O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 133

N.º 15

SESSÃO DE 25 DE FEVEREIRO BE 1896

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios — os dignos

Visconde de Athouguia
Arthur Hintze Ribeiro

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. — Correspondencia. — O sr. presidente nomeia uma deputação para ir a Santarem assistir ás exequias destinadas a suffragar as victimas do incendio do club artistico. — O digno par Cau da Costa requer que a commissão de fazenda se reuna durante a sessão. Este requerimento é approvado. — O digno par Carlos Palmeirim apresenta o parecer referente ao requerimento em que o sr. conde de Linhares pede que lhe seja permittido entrar na camara por direito hereditario. Vae a imprimir. — O digno par conde de Thomar manda para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos aos ministerios da marinha e da guerra. São expedidos. — O digno par conde de Lagoaça faz diversas considerações em relação ás recompensas a conceder aos expedicionarios á Africa oriental, e allude tambem á prisão dos auctores do attentado contra o dr. Joyce. Responde ao digno par o sr. ministro do reino. — O sr. presidente communica que o digno par Sá Brandão não comparece á sessão por incommodo de saude.— O digno par Cau da Costa manda para a mesa o parecer da commissão de fazenda, sobre o projecto de lei que remodela a contribuição de registo. E mandado imprimir.

Ordem do dia: discussão do parecer n.° 5, sobre o projecto de lei n.° 8. É declarado em discussão na generalidade. — O digno par conde de Bertiandos, pedindo a palavra para uma questão previa, apresenta uma moção, e justifica-a. E admittida á discussão. Discursam sobre esta moção o digno par Francisco Costa, o sr. ministro do reino, novamente o digno par conde de Bertiandos, o digno par conde de Lagoaça, novamente o digno par Francisco Costa, tambem novamente o digno par conde de .Thomar e depois o digno, par conde do Bomfim, que manda para a mesa uma proposta. É lida na mesa, admittida e considerada em discussão, conjunctamente com a outra proposta. — Dá-se conta de um officio do ministerio das obras publicas, acompanhando uns documentos pedidos em uma das sessões antecedentes pelo digno par conde de Thomar.— O digno par conde de Lagoaça refere-se á proposta do digno par conde do Bomfim.— O digno par conde de Bertiandos requer que, para a votação, a sua proposta seja dividida em duas partes. Este requerimento é approvado, rejeitada a proposta do digno par conde de Bertiandos e considerada por este prejudicada a proposta do digno par conde do Bomfim. — Considerado de novo em discussão, na generalidade, o projecto n.° 8, discursa primeiro o digno par conde de Bertiandos e depois o digno par conde de Thomar até dar a hora.— O digno par conde do Bomfim pede à palavra, mas o sr. presidente pondera-lhe que já deu a hora. — Levanta-se a sessão, designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 20 dignos pares.

Foi lida e approvada sem discussão a acta da sessão anterior.

(Assistiu á sessão o sr. ministro do reino.)

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Officio da presidencia da camara dos senhores deputados, incluindo a proposição de lei que tem por fim conceder uma pensão á viuva, filhos e filhas do major Alfredo Augusto Caldas Xavier.

Foi enviada á commissão de fazenda, ouvidas as de guerra e de marinha.

Officio da mesma procedencia, incluindo a proposição de lei que tem por fim remodelar a contribuição de registo. Foi enviada á commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — Convido o digno par sr. Arthur Hintze Ribeiro a occupar o logar de secretario, na ausencia dos dignos pares vice-secretarios.

O sr. Cau da Costa: — Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que a commissão de fazenda, dispensado o regimento, se reuna durante a sessão.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o requerimento do sr. Cau da Costa tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae tambem ler-se o que consta de um telegramma do vice-presidente da camara municipal de Santarem.

Leu-se, pois, um telegramma do sr. Alfredo Glauco de Oliveira, vice-presidente da camara municipal de Santarem, annunciando que a mesma, camara deliberou mandar celebrar exéquias no dia 27 do corrente, no templo da Graça daquella cidade, sufragando as victimas do incendio do club artistico.

O sr. Presidente: — A camara quererá fazer-se representar por uma pequena deputação. Essa deputação será composta dos srs. visconde de Athouguia, Arthur Hintze Ribeiro e Francisco Simões Margiochi.

Estão inscriptos para antes da ordem do dia os srs. Carlos Augusto Palmeirim e conde de Thomar.

Tem a palavra o sr. Palmeirim.

O sr. Palmeirim: — Mando para a mesa um parecer da commissão de verificação de poderes.

(Lido na mesa foi mandado imprimir.}

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. conde de Thomar.

O sr. Conde de Thomar. — Pedi a palavra para mandar para a mesa dois requerimentos.

O primeiro é o seguinte:

(Leu.}

O outro requerimento e o seguinte:

(Leu.}

Peço urgencia da remessa d’estes documentos a fim de estar habilitado não só para a discussão das recompensas a dar aos expedicionarios, como a conhecer os factos que determinaram dar essas distincções.

O sr. Presidente: — Vão ler-se os requerimentos mandados para a mesa pelo digno par.

Lidos na mesa foram mandados expedir os requerimentos, que são do teor seguinte:

Requeiro que, pelos ministerios da marinha e da guerra, sejam remettidos a esta camara os relatorios do commissario. régio, e bem assim os relatorios dos commandantes das forças expedicionarias, que serviram de base para as recompensas e distincções dadas aos officiaes de todas as armas que tomaram parte na expedição á Africa oriental.

Sala das sessões, em 25 de fevereiro de 1896. = O par do reino, Conde de Thomar.

Requeiro, pelo ministerio da marinha, copia dos autos e

16

Página 134

134 DIARIO DA CAMAEA DOS DIGNOS PARES DO REINO

declarações feitas pelo Gungunhana e mais prisioneiros de guerra sobre os motivos que os levaram a hostilisar Portugal; bem como todas as informações do residente portuguez junto do dito regulo, ou informações que sobre este assumpto tenham chegado ao conhecimento do sr. ministro da marinha.

Sala das sessões, em 25 de fevereiro de 1895. = 0 par do reino, Conde de Thomar,

O sr. Conde de Tlomar: — V. exa. dá-me licença?

Desejava que v. exa. me dissesse se já vieram os documentos que requeri por parte do ministerio das obras publicas, relativos á companhia das aguas. Esses documentos foram pedidos ha mais de tres semanas, e referem-se a um assumpto bastante importante, que tem occupado a attenção publica. Pedia, portanto, a v. exa. que, no caso de elles ainda não terem chegado se instasse para que viessem.

O sr. Presidente: — Vou pedir informações á secretaria, e se não tiverem vindo, renovar-se-ha a requisição.

Tem a palavra o sr. conde de Lagoaça.

O sr. Conde de Lagoaça: — Tinha pedido a presença do sr. ministro da guerra para tratar de um assumpto que mais directamente diz respeito ao titular daquella pasta,

S. exa. não está presente por motivo justificado, ter de assistir na outra casa do parlamento á discussão do projecto de recompensas apresentado pelo governo.

O assumpto, todavia, tem tal importancia, que nunca é de mais que ácerca d’elle a representação nacional diga algumas palavras.

Como se tem dito aqui varias vezes, o pagamento da. divida contrahida para com Mousinho de Albuquerque, para com a expedição á Africa, representa a satisfação de uma divida de honra nacional; e o governo, não a pagando, mostra não ter a consciencia dos seus deveres politicos.

O sr. ministro do reino, por quem tenho muito respeito e consideração, é um elemento preponderantessimo no governo.

A sua voz não terá sido ouvida sobre o assumpto.

Elle, porém, esperava que s. exa. dissesse a sua opinião, auctorisadissima por todos os motivos, com respeito ao facto heróico praticado por Mousinho de Albuquerque, facto raie excede tudo quanto ha muito tempo se tem praticado tanto no paiz como fóra d’elle, facto de tal ordem que as nações estrangeiras se apressaram a perguntar, por telegrammas, aos seus agentes consulares em Lourenço Marques, se effectivamente aquelle feito se tinha levado a cabo por uma maneira tão extraordinaria, em fim, se o facto era verdadeiro, tão impossivel elle se lhes augurava.

