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O SR. MARQUEZ DE FRONTEIRA: — O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros disse-me que vinha, mas os outros estão compromettidos na outra Camara, por que tem a palavra, e o Sr. Presidente do Conselho acha-se doente.

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: — Não me opponho ao addiamento, mas quero aproveitar esta occasião para significar a conveniencia de se adoptar nas nossas Camaras o mesmo que se faz em Inglaterra em similhantes casos: a discussão da Resposta ao Discurso da Corôa, tem ali logar simultaneamente em ambas as Camaras, e o mesmo podia seguir-se entre nós, por que sendo os Ministros seis não haveria difficuldade em que se dividissem, e assim assistissem á discussão em cadauma das Camaras. (Apoiados.)

Sendo a Camara consultada, approvou a proposta do Sr. Silva Carvalho.

O SR. PRESIDENTE: — A Ordem do dia para ámanhan e a discussão das duas Propostas, que a ella foram hoje admittidas, e Pareceres de Commissões. Depois de ámanhan começará o debate da Resposta ao Discurso do Throno. — Está fechada a Sessão.

Passava das duas horas.

N.º 13. Sessão de 24 de Janeiro. 1843.

(PRESIDIU O SR. DUQUE DE PALMELLA — E ULTIMAMENTE o SR. CONDE DE VILLA REAL.)

FOI aberta a Sessão pela uma hora e meia da tarde: estiveram presentes 24 Dignos Pares — os Srs. Duque de Palmella, Marquezes de Abrantes, de Fronteira, de Ponte de Lima, e de Santa Iria, Condes do Bomfim, de Lavradio, de Lumiares, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Semodães, da Taipa, e de Villa Real, Viscondes de Fonte Arcada, e de Laborim, Barão do Tojal, Ribafria, Gamboa e Liz, Margiochi, Giraldes, Silva Carvalho, Serpa Machado, Polycarpo José Machado, e Trigueiros.

Lida a Acta da Sessão antecedente, ficou approvada.

Passou-se á Ordem do dia, entrando em discussão a Proposta do Sr. Ribafria sobre, a Camara eleger, com urgencia, uma Commissão especial pura fazer um Projecto de Lei de Regimento externo. (P. pag. 58, col. 2.ª)

Dada a palavra ao author, disse

O SR. RIBAFRIA: — Eu pediria á Camara permnittisse que a Mesa nomeasse esta Commissão. Agora nada ha que dizer, e na occasião da discussão do Regimento é que isto se tomava urgente, para se poderem votar mais livremente todos os Artigos que não pertenciam ao mesmo Regimento: comtudo ainda agora se poderão tirar dali as disposições que digam respeito ao Regimento externo, e fazer dellas uma Lei.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: — Não póde deixar de ser admittida esta Proposta: nós não temos Lei de Regimento externo, e creio que toda a Camara convirá em que é necessario fazèla. Resta saber se esta incumbencia ha de ser dada a uma Commissão, ou se ha de encarregar-se disto um Membro da Camara: tenho idea de que o Sr. Conde de Lumiares se offereceu já para apresentar um Projecto de Regimento externo, e a mim parece-me que os trabalhos de um só são quasi sempre mais promptos, e mais bem combinados do que os das Commissões; por conseguinte desejaria ouvir o que o Digno Par responde a esta minha observação.

O Sn. PRESIDENTE: — Se o Sr. Conde de Lumiares quizer fazer este trabalho, talvez que o Digno Par author da Proposta convenha em retirala.

O SR. RIBAFRIA: — Convenho, certamente.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: — Eu não estou muito de accòrdo com estes precedentes de se nomearem Commissões para fazerem Projectos de Lei; as Commissões são para rever Projectos: álem de que, um Projecto de Lei é mais obra de um homem do que de muitos; e eu não posso deixar de pedir ao Digno Par licença para lhe dizer que não afaste de si esse trabalho, pois que todos conhecem que elle e muito capaz de o apresentar, ou, por outro lado, constando que o Sr. Conde de Lumiares pretende apresentar um Projecto de Regimento externo, parecia-me mais proprio que se acceitasse o offerecimento do Digno Par, e que o author da Proposta então a retirasse.

O SR. RIBAFRIA: — Já disse que a retirava, mas com a condição, de que o Sr. Conde de Lumiares apresente o seu Projecto.

O SR. CONDE DE LUMIARES: — Declaro que estou prompto a apresentar um Projecto de Regimento externo, melhorou peior: igualmente farei meu o outro Projecto, apresentado ao Senado pelo Sr. Felix Pereira de Magalhães, para quando a Camara se formar em Tribunal de Justiça, ajuntando-lho as alterações necessarias para ficar appropriado á Camara dos Pares.

O SR. SILVA CARVALHO: — Feita a declararão do Sr. Conde de Lumiares, e retirada a Proposta do Sr. Ribafria, não ha mais nada afazer: este negocio acabou inteiramente.

O SR. PRESIDENTE: — Todavia convirá que se fixe bem a idea de que as Commissões são principalmente destinadas ao exame dos Projectos que se apresentam á Camara.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: — Apoiado. O acto de apresentar um Projecto, é um acto voluntario, e o de exigir de nina Commissão que redija um Projecto, é um acto forçado, e a Commissão póde até não estar habilitaria para o fazer, ou não querer: por consequencia digo que me não parecia mesmo muito regular que se approvasse a Proposta do Digno Par.

A Camara annuiu a que o Sr. Ribafria retirasse a sua Proposta.

O SR. PRESIDENTE — Está em discussão a outra

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Proposta, do Sr. Conde de .Lavradio, tambem admittida hontem...

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Perdoe V. Exa., mas parece-me que seria muito conveniente que assistisse a esta discussão algum dos Srs. Ministros da Corôa.

O SR. VISCONDE DE LABORIM:- Isso poderia ler logar quando a Commissão nomeada apresentasse o seu Parecer; mas, com quanto respeite a opinião do Digno Par, o Sr. Conde de Villa Real, não acho que a presença dos Srs. Ministros da Coroa seja necessaria sómente para decidirmos se se deve, ou não nomear uma Commissão, até mesmo por que isso é um objecto da disciplina interna da Camara.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Não me opponho de fórma alguma á indicação do Digno Par Conde de Villa Real, confesso que mesmo me parece mais regular, porque na sustentação dos argumentos que hei de apresentar para fundamento da minha Proposta, póde apparecer alguma idéa que precise ser immediatamente respondida pelos Ministros da Corôa, e eu não quizera fazer-lhes uma surpreza.

O SR. TRIGUEIROS: - Eu sou da opinião do Digno Par que se assenta ao pé de mim, quero dizer, que se não chame o Ministerio para ver deliberarmos sobre se havemos de nomear uma Commissão, mas intendo que os Srs. Ministros deverão ser avisados quando essa Commissão (chegando a ser nomeada) apresentar o seu Parecer, e este se discutir; entretanto, simplesmente para se nomear a Commissão, declaro que o não acho necessario.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Eu tambem convenho com a opinião dos Dignos Pares, de que para a nomeação de uma Commissão não é necessaria a presença do Ministerio; mas a minha proposta era fundada nas razões com que o Sr. Conde de Lavradio tinha que fundamentar a sua indicação, razões que obrigariam provavelmente o Ministerio (se estivesse presente) a dar-lhe alguma resposta. Submetto a minha proposta á consideração da Camara, para que decida como julgar conveniente se este objecto deve ser ou não addiado.

O SR. PRESIDENTE: - Parece-me que o Digno Par author da Proposta concorda nisso.

O S.R. CONDE DE LAVRADIO: - Não me opponho.

O SR. CONDE DE VILLA REAL:- Devo declarar que o addiamento por mim pedido não é de dias, mas momentaneo, quero dizer, até apparecer algum dos Srs. Ministros.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - Sr. Presidente, parece-me que o Sr. Conde de Villa Real, e o Sr. Conde de Lavradio estão uniformes em que os Srs. Ministros devem assistir á discussão quando se tractar da materia, mas não em que venham a esta Camara afim de serem presentes ao objecto da nomeação da Commissão, que é um ponto disciplinar da Camara; e então eu tambem convenho com as idéas dos Dignos Pares a este respeito.

O SR. TRIGUEIROS: - Sr. Presidente, a razão apresentada pelo Sr. Conde de Villa Real é forte, mas não e applicavel para o caso presente, porque, ainda que appareçam arguições ou censuras, como o Digno Par deu a intender que haveria a fazer, visto que o procedimento do Governo não está em harmonia com as idéas do Digno Par author da Proposta, ellas não hão de ficar indefezas, por quanto ha de haver a nomeação da Commissão, e depois esta tem de apresentar o seu Parecer, que entrará em discussão, e então as arguições e censuras serão respondidas pelo Governo: por consequencia, aquella razão não era boa para o caso da nomeação da Commissão, e sim para quando se tractasse propriamente do objecto.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Para mim é indifferente que se faça ou não o convite, como indicou o Sr. Conde de Villa Real: ainda que senão vai tractar da discussão, o que só terá logar depois de ser apresentado o Parecer da Commissão, com tudo, como para eu sustentar a minha Proposta, será talvez necessario fazer algumas referencias e censuras a actos do Governo, desejaria fazélas na presença dos Srs. Ministros da Corôa: eis aqui a razão pela qual eu pedia que ficasse esta questão addiada até que podessem vir aqui os mesmos Srs. Ministros. - Deverei tambem observar que se os Srs. Ministros, por se acharem empenhados em alguma discussão na outra Camara, não poderem vir hoje a esta, isso não impede que se faça a nomeação da Commissão.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Repito que concordo com os Dignos Pares sobre não haver necessidade da presença dos Ministros para a decisão da nomeação da Commissão. Agora devo explicar que conversando hoje com o Digno Par, o Sr. Conde de Lavardio, é que tive esta idéa, na qual elle concordou, e por isso a propuz. Apezar de só se tractar da nomeação da Commissão, era muito natural que se entrasse em discussão sobre o objecto do Officio.

O SR. CONDE DC LAVRADIO: - Eu ouvi dizer que um Digno Par se tinha retirado da Camara por ser Conselheiro d'Estado; mas observo que aqui não se tracta do Conselho d'Estado, e sim de um. negocio da competencia desta Camara: isto é um precedente contra o qual eu protesto, por que se elle fosse seguido tambem V. Exa. se deveria retirar da Presidencia, e outros Conselheiros d'Estado que pertencem a esta Camara dos seus logares, o que seria muito inconveniente.

