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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
EXTRACTO DA SESSÃO DE 5 DE MARÇO.
Presidencia do Exm.º Sr. Marquez de Loulé, Vice-Presidente supplementar.
Secretarios – os Srs.
Conde de Mello.
C. da Louzã (D. João)
(Assistia o Sr. Ministro, da Marinha.)
Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 41 dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.
O Sr. Secretario Conde de Mello deu conta do seguinte expediente:
Um officio do Ministerio da Justiça, acompanhando 80 exemplares das contas do mesmo Ministerio, relativas á gerencia do anno economico de 1853 a 1854, e exercicio de 1852 a 1853.
Mandaram-se distribuir.
- da presidencia da Camara dos Srs. Deputados, acompanhando uma proposição de lei, que isenta de direitos de importação os objectos que José Pedro Collares Junior e Irmãos importarem para a reedificação da sua fabrica, incendiada no dia 4 de Novembro de 1854.
Remettida á commissão de fazenda.
O Sr. Presidente — Devo participar á Camara que a deputação encarregada de apresentar á Sancção de Sua Magestade o projecto das Côrtes, que esta Camara ultimamente approvára, para que a Camara municipal da cidade do Porto podesse contrair um emprestimo, foi recebida pelo Mesmo Augusto Senhor com a sua costumada benevolencia.
O Sr. Barão de Porto de Moz - Manda para a Mesa um requerimento dos empregados subalternos desta Camara, em que pedem que ella resolva o negocio relativo á fixação de seus ordenados, em harmonia com o que na ultima sessão esta Camara resolvera, (içando desde logo sem effeito o systema de gratificações, que percebiam em virtude do augmento das sessões. Lembram que já são passados dois mezes desta sessão sem que se tenha resolvido cousa alguma, quando a Camara havia declarado que tractaria deste negocio no principio della; além de que a outra Camara ha já um anno que tomou uma resolução igual á que os requerentes pedem que se adopte.
O Sr. Secretario Conde de Mello — Leu o requerimento.
O Sr. Presidente — Não sei se a Camara quererá que este requerimento vá a uma commissão, ou que fique sobre a mesa?
O Sr. Visconde de Algés — À Mesa, á Mesa.
O Sr. Barão de Porto de Moz — Este negocio é muito simples: e parece-lhe que, attenta a muita confiança que a Mesa merece a esta Camara, o mais acertado, e mesmo o mais breve, sem prejuizo de certo da justiça que deve haver, seria que a Mesa fosse quem tomasse conhecimento do requerimento, que acabava de mandar-lhe, dando depois o seu parecer. E pede que seja isso o que se proponha á votação.
O Sr. Visconde de Algés — Eu creio que este negocio já está até certo ponto resolvido. A Camara já encarregou a Mesa de apresentar um parecer, fixando os ordenados dos empregados do quadro da secretaria desta casa, e na sessão passada se adiantaram muito esses trabalhos, pois chegou a fazer-se um relatorio que foi remettido á commissão de fazenda, e não chegou a resolver-se, porque além de ser um trabalho e complexo, estava a sessão proxima a terminar. Se, por em quanto, nesta sessão ainda se não tractou disso, é por não ter havido occasião, mas que era de esperar que com brevidade a Mesa, de accôrdo com a commissão de fazenda, tracte deste negocio. Os papeis estão na secretaria, e esse requerimento que agora se apresenta, intende o orador que é mais uma memoria, similhante áquellas que se apresentam quando tas autos estão promptos em conclusão para serem resolvidos, do que um novo requerimento.
O Sr. Barão de Porto de Moz — Não ha duvida nenhuma sobre o que o digno Par acaba de dizer, e por conseguinte eu desisto da minha proposta.
O Sr. Presidente — Pois bem. A Mesa fica encarregada de dar andamento a este negocio.
O Sr. Eugenio d'Almeida — Peço a V. Ex.ª a palavra para uma participação muito simples. O nosso collega o digno Par, o Sr. José Isidoro Guedes, encarregou-me de participar a V. Ex.ª e á Camara, que tem faltado a algumas sessões em consequencia do fallecimento de sua mãe.
A Camara resolveu que fosse desanojado o digno Par.