De todos os jornaes estrangeiros, não houve um só que não dissesse que o feito praticado por Mousinho era o mais notavel da guerra negra.

Sabe que não é de uso, ou não tem força, a, citação do que se passa em conversações particulares; mas, em todo o caso dirá que tendo a honra de entreter relações intimas com muitos diplomatas estrangeiros, póde afiançar á camara que todos elles têem como extraordinario, como unico, o valor d’aquelle valente soldado.

Toda a gente assim o entende, menos o governo de Sua Magestade ou, pelo menos, parece, que é a unica entidade que deixa de pensar como pensa toda a demais gente.

Não fallou ainda o sr. João Franco Castello Branco que, apesar de todos os seus erros politicos, occupa, e com muita justiça, um logar distincto na politica portugueza, e que tem um largo e prospero futuro diante de si.

É um homem novo; mas é um homem honrado.

Pois bem; é para a sua honradez que elle appella. para que s. exa. lhe diga, com a mão na consciencia, se não julga ser uma grande injustiça o que se está praticando, se não é uma situação indigna e affrontosa aquella em que nos querem collocar aquelles que têem a responsabilidade do mando.

Já disse em uma das sessões passadas que se não calaria emquanto se não pagasse essa divida sagrada a Mousinho de Albuquerque, o intrépido aprisionador do Gungunhana, e ao coronel Galhardo, o illustre chefe militar da expedição.

Disse que não se calaria, e não se calará.

Querem que voltemos á antiga?

Pois voltemos.

Felizmente é novo e, se Deus lhe der saude, ainda poderá fazer o que outros fizeram, isto é, recorrerá ao obstruccionismo.

Fallará um mez a fio, se tanto for preciso, quando ali chegar o projecto que actualmente se está discutindo na camara dos senhores deputados, visto que assim o exige a honra nacional.

Pede ao sr. presidente que empregue os seus bons officios, para que se reuna a commissão de guerra, achando inadmissivel que nesta altura da sessão, passados quasi dois mezes depois da abertura do parlamento, ella ainda não esteja constituida, quando ha tantos assumptos dependentes da sua approvação e questões tão importantes, como a dos postos de accesso aos que arriscaram a sua vida na defeza da patria.

Dizer-se que não tem havido numero para a commissão se reunir, não o convence, porque esse argumento póde servir para sempre, e; nunca a commissão se reune.

Appello para o nobre almirante Baptista de Andrade, que faz parte desta commissão, para o nobre almirante, que é tambem um heroe, um homem, a quem a patria deve assignalados serviços, e que arriscou a sua vida no campo da batalha em defeza das nossas instituições, para que empregue igualmente todos os seus bons officios a fim de que a commissão se reuna e de o seu parecer ácerca do seu projecto de lei.

O que se diz por ahi ácerca do exercito é, no meu entender, muito pouco sensato, e não passa de uma insidiosa insinuação.

A verdade, porém, é que o governo concorre pelo seu procedimento para que no animo publico se levantem estas opiniões, que tão contrarias podem ser aos interesses publicos e ás instituições.

Por isso pede ao nobre ministro do reino que, como ministro, como estadista que tem um logar proeminente, e como homem que tem diante de si um largo futuro, diga alguma cousa a esto respeito.

Quando vier a esta camara o projecto das recompensas, que actualmente se discute na camara dos senhores deputados, fará então mais largas e energicas considerações.

Deseja ainda fazer outra pergunta ao sr. ministro do reino.

O sr. Presidente: — Peço licença para interromper o digno par, a fim de observar-lhe que já passou o praso que o regimento marca, para, depois da leitura do expediente, se tratar de quaesquer negocios antes da ordem do dia. Por isso peço ao digno par, que não querendo ficar com a palavra reservada, seja breve nas suas considerações.

O Orador: —Vuo terminar. Quando se discutiu nesta camara a lei relativa aos anarchistas, o sr. presidente do conselho, interrompendo o digno par o sr. conde de Thomar, disse que já estava preso o individuo auctor do attentado praticado, bem como mais oito ou nove, que com elle eram cumplices.

Ora, pessoa que me merece toda a confiança, mas que póde estar mal informada, disse-me ha dois dias que tal facto não se dera; que o individuo que disse ter atirado a bomba estivera caçoando com a policia.

Custa-me acreditar similhante cousa; mas como o facto é grave, peço ao sr. ministro do reino que diga se .sabe alguma cousa a este respeito. Igualmente pergunto a s. exa.

Página 135

ÔESSÃO N.° l5 DE 25 DE FEVEREIRO DE 1896 135

qual a rasão por que todos os individuos presos ainda não foram enviados para o poder judicial.

Como a lei diz que aquelles crimes serão punidos com seis mezes de prisão, sendo depois os incriminados postos á disposição do governo, deseja saber se o facto dos presos não terem sido ainda remettidos para juizo resulta do governo interpretar aquellas palavras da lei no sentido de serem os seis mezes contados no governo civil, sem que os presos sejam remettidos ao juiz competente.

(O discurso será publicado na integra e em appendice Ciando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Não sabe se depois da observação que o sr. presidente dirigiu ao digno par sr. conde de Lagoaça, poderá usar da palavra.

O sr. Presidente: — Tem v. exa. a palavra.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Vae. responder em primeiro logar á pergunta que o digno par lhe dirigiu, dizendo a s. exa. que os auctores do attentado praticado ha pouco na rua Duque de Bragança, estão presos. Consta-lhe até que a sua culpabilidade está absoluta e mesmo excepcionalmente bem demonstrada nos autos levantados. Esses autos têem sido demorados, por isso mesmo que se referem a factos completos, a fim de pôr bem a claro não só a maneira por que se praticou o crime, mas até a responsabilidade de cada um dos criminosos.

Acrescentará que os réus não seriam julgados mais cedo se não houvesse o juizo de instrucção criminal, porque o tempo que tem levado a instaurar o processo, seria gasto na Boa Hora em formar o corpo de delicto, substituido pelos autos e outras peças do juiz instructor.

Póde dar estas informações ao digno par com a certeza de que não as dá erradas, e que vão ser mandados para juizo esses criminosos logo que esteja concluido o processo que se instaurou.

Disse o digno par, ironicamente, que o governo se dispensava de submetter aquelles individuos ao julgamento nos termos da lei para lhes applicar a pena que o juiz entendesse, e depois serem entregues ao governo para lhes dar o destino que julgasse mais conveniente.

Póde dizer ao digno par que da parte do governo não ha o menor desejo de commetter qualquer arbitrariedade ou de praticar qualquer excesso.

O governo propoz ás côrtes uma lei excepcional, lei que effectivamente dá ao poder executivo faculdades largas e excepcionaes, mas perfeitamente dentro das faculdades concedidas ao poder judicial, faculdades que se hão de manter.

O digno par deseja conhecer a sua opinião como homem e como ministro ácerca dos serviços prestados por Mousinho de Albuquerque e sobre a recompensa que se lhe deve dar.

Como homem, o digno par comprehende bem que não sendo elle membro d’esta camara, não póde dizer o que pensa sobre o assumpto. Dentro do governo, das resoluções a tomar sobre qualquer assumpto, a opinião dos ministros é a opinião do governo.

O governo tem a maior admiração por Mousinho de Albuquerque, o maior reconhecimento pelos altos e importantes serviços que prestou, e não sabe que admirar mais, se a sua coragem se o seu desprendimento. Em Mousinho de Albuquerque dá-se esse conjuncto rarissimo de qualidades — coragem inexcedivel e uma abnegação tambem inexcedivel.

O governo, pois, tem esta opinião ácerca d’aquelle bravo e distincto official do nosso exercito.

Na camara dos senhores deputados está-se discutindo um projecto que o comprehende entre as differentes recompensas a dar a alguns officiaes que mais se distinguiram nas campanhas de Moçambique, e a mesma camara resolverá como entender em sua alta sabedoria.

Esta camara tem de se occupar do mesmo assumpto, e n’essa occasião o governo dirá claramente á camara á sua opinião.

Portanto, o digno par, querendo ter a bondade de aguardar o tempo que seja necessario, encontrará a opinião do governo com a maxima lealdade.