O SR. TRIGUEIROS: - Eu não estava levantado quando disse que o Sr. Silva Carvalho se tinha retirado, e o fiz como em um á parte. (O Sr. Conde de Lavradio: - Então peco perdão.) O Sr. Silva Carvalho levantou-se no momento em que se tractava deste objecto, e então imaginei eu (e imaginei mal) que tinha sido por isso; no entretanto eu não sou de opinião que um Membro da Camara, por ser Conselheiro d'Estado, não deva assistir a esta, discussão.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Pareceu-me que o Digno Par linha dito aquellas palavras levantado.

(Pausa)

O SR. TRIGUEIROS: - Sr. Presidente, pedi a palavra para aproveitar este intervallo, e fallar sobre um objecto que me parece da maior urgencia, e a respeito do qual chamo a attenção da Camara.

V. Exa. ha de lembrar-se de que eu apresentei nesta Camara um Projecto de Lei ácerca do contrabando de Cereaes, Projecto que teve as honras da discussão, e ainda mais, as da approvação: correram os tempos, dissolveu-se a Camara dos Deputados, e eu tive de usar da minha iniciativa so-

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bre o mesmo objecto; isso fiz, e este teve uma nova discussão e nova approvação; foi remettido para a Camara dos Deputados, e consta-me que lá foi a uma Commissão que o approvou: porém neste tempo a Camara tornou-se á dissolver, e o Projecto veiu remettido para esta Caza. Na Sessão passada insisti nelle, e use novamente, pela terceira vez, da minha iniciativa. - Agora pedia muito encarecidamente a urgencia deste negocio, por quanto as calamidades do Paiz a este respeito não podem ser maiores: (Apoiados.) todos os dias cresce a necessidade de se tomar alguma medida relativamente ao escandaloso contrabando de Cereaes, por que os lavradores estão no ultimo apuro, por isso que, hão só não podem vender os seus generos senão por um preço vilissimo, mas até nem sempre por esse podem effectuar a sua venda, por que nem sempre acham compradores: vendo pois que nenhuma das medidas tomadas sobre este mal gravissimo tem conseguido o seu fim, lembrava que, uma vez que temos de receber os Cereas estrangeiros, (visto que são introduzidos por toda a parte sem estorvo) era melhor se permittisse por uma Lei a sua entrada franca, impondo-se-lhes um tributo maior, por que assim ficavamos com o mesmo mal que temos soffrido até agora, mas ao menos d'ahi proviria algum recurso para o Thesouro. Ora o lavrador, uma vez ainda póde ir pedir emprestado, e obter alguns recursos, mas, depois de um anno, de dons, de tres, estes hão de se extinguir, é por consequencia elle ha de acabar. Esta acontecendo por toda a parte que, no principio das colheitas, tempo em que os Cereaes devem valer menos, é então quando valem mais; e no meio do anno, quando o consumo é de reserva, quando já apparecem as sementeiras, e por consequencia é maior o consumo dos generos, baixarem estes: e que é isto, Sr. Presidente? É por que chega a epocha na introducção do contrabando. Por tanto devemos tractar de tomar uma medida que obste de algum modo a este mal, em vez de gastarmos o tempo com couzas que merecem pouco a pena, por quanto evitar o contrabando de todo torna-se impossivel n'uma raia tão extensa qual é a nossa, para isso seria necessario uma muralha como a da Tartaria; entretanto julga-se que, como se não póde evitar um mal inteiro, não deve remediar-se em parte, e com esta lógica não me posso eu conformar de maneira nenhuma: por isso peço a V. Exa., que tem um coração de quem ama a sua Patria, e que tão dignamente occupa essa Cadeira, que de este Projecto para Ordem do dia com a maior brevidade; elle decerto ha de ter pouca discussão, por que já tres vezes tem sido discutido.

O SE. SECRETARIO MACHADO: - Foi remettido para a Commissão, e esta ainda não deu o seu Parecer.

O SR. TRIGUEIROS: - Para a Commissão de Legislação não foi elle.

SR. SECRETARIO MACHADO: - Enviou-se á de Administração Publica.

O SR. TRIGUEIROS: - Eu sei que estão para se fazer representações a esta Camara sobre este objecto, mas tudo isso é nada uma vez que da nossa parte não haja vontade.

O SR. VISCONDE DU LABORIM:- Apoiado.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Eu peço a palavra sobre este objecto.

O SR. PRESIDENTE: - Isto é uma mera conversação.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Seja ou não seja méra conversação, eu quero saber se posso fallar.

O SR. PRESIDENTE: - Póde fallar, sim Senhor, mas peço-lhe que não tenha tanta impaciencia, por que eu estava, aqui: á procurar aonde parava um Projecto. .. Ora, como o Digno Par acaba de entrar ha pouco, dir-lhe-hei que o Sr. Trigueiros acabou" de fallar sobre o negocio relativo ao contrabando de Cereaes, e ...

O SR. CONDE DA TAIPA: - Eu quero saber quando é que tenho mostrado nesta Camara que falta á ordem, para que se me dê uma lição antes de eu ir fallar, assim como quero saber se V. Exa. está authorisado para isso, quando o Presidente pelo sen logar não é outra couza mais do que um Ministro da Lei, isto e, um regulador desta Camara, e como tal não lhe reconheço autoridade para me dar uma admoestação, e já não é a primeira vez...

O SR. PRESIDENTE: - Eu não lhe dei admoestação nenhuma, nem estou authorisado para isso; mas V. Exa. ainda o está menos para m'a dar a mim. Eu estava procurando saber qual era o estado de um negocio para o dizer á Camara, e logo depois ia dar a palavra ao Digno Par; e então não sei para que é esse fogo, nem de que sirva a sua advertencia.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Eu não dou advertencias; estou reclamando contra uma injuria que V. Exa. me tem feito já repetidas vezes... (Sussurro.)

VOZES: - Ordem. Ordem.

O SR. PRESIDENTE: - Eu appello para toda a Camara, e ella julgará se tem ou não logar estas observações; ao menos no momento actual de certo não tem nenhum, e não me lembro que vezes são essas a que V. Exa. fez allusão. A minha vontade não é faltar á consideração a nenhum dos Membros da Camara. { Apoiados.)

O SR. CONDE DA TAIPA: - O caso é que a discussão estava estabelecida nesta Camara, eu tinha pedido a palavra quando acabava de faltai o Sr. Trigueiros, e V. Exa. admoestou-me logo sobre o que aquillo era, como que eu o não soubesse; até ahi ainda chega a minha intellectualidade.

O SR. PRESIDENTE:-Eu não accrescentarei uma palavra mais, e appello novamente para a Camara.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Eu tinha pedido a palavra sobre o contrabando de Cereaes, em consequencia de uma moção, ou de uma conversação que introduzira o Sr. Trigueiros..,

(Entraram os Srs. Ministros do Reino e da Fazenda.)

O SR. SILVA CARVALHO: - Mas eu pedi a palavra sobre a ordem.

O SR. CONDE BA TAIPA: - Pois bem, falle.

O SR. SILVA CARVALHO: - Sim Senhor. Eu desejo saber o que está dado para Ordem do dia de hoje?

O SR. PRESIDENTE: - A Ordem do dia é uma Pi oposta do Sr. Conde de Lavradio, que estava admittida á discussão; mandaram-se avisar os Srs. Ministros, com a approvação de muitos Membros desta Camara, para que viessem assistir a essa discussão: então um Digno Par, o Sr. Trigueiros, (mesmo sem eu lhe ter dado a palavra) disse que queria

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aproveitar esse intervallo, em quanto os. Srs. Ministros não vinham, para fazer algumas observações, sobre um Projecto de Ler relativo ao contrabando de Cereaes, e tendo fallado a esse respeito concluiu pedindo que o mesmo Projecto fosse dado para Ordem do dia com brevidade: verificou-se que não estava em cima da Mesa, e, em, quanto se entrava em duvida aonde a Projecto parava, e quando eu o procurava numa relação deles, entrou o Digno: Par Sr. Conde da Taipa, e antes de se lhe: ter. dado a palavra, começou, a fallar lançando-me em rosto que eu lhe queria dar lições (e não sei que mais couzas) só por que eu o interrompi para lhe dizer que nada se discutia, e que aquillo era uma simples conversação. Agora perguntarei á Camara se quer que essa conversação continue, ou que se passe á Ordem do dia?...

MUITAS VOZES: — Ordem do dia. Ordem do dia.

O SR. CONDE DA TAIPA: — Eu quero a palavra, por que tenho immensas couzas a dizer sobre este objecto, visto que sempre se moveram, e se discutiram incidentes antes da Ordem do dia; agora o empenho que ha em cortar este, é a que eu não posso imaginar.

O SR. PRESIDENTE: — Supponho que não ha empenho em negar a palavra ao Digno Par.

O SR. CONDE DA TAIPA: — V. Exa. não o terá, mas vejo que algum empenho ha: peço que a Camara soja consultada, e se eu não poder agora fallar neste objecto, então trarei uma moção para aqui se discutir o negocio do contrabando dos Cereaes, e qual se está fazendo em Portugal todos os dias.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: — Sr. Presidente, eu sinto muito este incidente que acaba de succeder, assim como achar-me em opposição com o meu nobre amigo. S. Exa. não estava presente quanto principiou a Sessão, e por isso não sabe o que aqui se pasmou: a Camara resolveu mandar communicar aos Srs. Ministros que se tractava de um objecto a que talvez fosse conveniente assistirem; SS. Exas. estavam occupados na outra Camara, e vieram aqui para esse fim: por tanto requeiro que se tracte já da Ordem do dia, deixando o incidente para outra occasião, por que hoje deve haver nas duas Camaras discussões muito importantes.

O SR. SILVA CARVALHO: — Eu concordo com o Digno Par. o Sr. Conde de Lavradio, para que se passe á Ordem do dia, e o Sr. Conde da Taipa poder fallar em outra occasião nesta questão, em que eu tambem sou interessado; mas hoje viemos aqui para o objecto que se deu para Ordem do dia, e não devamos gastar o tempo com o que não está dado para ella: o Sr. Ministro foi convidado para esse fim, não sei se terá necessidade de voltar á outra Camara, e então proponho que passemos immediatamente á Ordem do dia.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS DO REINO: — Eu estou prevenido pelo Digno Par, e só peço á Camara que tenha em consideração que o Ministerio se acha empenhado na outra Camara em uma questão importantissima; hontem tive eu a palavra, hoje tive de responder-se ao meu discurso, e deseje ouvir essa resposta; alguns dos meus Collegas tambem tem a palavra, e por tanto é indispensavel que o Ministerio ali esteja presente. (Apoiados.)