O Sr. Presidente - Passemos á ordem do dia.
Vai ler-se o parecer n.° 203 sobre o projecto de lei n.º 178, da Camara dos Srs. Deputados.
Parecer n.° 203
A commissão de fazenda examinou, como lhe cumpria, o projecto de lei n.º 178, que veio da Camara dos Srs. Deputados, e que tem por objecto o authorisar o Governo a abrir um credito extraordinario até á quantia de 10:000$000 réis para occorrer ás despezas necessarias, a fim de que os productos da indústria nacional concorram na exposição universal da industria, que proximamente ha-de ter logar em Paris.
A commissão, attendendo á conveniencia que deve resultar para o paiz, da concorrencia dos productos da industria nacional na exposição geral, é de parecer que seja approvado o dito projecto de lei, para que, apresentado com as solemnidades do estylo ao Chefe do Estado, possa receber a sua sancção.
Sala da commissão, 28 de Fevereiro de 1855. = José da Silva Carvalho, Presidente = Visconde de Castro = José Maria Grande = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Thomás de Aquino de Carvalho = Visconde de Algés = Francisco Simões Margiochi.
Projecto de lei n.° 178.
Artigo 1.º É o Governo authorisado a abrir um credito extraordinario até á quantia de dez contos de réis, destinados para occorrer a todas as despezas necessarias, a fim de que os productos da industria nacional concorram na exposição universal da industria, que ha-de ter logar em Paris.
Art. 2.° O Governo dará conta ás Côrtes do uso que fizer desta authorisação.
Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 16 de Fevereiro de 1855. = Júlio Gomes da Silva Sanches, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Carlos Cyrillo Machado, Deputado Secretario.
Não havendo quem pedisse a palavra, foi o parecer posto a votos, e approvado.
Entrando-se na especialidade, foi o projecto approvado sem discussão.
Tambem se approvou a mesma redacção.
O Sr. Presidente — Agora tem a palavra o Sr. Ministro da Marinha e Ultramar.
O Sr. Ministro da Marinha e Ultramar — Quando se fechou a ultima sessão desta Camara, estava elle Sr. Ministro respondendo a algumas observações que o digno Par o Sr. Conde de Thomar havia feito em continuação das interpellações que lhe tinha dirigido; e n'uma dessas observações ou interpellações, notou o orador que o digno Par dissesse que o Governo provisorio tinha sido nomeado, sem que fosse ouvido o Conselho do Governo—
O Sr. Conde de Thomar — Disse que me parecia ter-se faltado á exactidão — quando se declarava na Portaria do Governador, que o Conselho tinha sido unanime quanto á creação do Governo provisorio.
O Sr. Ministro da Marinha — Então ouvio mal. Mas crê que será bastante a declaração que existe na secretaria, pois é assim que lho chamam os proprios interessados, e que é uma só e não quatro, como pareceu inculcar o digno Par.
O Sr. Ministro disse que o Governo nem do facto havia reconhecido aquelle Governo provisorio, porque nem uma unica ordem ou officio, lhe tinha dirigido, e muito menos o podia reconhecer de direito, porque para isto era preciso que lhe tivesse approvado alguma das suas medidas, o que nunca teve logar.
Quanto ao retrato observou o Sr. Ministro que o Sr. Conde dissera que esse retrato havia sido pago com o dinheiro do Estado, e que por conseguinte esse dinheiro devia ser reposto no que elle Sr. Ministro está de accôrdo, se assim foi, e diz, se assim foi, porque o Governo até hoje de tal não teve conhecimento, se não pelo que consta do Boletim.
Tractando da questão da passagem dos escravos que é a que o Sr. Ministro considera mais importante, disse S. Ex.ª que o tractado que regula a exportação dos escravos não diz que um navio não possa levar mais do dez escravos, indo á testa de cada dez um colono; e ao menos ninguem dirá que tal se deduz daquelle tractado, o qual o que diz é — que cada colono não possa levar mais de dez escravos; assim o intende tambem o Conselho ultramarino, Tribunal composto de cavalheiros que muito desejam ver extincto o trafico da escravatura, e que de certo não querem que Portugal se comprometa de modo algum com a nação ingleza. A opinião por ora do Governo é que em cada navio podem ir mais de dez escravos, mas não mais de dez escravos por cada colono, porque o fim do Tractado é que os escravos não sejam exportados para o Brasil, para a Cuba, o para outras partos illicitamente a pretexto de que vão para as nossas possessões ultramarinas.