Quanto ao mais não diz nada porque não tem a honra de ser membro desta camara.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o entregar.)

O sr. Presidente: — O digno par sr. Sá Brandão encarregou-me de participar á camara que não comparecia á sessão de hoje por falta de saude.

O sr. Cau da Costa: — Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre o decreto dictatorial relativo á contribuição de registo.

Leu-se na mesa e foi a imprimir para ser distribuido pelas casas dos dignos pares.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Vamos entrar na ordem do dia. Vae ler-se o parecer n.° 5 sobre o projecto de lei n.° 8.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

PARECER N.° 5

Senhores. — Está sujeito ao nosso exame o projecto de lei n.° 4, vindo da outra casa do parlamento e que contem a reforma da camara dos pares do reino e algumas modificações de anteriores leis constitucionaes a que se refere o decreto de 20 de setembro do anno passado, que o governo publicou em dictadura.

Foi este diploma governativo promulgado com o proposito claro e positivo de completar a reforma eleitoral que será em breve sujeito tambem á nossa apreciação, o de aperfeiçoar e melhorar uma corporação politica que a pratica havia demonstrado não ter chegado a lograr as vantagens da sua constituição e a influencia elevada que lhe fora attribuida pela lei de 24 de julho de 1885.

No relatorio que precede o decreto de 20 de setembro o governo amplamente expoz o systema que melhor se lhe afigurou para attingir a realisação do seu proposito e os fundamentos que o haviam determinado a adoptal-o.

Tambem o assumpto foi devidamente estudado e esclarecido, quer pelo parecer da commissão respectiva da camara dos senhores deputados, quer pela discussão que houve n’essa camara.

Não carecemos, portanto, de reiterar as rasões adduzidas para justificar a remodelação da camara dos pares do reino — remodelação ainda aperfeiçoada, de accordo com o governo, na outra casa do parlamento, onde se inseriram, em alguns artigos do alludido decreto, disposições com que, sem duvida, foram attendidos principios reconhecidamente consentaneos com as conveniencias publicas.

Citaremos entre outras as prescripções das nomeações dos pares, e as incompatibilidades fixadas no exercicio das suas funcções, que farão sobrelevar o prestigio da camara, e a previdente e salutar doutrina do artigo 7.° com a qual nem a administração dos serviços publicos padecerá, nem deixará de ter logar o devido e opportuno exame e fiscalisação parlamentar sobre o orçamento do estado e sobre a applicação da mais onerosa contribuição á defeza e segurança da patria.

Podem suscitar-se duvidas ou interpor-se opiniões diversas sobre a proficuidade do systema preferido na contextura do projecto que vae discutir-se. Acontece o mesmo a todas as producções do espirito humano, e bem comprovam esta verdade as differentes phases por que ha passado a constituição da camara dos pares desde a outorga da carta constitucional. A evolução das idéas determina sempre a alteração de doutrinas por melhores que se te-

Página 136

136 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

nham conceituado. O que é indispensavel, e deve considerar-se obrigatorio, é que a nova organisação d’esta camara seja sempre executada de boa fé e com rigoroso escrupulo, acatando-se o superior pensamento nos interesses do paiz que a inspirou e suggeriu.

Confia a commissão que assim acontecerá.

D’estas apreciações resulta que a vossa commissão Beja, de parecer que approveis o seguinte projecto de lei.

Sala das sessões da commissão, em 21 de fevereiro de 1896. = A. de Serpa Pimentel = José Baptista de Andrade = Antonio Emilio Correia de Sá Brandão = Augusto César COM da Costa = José Maria dos Santos = Jeronymo da Cunha Pimentel = A. A. de Moraes Carvalho = Tem voto dos dignos pares: Thomás de Carvalho = Conde de Azarujinha = Francisco Joaquim da Costa e Silva, relator.

Projecto de lei n.° 8

Artigo l.° A camara dos pares é composta de membros vitalicios, em numero não excedente a noventa, nomeados pelo Rei, alem dos pares por direito proprio mencionados no artigo 40.º da carta constitucional e no § 2.° do artigo 6.° da lei de 24 de julho de 1885.

§ 1.° Continuam fazendo parte da camara dos pares os actuaes pares do reino por direito hereditario, e pelo mesmo titulo terão ingresso n’esta camara os que se acharem comprehendidos na disposição do § 7.° do artigo 6.° da referida lei.

§ 2.° No numero de noventa pares do reino, fixado pelo presente artigo, ficam incluidos os actuaes pares de nomeação regia, mas não se comprehendem os pares por direito hereditario.

Fica por este modo alterado o artigo 6.° da lei de 24 de julho de 1885.

Art. 2.° Não podem ser nomeados pares do reino os cidadãos que tiverem menos de quarenta annos do idade, ou os que forem absolutamente inelegiveis para deputados.

§ 1.° Não são comprehendidos na ultima parte d’este artigo:

1.° Os chefes de missões diplomaticas;

2.° Os commissarios regios nas provincias ultramarinas e os governadores das mesmas provincias;

3.° Os empregados superiores da casa real.

§ 2.° A nomeação de par do reino será officialmente communicada á camara dos pares, e por proposta de algum dos seus membros poderá ser impugnada no praso de cinco dias desde a communicação, com exclusivo fundamento na infracção d’este artigo, sendo a impugnação resolvida pela camara no praso de dez dias, desde a apresentação da proposta.

§ 3.° Na falta de impugnação ou resolução, nos termos e prasos declarados no paragrapho antecedente, o presidente da camara dos pares admittirá o nomeado a prestar juramento e a tomar assento na camara.

Art. 3.° Os pares do reino que actualmente ou de futuro servirem logares nos conselhos administrativos, gerentes ou fiscaes de emprezas ou sociedades constituidas por contrato ou concessão especial do estado, ou que deste haja privilegio, não conferido por lei generica, subsidio; ou garantia de rendimento, salvo os que por delegação do governo representarem n’ellas os interesses do estado, e os pares do reino que forem concessionarios, arrematantes ou empreiteiros de obras publicas, ficam inhibidos do exercicio do pariato, não podendo ser admittidos a tomar parte nas discussões nem a votar, emquanto não provarem que cessou o motivo de qualquer d’estas incompatibilidades.

§ unico. A infracção deste artigo será punida com a pena de suspensão dos direitos politicos até tres annos, e tornará nullos de direito todos os actos em que individual ou collectivamente tome parto o par infractor no serviço das mesmas sociedades, emprezas, concessões, arrematações ou empreitadas.

Art. 4.° Os ministros podem nomear, de entre os funccionarios superiores da administração do estado, delegados especiaes para tomarem parte perante ás camaras legislativas na discussão de determinados projectos de lei.

§ unico. A nomeação será communicada ao presidente da respectiva camara, na qual o delegado terá assento durante a discussão do projecto para que for designado.

Fica por este modo additado o artigo 47.° da carta constitucional.

Art. 5.° Quando alguma das camaras legislativas não approvar, no todo ou em parte, qualquer projecto de lei emanado da outra camara, ou não approvar as emendas ou addições feitas pela outra camara sobre qualquer projecto de lei, será nomeada uma commissão de igual numero de pares e deputados, logo que assim o resolva alguma d’ellas, e o que a commissão decidir por pluralidade de votos, servirá para ser immediatamente reduzido a decreto das côrtes geraes ou para ser rejeitado o projecto.

§ 1.° Havendo empate na votação do projecto ou de algum dos seus artigos, ou na de qualquer das emendas ou addições, ou quando a commissão não chegue a resultado algum sobre o assumpto que lhe foi commettido, poderá qualquer das camaras pedir a reunião dás côrtes geraes, representando n’esse sentido ao poder moderador.

§ 2.° As côrtes geraes serão convocadas e reunir-se-hão dentro de trinta dias, na camara dos deputados, sob a direcção do presidente da camara dos pares, servindo de secretarios o primeiro de cada uma das camaras.

§ 3.° Se no dia para que forem convocadas as côrtes geraes não se reunir a maioria dos membros de cada uma das camarás, será a sessão adiada para o primeiro dia util, em que se deliberará, seja qual for o numero de pares e deputados que compareçam. O objecto dá divergencia será votado sem discussão.

