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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 19 DE FEVEREIRO DE 1861

- PRESIDÊNCIA DO EX>° SU. VISCONDE DE LABORIM VICE-PRESIDENTE

u , - j. (Conde de Mello

Secretários: os d.gnos pares jbrito do eio

CAssistiam os srs. presidente do conselho, ministro da guerra, e ministro da fazenda.)

Pelas tres horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 25 dgnos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

Como não houvesse correspondência a mencionar, O sr. Conde de Thomar: — Mandou para a mesa um parecer da commissão de instrucção publica (leu). A imprimir.

O sr. Conde de Samoãães : — Eu tenho de annunciar uma interpellação ao nobre ministro dos negócios da guerra sobre a execução da carta de lei de 14 de agosto de 1860, pela qual se concederam certas vantagens pecuniárias e de postos aos officiaes que serviram durante o cerco do Porto em batalhões nacionaes creados n'aquella cidade. Esta carta de lei começou já a ter execução, porquanto muitos dos individuos comprehendidos nas circumstancias ali mencionadas já foram reformados; não sei porém que venha no orçamento verba alguma para pagar os seus soldos; ehavendo de mais a mais uma lei que só auctorisa a reforma dentro de certos cabimentos, d'ahi deve resultar, ou engano completo para aquelles officiaes, ou então arbitrio do governo. Desejo interpellar o nobre ministro a este respeito;, mas como s. ex.a não está presente, mandarei por escripto para a mesa a nota de interpellação a fim de ser communicada ao sr. ministro, e logo que s. ex.a compareça verificarei a minha interpellação.

O-sr. Presidente: — Queira mandar para a mesa, e depois consultarei a camará se annue a que se envie ao sr. ministro a nota de interpellação de v. ex.a

O sr. Conde de Samodães: — Leu e mandou para a mesa a seguinte nota de interpellação:

«Desejo interpellar s. ex.a o sr. ministro dos negócios da guerra acerca da execução que tem dado e pretende dar á carta''de lei de 14 de agosto de 1860, sobre os officiaes dos batalhões nacionaes que serviram no cerco do Porto. = Conde de Samodães».

Consultada a camará, resolveu que a nota de interpellação fosse enviada ao sr. ministro.

1 ORDEM DO DIA

discussão do parecer (n.° 108)

A commissão de instrucção publica examinou o projecto de lei n.°131, vindo da camará dos srs. deputados, e é de parecer que seja plenamente approvado.

Não existe hoje motivo plausível para que continue o estado excepcional em que ainda se acham os filhos das escolas medico-cirurgicas, em vista da reforma de 1836. Têem as ditas escolas passado por importantes reformas, e muitas habilitações são hoje exigidas para os alumnos que as frequentam. Seria alem d'isto contrario a todas as regras de boa administração scientifica que as escolas medico-cirurgicas não podessem habilitar os seus alumnos- para o seu próprio professorado em toda a extensão do ensino que a lei lhes confere. Não ha effectivamente motivo para

que os cirurgiões sejam excluidos de ensinar a medicina que aprenderam e que segundo a lei podem livremente exercitar.

.* A commissão de instrucção publica julga também ser muito aceitável e justa a disposição do artigo 2.° do projecto, emquanto estatue igualdade de condições para exercicio da medicina entre facultativos formados no paiz, e não em universidades estrangeiras. Entende a commissão que o exame a que agora são obrigados é insufficiente, e que deve ser substituido por uma prova incontestável de sua capacidade.

Por taes fundamentos, e outros que não poderiam escapar á penetração da camará, é a commissão de parecer que o mencionado projecto n.° 131 seja approvado para ser sujeito á sancção real.

Sala da commissão, em 8 de fevereiro de 186\.=Conde de Thomar = Marquez de Vallada = Joaquim Antonio de Aguiar = Conde da Ponte =Visconde de Algés.

PROJECTO DE LEI N.° 131

Artigo 1.° Os cirurgiões formados nas escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto e os bacharéis em medicina pela universidade de Coimbra, poderão concorrer a todas as cadeiras que constituem o curso completo d'aquellas escolas.

§ único. Em igualdade de circumstancias, depois do concurso, serão preferidos os bacharéis em medicina para as cadeiras medicas, e os cirurgiões para as cadeiras cirúrgicas.

Art. 2.° A nenhum facultativo formado em universidade ou escola superior estrangeira será permittido o exercicio da medicina em Portugal, sem haver previamente passado todos os exames das disciplinas que constituem o curso da escola em que se quizer habilitar, e provado todos os preparatórios que são exigidos para a sua matricula.

§ único. A estes facultativos é dispensado unicamente o tempo de frequência nas escolas.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das cortes, em 4 de fevereiro de 1861.= Cwsfo-dioRebello de Carvallo, deputado presidente = José de Mello Gouveia, deputado secretario=Car(os Cyrillo Machado, deputado secretario.

Approvado sem discussão na generalidade.

Passou-se á especialidade.

Artigo 1.° e seu §.

O sr. Conde de Samoãães:—Não sou o mais competente para tratar d'este assumpto; desejo porém ouvir algumas explicações da illustre commissão acerca de uma duvida que se me offerece na redacção d'este artigo. Parece justa a sua doutrina, por isso que não ha hoje rasão para fazer distincções entre os que estudam medicina na universidade e os que a estudam nos escolas medico-cirurgicas. Os estudos são análogos, pelo menos em grande parte, e por consequência não ha motivo para essas distincções que n'outro tempo existiam. A duvida porém que se me apresenta é sobre a redacção, como disse. Parecia-me que em logar de bacharéis em medicina, a que se refere o artigo, se devia talvez dizer—bacharéis formados. E com effeito é certo que o bacharel em medicina não tem o curso completo da faculdade, e, como a camará e v. ex.a sabem perfeitamente, não estão habilitados a exercer a clinica, e por conseguinte ainda menos o magistério. É o mesmo que se dá' com os bacharéis em direito em relação aos bacharéis formados: aquelles não podem exercer os cargos de letras, o que é só dado a estes últimos. Portanto parece-me que podemos applicar o mesmo para esta especialidade, devendo tão somente ser admittidos a concurso os bacharéis em medicina que tenham o curso completo e sejam formados, pois é sabido que no quinto anno d'aquella faculdade se ensinam varias disciplinas indispensáveis para o exercicio da me-

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dicina, taes como: medicina legal, hygiene publica, arte obstétrica, uma aula mais de clinica, etc., etc.