O SR. PRESIDENTE: - Creio que a Camara decididamente quer que se passe á Ordem do dia. ( Apoiados.)} Tem a palavra o Sr. Conde de Lavradio; mas antes disso vai lêr-se a Proposta do Digno Par, que o objecto da discussão.

Foi effectivamente lida a Proposta do Sr. Conde de, Lavradio, sobre, ser nomeada uma, Commissão para examina o Officio do Sr. Ministro dos Negocios do Reino em que recusava o extracto das actas do Conselho d’Estado. (V. pag. 87, col. 2.ª)

O SR. CONDE DE LAVRADIO: — Sr. Presidente, attendendo ao que acaba de se passar, attendendo mesmo ás reflexões que acaba de fazer um dos Srs. Ministros da Corôa, sustentarei brevemente, a Proposta que tive, a honra de submetter, á Camara, a qual me padece fundada, em um direito tão claro que bem pouco me será necessario dizer para convencer os Dignos Pares da justiça, da sua admissão. Seja-me comtudo, permittido trazer á memoria dos meus nobres Collegas a historia deste negocio.

Em 28 de Dezembro ultimo fiz um Requerimento a esta Camara, para que, pela Repartição competente, fossem pedidos ao Governo certo extractos das actas do Conselho d’Estado; um delles referia-se ao ultimo addiamento das Côrtes, ao segundo, ao Decreto de 12 de Dezembro, pelo qual se deu uma nova fórma á arrecadarão da Fazenda: a Camara, depois de haver seriamente reflectido sobre, este meu Requerimento, resolveu-o favoravelmente, e entre os Dignos. Pares que o approvaram notei (e não posso deixar de indicar esta occurrencia que é digna disso) dous Membros do Conselho, d’Estado, em um dos quaes concorre a circumstancia de ser o Presidente do Conselho de Ministros. Votou-se pois que se pedissem aquellas actas; e nesse mesmo dia (28 de Dezembro), segundo as informações que tenho, os Dignos Pares Secretarios, sempre zelosos no exacto e prompto cumprimento das deliberações desta Camara, officiaram ao Ministerio dos Negocios do Reino pedindo a remessa dos mencionados extractos. Quasi um mez se passou sem que o Sr. Ministro se dignasse satisfazer á requisição desta Camara, nem mesmo communicar-lhe o motivo da uma tão censuravel demora. Tal é a consideração! que SS. Exas. tem para com esta Camara! Sem resposta ficaria por certo aquelle Officio, se nestes ultimos dias não tivesse sido feito na Camara dos Srs. Deputados um Requerimento similhante ao meu, e se aquella Camara não tivesse sobre elle tomado, uma resolução identica á desta. Então julgaram SS. Exa. que não era possivel continuar a illudir esse pedido, e reconhecendo a necessidade de responderem á requisição da Camara dos Srs. Deputados, responderam ao menino tempo á que esta Camara muito antes lhes havia dirigido. Mas qual fui essa resposta, assignada pelo Sr. Ministro dos Negocios do Reino, que está presente? A Camara já a ouviu ler, mas como esta leitura foi rapida, peço licença, para a tornar a ler, e para a commentar: (Leu.) Uma resposta desta natureza dada a um dos Corpo? Colegislativos, é couza nova, não só nos annaes da nossa historia constitucional, mas nos dos outros, paizes que gozam desta fórma de governo.

Sr. Presidente, não é já a minha Proposta que hoje estou defendendo, mas sim a dignidade desta Camara menoscabada pelo Ministerio. — Neste Officio do Sr. Ministro do Reino devem notar-se principalmente duas couzas; primeira — o desprezo Ccom

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que o Ministerio tracta uma solemne deliberação desta Camara; segunda - uma especie de reprehensão, que lhe dá, dizendo-nos - vós reclamastes aquillo que não estava no vosso direito pedir - Isto é o que eu quero provar, não só para minha defeza, mas da Camara, que estava no direito inquestionavel de fazer este pedido.

O Artigo 14.° da Carta Constitucional diz: (leu.)

- Aqui está pois a definição do que são as Côrtes; por consequencia todas as vezes que na mesma Carta se encontrar a palavra - Côrtes - deve intender-se que se tracta das duas Camaras. Segue o Artigo 15.°: (leu.) No paragrapho 7.° deste mesmo Artigo vejo claramente que um dos deveres desta Camara é velar na guarda da Constituição; e vejo mais no Artigo 139.° que outro dever nosso é examinar ao principio de cada Sessão se a Constituição Politica do Reino tem sido exactamente observada.

Á vista pois das disposições dos citados Artigos, é bem claro o dever que nós temos de examinar todos os negocios do Estado, e o modo porque todos os Funccionarios Publicos desempenham as funcções dos seus cargos. E por ventura poderia existir este dever se acaso lhe não correspondesse o direito de exigirmos todos os esclarecimentos e documentos, que nos fossem mister para o bom desempenho de tão importante dever como aquelle que resulta das claras disposições dos dons citados Artigos? A não existencia de um similhante direito seria um absurdo, e quem duvidasse deste direito faria uma grave injuria ao Augusto Legislador da Carta.

É pois incontestavel que esta Camara tem o direito de examinar os actos de todos os Funccionarios Publicos, e de os censurar quando assim o julgar conveniente. E como poderá ella examinar censurar os Conselheiros d'Estado, pelos conselhos que elles houverem dado secretamente, se as actas dos Conselhos lhe não forem communicadas?

Eu reconheço que o bem do Estado exige que alguns dos negocios que se tractam no Conselho d'Estado fiquem temporariamente secretos, alguns mesmo haverá, talvez, cujo segredo deva ser indeterminado, mas outros negocios ha, que ali se tractam, sobre os quaes o segredo longe de ser proveitoso e nocivo. E quantos negocios importantes não foram, ou não deviam ter sido submettidos ao Conselho d'Estado no intervallo que houve entre esta e a ultima Sessão Legislativa? Não confessou já o Ministerio em outro logar - que havia violado a Constituição do Estado, e que, pedia perdão em attenção ao bem que daquellas violações havia resultado para o Paiz? E não deveremos nós examinara parte que o Conselho d’Estado tomou nestes actos!

O ultimo addiamento das Côrtes não foi uma violação do Artigo 17.° da Carta Constitucional? Eu já sei a parte que o Ministerio tomou neste acto, já por isso o censurei, e hei de continuar a censurar; mas para saber se esta censura se deve estender aos Conselheiros d’Estado necessito conhecer qual foi o conselho que elles deram quando se lhes propoz aquelle illegal addiamento.

É pois indubitavel que a deliberação da Camara em nada excedeu os limites da sua authoridade, e que a resposta dada pelo Sr. Ministro do Reino e digna da mais severa reprehensão, tanto pela falta, de cumprimento de uma resolução tomada por esta Camara nos limites da sua authoridade, como pela arrogancia das expressões do seu Officio, que mais parece de um superior do que de um inferior. É incrivel que nos queira reprehender aquelle a quem, nós temos direito, e até dever, de censurar e reprehender!

E á vista de todas estas considerações poder-se-ha dizer que a minha Proposta não e fundada? Sr. Presidente, eu não peço que se tome uma deliberação, precipitada, o que peço é que o Officio do Sr. Ministro dos Negocios do Reino seja mandado a uma Commissão afim de examinar se as suas expressões são ou não offensivas para a Camara. Se assim se não resolver, esta Camara ha de talvez um dia envergonhar-se, quando sahir deste estado, de fascinação em que se acha (perdôe-se-me a expressão), e as Camarás futuras hão de julgar-nos Deus sabe como! ...

Antes de me sentar, seja-me permittido fazer mais algumas breves reflexões sobre o Conselho d’Estado, o que não julgo fóra de proposito.

Eu ja ha pouco observei que os negocios submettidos ao Conselho d’Estado podiam ser de tres especies differentes: uns que exigissem um segredo indeterminado; outros um segredo temporario; outros finalmente que não admittissem demora na sua publicidade, e sobre estes ultimos não só o Paiz deve saber que elles foram submeltidos ao Conselho d’Estado, mas deve conhecer qual foi o conselho que sobre elles deram os Conselheiros d’Estado.

Entre os negocios que depois de resolvidos não admiltem segredo enumerarei alguns:

A discussão que deve preceder a Sancção das Leis apresentadas ao Rei, discussão que, senão tivesse logar na presença do Soberano, deveria ser publica, como o são as discussões dos Projectos de Leis nas duas Camaras:

O Conselho sobre a creação de novos Pares; sobre a convocação de Côrtes extraordinarias, e sobre a prorogação ou addiamento das ordinarias; sobre concessão de amnistias, ou sobre o perdão ou moderação de penas; sobre a declaração de guerra &c.

Sr. Presidente, se não constar o modo por que nestes e outros negocios os Conselheiros d’Estado aconselharam o Monarcha, elles ficarão, apezar de Funccionarios Publicos, apezar das disposições do Artigo 111.° da Carta Constitucional, fóra de toda a responsabilidade, o que e inadmissivel em um governo constitucional ainda quando não fossem tão expressas e claras as disposições do citado Artigo.

Sr. Presidente, eu neste Paiz só conheço um Ente inviolavel, sagrado, não subjeito a responsabilidade, um Ente cujo nome deve ser repelido com o mais profundo respeito, esse Ente e o Rei; lodosos outros; por mais elevada que seja a sua cathegoria, não são inviolaveis nem sagrados, e são todos elles responsaveis.

Terminarei pois tornando a pedir á Camara que não estabeleça um precedente perigoso, que não aberre dos principios constitucionaes, e que approve a minha Proposta, elegendo uma Commissão para examinar o Officio do Sr. Ministro dos Negocios do Reino.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - Antes de fallar sobre a ordem, não posso deixar de dizer que tendo o Digno Par, no fogo do seu discurso, dito que esta. Camara se achava em fascinação, eu pela minha parte rejeito esta palavra do modo o mais so-

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lemne, como impropria, e gravemente offensiva. — Agora sobre a ordem: o Requerimento que está sobre a Mesa é para se saber se esta Camara admitte a nomeação de uma Commissão; é esta a materia que está em discussão, e não outra: por tanto peço a V. Exa. que faça com que todos os Oradores se restrinjam ao principio em questão.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - O Digno Par que acaba de fallar pareceu indicar que eu linha saindo da ordem.

O SR. PRESIDENTE: - Referiu-se á palavra fascinação, de que V. Exa. usou.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: — Essa retiro-a.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: — Estou satisfeito.