Art. 6.° O Rei exerce o poder moderador com a responsabilidade dos seus ministros:

§ 1.° Nomeando pares até ao numero de noventa, sem outra restricção que não seja a. do artigo 2.° da presente lei;

§ 2.° Prorogando ou adiando as côrtes geraes, e, nos termos do § 4.° do artigo 74.° da carta constitucional, dissolvendo a camara dos deputados e convocando outra que a substitua;

§ 3.° Perdoando e moderando as penas impostas aos réus condemnados por sentença, á excepção dos ministros d’estado, por crimes commettidos no exercicio das suas funcções, a respeito dos quaes só poderá ser exercida a prerogativa regia, tendo precedido petição de qualquer das camaras legislativas.

Fica por este modo substituido o artigo 7.° da lei de 24 de julho de 1885.

Art. 7.° Nos primeiros quinze dias, depois de constituida a camara dos deputados, o governo lhe apresentará o orçamento da receita é despeza do anno seguinte, as propostas fixando as forças de terra e mar e á dos contingentes de recrutamento da força publica. Quando até ao fim do anno economico as côrtes não hajam votado as respectivas leis, continuarão em vigor no anno immediato as ultimas disposições legaes sobre estes assumptos, até nova resolução do poder legislativo. Se, porém, as côrtes não estiverem abertas, serão extraordinariamente convocadas e reunidas no praso de tres mezes, a fim de deliberarem exclusivamente sobre os assumptos de que trata este artigo; se estiverem funccionando, não serão encerradas sem haverem deliberado sobre o mesmo objecto, excepto sendo dissolvidas; no caso de dissolução serão convocadas e reunidas no praso já indicado em sessão ordinaria ou em sessão extraordinaria para o mesmo exclusivo fim.

Fica por este modo alterado o artigo 12.° e ampliado a artigo 13.° do acto addicional de õ de julho de 1802.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 20 de fevereiro de 1896 = Visconde do Er vedai da Beira, vice-presidente = Abilio Au-

Página 137

SESSÃO N.° 10 DE 25 DE FEVEREIRO DE 1896 137

gusto de Madureira Beça, servindo de primeiro secretario = Antonio José Lopes Navarro, servindo de secretario.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

Tem a palavra o sr. conde de Bertiandos.

O sr. Conde de Bertiandos (para uma questão previa): — Sr. presidente, começo por ler a minha moção de ordem.

(Leu.)

É facil a explicação d’esta moção.

Sabem muito bem v. exa., sr. presidente, e a camara, que é possivel que este mesmo projecto que vamos discutir seja ou rejeitado ou emendado, e póde até succeder isso ao proprio artigo 5.°, que modifica o artigo 54.° da carta constitucional e a lei de 27 de julho de 1849.

Imaginemos que a camara dos pares o emenda, não no sentido da proposta do governo, mas por outro modo; resultará d’ahi o processo que o governo primeiro apresentou, que já não quer, pois que elle concordou com a camara dos senhores deputados, na sua rejeição?

Pois se nem a camara dos senhores deputados, nem esta camara, acceitam esse processo, ha de ser esse processo o que se ha de seguir?

Nesta hypothese, como se havia de resolver a divergencia que sobre este artigo surja entre as duas casas do parlamento?

O que me parece é que para dignidade d’esta camara importa assentar, desde já, e previamente, na discussão dos artigos do projecto o que deve seguir-se, porque é preciso que os pares do reino, quando emittirem a sua opinião, saibam o que d’ahi póde resultar.

A esta camara tambem pertence fixar jurisprudencia.

Julgo que deve seguir-se a que sobre este ponto está estabelecida no artigo 54.° da carta constitucional e na lei que regulamenta este artigo.

É esta a minha opinião, e creio que será tambem a opinião da camara.

O que eu entendo tambem é que esta questão deve tomar o logar da questão principal, e que nós não devemos entrar na discussão do projecto sem accentuarmos claramente o que succederá no caso de que a camara emende ou rejeite o projecto que está dado para discussão.

Mando para a mesa a minha moção.

O sr. Francisco Costa: — Peço a palavra como relator do projecto.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta que o digno par sr. conde de Bertiandos mandou para a mesa.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

Proposta

A camara, julgando que á sua dignidade importa assentar previamente no que entende, terá de seguir-se no caso de ser rejeitado ou emendado o projecto que vae entrar em discussão, affirma que deve ser cumprido o que a tal respeito preceitua a carta constitucional no artigo 54.°, regulado pela lei de 22 de julho de 1849, e passa á ordem do dia.

Sala das sessões da camara dos pares do reino, 25 de fevereiro de 1896. = O par do reino, Conde de Bertiandos.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que admittem á discussão esta proposta, tenham a bondade de se levantar.

Foi admittida.

O sr. Francisco Costa: — Sr. presidente, tive a honra de ser nomeado pela commissão do bill relator do projecto que entrou em discussão, e cabe-me tambem a honra de dizer algumas palavras, ainda, que poucas, para responder ao digno par e meu amigo, a quem muito respeito, o sr. conde de Bertiandos.

Sr. presidente, a proposta do digno par é verdadeiramente, na sua essencia, um adiamento da questão, e eu, por parte da commissão, declaro que não posso acceitar essa proposta.

O projecto que se discute e um projecto como qualquer outro dos que vem a esta camara.

Foi elle approvado na outra casa do parlamento e subiu á camara dos pares para ser approvado ou rejeitado.

Depois do que a camara resolver na sua alta sabedoria sobre o projecto, é que poderá haver necessidade de .considerar ou não o final da proposta do sr. conde de Bertiandos.

O projecto foi apresentado na camara dos senhores deputados, e esta camara introduziu n’elle algumas disposições que melhoraram muito o decreto dictatorial de 20 de setembro do anno passado.

O governo não mostrou instinctos auctoritarios no seu debate, pois que accedeu a que no projecto fossem feitas algumas alterações que, a meu ver, o melhoraram.

A proposta do sr. conde de Bertiandos, ainda, digo, é um adiamento da questão, adiamento com o qual a commissão não se póde conformar, e que está mesmo fóra das praxes desta camara nos termos em que está elaborado.

Trata-se de uma mensagem vinda da outra casa do parlamento, contendo artigos que reformam a camara dos pares do reino.

A commissão d’esta camara deu o seu parecer, conformando-se, sem discrepancia de qualquer dos seus membros, com o projecto vindo da camara dos senhores deputados.

Se a camara rejeitar o projecto, é que nós teremos ou não de observar os preceitos a que se refere a proposta do digno par o sr. conde de Bertiandos.

O sr. Conde de Bertiandos: — Quaes preceitos?

É essa a opinião do digno par. Peço a palavra.

O Orador: — Por consequencia, repito, por parte da commissão, que não posso acceitar a proposta que o sr. conde de Bertiandos mandou para a mesa, e entendo que nada mais tenho a dizer senão que o projecto deve continuar em discussão.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Comquanto não tenha a honra de pertencer a esta camara, é claro que, pela apresentação da proposta do digno par, que constitue uma verdadeira questão politica, assiste-lhe o direito de usar da palavra sobre este assumpto.

O sr. Conde de Bertiandos: — Não sei se v. exa. tem esse direito.

O Orador: — Desde o momento que o digno par tem duvida se posso ou não usar da palavra, vou pedir a v. exa. que consulte a camara.

(Pausa.)

Vozes: — Falle, falle.

O sr. Presidente: — Em vista da manifestação da camara, queira v. exa. continuar o seu discurso.

O Orador: — Pedindo a palavra, não é por fórma alguma para expor a sua opinião pelo receio de qualquer resolução que a camara venha a tomar. A camara comprehende que esta medida, que está a discutir-se, tem um caracter politico bem accentuado e é de natureza tal, que, da sua rejeição não poderia resultar outra cousa alem da saída d’elle, orador, do ministerio. Portanto, se fosse esta a resolução que a camara viesse a dar a este projecto, desnecessario seria resolver o conflicto entre as duas camaras.

