DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 75
Palacio das côrtes, em 6 de fevereiro de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.
Proposta de lei n.° 65-F
Artigo 1.° E abolido o imposto de viação, addicional ás contribuições de renda de casas, sumptuaria, industrial, de direitos de mercê, de matriculas e cartas, de decima de juros, de registro e do pescado. As verbas principaes das contribuições referidas serão augmentadas na proporção da taxa em que o dito addicional se acha actualmente fixado, nos termos das cartas de lei de 30 de julho de 1860 e de 16 de abril de 1867, se por outra fórma não vier a ser regulado quanto a algumas das mesmas contribuições.
§ unico. O governo publicará as novas tabellas das contribuições sumptuaria, industrial, de direitos de mercê e de matriculas e cartas, organisadas de conformidade com o disposto no presente artigo.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, 13 de janeiro de 1880. = Henrique de Barros Gomes.
O sr. Presidente: — Este projecto tem uma só discussão na generalidade e especialidade. (Pausa.)
Como nenhum digno par pedisse a palavra, foi posto á votação e approvado na generalidade.
O sr. Vaz Preto: — Peço a palavra.
O sr. Presidente: — Devo notar ao digno par que este projecto já esteve em discussão na generalidade e especialidade, e já foi approvado.
O sr. Vaz Preto: — Eu não sei qual é o projecto que se discute.
O sr. Presidente: — É o n.° 19, que já foi approvado, e que teve uma só discussão na generalidade e especialidade porque consta de um só artigo.
No entanto darei a palavra ao digno par. notando-lhe novamente que o artigo 1.° e seu § já esteve em discussão e foi approvado.
O sr. Vaz Preto: — Pois bem, é sobre o artigo 1.° que peço a palavra. Eu não venho atacar o projecto, porque acho que tudo o que for simplificar os serviços é de grande vantagem, e como este projecto tende a esse fim, não o combato.
O motivo por que a pedi a palavra é outro e simples. E para chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para o facto que se dá pela transformação do imposto. Por este systema apresentam-se ao publico como aggravadas as taxas da contribuição sumptuaria, posto que o não sejam, o que dá maus resultados. Esta contribuição, sympathica ao povo, que julga que ella recáe só sobre o rico, é uma contribuição completamente negativa, porque as vantagens que dá para o thesouro não compensam as que lhe tira. Eu me explico. Esta contribuição, fixando taxas, alem da percentagem sobre casas ricas, recáe sobre creados, carruagens e cavallos.
Afóra as casas, como a materia collectavel depende da vontade do contribuinte, é claro que, sendo as taxas elevadas, a materia collectavel escasseia, e com ella escasseia tambem o producto do imposto.
A taxa elevada é, pois, erro economico. Não são só estes os inconvenientes: ha outros ainda maiores, como vou demonstrar.
A contribuição sumptuaria, como todos sabem, e como já disse, recáe sobre creados, carruagens e cavallos. Para que esta contribuição possa produzir os convenientes resultados, é necessario que a taxa seja pequenissima, pois, se for elevada, qualquer individuo tem na sua mão deixai de pagar essa contribuição; para isso basta diminuir o nu mero de creados, de carruagens e de cavallos, ou fazer de todo desapparecer a materia collectavel.
Se as taxas porém forem diminutas, embora a contribuição por si renda pouco, faz com que rendam outras.
Por exemplo, sendo a taxa pequena, um individuo em logar de um cavallo póde ter tres ou quatro, os creados augmentam em proporção, e portanto o imposto de consumo augmenta igualmente.
Isto que se diz para um individuo applica-se em geral. Supponhamos que pela diminuição das taxas, dobravam ou triplicavam os cavallos e as carruagens, dobravam e triplicavam outras industrias, como a dos selleiros, a dos ferradores, a dos segeiros, a dos serralheiros, etc., etc.
Sr. presidente, isto ainda não é tudo.
Eu desejava que o sr. ministro me explicasse como se coaduna com esta contribuição os gastos que o governo está fazendo para desenvolver e aperfeiçoar a raça cavallar, comprando cavallos reproductores, tendo institutos agricolas, e depositos hippicos?
Eu desejava que o sr. ministro me explicasse como se coaduna com esta contribuição o direito protector, que o governo conserva para proteger a industria de carruagens nacionaes?
Esta contribuição não só é prejudicial ao desenvolvimento de certas industrias, mas impede que outras novas se criem.
Sr. presidente, parece-me que o que acabo de expor é um attentado. Supponha agora o sr. ministro, que as taxas são pequenas, ou mesmo nenhumas; n’este segundo caso a pequena verba que o thesouro recebe, que supponho ser de 80:000$000 réis desapparece, mas em troca as novas industrias que se crearem, as que augmentarem, as que se desenvolverem, e os impostos de consumo e alfandegas hão de crescer e produzir o dobro, o triplo e o quádruplo da actual contribuição. Esta contribuição é uma perfeita illusão, e creia o sr. ministro que não são com illusões que se concertam as finanças.
Foi para chamar a attenção de s. exa. sobre este ponto que eu pedi a palavra, porque realmente é esta uma questão importante e digna de toda a consideração.
O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): — Não tomarei muito- tempo á camara. Prestei a devida attenção ás reflexões que acaba de fazer o digno par o sr. Vaz Preto, e só tenho a responder que mais tarde se tiver de propor alguma medida a respeito da questão que s. exa. tratou, não deixarei de tomar em consideração as observações do digno par.
Por agora permitta-me s. exa. que lhe diga que labora n’um equivoco, pois não se trata n’este projecto de elevar a contribuição sumptuaria, nem outra nenhuma contribuição, não se faz mais do que incorporar os addicionaes na taxa principal dos impostos, não se augmentam as contribuições, que ficam subsistindo taes quaes se acham estabelecidas pelas leis existentes. Isto é puramente uma questão de simplificação do serviço.
Por consequencia, já ve o digno par que as observações não colhem para o caso presente, o que não quer dizer que não as tomarei na devida consideração em ensejo opportuno.
O sr. Vaz Preto: — Sei perfeitamente que não se augmenta o imposto, que não se paga mais, que apenas se incorporam as addicionaes no imposto principal, mas o facto é que as taxas apparecem como augmentadas pelo facto de se lhe addicionar proporcionalmente aquillo que era pago por outra fórma e por outro systema.
Embora o contribuinte não pague mais, elle poderá ainda julgar as taxas crescidas, e portanto diminuir os objectos sobre que recaem as taxas.
Eu creio que esta transformação, fazendo-se as taxas elevadas produzirá mau effeito no publico, porque, se até agora o contribuinte pagava sem saber o que pagava, d’aqui por diante fica sabendo bem o que paga.
Nos paizes que estão mais adiantados do que nós, pouca importancia se tem dado a esta contribuição. Se bem me lembro na França julga-se de tão mau effeito, que as mu-