Aguardo as explicações da commissão, e se porventura ellas me não satisfizerem, mandarei para a mesa um additamento para que á palavra bacharéis se ajunte o adjectivo formados.

Agora direi mais que, visto querer-se por este artigo ampliar o concurso para os indivíduos que pertendam exercer o magistério, me parece também que nelle se devia inserir alguma providencia em relação aos doutores em medicina pelas universidades estrangeiras, e que actualmente ou de futuro forem habilitados para exercer a clinica, seja em virtude de leis anteriores, seja em virtude d'esta lei. Effectivamente não ha rasão para serem excluídos do concurso, pois se por yentura não derem provas correspondentes, lá está o jury que os excluirá: não sei se este projecto teve a iniciativa do governo; parece-me que não, e que foi da parte de um illustre membro da outra camará que ella partiu. ,

Por consequência eis uma rasão mais para haver duvida na approvação desta medida. Ê sabido que no governo constitucional a iniciativa mais profícua é a que parte do governo, que tem na mão as rédeas da administração e sabe melhor o que é preciso propor; o que não acontece com os projectos que apparecem a retalho sem a iniciativa do governo, e que muitas vezes estão em contraposição com certas idéas de administração, cujo pensamento só pôde existir em toda a sua plenitude pelo governo. ¦ . Por isso affigura-se-me que este projecto com quanto na sua base seja justo, é deficiente, pois é hoje sabido que o estudo da medicina precisa de uma grande reforma: a universidade tem-na reclamado, e as mesmas escolas não a rejeitam ; e se attendermos á grande falta que no paiz ha de facultativos, n'ella veremos um testemunho mais do quanto se torna precisa tal reforma. E de que provém tamanha falta? Não é ella devida ás difficuldades que se encontram no actual systema de estudos médicos? Não é em consequência d'esses difficeis e complicados estudos que escaceia o numero de indivíduos que se habilitam a seguir a carreira da medicina? E essa falta já tão sensível no presente, tornar-se-ha ainda muito mais no futuro, se não se proceder a essa reforma. Na maior parte das povoações de pequena importância não ha facultativos: percorrem se muitas vezes léguas na provincia sem se encontrar um só.

O que isto prova é a necessidade de crear uma classe secundaria de facultativos, que se habilitem com um curso mais fácil para poderem ir servir nas povoações pequenas que não podem dar a um facultativo grandes interesses; pois na verdade os facultativos, pela sua raridade, têem-se tornado mais exigentes. ,

Ora, se esta necessidade é tão reconhecida por toda a gente, qual ha de ser a rasão porque se não ha de apresentar uma reforma mais completa acerca dos estudos médicos d'este paiz, hoje, que estes estudos têem feito tanto progresso, hoje que se têem descoberto tantos meios de curar por differentes systemas, como por exemplo, o systema homceopatico, o hydropathico e outros que têem produzido mais ou menos effeitos, mais ou menos vantagens? N'esta capital existem- muitos consultórios que exercem a medicina, não só pelo systema official, mas pelos diversos systemas, e têem uma clinica mais ou menos-extensa. A epocha está bastante adiantada na medicina, e portanto não poderemos continuar com o systema de ensino que ha alguns annos seria muito conveniente, mas que hoje não o é; bem como é indispensável metter nos quadros das disciplinas medicas, esses novos systemas que têem um grande futuro e não menos grande alcance; mas que é necessário elles sejam estudados e investigados convenientemente. Isto mesmo sé está fazendo em França, Allemanha, Itália, etc, e é indispensável que sigamos essas nações, pois ellas, mais adiantadas do que nós na civilisação, devem servir-nos de guia.

Ha bem pouco tempo que um membro d'esta casa, o nobre duque de Saldanha, publicou um trabalho ímportan-tissimo acerca do systema homeopathico, o que prova, que elle não só tem' chamado a attenção dos nossos médicos, mas também das altas capacidades, que vêem n'este systema um futuro, e procuram por meio dos seus estudos e trabalhos dar á humanidade aquelle alivio de que carece, para o qual a medicina official se tem mostrado impotente.

Sr. presidente, estas reflexões tendem unicamente a demonstrar que este projecto, tal como está, não é de grande utilidade, nem de alcance algum: acho-o todavia justo, e tanto o acho que voto por elle, desejando ao mesmo tempo amplia-lo; comtudo, o que eu desejava essencialmente era chamar a attenção do governo, que está de certo já chamada sobre este objecto, a fim de que elle, quanto antes, apresente um trabalho completo acerca dos estudos médicos d'este paiz; porque nós temos tres escolas que, effectivamente, por este mesmo projecto se mostra serem a mesma cousa; portanto, um paiz como o nosso, que tern tão pequena área e tão diminuta população, não precisa de tão grande luxo de instrucção publica n'este ramo, mas só necessita que ella seja organisada convenientemente, de modo que dê facultativos habilitados cm todos os ramos da vastíssima e difficil arte de curar; e estes em tal numero, como o paiz carece; pois de certo ninguém dirá que estas tres escolas, apesar do grande aperfeiçoamento em que estão, habilitam um numero de alumnos sufficiente para preencher a falta que ha. Eu não fallo deLisboa, sr. presidente, porque esta capital tem numero bastante de facultativos, fallo das provindas; quem vive ali é que vê a fal ta que existe de facultativos, e reconhece, como eu, a necessidade urgente de quanto antes estabelecer uma classe secundaria, como a que ha n'outros paizes, e que possam fazer melhor serviço do-que fazem esses barbeiros e san-

gradores das pequenas aldeias, que são a maior desgraça n'um paiz, pois quando são chamados á cabeceira de um enfermo, é quasi sempre para lhe darem a morte.

Sr. presidente, não apresento nada a este respeito, porque me não acho habilitado para o fazer; o governo é que está n'esse caso: tem agora perto de si o conselho de instrucção publica, por isso pôde aproveitar-se dos seus estudos e trabalhos para fazer bom serviço ao paiz que bem o precisa.

Limito-me psis a fazer estas reflexões, em relação aos bacharéis serem ou não formados, e acerca dos doutores na faculdade de medicina dos paizes estrangeiros, que se acham habilitados com o competente curso, poderem concorrer ás cadeiras destas escolas.