A rasão por que pediu a palavra foi porque lhe parece que se está a discutir o que não precisa de discussão, porque esta camara votou, depois de ser approvado na camara dos senhores deputados, e já hoje está sanccionado por El-Rei, publicado no Diario do governo, o bill de indemnidade que relevou o governo das responsabilidades em que incorreu assumindo o exercicio de funcções legislativas e constitucionaes. Portanto, o que se pretende discutir é já lei do paiz. Acresce que no § unico se estabelece que continuarão em vigor, até nova resolução das camaras, as providencias, de caracter legislativo promul-

Página 138

138 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

gadas pelo governo, e entre ellas está esta, que foi apresentada á camara dos senhores deputados, e em que o governo concordou se fizessem algumas modificações.

Em vista d’esta lei, o processo que se tem a seguir é o que está estabelecido no artigo 5.° do decreto de 2õ,de setembro de 1895.

Ora, desde que é esta a lei, parece-lhe que, sem offensa da opinião do digno par, desnecessario é estar aqui a discutir, ou a votar, uma cousa desde que ella já está resolvida pelo proprio decreto em discussão.

O sr. Conde de Bertiandos: — Sr. presidente, tanto era digna de attenção a questão que tive a honra de apresentar, que vejo existir grande divergencia entre o sr. ministro do reino e o illustre relator da commissão, para o caso de se rejeitar este projecto ou de soffrer qualquer emenda. O que succede? A esta pergunta respondeu o sr. relator da commissão «o que preceitua a carta constitucional», vem o sr. ministro do reino e diz «não senhor, não é», é o que ninguem quer, o que não quer o proprio governo, que já o declarou na camara dos senhores deputados, o que não quer a camara dos deputados, o que não quererá esta camara!

Veja v. exa. como tudo se embaralha desde que saímos para fóra da lei constitucional, que homens audazes quebraram sem se lembrar das difficuldades em que depois collocam os corpos legislativos.

Difficuldades gravissimas!

Pois não vê v. exa., não vê a camara, como já apparece este conflicto entre o governo e o illustre relator da commissão?!

Pois não será importante assentar-se sobre a jurisprudencia a seguir, quando já ha esta divergencia?!

Eu insisto porque a camara resolva como entender, na sua alta sabedoria; mas que resolva por qualquer forma.

Já sabemos a opinião do governo e a da commissão; vejamos qual é a opinião da camara.

Pois havemos de discutir até ao fim um projecto sem saber em que lei vivemos?! (Apoiados.)

Isto importa á dignidade d’esta camara, não é uma questão politica, e não sei porque o sr. ministro do reino interveiu n’ella, não sendo membro d’esta casa.

Não é uma questão politica, não, porque nada tem com a existencia do sr. ministro do reino no gabinete, riem com a do governo nos conselhos da corôa. É uma questão de jurisprudencia, de direito publico!

Não havia necessidade de que o sr. ministro do reino viesse dizer-nos: «vejam o que resolvem, porque eu cáio!»

Pois isto tem lá nada com o governo?!...

Não tem nada.

O governo não tinha que vir aqui apresentar a sua opinião a tal respeito; mas ainda bem que veiu, porque veiu mostrar que havia uma larga divergencia entre elle e o sr. relator da commissão, e provar, portanto, que o assumpto é grave e bem merece a nossa attenção.

Por isso eu mantenho a minha opinião de que é indispensavel que a camara diga o que julga a este respeito.

O sr. Conde de Lagoaça: — Pouco mais tem a acrescentar ás palavras eloquentes do digno par o sr. conde de Bertiandos.

S. exa. muito bem accentuou até, onde a camara poderá ir quando um governo salta sobre a constituição do estada, levada por interesses mais ou menos politicos, sem se fundar no bom direito!

O acaso, a prepotencia, a vontade absoluta do sr. João Franco Castello Branco. Nada mais!

Vamos todos!

Ora, mandar é uma energia de caracter, mas s., exa. faz tudo muito precipitadamente.

Na sua economia interna falta-lhe aquillo que nós representâmos na economia constitucional. Falta-lhe o elemento ponderador.

S. exa. resolve as questões muito precipitadamente, levianamente mesmo, não olha ao futuro, não pensa noa resultados das suas deliberações.

A camara resolverá como entender em sua alta sabedoria, mas o que não póde é harmonisar o sr. relator do projecto com o sr. ministro do reino. Isso é que nem Santo Antonio, o do centenario, é capaz de conseguir.

O digno par o sr. Francisco Costa, seu illustre amigo, tem uma opinião que é sua, que é verdadeira e boa; conserve-a, não sáia d’ella. Não venha de novo usar da pala-lavra para declarar «que onde digo digo, digo que não digo».

S. exa., com a sua auctoridade, confessa que no caso do projecto ser rejeitado devemos ir á constituição, e o sr. ministro do reino entende o contrario.

Quer dizer, s. exa. não soube bem o que disse, ou é de tal modo absurdo o que expoz, que não se póde comprehender. S. exa. disse, que se fosse rejeitado o artigo ficavamos subordinados ao preceituado no decreto dictatorial, antes das modificações feitas pela camara dos senhores deputados.

Crê que foi isto... Não o affirma para evitar ter de corrigir a sua affirmativa.

Sendo assim, cair-se-ia n’um ridiculo assombroso.

Pois como quer s. exa. que o governo publique um decreto anti-constitucional, reformando arbitraria e violentamente a carta constitucional, dando ao poder moderador a solução de certos e determinados negocios, e apresenta esse decreto á camara dos senhores deputados, que o modifica ou altera, e venha depois dizer: Emquanto estas modificações ou alterações não passam na camara dos pares, fica sendo lei do estado o decreto nos termos em que foi apresentado á camara dos deputados?

O sr. ministro do reino é muito intelligente, é muito boa pessoa, bom chefe de familia, reconheço-lhe todos estes predicados, mas entendo que tudo isto é seu, e não é.

A camara dos senhores deputados, a qual, na opinião do sr. João Franco, e de accordo com os seus principios, melhor representa o paiz, disse que aquelle artigo do decreto não era bom, que precisava de emenda, e emendou-o.

O governo concordou que não era bom, e acceitou a emenda: quer dizer, o governo não quer aquelle artigo, a camara dos senhores deputados, e por consequencia o paiz que ella representa, tambem o não quer.

Ninguem quer o artigo 5.°, ou se engana no numero, ninguem quer o artigo que está neste projecto e que corresponde ao que vinha no decreto dictatorial.

Pois a doutrina d’esse artigo é que deve prevalecer na opinião do sr. ministro.

S. exa., na sua consciencia intima, sabe muito bem que o que deve prevalecer é a opinião do nosso antigo collega o sr. Francisco Costa.

Poderia ainda adduzir outras considerações a este respeito, mas não as fará agora. No emtanto permitta-lhe a camara que ache estranhavel o dizer o sr. Francisco Costa que este projecto é como os outros, isto é, que não possue natureza differente dos outros.

Pois este projecto é como os outros?

Pois é igual a qualquer outro um projecto que póde ser a morte certa e inevitavel d’esta camara; um projecto que altera fundamentalmente a constituição do estado?

Julga que as conclusões da proposta do sr. conde de Bertiandos fóram acceitas pelo sr. Francisco Costa e, se não são do agrado do sr. ministro do reino, paciencia. Gosta muito de o ouvir fallar e de o ver aqui, mas francamente, n’esta questão s. exa. tinha pouco ou nada a fazer n’esta camara.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.}

O sr. Conde de Thomar (para um requerimento): — O meu requerimento é muito simples. Vejo que estão todos laborando em erro? desde o sr. relator até ao sr, ministro do reino,

Página 139

SESSÃO N.° 15 DE 25 DE FEVEREIRO DE 1896 139

O sr. Francisco Costa: — Já pedi a palavra.

O Orador: — A proposta do digno par sr. conde de Bertiandos não é de adiamento, é uma questão previa; e sendo questão previa, a camara tem de pronunciar-se sobre ella.

O sr. Presidente: — Tenho a observar ao digno par que s. exa. está inscripto sobre a moção do sr. conde de Bertiandos. Agora, só tem a palavra para um requerimento.