O SR. CONDE DA TAIPA: — Sr. Presidente, as palavras má fé, o adverbio insidioso, e outras expressões similhantes, certamente que se devem rejeitar; mas a palavra fascinação creio que não está no mesmo caso. O estar eu fascinado (por exemplo) não é um acto voluntario, é um acto que vem, a meu pezar, pelas minhas circumstancias intellectuaes; e então dizer-se que alguem está fascinado não o uma injuria, nem póde rejeitar-se como tal a applicação do vocabulo que exprime um estado de paixão em que o homem está a seu pezar, e sem culpa sua; não póde rejeitar uma increpação que se lhe faz quando elle não sabe, nem póde saber só aquelle estado em que se diz elle está é ou não verdadeiro; o que póde e mostrar com razoes,, com argumentos, que o motivo da sua conducta tem uma base solida, e que não é por estado de halucinação apaixonada. Por consequencia declaro que quando de mim disserem que estou fascinado, hei de procurar razões e argumentos para mostrar que o não estou; mas rejeitar só, e sem fundamentos, sem provas não quer dizer nada. — Eu não sei se o Digno Par está fascinado ou não; mas, se não esta, é preciso que o mostre por factos, e com argumentos solidos que a sua conducta é conforme á pratica, á experiencia, e á razão, e que não obra por uma paixão de que esteja possuido: simplesmente rejeitar a expressão, não quer dizer nada.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: — Eu já retirei a palavra fascinação, e torno a declarar que a retiro se tanto e preciso. Aproveito esta occasião para dizer que não tive a mais leve intenção de offender nenhum dos Membros desta Camara; o termo de que usei não era tendente a isso: talvez que seja eu o fascinado.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: — Quando S. Exa. se dignou de retirar a palavra, que julguei offensiva, dei todas as provas de que estava satisfeito; e então cessou inteiramente a questão, e não tinha logar a lição da intelligencia do termo fascinado, que o Digno Par o Sr. Conde da Taipa me quiz dar, e que eu não necessito, e considero, totalmente errada: a palavra não póde deixar de ser tomada no sentido de nos arguir de nos acharmos possuidos de uma paixão cega, e devida até a uma origem diabolica; e em seguindo logar, parece que se quer metter em duvida, por uma similhante invectiva, que não somos, livres nas nossas opiniões e discussões, pois que um termo de similhante natureza ataca a nossa liberdade: finalmente S. Exa. conheceu a força da expressão, que impropriamente soltou, e por isso a retirou, devendo assim acabar este incidente, apezar do que ponderou o Digno Par, que fez reviver o desagradavel motivo.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS no REINO: — Acho muito em regra o requerimento do Digno Par, o Sr. Visconde de Laborim, para que se não discuta agora outra couza se não a Proposta do Sr. Conde de Lavradio sobre a nomeação de uma Commissão; mas V. Exa., e a Camara não poderão deixar de concordar em que, tendo sido dirigidas algumas graves imputações ao Governo, e necessario, é forçoso responder-lhe, mesmo por que o Governo tem de dar satisfacção a esta Camara.

Sr. Presidente, eu não posso realmente conceber como S. Exa. achou fundamento nesse Officio para dizer que o Ministerio tinha mostrado desprezo para com esta Camara, e que lhe havia dirigido uma reprehensão. Reconheço que qualquer das Camaras tem o direito de exigir esclarecimentos ou papeis do Governo, sempre que esses esclarecimentos ou esses papeis lhe sejam necessarios; mas tambem e verdade, Sr. Presidente, e reconhecido (não ao nesta e na outra Camara, mas em todos os Parlamentos do Mundo) que, quando se fazem taes exigencias, ao Governo fica o declarar se póde ou não satisfazèlas, se póde ou não remetter taes ou taes papeis. Nem considero que da resposta do Ministerio se possam tirar as consequencias de que recusando enviar estes papeis elle despreza ou reprehende a Camara: se assim fosse, diariamente estava o Ministerio Inglez desprezando e reprehendendo o Parlamento, por que a todo, o momento ali se pedem papeis ao Governo, e a todo o momento está o Governo declarando ás Camaras que taes papeis não podem ser mandados, sem que ainda até agora nenhum membro de nenhuma dessas Camaras se queixasse de se lhe não mandarem, ou se lembrasse de dizer que isso era desprezar ou reprehender a Camara.

O Digno Par acha offensivas e arrogantes as phrases do que se serve o Officio: eu peço á Camara que examine bem, e queira dar a devida attenção ao mesmo Officio. Entretanto no seu discurso o Digno Par sustentou algumas doutrinas com que não posso conformar-me, nem como Membro do Poder Executivo posso deixar passar algumas das asserções de S: Exa.

Sr. Presidente, os Poderes do Estado são pela Carta independentes; e eu não reconheço no Digno Par, nem em qualquer outro individuo das Camaras o direito de reprehensão a respeito dos Membros do Poder Executivo. E aonde está esse direito?... A palavra é assás forte, um pouco inconveniente, e não está de accôrdo. com os principios do governo representativo. (Apoiados.) O Digno Par, que nesta Camara se tem esmerado em sustentalos. deve reconhecer que os Ministros representam um Poder do Estado, e que como taes não podem ser reprehendidos.

Eu não sei se as actas pedidas são necessarias para aquillo que diz o Digno Par, ou se S. Exa. póde deduzir dellas o direito de censurar os Conselheiros d’Estado: é uma doutrina com que tambem me não posso conformar. Segundo a Carta, os Conselheiros d’Estado são responsaveis pelos conselhos dolosos por elles dados á Soberana, mas para fazer effectiva a sua responsabilidade, e preciso que sejam accusados onde compete, e depois julgados por esta Camara; podem, digo, ser julgados, mas não vejo que haja

1843. - JANEIRO.

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direito para os censurar por haverem emittido, uma ou outra opinião.

Sr. Presidente, quando esta questão se tractar mais particularmente, então o Governo mostraria que estava no seu direito em negar as actas: por agora: não entro o mais nella. Intendi porêm que não podia hoje deixar, de dar estas explicações, por que o Governo tem a maior consideração pela Camara dos Dignos Pares; e peço a S. Exa. que ao menos nesta parte, haja da fazer mais justiça aos individuos que compõem o actual Ministro. E que proveito viria aos Ministros de faltarem para com esta Camara ás convenoencias devidas? Não daria isto fundamento para serem asperamente censurados? Indubitavelmente. Por consequencia, Sr. Presidente, se não houve, essa supposta intenção, se as palavras do Officio não dão logar a que se passa intender que o Governo tivesse em menos consideração esta Camara, ou que lhe quizesse dar reprehensões, ha de convir-se que muita das considerações expostas pelo Digno Par foram trazidas um pouco fóra de proposito, e bem assim que algumas das doutrinas expendidas por S. Exa. não podem ser admissiveis.

Sr. Presidente, pelo extracto de uma das Sessões desta Camara, que se transcreveu n'um dos jornaes da Capital, vi eu que o Digno Par aqui dissera. - que sabia tudo quanto se passara no Conselho d'Estado! Quando li uma asserção de similhante natureza, fiquei espantado; por que eu conheço bem tdos os membros do Conselho d'Estado, sei que elles cumprem com os seus deveres, e que reconhecerão que as Leis e a sua honra lhes vedam o revelar os segredos do Estado: não pude por tanto atinar como o Digno Par se julgasse authorisado para dizer o que disse! Sr. Presidente, essa questão do addiatamento é uma daquellas que mais cuidado tem dado ao Digno Par, trazendo-a por vezes á discussão; eu não tenho duvida em declarar que o Conselho d'Estado foi de opinião de que as Côrtes não podiam ser addiadas; mas o Governo está prompto a respondder por esse actor e com a Carta na mão espero que ha de pravas que estava no seu direito quando decretou o addiamento das Camaras. Sr. Presidente, o Conselho d'Estado é consultivo; o Governo póde por tanto seguir, ou apartar-se da opinião do mesmo Conselho: nesta parte não a seguiu, e tendo assim procedido póde ser responsavel, mas ha de ser pelos meios estabelecidos na Carta; venha a accusação, e o Governo se defenderá; agora não é a occasião, nem este o logar, competente para expor os motivos que teve para não seguir aquella opinião. Eu respeito muito as opiniões do Conselho d'Estado, e as de cadaum dos seus membros em particular, mas é força confessar que o Conselho d'Estado podia enganar-se ( por que não é infallivel) intendendo a Carta de uma maneira diversa dsquella por que a intendeu o Governo.

E conclusão,Sr Presidente, se a Proposta do Digno Par fôr tractada, em relação a esta materia, o Ministerio terá ainda occasião de entrar mais largamente na discussão della, e parece-me que ha de provar que os seus actos estão dentro da orbita, constitucional.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - (Para explicação de factor)j Eu não posso agora referir exactamente quaes foram as palavras de que me servi nesta Camara quando disse no Conselho d'Estado se tinha rejeitado a proposta do addiamento das Côrtes; mas como respeito muitos os membros do Conselho d'Estado e não devo comprometter nenhum delles, desejo declarar que não foi por SS. Exas. Que em suber o que se tinha passado no Conselho, mas sim pelo que na outra Camara foi dito por um membro della em presença do Ministerio e de dous membros do Conselho d'Estado, os quaes todos pelo seu silencio confirmaram o que o illustre: Deputado havia ditos eis aqui o motivo, e o unico, por que eu disse com afouteza que sabia o que se tinha passado no Conselho d'Estado. - Parece-me que devia apressar-me a fazer esta declaração solemne e mais algumas observaões desejaria fazer, mas resrecvo-me para logo, para o que desde já peço novamente a palavra.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Ha certas circumstancias, Sr. Presidente, em que por mais que se digam as couzas não fazem effeito nenhum: assim, no caso em questão, por mais que o Sr. Ministro do Reino dissesse - que ninguem podia saber as discussões do Conselho d'Estado, que todos os seus membros são incapazes da reveliam um segredo &c. - o certo é que a couza em sendo segredo dentro em oito dias sabe-se. Sahiu para o mundo que o Conselho d'Estado tinha sido unanime em rejeitar o addiamento das Côrtes, isto sem discrepancia de um voto, nem mesmo do Sr. Presidente, que é Conselho d'Estado; e assim se repetiu em todas as cazas, em todos os circulos, e em todas as praças, por consequencia é uma prova moral de que ninguem duvida do facto, e não temos outras por que não vieram as actas do Conselho d'Estado, visto que o Sr. Ministro não quer publicadas em razão do Conselho d'Estado lhe sido contrario. Ainda ha mais provas moraes para se conhecer que não só no Conselho d'Estado, mas tambem em mais alguem de dentro do Ministerio, havia repugnancia ao addiamento, por quanto todos os Decretos, que tem relação com os differentes negocios d'Estado e que não são exclusivamente d'uma só Repartição, appareceram sempre referendados por todos os Ministros, e o Decreto do addiamento das Côrtes, sendo o de maior importancia, apparece referendado sómente pelo Sr. Ministro dos Negocios do Reino, o que mostra que aquillo foi uma medida de prepotencia do mesmo Sr. Ministro tomada não só contra o voto do Conselho d'Estadlo, mas tambem cobntra a opinião dos seus Collegas, por que os seus Collegas não quizeram pôr o nome em similhante Decreto, assignando ás vezes outros bem triviaes, e que podiam ser assignados por um só Ministro. Deste facto resulta uma grande verdade, e é que o Sr. Ministro do Reino está illudido com a decantada maioria, pois que o Sr. Ministro está em minoria na Camara dos Srs. Deputados, está em minoria na Camara dos Pares, está em minoria no Cobnselho d'Estado, e está em minoria no mesmo Ministerio de que faz parte de modo que o Sr. Ministro do Reino não tem hoje por si se não a foram... (O Sr. Marquez de Fronteira: - Não está.) O Sr., deixa-me continuar. Não se póde fallar no Sr. Ministro que não haja logo interrupções! - O caso é que elle está em minoria, por que a Camara dos Srs. Deputados decidiu por uma votação que viessem as actas do Conselho d'Estado, e o Sr. Ministro decidiu depois, que as não queria dar logo S. Exa. perdeu a maioria na outra Camara: na Camara dos Pares ven