O sr. J. A. ãe Aguiar: — Não se julga suficientemente habilitado para tratar a questão, tanto por não ser da sua profissão, como por ser matéria muito importante; e é necessário saber-se a fundo o que ainda se não sabe, como muito bem disse o digno par — qual dos systemas que existem é o melhor; e ainda mesmo que se soubesse-quasi seria inútil esta resolução, porque successivamente viriam outros que inutilisariam os estudos feitos. Porém, não é este o objecto de que se trata.

O digno par reconhece que ha justiça no projecto em discussão; e, effectivamente, o orador entende que a idéa capital do projecto cão se pôde combater. Ora, se ha justiça no projecto, porque rasão ha de retardar-se a sua resolução? Ha de esperar-se a fim de satisfazer os desejos do digno par,, para quando se faça a reforma dos estudos médicos? E quando se poderá fazer? O digno par mesmo reconhece queé objecto muito difficil; e portanto s. ex.a não deixará de convir em que deve separar-se esta questão da questão geral do ensino.

Observou que, do discurso do digno par, o que pertence ao projecto que está em discussão, são as duas reflexões que s. ex.a fez ; a primeira — sobre á falta de declaração de que os concorrentes habilitados pela universidade de Coimbra fossem bacharéis formados; declaração em que o orador convém; e, apesar de não ter combinado com os seus collegas'da commissão de instrucção publica, está persuadido que elles também concordam n'ella; pois não podia ser outra a mente da camará dos srs. deputados quando se approvou este projecto.

A outra reflexão considera-a mais importante, e não julga que as duas hypotheses sejam as mesmas; isto é que estejam em idênticas circumstancias os médicos formados em universidades estrangeiras, só porque fazem os exames das disciplinas n'este paiz. Não os julga no mesmo caso d'aquel-les que cursaram os estudos na nossa universidade ou nas escolas reconhecidas; que entretanto pôde ser que venha a convencer-se do contrario, mas como lhe parece que isto é uma idéa nova que não foi tratada na outra camará, e que nem occorreu á commissão, julga conveniente que, sem pre-juizo da votação do projecto, vá á commissão o additamento do digno par, a fim de ser considerado pelos seus membros, e depois pela camará, com mais conhecimento do assumpto. - O sr. Presidente:—Queira o digno par o sr. conde de Samodães mandar para a mesa os seus additamentos.

O sr. Conde ãe Samodães:—Mando então pára a mesa os dois additamentos:

O primeiro, é que depois da palavra bacharéis se ajunte a palavra formados, este já foi adoptado pela commissão e não havia rasãó para o contrario, porque apesar de geralmente se entender quando se falia em bacharéis, que são formados, todavia ha muitos que o não são, e aqui na escola polytechnica tem havido duvidas sobre se se devem admittir ao concurso das cadeiras, quer de philosophia quer de mathematica, porque não ha lei expressa aonde se diga isto; e aqui entendo que é conveniente que se declare que devem ser os bacharéis formados, que são os que têem um curso completo, mesmo para evitar duvidas.

Agora o outro additamento é o seguinte (leu).

Este additamento é aquelle que o illustre relator da commissão pede que seja remettido á mesma, sem prejuizo do andamento d'este projecto. Eu não tenho duvida nenhuma em que isto se faça, porque não sou interessado no projecto, visto que não sou formado em medicina; o que desejo porém é que se amplie este projecto, o mais que seja possivel a todos os que estão em circumstancias idênticas.

Eu entendo, sr. presidente, que o individuo que tem um curso completo de uma universidade estrangeira, que passa por todos os exames preparatórios, epor todos os das cadeiras das escolas, está muito habilitado para concorrer ás cadeiras d'essas mesmas escolas, e se porventura as provas que der não forem sufficientes, lá está o jury para o pôr fora, do combate, e assim não resulta inconveniente algum.

E certo, sr. presidente, que hoje no nosso paiz ha muitos facultativos habilitados em universidades estrangeiras, e que exercem a clinica com grande vantagem do publico, e fazendo estes indivíduos os cursos em universidades acreditadas, e tendo alem d'isso a obrigação de passar por exames rigorosos cpmo está determinado no artigo 2.°, não vejo inconveniente algum em que se approve o meu additamento.

Agora emquanto á outra questão, já se vê que a tratei incidentemente, o que quiz foi fazer sentir que era indispensável tratar-se d'ella, porque ha falta de facultativos no paiz, e as faltas que todos os annos succedem por mortalidade, não são preenchidas por um numero igual de novos facultativos, por que as nossas escolas são verdadeiras universidades, e não habilitam, pelos muitos estudos, o numero necessário, e portanto é indispensável prover de remédio a este mal.

Agora emquanto aos systemas médicos, sei que não é possivel estabelecer qual é o verdadeiro; a verdade ha de estar sempre incógnita, e pelo menos controvertida até á

consummação dos séculos, a1 verdade existe no seio de Deus, e aos homens cumpre só prescruta-la: o que porém entendo é que todos os systemas devem ser ensinados nas escolas, e ensaiados nos hospitaes: o estado actual de sciencia exige e reclama, que se ensinem alem do systema official também os systemas hydropathico e o homeopathico, a fim de se habilitarem os facultativos com tudo que estes systemas têem de bom. Deixe-se-lhes liberdade ampla na clinica, mas saibam profundamente e sem paixão o que todos os systemas encerram. É isto o que eu quiz fazer sentir, porque estes dois systemas de que acabei de fallar têem feito progressos de tal ordem, que não é possivel exclui-los do quadro do ensino medico. No Porto mais de metade da população cura-se hoje pelo systema homeopathico, e o que é certo é que nas escolas por um espirito de rotina, e pertinácia, que mal se comprehende, despreza-so o mesmo systema; dizendo isto exceptuo a universidade, cuja illustra-ção sempre se tem manifestado, dando a este, e a outros toda a importância devida: d'isto resultam graves inconvenientes para a saúde publica; portanto em qualquer reforma que se faça é preciso attender aos factos importantes, que todos os dias temos debaixo dos olhos.

ADDITAMENTOS

1. ° Depois da palavra = bacharéis = addite-£e = forma-dos=.

