annos depois de feito o accordo com os credores, Portugal se obrigava a manter o regulamento da junta de Credito Publico, de 8 de outubro de 1900, em que está estabelecido que a Junta administra a divida publica interna e externa, independentemente de qualquer repartição ou autoridade. Tudo isto brigava com o artigo 30.° do projecto, em que se sujeita ao visto previo do director geral de contabilidade publica todas as ordens de pagamento.

Vem então o Sr. Mello e Sousa declarar que Portugal estava no seu direito de assim proceder, por virtude da resalva feita no § unico da base 2.ª da lei de 14 de maio de 1902. Não foi seguro nos seus effeitos o argumento, mostrando apenas de quem o apresentou o desejo de defender a causa em perigo.

A disposição invocada diz:

"Fica, porem, declarado, para todos effeitos, que as disposições contidas nesta base, de modo algum affectarão ou poderão prejudicar a autonomia financeira, economica e administrativa da nação portugueza".

Ora a base em questão é a base 2.ª, que trata somente da consignação e da maneira de entregar á Junta as sommas necessarias para o serviço da divida externa.

Mas a estipulação que obriga Portugal a manter o regulamento da Junta, que lhe dá autonomia e independencia para administrar a divida publica fundada; está depois da base 3.ª

Tanto basta para se comprehender que ficou de pé toda a argumentação que eu adduzi para demonstrar que era necessaria uma emenda ao projecto, estabelecendo que o disposto no artigo 30.° não era applicavel ao serviço da divida fundada. Vem então o Sr. Espregueira, e esse fui mais radical nas suas affirmações, com uma facilidade que me assombra. Disse o Digno Par que o projecto nada alterava o que está estabelecido em relação á divida externa, pois as ordens de pagamento para o serviço d'esta são passadas na Direcção Geral de Contabilidade e enviadas ao visto do Tribunal de Contas, não havendo atai apregoada independencia da Junta e do serviço da divida fundada.

Não devia ser assim; mas o Sr. Espregueira deu um tal entono e ares de convicção ao que dizia, que me obrigou a ir ao Tribunal de Contas verificar o que se fazia a este respeito.

Fôra mais uma inexactidão: nada vae ao Tribunal de Contas em relação á divida externa, a não serem as contas da Junta no final do exercicio.

Está, pois, de pé toda a minha argumentação que ainda vou additar, por se reconhecer que é indispensavel accrescentar a emenda que propuz.

No artigo 8.° do projecto estabelece-se que "no orçamento são descriptas sem excepção alguma todas as receitas e despesas ordinarias e extraordinarias".

E mais um ataque ao regulamento da Junta, que pelo convenio Portugal se obrigou a manter.

Na verdade, no seu artigo 19.°, é criado um fundo especial de amortização, constituido: 1.°, pelos juros dos depositos da Junta nos paizes estrangeiros; 2.°, pelo producto dos descontos feitos pela antecipação do pagamento dos juros da divida interna. O fundo é empregado na compra de titulos externos, que são assim extraordinariamente amortizados.

A passagem d'esta receita para o orçamento, para ter a applicação geral de todas as receitas geraes, brigaria com o convenio e com a lei que o nosso paiz se obrigou a manter por 75 annos.