=ejo declarar: q^ie i>ão, for piar SS., lt>i.aa qfie eth snbet

o:quo ssjtinii-a1 passado no Conselho, tniis. si^n ptdor

cf+ie; na-oulra; Camará; fbn dito por um Ha^mbro^d;^!*

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td^Kstado. triitiat siilw iinamia" einv rejfil-ajr- cnaddia-*

j mento das.\Ci)òrtes,. islo) aem diiactepancjflfde um-vo.".

to, nem mesino- d"Sn. Brejidònte,. que- é-Conse-^

Uieiro.ºdiEéli?do4 e assim? sei: repeti u-em; lodastaa ra>

;/as,- eta- todoi o^circjuT"?,: e em todas? as> ry-açaS),,

*por con&ffcfuancia áMiraa. prova morah de; que-nino

^ucm duvidando facto, e-não ternos ontra^fppr que-

nào- vieram as* "^ctaa^ d/j Consellio- dEstadf"k, visto, | que o: Sn M inistro- irào: q.uen publicalns em. ra?ão doj iCo-nseliho "d:Estadoilhe-tersido contrario. Ainda; ha^ j mais prosas moraesi para. se; conhecej- que- não* só noj iConsdltoj dEstado,_ mas: tanib,om emimais-a:lgHeirii;de.de.r3lro do Mànislerio, - havia repugnancia aoiad-idiajiiento;i ponquanlo todos, os- Decretos*,, que tem

; relação1 com os difterentes negoeios-cVEsta.do e^quc-nàqrsào.ºxclusivamentet d!uma só Repartição.,, ap,-parecen". sempre "referendado^-por todos os-Ministios^, e- o Decreto, dó. addiamenlct>das:Gôrtes,, sendo-o de" maior importanciai, apparececr refarerrdftdor semente pelp, Sn. MinJstro* d^s Negociou do Roino",; o que rscstiftqufiiaqiiilio; foi iuna> medida de prepotencia; doifr>eanD?Si: ÃLjiii&tro tomada; não. SQ< contra Of^^olof do. Conselho cBEslado, mas: tambem: contra" a. opi-^ rtiàp dosc-seus/Cojlegas^pocque o^, s.eusiGolÍQgas- nàa qjjizeram pôr-o nome em-tskmilhajtteiD.eereto, assigr nando ás vezes outros bem triviaes, e que. podiam: str.as&i^nadQSj pei-uiit sójJVIJmstrot DJJ&ÍQ facto, resulta < u roa ^girander verdade 1, ererque^o Sr..Ministro, do- Reibo- está. illudidoo com\ a: d (c)cantador nffaiorJa^. poise quero,Sn. Minislrcoestá.ern,minoria^na.Cania" ra^ d"s-. Srs.v Deputados,;, está. .em; minoria nanCamaT"! dosiP^es^ está em minaria..np ConsellKx.d^Esjtiidii,,, e- (^tál enu m-iaoraai no; njesm^o Ministerio^ derque. faz-portei,-".ditmodob que> o- Sr.. JMiimtnv do.TRej-.nãa^ te-aacjboja peori si- se-nãti a; fnirai ...(0,5!>v, Mvrqvc*, cteFro/ÀfeeraeVi.Não está-.) ÓiSri,- deixe-ree centir-miar.: -Niaor sa-p.óde.fallaT no.Srv MJnistr^ que.nào, hajatlogi"!jinterriip9Ôes~!>-%G1ica50 é:quQ ejlô-.esiá^nt Oiiporiar, -.pçffj que III Gamaramdo>- Srs.- Deputados, decidjirrpoi^ itma> volaçao:,.que*viessem as.acta* do C.CHJgelhioidrEstada), etòiSn: Ministro; decidiu;dep_ois, q-v>ô(as;nào^qi4Qrra; dar";. IcgtiSrBx>tt perdei a^ maiorias nar bmtra! Garaara^r lãi-QaanaNt cU*> -Paresi.v^nr

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ceu-se por maioria (com a qual votou o Sr. Presidente do Conselho de Ministros) que viessem as actas do Conselho d'Estado, e o Sr. Ministro recusou; está em minoria na Camara dos Pares: o Sr. Ministro consultou- é Conselho d'Estado, este não annuiu á sua proposição; está em minoria no Conselho d'Estado: os seus Collegas não quiseram referendar o Decreto do addiamento; o Sr. Ministro está em minoria com os seus proprios Collegas. Esta é que é, Sr. Presidente, a verdade do caso. - Este addiamento foi uma falta politica das muitas que tem commettido o Sr. Ministeiro dos Negocios do Reino; muitas tem commettido, mas tantas ha de fazer que acabará a sua muito curta vida politica, que eu vejo prestes á espirar, por que lhe vai faltando tudo: já lhe falta a Camara dos Deputados, falta a Camara dos Pares, falta o Conselho d'Estado, faltam os seus Collegas, e daqui a pouco faltar-lhe-ha mais alguma couza, e o Sr. Ministro tem de morrer, não sei se de inanição se de gangrena; faço votos ao Todo Poderoso, já que elle tem de acabar, para que seja antes de inanição do que de gangrena.

O exemplo que trouxe o Sr. Ministro do Reino da Inglaterra, não vem para o caso: diz o Sr. Ministro - todos os dias se pedem em Inglaterra documentos ao Ministerio, e esses documentos não vem: - mas que responde o Ministerio quando se lhe pedem esses, documentos? Se se referem a negociações pendentes, diz - eu não posso apresentar taes documentos por que podem contrariar ou destruir a negociação, e convèm não inbabilitar o Governo: - mas se algum membro do Parlamento Inglez, com a approvação da respectiva Camara, dissesse ao Ministerio (e lá tambem ha lei para que certos negocios se não concluam sem o Rei ouvir o seu Conselho privado,) que apresentasse qualquer acta do Conselho privado, estou persuadido que nenhum Ministro ousaria recusala. - É bom citar, mas é preciso conhecer primeiro as circumstancias das couzas que dizem respeito áquellas que se citam: examine o Sr. Ministro do Reino se ha um facto destes nos annaes da historia de Inglaterra.

Em fim, Sr. Presidente, por não repelir aquillo que dentro em quatro ou cinco dias tenho a dizer quando, vieram aqui outros negocios, calar-me-hei: entretanto, creio que o facto está prejudicado, que toda a gente sabe que se violou a Carta Constitucional por esse illegal: addiamento das Côrtes, que o Conselho d'Estado lhe foi contrario, e que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino tomou sobre si essa medida; tudo mais é gastar o tempo com palavras escusadas: não é com força pbysica que havemos de lançar fóra o Sr. Ministro, ha de cahir aos golpes da força moral, que se vai amontoando com a manifestação destes factos patenteados nas discussões do Corpo Legislativo. - Nada mais digo.

O SR. MARQUEZ DE FRONTEIRA: - Pedia a V. Exa. quizesse consultar a Camara sobre se a materia está ou não discutida, por que o objecto reduz-se a saber, se ha de haver ou não a nomeação da Commissão e depois o Sr. Conde de Lavradio tem o direito de dar as suas explicações.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - (Sobre a ordem.) Em geral os authores das propostas tem o privilegio, isto é - o direito (por que eu não quero privilegios) de dar todas as explicações que lhes parecerem necessarias. O Sr. Ministro dos Negocios do Reino apresentou algumas idéas que é preciso combater; eu prometto á Camara não lhe tomar muito tempo, por que parte dellas já foram prevenidas pelo Sr. Conde da Taipa. - S. Exa. fez a citação de Inglaterra, e... (Sussurro.) Eu creio que V. Exa. me deu a palavra?

O SR. PRESIDENTE: - Está usando della domo author da Proposta.

SR. SILVA CARVALHO: - Primeiro deve consultar-se a Camara; e se ella julgar a materia discutida, depois de votada é que tem logar as explicações.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Parece-me pouco generoso o querer-se-me tapar a bocca, quando eu pedi que fosse avisados os Srs. Ministros, dando assim uma prova de que os não queria surprehender, couza que não desejo fazer não só aos Srs. Ministros, mas a ninguem, por que sempre quero batalhar honrosamente.

O SR. MARQUEZ DE FRONTEIRA: - O Digno Par o Sr. Conde de Lavradio póde apresentar as suas explicações depois da votação. (Apoiados.)

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Eu só desejava observar, antes da votação, que ainda ninguem disse nada relativamente á nomeação da Commissão, que e o objecto dal Proposta.

Consultada a Camara, decidiu que a materia estava sufficientemente discutida.

O SR. CONDE DA TAIPA: - Eu proponha que a votação seja nominal. (Apoiados.}

O SR. PRESIDENTE: - Alguns Membros da Camara tem que dar explicações, assim como o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, por que para ellas pediram já a palavra: eu tambem desejo dizer depois alguma couza ácerca de certos pontos em que se tocou por occasião de se discutir a Proposta do Sr. Conde de Lavradio: quanto á Votação nominal, declaro-me contra um tal costume praticado nesta Camara, por que o não julgo muito conforme á sua natureza; entretanto varios Dignos Pares parece que preferem este modo de votar, e por isso vou consultar a Camara.

Sendo assim feito, resolveu que a votação fosse nominal.