2. ° Os doutores em medicina pelas faculdades estrangeiras, habilitados para exercer a clinica no paiz, são igualmente hábeis para concorrer ás cadeiras medicas e cirúrgicas das escolas medico cirúrgicas de Lisboa e Porto = Conãe ãe Samodães.

O sr. Presiãente:—Uma vez que o sr. relator da commissão convém, em nome dos seus collegas da commissão, em que o aditamento do sr. conde de Samodães vá á commissão, sem prejudicar o andamento do projecto, vou consultar a camará sobre se approva que isto se faça.

O sr. Marquez ãe Niza:—Peço a palavra.

O sr. Presiãente: — Tem o digno par a palavra.

O sr. Marquez de Niza:—Não tencionava fallar sobre o projecto que está agora em discussão, porque se reservava para quando aqui se discutissem as Íeis do saúde publica, nas quaes parece-lhe que havia idéa de inserir o que vae agora propor, visto que já se admittiu um additamento, e que o projecto volta á outra camará, ao menos pelo acrescentamento dc uma palavra, que já se admittiu.

Acha justíssimo que se exija aos facultativos formados nas universidades estrangeiras que passem pelos exames de todas as disciplinas que compõem o curso da escola cm que se quizerem habilitar, como diz o projecto, para poderem exercer a clinica no paiz; porque se ha muitas universidades e escolas superiores de instrucção cuja importância, merecimento e rectidão ninguém contesta, ha também outras onde se podem obter graus e diplomas sem frequência e sem capacidade alguma. Assim, tratando-se principalmente da saúde publica, é muito bem entendido que se exija essa condição. Entretanto parece-lhe quo ha rigor demasiado em não fazer uma excepção para os médicos ou cirurgiões formados em universidades estrangeiras (fossem ou não estrangeiros), que provassem ter já exercido o professorado; pois estes, em tal caso, devem estar acima de toda a suspeita. Crê que não havia inconveniente algum em exceptuar das provas os que tivessem exercido o professorado nas universidades estrangeiras ; e que pelo contrario seria muito vantajoso, porque em occasiões afflictivas, como ainda ha menos de meia dúzia de annos nos aconteceu por duas vezes com epidemias bastante, mortíferas, seria conveniente chamar alguns d'esses grandes professores, como 03 que vieram aqui nos tempos a que acabava de referir-se, um mandado pelo governo inglez, e outro pelo governo francez, para estudarem e fazerem as suas observações nos hospitaes, etc. E como é melhor aproveitar agora esta occasião do que deixar para esse momento o estabelecer uma providencia que deve estar já adoptada de antemão e por todos conhecida, entende que é muito a propósito consignar desde já n'esta lei uma disposição n'este sentido.

Dizendo alguma cousa acerca das diversidades de systemas, declarou que não se assustava com isso, porque não viu sanecionado pelos círpos scientificos senão um único systema. Com effeito, a sciencia não pôde ser senão uma, assim como não ha senão uma verdade: o que varia são as applicações, os systemas, que muitas vezes também são filhos da especulação, do charlatanismo, do desejo de tornar importante e saliente um certo nome, etc. (apoiados). O que é facto é que ainda se não viu um homem de talento transcendente dar grande attenção a essas innovações com que outros especulam. Com isto não quer dizer que se não tenha visto alguns homens instruídos preferirem uns a outros systemas de applicação, e mesmo adoptar década um alguma cousa; mas esses são os primeiros a reconhecer que a sciencia é uma só. A homeopathia, a hydropathia, etc. o que são senão o resultado dos mesmos principios que aprendem os médicos que seguem a allopatia; a applicação differente, mas baseada nos mesmos principios. Não acho por isso que seja necessário estabelecer o ensino dos differentes systemas, pois os estudos necessários para ocomeço da educação medica são os mesmos para uns e outros; ba-seiam-se todos no estudo da chimica, da physica, da philosophia, da mechanica, da therapeutica; tudo mais é o resultado das sympathias ou do desejo de se tornarem salientes por uma certa excentricidade. Portanto, respeitando as opiniões do digno par, não acho que seja necessário estabelecer o ensino dos vários systemas, aliás seria necessário faze-lo não só em relação á homeopathia e á allopatia, mas mesmo em relação ao systema raspalhista, e a mil ,outros que têem apparecido (apoiados).

Eeserva-se para tratar mais de espaço esse- assumpto quando se discutir a reforma de leis de saúde; e por agora

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contenta-se em ter dito de passagm estas poucas palavras, pedindo licença para mandar para a mesa o seguinte additamento.

Proponho que se additem ao artigo 2.° as seguintes pala-vras=sendo dispensados d'estas provas os facultativos que tiverem exercido o professorado nas escolas estrangeiras. =

O sr. Presidente: — O additamento do digno par tem logar para quando tratarmos do artigo 2.°

O sr. Marquez de Niza: — Suppoz que era esse o artigo que se discutia porque, tendo estado fora da sala, por alguns minutos, quando entrou de novo, ouviu o final do discurso do digno par o sr. conde de Samodães e entendeu que s. ex.a fallava da matéria do artigo 2.°, e que era esse justamente O que estava em' discussão.

O sr. Presidente:—Pica sobre a mesa para ser consultada a camará em occasião opportuna.

O sr. Conde de Thomar: — Parece-lhe que não ha questão alguma sobre a matéria do projecto; que todos concordam em que o principio é justo e deve ser approvado. A emenda que apresentou o seu nobre amigo o sr. conde de Samodães para que se diga bacharéis formados foi admit-. tida pela commissão para que houvesse toda a claresa, se bem podesse parecer desnecessária: mas emquanto ao additamento que o mesmo digno par apresentou é objecto que precisa de estudar; e um dos seus membros já declarou que achava mais conveniente que attenta a importância da matéria, se permittisse que a commissão a examinasse dando conta depois á camará; e por isso se todos estiverem de accordo, pôde votar-se salva esta espécie nova que será depois attendida como se julgar que convém (apoiados).

Quanto ao novo additamento apresentado pelo digno par o sr. marquez do Niza, esse parece-lhe conter matéria ainda mais importante (apoiados). Affigura-se-lhe mesmo que terá de o combater, porque ou não o comprehendeu bem, ou não pôde ser admittido em vista dos principios consignados no artigo 2.° os quaes não podem consentir excepção alguma (apoiados). Comtudo, como o projecto sempre terá que voltar á commissão, parecia-lhe que em deferência para com o digno par, e em attenção mesmo á importância e gravidade da matéria do seu additamento, deveria ir também á commissão para igualmente dar um parecer sobre elle (npoia-âos).