Pareceu ao Sr. Ministro, que o digno Par dissera que se haviam passado escravos para as ilhas de S. Thomé e Principe, a titulo de passageiros; e em resposta a essa arguição passou a ler o officio do commandante de um dos navios, em que se dizia que essa passagem tinha tido logar, assim como leu um outro officio do Governador da ilha de S. Thomé, o qual diz que effectivamente um navio levara maior numero de escravos, do que dez, indo comtudo um colono para cada dez escravos, e isto porque se reconhecera, que a Lei permittia esta exportação, e accrescentou, que não julgasse comtudo o digno Par, que o Governo ficou aqui; o Governo remetteu todos os papeis, relativos a este negocio, ao Conselho ultramarino, este consultou, e na conformidade da sua consulta o Governo expedio ao Governador geral de Angola, uma Portaria, que passou a ler, em que se censurava o procedimento do Governo provisorio de Angola.
O nobre Ministro leu ainda alguns outros documentos, e continuou dizendo que por isto conheceria o digno Par que não foi sem motivo que o Governo disse — que sobre este ponto estava ao facto de tudo quanto tinha havido. (Entra o Sr. Ministro do Reino.) Disse mais — que houve um empregado de Angola que protestou contra o modo pelo qual se havia feito o embarque dos escravos, protesto que a Junta de Fazenda lhe não admittira, em consequencia do que foi-lho dirigida uma Portaria, estranhando á Junta o seu acto (leu).
(O Sr. Conde de Thomar — Apoiado. Muito bem).
Quando ha pouco se fallou no retrato, disse o Sr. Ministro, que ficára sabendo, por um impresso, que por ahi correu, que era costume em Angola dar-se 100$000 réis ao. Governador, quando chegava do novo; e que só os dous ultimos Governadores tinham deixado de os receber; sobre o que se ha-de consultar o Conselho ultramarino, a fim de se saber se a provisão que de termina aquelle pagamento deve ou não hoje considerar-se em vigor.
Tractando-se dos castigos inflingidos aos escravos, disse S. Ex.ª, que o digno Par impugnou a medida que ultimamente a este respeito se havia tomado; mas elle (Sr. Ministro) intende que já foi muito bom tirarem-se esses castigos das mãos dos senhores; mas que se o digno Par tem em pensamento uma medida que melhor substitua o que havia a este respeito, lhe pede que a apresente, porque o Governo remette-la-ha ao Conselho ultramarino, o qual depois melhor regulará este importante objecto: diga pois o digno Par se quer que os castigos estejam dependentes do capricho barbaro dos senhores, ou sejam dados pela authoridade publica?...
(O Sr. Conde de Thomar - Quando vir a medida do Governo, então direi qual é a minha opinião).
Nesse caso o Sr. Ministro intende que deve defender a medida, porque o que está ô muito melhor do que o que existia. Das medidas que foram adoptadas pelo ex-Governador de Angola, e pelo governo provisorio ultimamente, depois de ouvidas as authoridades competentes, o Governo já de ante-mão vê as que podem, ou não podem ser approvadas, e uma das que julga acceitaveis é essa do castigo aos escravos que intende devem ser em publico.
O Sr. Ministro ponderou que o digno Par fez uma oração brilhante e pathetica, expondo a fórma porque eram castigados os negros, figurando o sangue a correr-lhes em jorros, e elles atados a uma escada onde soffriam um cruel supplicio! Mas que, infelizmente, este castigo cruel tambem ainda hoje é applicado aos brancos! Muito bem sabe elle (Sr. Ministro) que perante a rasão e a justiça o homem negro é igual ao homem branco, que entre elles nenhuma diferença deve haver; mas que a haver alguma deve ser para com os brancos; e no entanto ainda hoje os brancos recebem o castigo das varadas! E isto porque o maior numero, que não está na