Sobre a proposta do Sr. Conde de Lavradio, disseram = approvo = os Dignos Pares

Marquez de Abrantes,
Conde do Bomfim,
de Lavradio,
de Rio Maior,
da Taipa,
Visconde de Fonte Arcada,
Giraldes;

e disseram = rejeitos os Dignos Pares
Marquez de Fronteira,

de Ponte de Lima,
Conde da Ponte de Santa Maria,
de Semodães,
de Villa Real,
Visconde de Laborim,
Barão do Tojal,
Rihafria,
Gamboa, e Liz,
Margiochi,
Silva Carvalho,
Serpa Machado,

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Trigueiros,
Duque de Palmella,
Conde de Lumiares,
Polycarpo Machado.

Ficou por tanto rejeitada a Proposta por 16 votos contra 7.

Teve depois a palavra para explicação, e disse

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Hei de fallar muito pouco, e limitar-me-hei sómente a refutar alguns erros historicos, e outros de Direito constitucional proferidos pelo Sr. Ministro dos Negocios do Reino.

Em quanto ao que pratica o Governo Inglez quando em alguma das Cazas do Parlamento se lhe pedem documentos relativos a qualquer negocio, permitta-me o Sr. Ministro do Reino que, sem o querer tachar de ignorante, lhe diga que S. Exa. está mal informado sobre esta materia: em Inglaterra nunca os Ministros da Coroa recusam os documentos que lhes são pedidos, excepto se elles dizem respeito a negociações pendentes com alguma Potencia estrangeira, como já muito bem observou o Digno Par Conde da Taipa, mas documentos da natureza dos que eu pedi, não creio que S. Exa. me possa apontar um só exemplo de haverem sido recusados.

Disse o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, entre outros erros de Direito constitucional que proferiu, que os Ministros faziam parte do Podêr Executivo: o Podêr Executivo, Sr. Presidente, reside no Rei, os Ministros são sim os orgãos desse Podêr, mas não parte delle. - Disse mais S. Exa. que os Ministros eram os representantes do Podêr Executivo: outro erro; elles não são os representantes do Podêr Executivo, mas sim os seus procuradores, ou os seus orgãos, como já disse. - Observou depois disso S. Exa. que tanto os Ministros como os Conselheiros d'Estado estavam fora do alcance; da censura desta Camara: isto é um erro crasso, e uma blasfemia ide Direito constitucional, por que não ha Funccionario algum Publico, excepto o Rei, que não esteja subjeito á censura desta Camara, e accrescentarei mesmo á de qualquer Cidadão. Quanto aos Ministros direi que a Camara dos Pares tem direito, e mesmo dever de os censurar, e até reprehender, quando conhecer que elles não desempenham ás suas obrigações.

Limito a isto as minhas observações, por que a Camara já se acha um pouco distrahida e cançada; nada mesmo teria dito se me não parecesse necessario protestar contra as blasfemias de Direito constitucional proferidas por um Ministro da Corôa.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Como não pude fallar sobre a materia, por se julgar discutida, quererei fazer algumas observações sobre o que tenho ouvido dizer, visto que o negocio é bastante importante.

Eu não posso concordar com o nobre Par, por que não acho no Officio uma prova de desprezo para com esta Camara, nem reprehensão nenhuma. A parte do Officio, que como tal foi censurada pelo Digno Par, é como explicação do motivo que o Governo teve para recusar as actas. Quanto a mim, não podia exigir mais dos Ministros actuaes do que eu estaria disposto a conceder sendo Ministro: então recusei algumas vezes varios pedidos das Camaras. O voto de uma das Camaras tem certamente muito pezo mas não tem força de Lei. Aqui tem-se admittido como pratica constante não se recusar o pedirem-se certos esclarecimentos, por que se julga que o Ministerio tem o direito de os não apresentar, conforme as conveniencias que para isso achar.

Aproveito a occasião para dar a explicação do meu voto quando aqui se propòz a primeira vez este negocio. - O desejo que eu tenho de não me eximir nunca da responsabilidade que me toca, não só pelos meus actos, mas tambem pelas minhas opiniões politicas em qualquer occasião, fez com que então votasse a favor da indicação do Digno Par; mas vendo que outro Digno Par, e meu Collega do Conselho d'Estado, votou contra, senti que não devia ter votado por aquelle modo. Com franqueza o declaro, por que acho que o precedente de pedir as actas do Conselho d'Estado seria um precedente, e um exemplo muito prejudicial. Actualmente porém, pela declaração que fez o Sr. Ministro do Reino, de que tinha obrado só pela opinião do Governo, e não pela do Conselho d'Estado que foi contraria, cahe por terra todo e qualquer motivo que podesse haver para pedir a acta do mesmo Conselho afim de se impor a responsabilidade do addiamento das Camaras aos Conselheiros d'Estado, por que eu tambem intendo que elles estão subjeitos á responsabilidade na fórma declarada pela Carta Constitucional, isto é, quando derem um conselho doloso. (Apoiados.)

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS DO REINO: - Sr. Presidente, o Digno Par, o Sr. Conde da Taipa, que já em outras occasiões me honrou com o seu apoio politico, (O Sr. Conde da Taipa: - De que estou bem arrependido.) - Eu o creio. - E que tem continuado a honrar-me sempre com a sua amizade pessoal, considerou-me ás portas da morte. Eu não sei de que morte fallou o Digno Par; se S. Exa. me considera ás portas da morte natural, não se engana, por que a minha saude não é boa, mas se me considera ás portas da morte politica, como creio, ha de S. Exa. permittir-me lhe diga que em quanto a maioria se conservar no estado em que se acha nas duas Camaras, e o Ministerio marchar como marcha, estará longe de morrer; por que, Sr. Presidente, o meu systema não póde deixar de agradar á maioria de uma e outra Caza do Parlamento, pois se reduz á consolidação do governo representativo, e á conservação da ordem neste Paiz, (Apoiados ) assim como á regularisação das finanças, (Apoiados.) e á de todos os ramos da publica Administração: (Apoiados.) este programma é igualmente o da maioria.

Sr. Presidente, e muito facil fazer epigrammas, ou lançar estigmas sobre um Ministro qualquer; mas quando isto se faz sem entrar na analyse dos seus actos, do seu systema, esse estigma, e esses epigrammas cahem por terra, ou não produzem effeito nenhum.

(O Sr. Presidente deixou a Cadeira, que foi logo occupada pelo Sr. Conde de Villa Real.)

Sr. Presidente, os Dignos Pares que procuraram destruir o que eu tinha adduzido trazendo um argumento parlamentar de Inglaterra, transtornaram inteiramente aquillo que eu havia, dito: Sr. Presidente, eu não quiz ir buscar aos exemplos de Inglaterra o direito que o Governo teria para negar as acta do Conselho, d'Estado, não era essa, a razão; mas recorri a esses exemplos para repellir a

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accusação que se fazia aos Ministros, em quanto se dizia (com referencia ao contheúdo no meu Officio) que o Governo tinha desprezado, tinha reprehendido a Camara dos Dignos Pares. Era esta a proposição do Sr. Conde de Lavradio, e eu tractei de mostrar que naquelle Officio (que fôra remettido em nome do Governo) não havia motivo pira sustentar que se tivesse desprezado ou reprehendido esta Camara; que este exemplo era seguido em outros paizes constitucionaes, e em Inglaterra diariamente: os mesmos Dignos Pares o reconheceram. Pergunto: não é verdade que o Governo Inglez recusa muitas vezes no Parlamento papeis que por elle lhe são pedidos? Ninguem poderá negalo. E quando este acto se verifica, tem algum membro do Parlamento Britannico accusado os Ministros de que assim desprezem, ou reprehendam as Camaras? Ninguem o affirmará. Esta era a questão que se tinha suscitado, e a isto é que se respondia.

Sr. Presidente, eu pedi especialmente a palavra para declarar ao Digno Par (que sinto se ausentasse, talvez para não ouvir esta explicação) que quando se falla em pleno Parlamento, e se accusa um Governo, e necessario que previamente estejamos certos da exactidão dos factos, e que nunca se deve accusar indiscretamente, ou sem provas, por que o resultado será o cahirem taes accusações por terra. - A que proposito pois veiu o dizer-se que o Decreto do addiamento das Côrtes, Decreto privativo do Ministerio do Reino, mostrava a divergencia do Conselho de Ministros, e que elles haviam votado contra esse addiamento, só por que não era referendado por todos os Membros do Ministerio? É necessario ter uma logica muito fina para achar no Decreto tudo quanto foi referido pelo Digno Par! - Sr. Presidente, não houve tal divergencia, todos os Ministros foram concordes, foram todos de opinião de que o Governo não podia deixar de addiar as Camaras, não só por que estava authorisado pela Lei para o fazer, mas por que as necessidades publicas assim o exigiam: por tanto eu nego o facto de que houvesse a supposta divergencia em vista da falta da referenda de todos os Ministros em um acto só proprio do Ministerio do Reino.

O mesmo Digno Par, pelo facto de ter sido aqui approvado o Requerimento do Sr. Conde de Lavradio pedindo as actas do Conselho d'Estado, e por que na outra Caza tambem foi approvada uma igual proposta, intende que o Ministro do Reino está em minoria nesta Camara, e na dos Srs. Deputados; e accrescentou que o mesmo lhe acontecia em relação ao Conselho d'Estado, e no proprio Conselho de Ministros! Sr. Presidente, dura guerra se levanta contra o Ministro dos Negocios do Reino, e no em tanto a minoria está como estava; não consta que levasse ávante nenhuma das couzas que tem apresentado contra os actuaes Ministros, e isto prova que o Ministerio está em minoria n'uma e outra Camara, no Conselho d'Estado, e no Conselho de Ministros! - Sr. Presidente, aqui não se tracta de Ministro do Reino, nem de Ministro da Justiça, n'uma palavra, a questão não é de pessôas; e parece impossivel que esta Camara, pelas capacidades que contem, houvesse de resolver qualquer assumpto sómente em relação á pessòa de um Ministro: aqui, Sr. Presidente, deve-se tractar de principios, de systemas; e desgraçadas as questões quando são trazidas unicamente contra as pessoas. - A prova que se quer tirar do facto de serem approvados similhantes Requerimentos em uma e outra Camara, de certo que não póde servir para tirar a conclusão de que o Governo está em minoria; o Requerimento feito na Camara dos Deputados por um nobre Membro della sobre tal objecto, foi approvado pelo meu proprio voto, pelo dos Ministros, e pelo dos meus mais decididos amigos e defensores da actual Administração: ora quando o Governo vota por uma proposta apresentada em qualquer das Camaras, poderá com verdade dizer-se que o Ministerio ficou em minoria por que essa proposta se venceu! É preciso ter uma logica demasiado fina para deduzir tal consequencia de similhante facto! (O Sr. Conde de Lavradio: - A palavra para uma explicação.)