Não lhe parece pois necessário que haja agora mais discussão alguma sobre similhante objecto; e comquanto goste de ver mostrar conhecimentos em matéria tão diffi-cil, como é a especialidade em que têem entrado os dignos pares, os srs. conde de Samodães e marquez de Niza, entra em duvida que seja este o logar competente e a occasião própria de faze-lo (apoiados). Discutir agora aqui qual é o systema preferível de medicina parece-lhe ser extemporâneo. Pede portanto que se passe á votação do projecto nos termos que expoz, isto é, salva a matéria dos addita-mentos que a commissão houver de considerar.

O sr. Marquez de Niza: — Repete que quando apresentou o seu additamento cuidava que se estava discutindo o artigo 2." Agora depois de ouvir o digno par o sr. conde de Thomar dar a sua opinião sobre o que convém, e lhe parece mais acertado fazer-se com relação aos additamen-tos, conforma-se com o que s. ex.a diz, isto é, que se vote o projecto, salva a doutrina dos additamentos, que deverão ser submettidos á commissão para os tomar na consideração que lhe parecer que merecem; sendo depois esse negocio objecto de outra discussão á vista do parecer que se apresentar.

Pediu pois que se consultasse a camará sobre se o seu additamento deve ir á commissão juntamente com o do sr. conde de Samodães.

O sr. Visconde de Algés (sobre a ordem):—Na qualidade de membro da commissão, concorda com os seus collegas que por parte da mesma, já tomaram a palavra, e como o projecto tem de voltar á commissão, levantou-se para pedir que se discrimine bem o que é additamento e o que ó emenda, pois o projecto póde-se votar já, salvos os additamentos, mas as propostas podem ficar prejudicadas com a votação do projecto; e por isso julga que deve por-se á votação o projecto, na parte em que não possa ser prejudicado pelas emendas.

A proposta do digno par,conde de Samodães é um additamento propriamente; mas a do digno par marquez de Niza, ó mais uma emenda do que um additamento, e portanto parece-lhe que seria mais conveniente não haver nenhuma decisão a respeito d'elle, emquanto não fosse a sua matéria considerada pela commissão e decidida posteriormente pela camará (apoiados).

O sr. Presidente: — O artigo 1.° tem continuado a estalem discussão, e salvas as emendas e additamentos que a elle se tinham oíferecido, vou pô-lo á votação se ninguém mais pede a palavra. * Foi approvado.

O sr. Presidente: — Creio que também já pôde votar-se sobre o acrescentamento da palavra formados (apoiados), que é a primeira alteração que se propoz, e na qual a commissão logo sc mostrou concorde, e a camará igualmente.

Foi approvada.

Artigo 2.°—Também approvado, salvas as outras indicações e sem prejuizo do que houver de se resolver sobre a proposta do sr. marquez de Niza.

• Artigo 3.°—Approvado salva a redacção ultima que se der ao projecto.

O sr. Conde de Samodães: — Eu desejava agora dar uma explicação antes de se passar a outro objecto.

O sr. Presidente: — Tem o digno par a palavra para uma explicação.

O sr. Conde de Samodães:—Sr. presidente, eu depois do que disse o digno par o sr. conde de Thomar, já quasi nada tenho que dizer: eu não vim aqui discutir qual dos syste-

mas médicos era mais conveniente; para isso julgo-me incompetentíssimo: o que disse é que todos elles deviam ser estudados, meditados e observados na escolas e nas enfermarias ; porquanto, muitas vezes, uma cousa que não se julga de utilidade ao principio, depois mostra-se que é muito conveniente: nós temos exemplos d'isto em muitas descobertas, como a das machinas de vapor de alta e baixa pressão, a telegraphia eléctrica, o anestesismo e outras, que foram consideradas como charlatanismo, e depois se reconheceu a sua verdade e conveniência, e têem mudado a face do mundo. Por consequência, nas escolas, e principalmente nas universidades, não se deve despresar systema algum para, depois de estudado, ver o que ha n'elle aproveitável.

De certo, sr. presidente, que os estudos médicos, na parte que diz respeito ao corpo humano, isto é, á anatomia e physiologia, são os mesmos em todos os systemas; mas, em quanto á matéria medica e á therapeutica, são diversos conforme se segue um ou outro systema, e portanto subsiste a minha observação para pedir ao governo que, qualquer que seja o systema que adopte, haja de admittir no quadro das sciencias medicas os methodos de curar, que os factos têem provado que lhes não cabe o epíteto de charlatanismo, mas sim pertencem já ao corpo doutrinal da sciencia. É isto que eu queria dizer.

O sr. Presidente:—Passamos ao paréfcer n.° 111,'e vae ler-se.

Leu-se, e entrou em discussão o seguinte

PARECER TS.° 111

A commissão de instrucção publica, conformando-se com as ponderosas rasões em que se funda o projecto de lei n.° 128, vindo da camará dos srs. deputados, para haver de se crear na faculdade de theologia da universidade de Coimbra a mui importante cadeira de theologia pastoral, é de parecer que se adopte o referido projecto de lei, e seja sub-meftido á saneção real.

Sala da commissão, em 15 de fevereiro de 1861. —Manuel, cardeal patriarcha={?cmc?fi de Tliomar—Joaquim Antonio de Aguiar=Visconde de Algés=Marquez de Vallada.

PROJECTO DE LEI N.° 128

Artigo 1.° E creada na faculdade de theologia da universidade de Coimbra uma cadeira para o ensino da theologia pastoral e eloquência sagrada.

Art. 2.° Pica revogada a legislação em contrario.

Palacio das cortes, em 25 de janeiro de 1861. =Custo-dio líebello de Carvalho, deputado presidente = José de Mello Gouveia, deputado secretario=Carlos Cyrillo Machado, deputado secretario.

O sr. Conde de Samodães:—Sr. presidente, este projecto e o que se segue são dois projectos quasi idênticos, ao menos na sua essência, porque são para a creação de uma cadeira na universidade de Coimbra para o ensino de theologia pastoral e eloquência sagrada, e das cadeiras de geometria descriptiva, e de physica dos fluidos imponderáveis.,..

