O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SESSÃO N.° 14 DE 3 DE JUNHO DE 1908 9

É opposta a todos os principios democraticos. A doutrina dominante, hoje, é a subordinada á theoria das associações declaradas e não declaradas, adoptada na Italia, na Belgica, na França, depois do Ministerio Waldeck Rousseau, e na propria Allemanha, depois da promulgação do Codigo Civil.

Pelo artigo 2.° da lei francesa, as associações de pessoas poderão formar-se livremente, sem autorização ou declaração previa. Assim as associações politicas, as ligas, os clubs, não são coagidos á declaração previa; não indicam sedes, nem regime interno: são absolutamente livres na sua organização e funccionamento. É uma lei fundada sobre a distincção das associações declaradas e não declaradas que os dissidentes desejariam ver estabelecida em Portugal.

E com respeito á imprensa? Entendem os partidos que deve subsistir a actual lei? Comprehende-se isso por parte do partido progressista, que, ao contrario de todas as suas affirmações, e ferindo absolutamente todo o seu passado, a votou. Mas, os regeneradores? O Sr. Julio de Vilhena não fez aqui declarações terminantes? Não vim eu discutir essa lei, que foi um dos instrumentos da morte politica do Sr. João Franco. Presagiei-lh'o! Nb discurso em que a combati lembrei ao Sr. João Franco o episodio do imperador romano, alfageme do. seu officio, erguido ao imperio por uma conspiração de soldados pouco depois atravessado, do peito ás costas, pela adaga de um pretoriano, que, ao cravar-lhe a espada no corpo, bradou: a foste tu que a forjaste!"

O chefe regenerador liberal teve, na execução d'essa lei, nos verdadeiros comicios dos tribunaes, um dos mais temiveis instrumentos de demolição.

Viu-se forçado a um attentado, ainda maior que o seu erro: a suspendê-la pela violencia.

A lei de imprensa tem de ser revogada. Ha de adoptar-se como base o julgamento do jury e não o dos tribunaes correccionaes.

Não ha homem publico sinceramente liberal que não comprehenda que a liberdade da imprensa é, em todos os povos, a historia da liberdade. Mal começaram a apparecer nos países da Europa as pequenas machinas movidas a braços, as grosseiras letras de chumbo, os Principes despoticos e crueis moveram uma guerra de odio e sangue áquelles que as empregavam.

Quantos corpos humanos aspados e rodados, fracturados horrivelmente pelos instrumentos de tortura, esfarelados nas chammas da fogueira!

No nosso país vê-se que ao mais pequeno sinal de reacção politica a imprensa é immediatamente abafada por leis de repressão.

No reinado dos Senhores D. Pedro V e D. Luiz I, que tinham ao seu lado estadistas e soldados educados nas lutas civis e militares da liberdade, a imprensa foi livre.

Desenhou-se a doutrina do engrandecimento do poder real: e immediatamente, logo, surgiram leis de perseguição !

A imprensa pode ter causado grandes males pelos seus desvarios, mas a sua acção é tão generosa e larga, tem feito tantos beneficios á humanidade, que o prejuizo dos seus excessos desapparece deante dos jorros de luz e de justiça que tem derramado pelo mundo inteiro.

Li, ha dias, um adoravel artigo de Anatole France, sobre a imprensa. Nelle figuram dois homens publicos, um conservador, outro liberal, que discutem se a imprensa deve ou não ser livre.

Num dos lances do dialogo, o defensor da repressão lê ao seu interlocutor doze linhas de um jornal em que este era insultado na sua honra e pergunta-lhe se ellas não o indignavam e maguavam. E obteve esta bella e doce resposta:

"Essas doze linhas, que, consideradas só em si proprias, são de baixo preço, eu tenho-as como intangiveis e sagradas, pois, despojadas da ideia, ellas foram ao menos traçadas com os sinaes do pensamento, com os caracteres da imprensa, com estas santas e pequeninas letras de chumbo que levaram pelo mundo fora o direito e a razão".

Cumpre que nesta grande e superior comprehensão da imprensa se inspirem os homens publicos.

Os dissidentes, se fossem poder, realizariam a obra de dotar o país com a lei mais absolutamente democratica que pudesse fazer-se. E não comprehendem sequer como regeneradores e progressistas não pusessem na boca do Rei frases decisivas e terminantes a este respeito.

Para a imprensa ser grande, basta a sua acção moderna na questão dos tabacos, dos sanatorios da Madeira e na questão dos adesatamentos!

E, a proposito, vou occupar-me da questão dos adeantamentos, não só pelo meu direito de tratar um dos assuntos que mais se referem á causa publica, mas porque já o versei na ultima resposta ao Discurso da Coroa e importa accentuar bem a comparação entre o estado em que se achava essa questão e aquelle em que se encontra agora. Esse estado aggravou-se.

Não vou discutir a proposta de lei sobre os adeantamentos, porque isso seria longuissimo, e desconheço até as modificações que nella possam ser introduzidas pelas respectivas commissões parlamentares.

Apenas quero expor o que, se os dissidentes tivessem o poder, fariam numa questão tão grave, de natureza moral, politica, administrativa - até internacional, se com esta palavra se pode significar que nella se fixam os olhos do mundo inteiro.

E, antes de tudo. quero accentuar o que já affirmei na sessão anterior, sem desmentido algum: "Não acredito, não posso acreditar, que qualquer Governo progressista houvesse entregue á Casa Real, ou a qualquer membro da Familia Real, sommas illegalmente concedidas". O chefe progressista affirmou-o: devo crê-lo.

Não pode haver artificio em assuntos tão graves. No meu tempo de Ministro não se deram.

Ou então ao conhecimento do Conselho de Ministros nunca foi levado conhecimento d'esse facto. Eu não tive conhecimento. Limito-me a falar por mim. Nem o illustre chefe do Ministerio a que pertenci, nem o meu collega da Fazenda me falaram em tal assunto. Foi o que disse: repito-o agora. Cada vez me cresce mais essa minha convicção, até pela presença do Sr. Espregueira nos Conselhos da Coroa - e na pasta da Fazenda.

O Sr. Espregueira não pode ter dado á Casa Real, nem a nenhum membro da Familia Real, qualquer somma illegal. Deus nos livre que assim fosse! Aliás qual seria a sua situação, a sua honra de homem e de Ministro?

Pode julgar alguem, por mais inimigo que seja do Sr. Espregueira, que S. Exa. commetteria a acção, sem nome, de vir elle proprio liquidar os seus erros, de entrar agora para a pasta da Fazenda com o firme intento de se subtrahir a responsabilidades, organizando nesse sentido a sua proposta de lei?

A mais simples noção de probidade moral não consentiria semelhante attentado!

O Sr. Espregueira está ali porque não fez esses adeantamentos. Nem o chefe do partido progressista escolheria para a pasta da Fazenda, agora, um dos responsaveis nesse acto illegal, porque isso, provando-se tal responsabilidade, daria ao país a impressão de que o Sr. Espregueira foi ali collocado para abafar as suas responsabilidades e as do chefe do seu partido. A organização do Ministerio, pelo menos na pasta da Fazenda, pareceria uma emboscada. Não acredito que se pudesse levar tão longe o desrespeito pela dignidade pessoal, pelo brio politico, pelos direitos da Nação - e até pela lealdade ao Rei!

Ao Rei sim! Porque foi Elle quem deu a demonstração, cinco dias depois do seu advento ao Throno, de que é um