Não se diga tambem que o Ministerio quer governar só pela força, se por ventura se intende a força bruta (como explicou o Digno Par), pergunto - onde esta essa força de que o Ministerio dispõem para impòr ao Parlamento? Aonde os factos pelos quaes se possa provar uma tal increpação? Sr. Presidente, de ha muito que eu tenho dito na outra Gaza que o Governo deve governar pela força, mas pela força que lhe provem da approvação da sua politica e do seu systema governativo em uma e outra Camara: o Governo não quer, por que não carece de outra força para dirigir os negocios publicos.

Sr. Presidente, mas uma blasfemia foi proferida por um Ministro, e esta blasfemia consistiu em dizer que os Ministros representavam nestas cadeiras um Poder do Estado! Sr. Presidente, onde estamos nós? Chamar-se a isto uma blasfemia de Direito constitucional! Diz-se que se tem estudado, e que se conhecem os principios do governo representativo, e entretanto mostra-se que nem a Carta Constitucional se tem lido! O que diz ella no Artigo que regula a materia em questão? Diz o seguinte: (leu.) Isto Sr. Presidente, não carece de commento; basta a simples leitura destas palavras para provar que, dizendo a Carta que o Rei é o Chefe do Podêr Executivo, e que o exercita pelos seus Ministros, estes representam um Podêr do Estado. Por tanto, repito que esta simples leitura é bastante para destruir a supposta blasfemia que se disse haver sido proferida por um Ministro da Corôa. - Não entrarei em outras explicações, e tenho concluido.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - (Sobre a ordem.) Longe de mim a idéa de tolher que qualquer Digno Par possa fallar, mas parece-me que não ha explicação de explicação, por que então, permitta-se-me que diga, desta fórma se urdirá uma cadêa tal que não terá fim; por tanto quando um Par pede a palavra para uma explicação, deve fallar; mas não para dar explicação de explicação, por que então seria um nunca acabar.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Era uma explicação sobre este incidente. Eu pergunto, e com a maior modelação, se me e permittido usar da palavra para responder a algumas couzas que disse o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, deixando ao arbitrio de V. Exa. dizer-me sim ou não; se me disser que não, hei de subjeitar-me, e se me disser que sim, hei de fallar: por tanto fico satisfeito com o que V. Exa. me der em resposta.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - O Digno Par já deu

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uma explicação, e por tanto sem uma resolução da Camara é-me impossivel conceder-lhe agora a palavra.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu renuncio, e outra occasião virá em que possa dizer aquillo para que a tinha pedido.

0 SR. TRIPEIROS: - Sr. Presidente, eu hei de ser muito breve, por que as explicações vão longas, te eu pedi u palavra para uma, quando alguem propôz a votação nominal, mas não me parece que deva deixar de a dar.

Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra na discussão, e o Sr. Duque de Palmella, que nunca se esquece de cumprir o Regimento, desta vez não teria tomado nota, ou por algum incidente dos muitos que podem succeder, foi causa de que eu não fallas-se sobre a materia; agora pois não usarei da palavra como tencionava por muitas razões: primeira, por que as questões acabaram, e as explicações não são logares proprios de reflexões sobre a materia; segunda:, por que o Digno Par a quem eu desejava muito responder não está presente: limito-me por tanto a dizer o motivo por que votei contra a moção do Digno Par, o Sr. Conde de Lavradio.

Eu ainda não intendo o que se pedia, e não admira, por que eu não intendo qual havia de ser o resultado da remessa do Officio do Governo a essa Commissão, e mesmo não sei o Parecer que ella havia de dar; e se o resultado que S. Exa. pretendia tirar da sua moção era lançar a censura, ou fazer uma diatribe contra o Ministerio, conseguiu por sua parte esse fim: por consequencia está o objecto da moção cumprido, e melhor do que o faria a Commissão, que naturalmente o não faria, por que não sei em que havia de basear o seu Parecer, ou antes ignoro que Parecer-se pretendia que ella désse.

Já bastante se disse sobre a maioria do Ministerio, que se pretende já não tem, e achar-se reduzido á força bruta, que logo se assegurou lhe faltará; finalmente ao Ministerio não resta nada. A este respeito só lembrarei o que se passou ha um momento, que responde plenamente á sinceridade com que aqui se assegurou que o Sr. Ministro dos Negocios do Reinio tinha perdido todos os elementos da sustentação no Ministerio, para provar que este dito não foi mais que sinc pectore vocem, e que a opinião em contrario mortifca interiormente quem o emprega: lembre-se a Camara que nesta occasião o Digno Par que o assegurou havendo algum sussurro na Sala, exclamou - Srs. estejam descalçados; em se fallando no Sr. Ministro ao Reino logo ha inquietações, e é raro que não venham logo estas interrupções! - O Sr. Ministro do Reino póde, e ha de cahir, por que é da ordem das couzas, mas não sei o modo como isto ha de ser por agora, sendo certo que elle tem a confiança da maioria: sei que póde perdèla, por que não ha Ministerio nenhum que não esteja subjeito a perder a confiança de qualquer maioria, mas que lhe falte essa hoje, contra tal asserção appello eu para os factos: aqui nesta Camara, e na dos Srs. Deputados, esse Ministerio que se diz estar em desintelligencia que ella, ainda não deixou de ter nas votações uma immensa maioria: essa desintelligencia do Ministro dos Negocios do Reino, com seus Collegas, não se comprehende o que é: por ora não ha meio, as esperanças são muito mal fundadas, e não vejo motivo para folgar como o Digno Par que fallou daquella maneira. Não acho grandes esperanças para lisongear-se, e os factos mostrarão que, em quanto o Sr. Ministro do Reino se conduzir como tem feito até agora, e tiver por programma o que aqui apresentou, os amantes do seu Paiz estou certo que lhe não hão de faltar com o seu voto, assim como estou persuadido que a maioria, logo que elle faltar ao seu programma, ha de retirar-lhe o seu apoio. (Apoiados.) Por consequencia conserve-se o Sr. Ministro como até aqui, tenha a peito a organisação do seu Paiz, puna o crime, dê estabilidade ao systema, e segurança á propriedade e aos Cidadãos; eu lhe asseguro que não hão de ser esses poemas (por que a fallar a verdade ha certos discursos que parecem poemas) que hão de fazer cabir os Srs. Ministros da Corôa.

O SR. DUQUE DE PALMELLA: - A Camara está cançada, e eu não abusarei da sua attençao: pedi a palavra para fazer algumas observações, e será no menor numero de palavras que podér; a minha situação é especial no negocio que se tractou hoje.

Eu dei um voto nesta Camara que conscienciosamente agora, e depois de ter reflectido sobre elle, me arrependo de o ter dado; não me envergonho de o confessar. Quando se pediram estes esclarecimentos ao Governo, movido do sentimento natural, (que partilham todos os membros do Conselho d'Estado) - de desejar sempre que quaesquer opiniões que tivesse emittido em outro logar fossem conhecidas de todos, uma vez que dellas se tractava - eu votei que se requisitassem esses esclarecimentos: depois reflecti que a requisição das actas do Conselho d'Estado, não era um negocio tão corrente como pedir quaesquer outros esclarecimentos; de mais acontecia ser o primeiro exemplo que entre nós. se dava disso, e pareceu-me que seria um exemplo fatal se se adoptasse em regra. O Conselho d'Estado, tal como se acha creado na Carta, e o Conselho do Podèr Moderador, e o Conselho do Rei em certos casos graves: por tanto o pedir communicação das suas actas não parece nina consequencia da Carta, a não ser nos casos de accusação dirigida contra Conselheiros d'Estado: estas accusações, para poderem ter seguimento, devem fazer-se na outra Camara, e recahir sobre factos, mas factos, por assim dizer, palpaveis e notoriamente de responsabilidade, para que as mesmas accusações possam fundar-se: por tanto é necessario que primeiro sejam accusados os Ministros (ao menos lenho por difficil a hypothese em que assim não deva proceder-se), e se estes para se justificar allegarem o voto do Conselho d'Estado, então se poderá recorrer á responsabilidade dos Conselheiros; mas antes de existir aquella primeira accusação, antes de exigir dos Ministros a responsabilidade dos seus actos, ameaçar o Conselho d'Estado por opiniões, que mesmo se não sabe se foram emittidas pelos seus membros, é realmente querer levar muito longe o direito de velar na guarda da Constituição! O Artigo 139.° da Carta, que foi mencionado por um Digno Par, diz o seguinte: (leu.) Ora para examinar se a Constituição Politica do Reino tem sido exactamente observada, é preciso examinar os factos que occorreram; estes são da immediata responsabilidade de quem os praticou, isto é, do Podêr, Executivo: se se mostrar que o Ministerio obrou mal, se por isso fôr competentemente accusado, e elle quizer desculpar-se com os conselhos que recebesse,

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declinando deste modo a sua responsabilidade, só então poderá recorrer-se á dos Conselheiros d'Estado.

Fallou-se em Inglaterra, e disse-se que naquelle paiz não seria recusado o pedido de uma Camara da maneira peremptoria por que nesta occasião o Governo recusou a requisição feita em ambas as Cazas do nosso Parlamento, e não se citaram outros exemplos de recusas, feitas pelo Ministerio, Inglez a taes pedidos, se não quando, allegasse o inconveniente que haveria de revelar o estado de uma, negociação pendente com, gabinetes estrangeiros; mas não se citou nenhum caso, de recusa de pedidos por parte das Camaras, que parecessem indiscretos; entretanto, se em Inglaterra se exigissem as actas do Conselho privado, estou certo de que tal exigencia seria recusada. Ora o nosso Conselho d'Estado, em alguns casos, póde ser equiparado ao Conselho de Ministros em Inglaterra, por que o Conselho de Ministros nesse paiz, como se sabe, não é unicamente composto dos Ministros mas tambem dos outros Conselheiros da Corôa, e nelle se tractam as grandes questões da politica do momento, do mesmo modo que acontece frequentemente no nosso Conselho d'Estado. Não negarei que a este Corpo falta ainda um Regimento, que o ponha de accôrdo com os principios da Carta; mas segundo os da sua antiga organisação, e mesmo conforme a pratica que se adoptou desde que começou a funccionar, entre nós o Concelho d'Estado tem sempre sido um Conselho propriamente da Corôa. Limito-me a estas observações sobre a natureza do mesmo Conselho; e unicamente accrescentarei, como resposta a um Digno Par quando disse - que em Inglaterra, estes esclarecimentos não seriam negados, - que - se tornava necessario provar primeiro - que elles seriam pedidos - para que da outra asserção de S. Exa. podes-se concluir-se alguma couza.