O sr. Presidente:—Mas o que está em discussão é o parecer n.° 111.

O Orador:—Eu refiro-me a ambos para não tomar o tempo á camará com duas discussões. O que é certo é que temos aqui dois projectos para crear cadeiras novas na universidade, e eu, que sou difficil em votar augmentos de despezas, não estou por ora disposto a dar o meu voto n'este objecto sem me convencer da necessidade d'estas cadeiras.

Sr. presidente, nós estamos no costume, que me parece muito inconveniente para a boa administração do paiz, de votar constantemente despezas, que pela maior parte das vezes não são justificadas pela necessidade da sua creação; mas depois acham-se os inconvenientes, porque o orçamento cresce em proporção collossal, e não ha remédio senão recorrer a impostos, e o deficit que elle havia de cobrir fica sempre existindo porque as despezas crescem sempre na proporção, ou maior ainda do que cresce o augmento do imposto. Ora se perventura se demonstra que é indispensável a creação de certos serviços, então uma nação, que quer subsistir, não tem remédio senão votar impostos, embora faça sacrifícios; mas quando não ha essa urgência do serviço, então caduca inteiramente o fundamento d'essa proposta, e deve-se seguir outro caminho. Sr. presidente, eu vejo que, apenas se cria uma cadeira na universidade, logo essa cadeira se quer nas escolas, e vice-versa; acabo de ver que, tendo-se creado um curso de letras em Lisboa, já está uma proposta na outra camará para a creação do mesmo curso em Coimbra, e aqui temos uma nova faculdade n'a-quella universidade, e d'aqui a pouco ha de o Porto também querer, e necessariamente ha de ter logar esta creação. Assim esta cadeira de physica dos fluidos impondera-, veis ha de ir para a academia polytechnica do Porto, e então em vez de se crear uma cadeira são tres, uma para Lisboa, outra para Coimbra, e outra para o Porto.

Ora, quem vir este projecto ha de julgar que estas disciplinas não entram no quadro das disciplinas da universidade de Coimbra, mas ninguém ignora que, se são cadeiras especiaes, ellas entram no quadro das, disciplinas da universidade; mas o principal motivo da creação das cadeiras provém dos lentes substitutos: pois ha por exemplo um que quer ser proprietário antes de lhe pertencer, e estando enfadado de esperar, o modo de chegar mais depressa a proprietário é pedir que se crie uma cadeira nova, e este é o methodo qie se tem seguido, e d'ahi resultam augmentos successivos de despeza que recaem sobre aquelles que têem de a pagar. Ora, estando eu disposto, na qualidade de membro d'esta camará, a votar todas as despezas necessárias, não hei de votar por aquellas de cuja necessidade me não convençam, e muito mais aquellas de que estou convencido que são inúteis. I Pelo projecto que está agora em discussão é creada uma J

cadeira para o ensino da theologia pastoral e eloquência sagrada na faculdade de theologia da universidade de Coimbra; eu fallo com toda a franqueza, não sei de que serve a creação d'esta cadeira para aquelle ensino ? Conheço muito bem qual é a elevação da missão d'aquelles que se destinam ao estado ecclesiastico, quer exerçam o seu ministério na posição mais humilde de curas de.almas, ou na mais elevada do episcopado; e sei também quaes são as differen-, ças escolásticas que os theologos fazem das diversas espécies de homilias, cathequezes,' praticas etc; estas differen-ças formam uma nomenclatura que se deriva de nomes gregos, e que custam a pronunciar, como disse o digno par em relação a outro objecto: o que digo é que o ensino d'es-ta sorte de estudos theologicos na universidade de Coimbra aeha-se já no quadro das suas cadeiras, e ninguém ignora que na universidade se ensina a theologia dogmática, a doutrina dos sacramentos, a mystica, a exegética, a historia da igreja catholica, o direito canónico etc, e em fim todo o complexo d'esta vasta sciencia que se chama theologia. Não se ensinará propriamente a fazer sermões e cathequezes, mas aquelles individuos que tiverem os principios que se aprendem na universidade, e os conhecimentos de rhetori-ca e lógica, e leiam os modelos magníficos que ha não só n'este paiz, mas em outros sobre este ramo, poderão fazer tudo quanto quizerem se tiverem a capacidade necessária para ,isso. Porque ha muitas pessoas que têem os conhecimentos precisos, mas não têem a capacidade conveniente para pregar, e v. ex.a sabe muito bem que na universidade de Coimbra os professores de theologia são obrigados a pregar em certas festas solemnes, e comtudo a maior parte d'elles não fazem estes sermões, e pagam a quem os prega. Isto não prova falta de proficiência n'aquelles professores, mas que não têem vocação para a oratória sagrada, e então já se vê que para alguém ser bom orador sagrado não basta só ter os conhecimentos das disciplinas que se ensinam na universidade, mas é necessário ter certa vocação para isso: não é pois da falta d'esta cadeira qu'e provém a raridade de bons oradores sagrados, mas sim de causas bem, differentes.

Tenho portanto mostrado, quanto entendo, que este ensino se acha comprehendido no quadro das disciplinas da faculdade de theologia da universidade de Coimbra; e que nós vamos crear, com o estabelecimento d'esta cadeira, um augmento de despeza para que não vejo por ora urgência, nem vejo rasão para a approvação d'estes projectos; e entendo mais que estas reformas feitas a retalho não são as mais convenientes. Houve tempo em que se fez uma reforma completa na instrucção publica, mas tendo-se depois gritado contra ella, em logar de se ter feito outra reforma que emendasse os defeitos d'aquella, abandonou-se este, negocio, e deixou^se á iniciativa dos membros do parlamento o apresentarem projectos encommendados para servirem antes os amigos do que a instrucção publica. Eu não sei se este projecto de lei proveiu da iniciativa do governo, porque d'este parecer não vejo cousa nenhuma que me esclareça a tal respeito, e vejo só que a illustre commissão declara que havia rasões ponderosas para se conformar com as disposições d'este projecto. Portanto, sr. presidente, eu não sei se a iniciativa veiu do governo; mas parecia-me que sobre objectos d'esta ordem a iniciativa devia vir só do governo; porque, se provém de algum membro do parlamento, ella é muito respeitável de certo, mas tem graves inconvenientes, e todos conhecem esses inconvenientes que provém da iniciativa individual dos membros do parlamento; pois de leis assim feitas resulta um complexo de idéas con-tradictorias que é difficil entre ellas descriminar qual é o verdadeiro pensamento que as rege. Pelo menos eu não gosto muito de ver apresentar os projectos no corpo legislativo pelos membros do parlamento, desejo mais que elles tenham a iniciativa do governo, porque o governo tem ou deve ter pelo menos um pensamento que deve ser seguido, o que não pôde ter um individuo, que está fora dos negócios, e não tem os esclarecimentos necessários para seguir esse mesmo pensamento.