O Orador: —A não ser que v. exa. queira que mande apenas para a mesa quatro palavras escriptas num papel, tenho que fundamentar o meu requerimento.

O sr. Presidente: — V. exa., pedindo a palavra para um requerimento, prefere a todos os oradores inscriptos; não póde, porém, fundamentar o seu requerimento.

O Orador: — Desde que v. exa. não me quer dar a palavra, não justificarei o requerimento.

O sr. Conde de Lagoaça: — Póde justifical-o por escripto.

O sr. Presidente: — O digno par sr. conde de Lagoaça não tem a palavra.

O sr. Conde de Lagoaça: — Eu fiz apenas um áparte.

O Orador: — O meu requerimento é para que v. exa., sr. presidente, se digne consultar a camara sobre se ella considera ou não a proposta do digno par sr. conde de Bertiandos como uma questão previa. Depois da camara decidir, então tomarei novamente a palavra.

O sr. Presidente: — Eu já declarei que era a proposta do sr. conde de Bertiandos que está em discussão.

Q Orador: — Então estamos em desaccordo, porque o sr. relator disse que era um adiamento, v. exa. diz agora que é uma questão previa, e o sr. ministro do reino tem outra opinião.

O sr. Presidente: — Ou seja questão previa, ou adiamento, está em discussão antes do projecto.

O Orador: — Como já disse, o meu requerimento é para que v. exa. se digne consultar a camara sobre se ella considera ou não essa proposta como uma questão previa. Depois se discutirá o parecer.

Não temos tanto que fazer que não possamos discutir tudo isto.

O sr. Presidente: — Não tenho necessidade de consultar a camara porque, ou seja questão previa ou adiamento, discute-se e vota-se antes da materia do projecto. É assim que a camara tem interpretado o artigo 57.° do regimento.

O Orador: — N’esse caso, se v. exa. considera a proposta como uma questão previa, havendo uma votação sobre ella, estou de accordo.

O sr. Francisco Costa (relator): — Não esperava uma discussão tão acalorada sobre as palavras que proferi, porque n’ellas se não encontra divergencia com o que disse o nobre ministro do reino.

Ou seja questão previa, ou adiamento, é para mim um caso novo o prevenir-se a hypothese de ser rejeitado um projecto. Tenho mais de quarenta annos de parlamento, e nunca vi fazer proposta similhante!

(Interrupção do sr. conde de Lagoaça.)

De-me licença o digno par. Eu deixei-o dizer o que quiz, e portanto permitta-me que exponha o que entendo..

Como disse, é um caso novo n’esta camara prevenir-se o que ella terá de fazer, o que ella ha de resolver, se um projecto não merecer a sua approvação.

Farei agora lembrar ao digno par sr. conde de Bertiandos as minhas ultimas palavras de ha pouco.

Eu disse, que este projecto era como outro qualquer, e que, no caso de ser rejeitado pela camara, ter-se-ia ou não I de observar o que o sr. conde de Bertiandos inscreveu nó final da sua proposta.

Com relação á moção de s. exa., rejeitei-a, é claro, por completo, porque, na minha opinião, que, ainda sustento, ella representava um adiamento.

Não vejo, pois, contradicção entre o que eu disse e o que disse o sr. ministro do reino; nem tambem é caso para tão animada discussão.

Entendo que se approvassemos a proposta do digno par, teriamos de adiar a discussão do projecto; é isso que eu, como relator, e por parte da commissão, não posso acceitar.

Em minha opinião, o projecto deve ser discutido, não podendo nós decidir desde já o que se fará no caso de ser rejeitado.

Era o que tinha a dizer.

O sr. Presidente: — Está inscripto o digno par sr. conde de Thomar.

Tem s. exa. agora a palavra.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, nós continuâmos exactamente no terreno em que estavamos.

O sr. relator da commissão diz que disse e diz que não disse, e continua a fallar em adiamento do projecto, diz, que é um principio novo, e que tem quarenta annos de vida parlamentar e que nunca viu exemplos de se adiar, a discussão de um projecto por qualquer rasão.

Ora, sr. presidente, nós não tratâmos de adiamento, nós queremos antes de tudo começar a discutir e esclarecer esta questão para chegarmos ao fim.

Quantas vezes, de accordo com o governo, se adia a discussão de um projecto?

Isto acontece em todos os parlamentos.

O digno par, o sr. conde de Bertiandos, deseja ser esclarecido sobre aquelle ponto, que citou na sua moção, e eu não ouvi uma unica palavra ao sr. ministro do reino, nem ao sr. relator da commissão, que o esclarecesse, e, portanto, peço á maioria d’esta camara que de a sua opinião sobre o assumpto, e diga se nós temos ou não rasão.

O caso em discussão é sobre o conflicto que se póde dar entre as duas camaras; como se resolve?

Desde que se publicou e votou, o bill é lei do estado, e Contendo o bill a reforma da camara dos pares, projecto hoje modificado pela camara dos senhores deputados, dado o conflicto entre as duas camaras, como é que se resolve a duvida do sr. conde de Bertiandos?

Pelo projecto primitivo dó governo sabe-se como se resolvia.

A camara dos senhores deputados fez uma emenda a esse artigo, e já não é o chefe do estado, como no projecto primitivo, que resolve o conflicto; hão de reunir as duas camaras e por maioria de votos é que o conflicto ha de ser resolvido.

Pergunto eu agora:

Qual é o principio que vigora?

E o artigo do projecto primitivo, ou aquelle que foi approvado pela camara dos senhores deputados?

Desejo esclarecer-me sobre este ponto. Eu peço ao sr. relator da commissão que esclareça este ponto.

Como se ha de resolver o conflicto na hypothese apresentada pelo digno par, o sr. conde de Bertiandos?

É pelo projecto que já passou na camara dos senhores deputados, ou pelo projecto primitivo que era considerado lei do estado?

Depois das explicações dadas sobre este ponto eu verei que tenho a dizer.

O sr. Presidente: — Tem a palavra, mas sobre a moção, o digno par, o sr. conde do Bomfim.

O sr. Conde do Bomfim: — Sr. presidente, a minha moção é a seguinte.

(Leu.)

O artigo 57.° diz o seguinte.!

(Leu.)

De onde se conclue que para entrar em discussão é necessaria uma previa votação da camara.

Em harmonia para com o regimento é que eu apresento

Página 140

140 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

a minha moção, porque desejo ser coherente com as minhas opiniões.

Diversos projectos têem vindo a esta camara e têem passado aqui sem uma proposta de adiamento.

Portanto, este projecto, a meu ver, e segundo a minha opinião, passaria da mesma maneira sem que o adiamento venha preterir, a discussão do projecto.

Repito, porque assim o tenho feito em relação aos outros projectos, seguirei a mesma, pratica.

Como se estava em duvida se seria resolvido o adiamento, e eu quero ser coherente, e não desejava que o adiamento viesse prejudicar a questão principal, por isso fiz esta proposta. Mas a camara é soberana, e eu respeitarei as suas decisões.

Leu-se na mesa a seguinte moção do sr. conde do Bomfim, e foi admittisa á discussão.

Moção

A camara considera adiamento a proposta apresentada como questão, previa para resolver o conflicto das duas camaras que em harmonia com o artigo 57.° seja consultada a camara. = Conde do Bomfim.

O sr. Conde de Lagoaça: — É extraordinario, é phantastico o que se está passando.

Póde o digno par sr. conde do Bomfim invocar quantos artigos quizer para fundamentar a sua proposta, elle é que não a approva, pela muita consideração que tem pelo sr. presidente. S. exa. respondeu ao sr. conde de Thomar que a moção do sr. conde de Bertiandos, quer como adiamento, quer como questão previa, havia de ser votada antes da discussão do projecto. E não está assim perfeitamente liquidada a questão? Elle entende que sim. (Apoiados.)

Louva-se na seriedade de caracter do honrado presidente.

O sr. conde do Bomfim teve as melhores intenções certamente, mas o facto é que apresentou uma moção que se póde interpretar como um voto de censura á mesa. Por isso ellle não a póde approvar, porque entende que a mesa, na honrada pessoa do seu presidente, deve ser sempre acatada, sendo elle, como s. exa. é, incapaz de saltar por cima da lei.