Por esta occasião observarei ainda que estes frequentes pedidos, que reputo mesmo abusivos (não quanto ao direito mas quanto á utilidade), de esclarecimentos, parece que deixam sempre o Governo authorisado a uma recusa, quando na communicação delles ache qualquer inconveniente, e não só o obvio de poder prejudicar alguma negociação pendente com Potencia estrangeira, mas tambem quando a remessa de taes esclarecimentos seja, equivalente á revelação, que elle supponha extemporanea, sabre o estado momentaneo de certas Repartições Publicas, do que talvez podessem resultar prejuisos se fossem prematuramente apresentados ao Publico.

Tendo por tanto reflectido mais, maduramente do que fizera naquelle instante, em que um impulso natural me levou a votar pelo pedido das actas do Conselho d'Estado, não posso deixar de declarar a V. Exa. que eu concordo na resposta dada pelo Sr. Ministro da Coroa á exigencia que lhe fora feita por parte desta Camara.

Quanto, ao modo por que se acha redigido o Officio, estou persuadido que não houve intenção de offensa, e que S. Exa. sómente se limitou a estabelecer os principios, e a fundamentar as razões por que recusava, julgando que assim o devia fazer nessa occasião, enviar á Camada as actas do Conselho d'Estado, observando que, ellas só podiam, ser exigidas pelo Tribunal competente, nos casos em que houvesse dó julgar os Ministros ou os Conselheiros, d'Estado.

Nada mais direi sobre esta materia; e simplesmente peço licença para accrescentar (em harmonia com uma declaração que fiz antes do deixar a Cadeira) que não posso considerar como uteis, nem como coherentes com a natureza desta Camara, as votações nominaes tão frequentes como tem tido logar ultimamente. Conheço que e um uso que existe entre nós desde que se estabeleceu esta fórma de governo, mas creio que é um uso irreflectido,, e que seria melhor desviar desse precedente, ou segundo, com menos frequencia: a natureza de uma Camara de Pares, sobre tudo quando couto esta é hereditaria, exige que ella- tenda a apresentar nina resistencia prudente e digna ás illusões, que muitas vezes momentaneamente fazem desvairar a opinião popular, n'uma palavra (e sem procurar circumlocuções) que se ostente como conserdora, obrando para isso de modo que não dê muitas occasiões a que os seus Membros se singularizem, mas sim a que elles, formem uma especie de barreira a tudo que fôr precipitação. ( Apoiados ) Por tanto para que servirá uma votação nominal, votação que sempre que se pede é concedida?... Eu faço justiça a todos os Dignos Pares: estou certo de que não ha nenhum nesta Caza que não deseje que as suas opiniões sejam conhecidas, dentro e fóra da Camara, e por que são conscienciosas ninguem aqui tem duvida de as apresentar: mas o que se ganha em as proclamar dessa maneira? Será o ver nos periodicos do dia seguinte os nomes dos que votaram em pró e em contra? Mas que resulta disso? Supponhàmos que a decisão, posto que acertada, não encontrava a approvação de uma parte do Publico, pergunto, não ficariam numa especie de desfavor aquelles Membros que concorressem para essa decisão. E que vantagem teriam a esperar os que votassem n'um sentido contrario? É por ventura esta Camara electiva para que podessem aspirar á sua reeleição?... Nada mais accrescentarei a estas considerações, ás quaes poderia dar muito maior desinvolvimento, mas estou persuadido que não e necessario por que toda a Camara ha de convir nellas. (Apoiados.)

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Pedi a palavra para fazer uma declaração, um annuncio, e um requerimento: a declaração é que o juro da discussão de hoje foi maior do que o capital; o annuncio é que não podendo eu conceber que em uma Monarchia Representativa possa haver Funccionario algum Publico, excepto o Rei, que não seja responsavel, e não podendo conbinar este principio com algumas doutrinas expendidas nesta Camara, hei de fazerem tempo competente uma Proposta tendente a esclarecer o modo por que se deve intender a responsabilidade dos Funccionarios Publicos; este annuncio desempenharei em outra Sessão. Agora o requerimnento e dirigido ao Sr. Ministro da Fazenda. - Tão raro é ter a fortuna de ver a S. Exa. nesta Camara, apezar. de ser Membro della, que não posso deixar-" de aproveitar esta occasião para lembrar-lhe o estado de penuria a que se acham reduzidas as Classes inactivas, os Militares, reformados os Funccionarios Publicos aposentados, os Egressos &c.: ainda ha poucos dias, vindo eu para esta Camara, encontrei um Militar, que defendeu a independencia do Paiz durante a guerra Peninsular, e depois a Liberdade na

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Ilha Terceira e no Porto, e perguntando-lhe pela s na saude, queixou-se-me dizendo que soffria de rhenmatismo; e aconselhando-lhe eu que tivesse dieta, respondeu-me que a isso o tinha obrigado, não a molestia mas o Governo, que lhe não pagava o seu soldo, pois o anno passado apenas recebera tres mezes desse vencimento, pagando-se-lhe o mez de Março em 31 de Dezembro! Este Official General está cuberto de cicatrizes que recebeu em defeza da independencia da Patria, e da Liberdade. Eu não digo que haja falta de zelo da parte de S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda, mas torno a lembrar-lhe estas Classes, por que dentro de pouco tempo, se lhes não acudir, se verá livre dellas e desapparecerá do Orçamento a verba de 80 contos mensaes, que tanto ellas gastam, havendo assim uma grande economia em consequencia dos individuos que as compõem terem todos morrido de fome.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Pedi a palavra para lembrar ao Sr. Ministro da Fazenda que tenha a bondade da mandar os esclarecimentos que eu pedi n'um Requerimento que tive a honra de fazer na Sessão passada, o qual foi approvado, e já nesta renovado: estes esclarecimentos são muito essenciaes para um Projecto que eu propuz, e que se vai discutir, afim de derogar a Lei sobre os manifestos dos gados no Termo de Lisboa. Peço por tanto a S. Exa. que os queira enviar quanto antes, visto que outros, que eu julgava que pela sua materia não poderiam vir tão cedo, já checaram a esta Camara: aquelles que acabo de lembrar são muito necessarios para que a Camara possa com pleno conhecimento de causa entrar na discussão do Projecto que apresentei.

O SR. MINISTRO DA FAZENDA: - Não é certamente sem muito sentimento que eu tenho deixado de appareeer nesta Camara, porem objectos graves, que occupam a minha attenção, sobre Projectos de Fazenda tem sido a unica causa dessa involuntaria ausencia.

Relativamente ás Classes inactivas, digo ao Digno Par que me interpellou sobre esta materia, que póde estar certo de que ao Governo não tem escapado a sorte daquelles individuos, por que em razão do grande apuro da Fazenda, de muitas despias, e de extraordinarios pagamentos que tem haviJo a fazer, é que aquellas Classes tem sofrido, bem a meu pezar, importando só as despezas extraordinarias deste anno na somma de 825 contos, que tem sahilo da receita ordinaria para essa applicação: mas o Governo tem um Projecto a apresentar ás Camaras, que ha de melhorar de uma maneira efficaz e solida a sorte destas Classes, e então é evidente que elle não se esqueceu, nem se podia esquecer de tal objecto; uma parte dos rendimentos publicos serão destacados para a Junta do Credito Publico afim de se destinarem ao pagamento das mesmas Classes.

Em quanto á outra indicarão do Digno ao Par, o Sr. Visconde de Fonte Arcada, direi que o Governo tem um Projecto a apresentar sobre a reforma da Alfandega das Sete Cazas, em que se tracta da abolição dos manifestos dos gados, o que de certo ha de favorecer muito a classe agricola: por consequencia os esclarecimentos pedidos pelo Digno Par ainda não vieram, suppondo o Governo que a remessa delles se tornava ociosa, visto que o Projecto a que alludi comprehendia a idéa do Digno Par: entretanto, se S. Exa. insistir, serão não obstinte remettidos.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - A. Orlem do dia para ámanhan é a discussão do Projecto de Resposta ao Discurso do Throno. - Está fechada a Sessão.

Eram quatro horas.

N.º 14. Sessão de 25 de Janeiro. 1843.

(PRESIDIO O SR. DUQUE DR. PALMELLA - E ULTIMAMENTE O SR. CONDE DE VILLA REAL.)

FOI aberta a Sessão pela uma hora e tres quartos: estiveram presentes 36 Dignos Pares - os Srs. Duques de Palmella, e da Terceira, Marquezes de Abrantes, de Fronteira, de Loulé, das Minas, e de Ponte de Lima, Condes do Bomfim, do Farrobo, de Lavradio, de Linhares, de Lumiares, de Paraty, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Semodães, da Taipa, e de Villa Real, Viscondes de Fonte Arcada, da Graciosa, de Laborim, de Oliveira, de Sá da Bandeira, e da Serra do Pilar, Barão do Tojal, Barreto Ferraz, Miranda, Ribafria, Gambôa e Liz, Margiochi, Pessanha, Giraldes, Silva Carvalho, Serpa Machado, Polycarpo José Machado, e Trigueiros. - Tambem esteve presente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Leu-se a Acta da Sessão antecedente, e ficou approvada: na desta foi mandada lançar a seguinte

Declaração.

Declaro que se estivesse presente Contem ma Camara, votiva contra a Proposta do Digno Par Conde de Lavradio, para que se nomeasse uma Commissão, que desse o seu Parecer sobre o Officio do Ministro do Reino, recusando a copia de cortas actas do Conselho d'Estado, que lhe tinham sido pedidas. Peço que esta minha declaração seja lançada na Acta. - Sala das Sessões 25 de Janeiro de 1843. - Visconde da Serra do Pilar, Par do Reino.

O SR. SECRETARIO MACHADO: - O Sr. Visconde de Villarinho de S. Romão não tem podido comparecer ás Sessões por incorri modo de saude.

O SR. SECRETARIO CONDE DE LUMIARES: - Peço licença para remetter á Commissão de Petições uma representação dos Pharmaceuticos do Concelho de Penamacôr. - A Cambra conveiu.

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - Sr. Presidente, na Sessão pesada apresentei um Projecto de Lei com o fim de difficultar a emigração das Ilhas dos Açôres e de Portugal para o Brazil, Projecto que foi mandado á Commissão do Ultramar em 22 de Agosto. A difficuldade de saber se as Commissões actualmente eleitas podem tornar conhecimento de negocios apresentados na Sessão anterior me leva a pedir que a Camara decida esta questão, afim de que a Commissão do Ultramar

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