N'este sentido, sr. presidente, estou disposto a votar contra estes dois projectos, mas depois de ouvir as explicações da commissão talvez me convença, e então mudarei de opinião.

O sr. Conde de Thomar: — Sente que não esteja presente/ o sr. relator da commissão', que respeita a este projecto, o em.mo sr. cardeal patriarcha (O )sr. Visconde de Algés: — Apoiado), que certamente por motivo justificado não pôde comparecer, porque s. em.a havia de justificar o parecer da commissão. Antes porém de dizer o que entende a tal respeito, não pôde deixar de declarar que está inteiramente conforme com o que acaba de dizer o sr. conde de Samodães, quanto aos inconvenientes que resultam de se usar da iniciativa indistinctamente sobre todos os ramos do serviço publico, concorrendo assim muitas vezes para o transtorno do mesmo serviço, o que é altamente prejudicial, e sente que o governo não tome o seu logar, tanto n'uma como n'outra camará, para evitar que se esteja muitas vezes transtor-' nando o pensamento do governo (apoiados). É necessário ter a coragem e a força para resistir a certas reformas, ainda mesmo quando são os próprios amigos politicos dos differentes ministérios que as propõem, porque os inconvenientes são palpáveis, como o sr. conde de Samodães acaba de expor, e toda a camará concorda. Reconhece que o direito de iniciativa aos membros das duas camarás é um principio altamente liberal, mas convém que se não abuse delle, e só se empregue em casos urgentes, quando, por exemplo, o governo, conhecida a necessidade e urgência de uma reforma, resiste a apresenta-la, então sim, então é necessário que os membros das camarás tenham a coragem de apresenta-la. Mas em objectos d'esta natureza desejava que fosse o governo sempre que a empregasse.

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Quando principiou a fallar disse que sentia que não estivesse presente o sr. cardeal patriarcha, porque s. em.a havia de justificar o parecer, mas parece-lhe que ha uma rasão clara,,pela qual entende que a. camará não deve dei-xan d© approvar ieste projecto, cora o qual, se não se equi-voca> o governo concordou, na camará dos srs. deputados. E verdade que o pareoer não está desenvolvido, mas, co-nhece-se\evidentemente ique^ tratandoTse dacreação de uma. cadeira de theologia pastoral, teve-se em vistaio ensino.de uma; materiai que bem poderá, seiv oomprehendidama generalidade, , como 'disse o digno par, nas disciplinas que se ensinam já nav faculdade de theologia, mas que não se ensina especialmente, e essa, matéria ié> uma das mais importantes; porque, é aquella- que pôde concorrer não só para instruir os; cidadãos nos-seus deveres e obrigações como christãos, mas igualmente como, cidadãos. N'uma palavra, n'esta cadeirai deve-se. ensinar quaes são as obrigações dos parochos, especialmente, porque'não ha na universidade de Coimbra uma cadeira de ensino destinada a este objecto. E quem pôde duvidar que este estudo das obrigações dos parochos, que desgraçadamente se não conhece pela maior parte (apoiados), poderá ser muito conveniente não só para a religião, como para o estado? O parocho qite souber cumprir os seus deveres, e ensinar o que é mister aos seus parochianos, para-serem bons christãos, tem conseguido muito, e é um homem util ao estado e á religião. Por consequência, pois se trata de uma cadeira para preencher esta lacuna, o orador entende que ella deve merecer a attenção da camará, a fim de se votar este projecto. Conhece que ha por elle um augmento de despeza, mas também conhece que as vantagens são tão grandes, que a camará não deve recusar-lhe a sua approvação.

O sr. Conde de Semodães:—Sr. presidente, eu não quero demorar a approvação d'este projecto.

Quantas vezes me tem succedido (quasi sempre), na minha carreira parlamentar, apresentar > os principios pelos quaes eu costumo guiar-me em certos objectos, e observa-los depois invariavelmente, deixando as cousas seguir o seu caminho, porque não está na minha mão obstar-lhes! Quando fazia parte da camará dos srs. deputados, muitas vezes apresentei esses principios, e depois de os haver sustentado e demonstrado tanto quanto podia, julguei-me então satisfeito, e d'ahi por diante rejeitava em silencio todas as medidas a que elles eram applicaveis para não estar a repetir constantemente o mesmo. N'csta camará, e sobre estes projectos, praticarei da mesma forma.

Concordo com o digno par o sr. conde de Thomar, que o estudo das obrigações dos parochos seja realmente muito importante; porém é certo que a maior parte d'elles, dos que ha e ha de haver, não preencherão cabalmente os seus deveres emquanto não houver uma boa lei de dotação do clero. Não serão aquelles que vão frequentar a universidade de Coimbra e que cursarem a theologia pastoral, os que exercerão depois as funcções parochiaes, que são laboriosas e pouco retribuídas; os que se formam tratam logo de arranjar algum beneficio mais pingue que o do difficil e pouco vantajoso cargo de cura de almas; e esse estudo de obrigações parochiaes, a que se pretende dar hoje grande desenvolvimento, aproveita menos aos que as hão de exercer, do que aos que na habilitação scientifica só buscam um meio de subirem aos benefícios ecclesiasticos que rendam mais, e com menos trabalho do que o ministério pá-rochial.

Por consequência, emquanto ao projecto, não me convencendo inteiramente de que este augmento de despeza seja indispensável, eu continuo a votar contra; mas é provável que o projecto passe, e não lhe causando assim mal nenhum, não faço senão mostrar a linha de conducta que sigo n'estas questões, e que em tudo aquillo que não for absolutamente indispensável áo serviço publico não têem que contar comigo: pois rejeito todo o augmento de despeza que não seja justificado pela necessidade.