Agora deseja explicar uma interrupção que ia a fazer em aparte quando fallava o digno par o sr. Francisco Costa.

S. exa. disse como se diz no Barba Azul: «isto nunca se viu cá».

O que é facto é que nunca se viu um projecto d’esta ordem.

O artigo 5.° do projecto estabelece o que se ha de fazer no caso de haver conflicto entre as duas camaras sobre a approvação de qualquer projecto.

Ora, é evidente, que, não tendo nunca vindo ao parlamento, durante o& taes quarenta annos de que o digno par fallou, projecto nenhum contendo disposições similhantes ao que se discute, ninguem se lembrou de perguntar o que se havia de fazer no caso de que se trata, mas agora que vem este projecto, era natural que ao nosso espirito occorressem quaesquer duvidas, e tão justas ellas são, que ha já a este respeito quatro opiniões differentes.

Parece-lhe que isto é logico, ou então não ha logica.

Dizia n’uma das ultimas sessões o sr. ministro da guerra, respondendo a algumas observações que ella tinha feito, que ou era lógica, o que s. exa. dizia ou então não havia logica.

Respondêra a s. exa.: é que já não ha logica.

Mas, isto parece-lhe mais claro do que agua, mesmo do que a agua de Canecas, e por isso insiste na questão levantada pelo sr. conde de Bertiandos, á qual o sr. relator do projecto não respondeu com uma unica palavra.

S. exa. disse que considerava a proposta do sr. conde de Bertiandos como um adiamento, e que como adiamento não a podia acceitar.

Ora, não é disso que se trata. .

A proposta do sr. conde de Bertiandos é uma questão previa.

Nós queremos ser elucidados sobre um ponto em que;emos duvidas.

(Interrupção do digno par sr. conde do Bomfim, que não se ouviu.)

O sr. Presidente: — Peço ao digno par que não interrompa o orador.

O Orador: — A camara quer saber o que se ha de fazer, caso o projecto seja, rejeitado.

Estar a discutir uma cousa sem saber o que se discute, não lhe parece que seja regular.

Resumindo,, dirá que a camara até este momento não sabe o que se ha de fazer, se o projecto for alterado ou rejeitado.

O sr. ministro do reino disse uma cousa, o digno par sr. Francisco Costa disse outra, e o sr. conde do Bomfim ainda outra.

Em que se fica?

É o que pergunto á illustrada maioria d’esta camara.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o entregar.}

O sr. Presidente.: — Como o digno par sr. conde de, Bertiandos é o auctor da. proposta, que está em discussão, não tenho duvida de dar a palavra a s. exa. pela terceira vez.

O sr. Conde de Bertiandos: — Se está mais algum digno par inscripto, eu fallarei depois.

O sr. Presidente: — Está unicamente inscripto o digno par.

O sr. Conde de Bertiandos: — Só para explicações, e v. exa. comprehendeu perfeitamente, a minha moção; era uma questão previa e não, um adiamento.

(Interrupções dos srs. condes do Bomfim e de Lagoaça, que se não ouviram.}

O sr. Presidente: — Peço aos dignos pares que não interrompam o orador.

O regimento, só permitte que os membros da camara e ministros usem das palavras: «apoiados» «ou ouçam», durante as discussões.

Outras interrupções, com permissão do orador, estão, admittidas pela praxe, mas de modo que não tornem as. discussões desordenadas e tumultuosas.

O sr. Conde de Lagoaça: — Ouçam! Ouçam!

O Orador: — No meu animo não havia o intuito de adiar a discussão do projecto, embora o resultado natural fosse o adiar-se pelo tempo necessario para que se votasse a questão previa.

Em todo o caso não houve proposta de adiamento fundada nas rasões do artigo 57.° do regimento.

Esse artigo não trata das questões previas; não comprehendo para que se trouxe para aqui o artigo 57.°, que diz o seguinte.

(Leu.)

Esta discussão não é conveniente ao bem do estado?

Sr. presidente, peço licença á camara para ligar no meu espirito esta phrase com a ponderação do sr. ministro do reino: «Tomem cuidado que o ministro do reino tem de saír».

Então será por isso, sr. presidente, que não é conveniente ao bem do estado que nós discutamos.

Não é conveniente ao bem do estado, s. exa. não o disse, mas lembrou o artigo 57.°, que diz o seguinte. (Leu.}

O sr. Conde do Bomfim: — Peço a v. exa. que me inscreva sobre este incidente para me justificar.

O Orador: — Desde o momento que eu mostrei qual o artigo em que s. exa. baseava a sua proposta, e não o dividiu em partes, tenho de o discutir todo.

Página 141

SESSÃO N.° 10 DE 25 DE FEVEREIRO DE 1896 141

A primeira parte do artigo é está: «quando não convenha ao bem do estado»; e não é possivel, sr. presidente, deixar de ferir o meu espirito, e ferir de certo o da camara, a lembrança do sr. conde do Bomfim, depois da reflexo do sr. ministro dó reino. Não posso deixar de dizer que me parece melhor discutir a sangue frio, discutir como homens de lei e não como politicos, porque se não trata aqui de uma questão politica.

Não ha rasão alguma para que se altere o modo como s. exa. interpretou o sentido da minha moção.

V. exa. viu perfeitamente o que ella era, era uma questão previa e não um adiamento.

Sr. presidente, disse o illustre relator da commissão, e disse muito bem: «Eu nunca vi n’esta camara tratar-se do que havia de succeder no caso de ser rejeitado um projecto de lei.»

Eu tambem nunca vi, porque até ao presente temos tido leis, temos tido a carta constitucional, essa carta em que parece agora ser pecado fallar-se. Tinhamol-a, que por muitos annos se executou a carta constitucional.

Sr. presidente, fallar na lei fundamental da nação não é ser revolucionario; mas eu já ouvi que certos vivas á carta constitucional eram considerados como tumultuosos!

Nós tinhamos a carta constitucional que, no seu artigo 54.°, dizia o que succederia; e esse artigo estava regulamentado por uma lei, que é aquella a que eu me refiro na minha moção.

Não havia a mais pequena duvida sobre o que succederia. E como havia o sr. relator, nos quarenta annos à que se referiu, ver um caso similhante?!

Não podia vel-o, porque esta circumstancia é excepcional.

É que, n’este momento temos talvez a carta constitucional revogada, e não temos ainda o que a ha de substituir!

Estâmos sem lei? Esta é que é a questão.

Viajâmos com um piloto, que é o sr. ministro do reino, piloto intelligente, de grandissimo valor, mas sem regulamentos.

O barco não tem regulamentos de bordo!

O que succederia no caso de ser rejeitado este projecto, e, sobretudo, no caso de ser emendado o artigo 5.°?

Temos um decreto dictatorial que já foi revogado n’esta parte pela camara dos deputados, ouvido o governo, que entendeu que, na verdade, não era conveniente a primitiva disposição; teriamos tambem a opinião da camara dos pares, e, n’ess4e caso, o que succederia?

O que não quer a camara dos deputados, o que não quereria a camara dos pares, o que não quereria o governo o que ninguem quer? O que todos rejeitaram.

Sr. presidente, isto não é, repito, uma questão politica, nem visa a que saia do gabinete o sr. ministro do reino.

O que havia de ser do governo!

Deus nós livre d’isso!

Eu vinha ingenuamente dizer á camara que me parecia que, ao menos n’este caso, se cumprisse o preceituado na carta constitucional!

Nos outros casos, quando a lei nova já está acceite pelas duas camaras, é differente, e poderá entender-se que não vigora a constituição; mas esta hypothese é unica e precisa de uma solução!

Mas que odio, sr. presidente! Que odio este do sr. ministro do reino á carta constitucional. Dir-se-ia que não é por essa carta que s. exa. está no poder.

Que odio este, sr. presidente. Não se comprehende; quando é certo que o governo occupa essas cadeiras precisamente porque temos... porque temos não... porque tivemos constituição!... Não sei de onde veiu ao sr. ministro tão má vontade; não lhe posso conhecer a origem.

Sr. presidente, vou terminar, porque não quero alongar está discussão, nem azedal-a.