Ainda hoje tive a honra de annunciar ao sr. ministro da guerra uma interpellação acerca da lei de 14 de agosto de 1860, sobre os officiaes que pertenciam aos batalhões na-cionaes, que serviram no cerco do Porto. Eu sempre me oppuz em todas as occasiões a que aquella lei passasse, e oppuz-me não só em relação aquelles officiaes, mas também com relação a todos os que pertenceram a outros batalhões1 nacionaes que serviram em differerítes epochas, e com relação aquelles que tinham servido em Évora Monte, porque tremia perante o augmento de despeza que aquella lei trazia, e previa os iuconvenientes que necessariamente resultariam á administração publica de uma lei que estabelecia um precedente terrivel, comtudo hoje é lei do paiz; mas hoje talvez o sr. ministro esteja já a soffrer os graves inconvenientes d'essalei, vendo-se notavelmente "embaraçado no cumprimento d'ella. Isto prova, sr. presidente, que muitas vezes eu > poderei estait em erro, mas também algumas vezes não estou tanto em erro que a minha opinião não seja talvez melhor!que a d'aquelles que estavam conformes com o que .passou em lei. ,Por, consequência, a respeito d'este*projectoj eu voto também contra, persuadido de que, se o nobre'ministro se vê agora embaraçado'no cumprimento1 d'aquella outra medida então tomada, talvez der pois se •vejam.) igualmente os inconvenientes d'esta medida, pelo' precedente que ella traz comsigoj

0 sr. 'Ministro' da- Guerrai (Sá da Bandeira):—Quero só declarar, que d'aqui a tres ¦ ou quatro dias estarei habilitado para responder á interpellação annunciada pelo-digno par conde de Samodães.i

01 sr.< Presidente: — Continua a discussão, do projecto. (Pausa.)

Não havendo mais quem tomasse a palavra, foi o projecto approvado numa só votação; e também a mesma, redacção.

DISCUSSÃO DO PARECER N.° 112

A commissão de instrucção publica examinou com a devida, attenção o projecto de lei n.° 122 que veiu da camará dos srs. deputados, e que trata de crear na universidade de Coimbra as cadeiras de geometria descriptiva, na faculdade de mathematica, e de physica dos fluidos imponderáveis (calórico, luz, electricidade e magnetismo) na faculdade de phi-losophia; e, reconhecendo a importância que tem a creação d'aquellas novas cadeiras, é de parecer que seja approvado aquelle projecto de lei.

Sala da commissão, 15 de fevereiro de 18Q1.=Manuel, cardeal patriarcha=Marquez de Vallada = Conde de Thomar = Visconde de Algés=Joaquim Antonio de Aguiar.

PROJECTO DE LEI N.° 122

Artigo 1.° Sad ereadas na universidade de Coimbra as cadeiras- de geometria descriptiva, na faculdade de mathematica, e de physica dos fluidos imponderáveis (calórico, luz, electricidade e magnetismo), na faculdade de philosophia.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das cortes, em 23 de janeiro de 1861. = Custodio Rebello de Carvalho, deputado presidente=José de Mello Gouveia, deputado secretario = Ca rios Cyrillo Machado, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão; e a mesma redacção.

O sr. Visconde de Athoguia: — Chama a attenção do sr. presidente do conselho para dizer a s. ex.4 que achava muito conveniente que se estabelecesse na universidade de Coimbra um curso theorico de engenheria civil, pois lhe parece que, em presença do numero de cadeiras que ali ha, uma das melhores cousas que se poderia fazer era crear lá mais este curso no qual se habilitassem indivíduos que depois podessem vir a ser empregados nos trabalhos de pontes e calçadas, aos quaes se dá a denominação de engenheiros civis. Suppõe que o sr. ministro se não opporá a esta creação; e francamente declara,que foi com esta idéa que votou pela approvação dos projectos de lei que acabam de votar-se.

O orador não entende da sciencia theologica, todavia nenhuma duvida teve em votar pelo projecto que cria essa nova cadeira destinada a ensinar ao clero quaes são os seus deveres e obrigações para com Deus e para com a pátria, obrigações estas que a maior parte do clero desconhece (apoiados). Estimaria ouvir o sr. presidente do conselho sobre a idéa que acabava de enunciar.

O sr. Presidente do Conselho:—- Concorda com o digno par emquanto á necessidade que ha de que se ensinem as matérias relativas ao estudo de pontes e calçadas; mas parece-lhe que s. ex.a.ha de, meditando melhor, concordar com elle, sr. ministro, em que o estudo d'essa sciencia pertence antes ás escolas especiaes, do que á universidade, como acontece n'outros paizes, os quaes nós devemos imitar a este respeito. O sr. ministro tem a universidade de Coimbra como a menos própria para o fim que propõe o digno par. Não duvida porém submetter este assumpto ao conselho geral de instrucção publica, e ouvir a sua opinião a tal respeito.

O sr. Visconde de Castro: — Pediu a palavra para ponderar que, com quanto o projecto de lei n.° 114 seja de interesse vital, é comtudo muito simples. Elle foi distribuido hoje; mas em presença d'estas rasões pedia ao sr. presidente que propozesse á camará se, dispensando no regimento, consentia que fosse dado para ordem do dia da sessão de amanhã.

O sr. Presidente: — Já era tenção minha o dizer á camará, que tendo sido distribuidos hoje os projectos de lei n.08 114, 115 e 116, mas sendo a matéria delles muito simples, dispensasse no regimento, se assim o entendesse, para se-re«-'i dados para ordem do dia de amanhã. Vou po-lo assim á votação.

A camará conveiu.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para amanhã será portanto a discussão dos pareceres n.08 114, 115 e 116. Está levantada a sessão.

Eram quasi cinco horas.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 19 de fevereiro de 1861

Os srs.: visconde de Laborim; marquezes, de Ficalho, de Loulé, de Niza, de Ponte de Lima; condes, das Alcáçovas, da Graciosa, de Mello, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Samodães, de Thomar; viscondes, de Algés, de Athoguia, de Balsemão, de Bcnagazil, de Cam panhã, de Castro, de Fornos de Algodres, de Podentes; barões, de Pernes, de Porto de Moz, da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Pereira Coutinho, D. Carlos de Mascarenhas, F. P. de Magalhães, Margiochi, Silva- Carvalho, Aguiar, Larcher, Silva Costa, Brito do Rio.

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