É uma questão simples, propriamente da camara dos pares importa ella a nossa dignidade; mas, todavia, não é uma questão politica. O que eu desejava é que se accentuasse qual era a opinião da camara; que ella votasse fosse o que fosse, mas que tivesse uma opinião para não ficarmos assim à boiar ao acaso.

Tenho dito.

O sr. Presidente: — Está esgotada a inscripção; vae ler-se a moção do sr. conde de Bertiandos.

Tem a palavra o sr. conde de Bertiandos sobre o modo de propor.

O sr. Conde de Bertiandos: — V. exa. fará como entender melhor, mas parecia-me que talvez fosse mais conveniente dividir a moção em duas partes.

O sr. Presidente: — Eu vou consultar a camara sobre se ella permitte que a proposta do digno par seja posta já votação conforme a indicação de s. exa.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

O sr. Presidente: — Vou mandar a proposta ao digno par em vista da manifestação da camara, a fim de s. exa. a dividir como entendei1.

Está posta á votação a primeira parte da proposta do sr. conde de Bertiandos.

Os dignos pares que approvam esta primeira parte da proposta tenham a bondade de se levantar.

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Não está approvada.

Ponho agora á votação a segunda parte da proposta.

Os dignos pares que approvam a segunda parte da proposta tenham a bondade de se levantar.

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Não está tambem approvada.

Está por consequencia rejeitada a proposta do sr. conde de Bertiandos.

Vae entrar em discussão o projecto na sua generalidade.

Permittam-me os dignos pares que eu verifique a inscripção

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Estão inscriptos os dignos pares srs. conde de Bertiandos, conde de Thomar e conde de Lagoaça.

O sr. conde do Bomfim tambem está inscripto para antes de se encerrar á sessão; conceder-lhe-hei a palavra se houver tempo para isso.

Tem agora à palavra o sr. conde de Bertiandos.

O sr. Conde de Bertiandos: — Sr. presidente, trata-se da reforma da camara dos dignos pares do reino, feita em dictadura e justificada por barulhos que houve na camara dos srs. deputados.

É isto o que eu tenho ouvido.

O governo, na sua larga dictadura, entendeu que esses ruidos da outra camara lhe davam direito a modificar muitas das nossas leis, e modificou até a constituição do estado. Não sei para quê...

Eu comprehendia, sr. presidente, que um governo cheio de escrupulos constitucionaes, n’um dado momento, quando visse que á constituição lhe prendia os braços e lhe não permittia que se mantivesse nó poder com vantagem para o paiz, viesse dizer á camara que era impossivel governar com essa constituição; mas um governo que se não deixa prender por artigos constitucionaes, para que quer reformas?...
Para que precisa d’ella?!

Pois o governo rasga a constituição e precisa que nós lh’a reformemos?! Não é necessario. Quando quizer torne a rasgal-a. E lá preciso que se incommodem por tão pouco!

Disse é governo que foi necessario modificar os artigos constitucionaes, porque era indispensavel salvar a constituição.

Sr. presidente, v. exa. não faz idéa como- esta declaração me impressionou.

Estando no meu gabinete, tive junto de mim alguns li-

Página 142

142 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

vros de direito publico; todos me diziam que aã constituições se deviam respeitar. E comtudo não me saia do espirito esta duvida, e pensava eu, mas não será preciso ás vezes violar as constituições para as salvar, não teria o governo rasão?

Se isso é assim, para que serve o estudo do direito publico?

Confesso a v. exa. o meu mau humor n’aquelle mo mento.

Repelli os livros, caíram no chão, e um d’elles, o de Benjamin Constant, abriu-se como para me castigar.

Sabe v. exa. o que elle respondeu ao modo áspero como eu o tinha tratado? Com estas palavras, que eu encontrei nas paginas em que elle se abriu:

«Um governo constitucional cessa do direito de existir logo que a constituição não existe; e uma constituição não existe desde que é violada. O governo que a viola, rasga o seu titulo; a datar d’esse mesmo instante póde subsistir pela força, mas já não subsiste pela constituição. Notae-o bem, estudae os factos e vereis que todas as vezes que as constituições foram viciadas o que se salvou não foram as constituições, mas os governos.»

É Benjamin Constant que o diz.

De certo que o argumento de violar as constituições para as salvar já vem de longe, já se conhecia.

O governo no seu relatorio ia estando de accordo com o que diz Benjamin Constant, pois começou assim o relatorio:

«Senhor. — Feita a reforma da lei eleitoral, e remodelada a constituição da camara dos senhores deputados da nação portugueza, o governo de Vossa Magestade, compenetrado do indeclinavel dever de se manter...»

Dir-se-ia que o proprio governo ia confessar toda a verdade.

Eu não quero alongar a discussão da generalidade do projecto. Desejo dizer alguma cousa sobre os differentes artigos, mas para não enfastiar a camara fallarei depois ou ainda na generalidade, conforme correr a discussão, ou depois na especialidade. Não devo occupar hoje tantas vezes a attenção d’esta camara, que receio cansar. Como v. exa. viu, ou pedi a palavra por ver que não havia ainda ninguem inscripto, e que o projecto ia ser posto á votação. Demais tenho abusado hoje da attenção da camara.

O sr. Presidente: — Estão sobre a mesa os documentos requeridos pelo sr. conde de Thomar, que vieram agora mesmo do ministerio das obras publicas.

Tem a palavra o sr. conde de Thomar.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, trata-se da generalidade do projecto. Sobre ella farei algumas considerações, visto que, concordando com diversas disposições d’elle, todavia o modus fadendi do governo não póde ter a minha approvação.

Quando se tratou do bill declarei que não podia dar o meu apoio ás medidas da dictadura promulgadas pelo governo.

Se o governo entendeu dever tocar na constituição do estado, e n’um dos seus pontos mais delicados, reformando a camara dos pares, tivesse convocado camaras com poderes constituintes e essas camaras que decidissem qual a fórma como devia ser reformada esta camara.

Entendeu o governo fazer larga dictadura e n’esse caminho entendeu não dever respeitar o modo de ser d’esta camara.

Disse o nobre relator da commissão que este projecto é como outro qualquer.

Permitta-me s. exa. que lhe diga que um projecto que ataca a constituição, que reforma a camara dos pares, não é como outro qualquer. É de uma grande importancia e lamento ver as cadeiras dos dignos pares quasi completamente desertas e que não tenhamos hoje um jubileu como succedeu por occasião da discussão do projecto do bill de indemnidade e de resposta ao discurso da corôa.

Por essa occasião esta camara tomou um aspecto imponente e que fazia lembrar os bons tempos, mas passada essa discussão ficámos reduzidos ao grupo regulamentar dos 19.

Sr. presidente, o parlamento tem por assim dizer abdicado completamente os seus direitos.

Antes da ordem do dia um digno par, meu amigo, levantou a questão de não se ter reunido ainda a commissão de guerra para dar parecer sobre um projecto apresentado pelo mesmo digno par a quem me refiro, o sr. conde de Lagoaça.

Ha mais de mez e meio que funcciona o parlamento- e ainda não está constituida a commissão de guerra, e ha quasi um mez que tive a honra de mandar para a mesa um projecto que a camara acceitou com a classificação de urgente.

O projecto era da minha iniciativa, não vinha recommendado pelo governo, ainda que o sr. presidente o acceitasse; a commissão porém, não se constituiu apesar da resolução que tinha tomado a camara.

Porque?

Porque o projecto não partia das cadeiras ministeriaes, mas de um dos membros d’esta camara!

Aqui tem v. exa. a que está reduzida a camara dos pares! E a que decadencia chegou!

Mas, v. exa. verá o que ha de succeder quando chegar a esta camara o projecto de iniciativa do governo sobre as recompensas a dar aos expedicionarios.

É como se carregasse n’um botão electrico, apparecerá logo a commissão, parecer e tudo quanto o governo quizer.

A commissão respectiva reunir-se-ha immediatamente para dar parecer sobre elle e ha de até haver alguem que peça para lhe serem aggregados alguns membros se outros eleitos faltarem, para ella não deixar de se reunir.

Isto, sr. presidente, não é censura á commissão de guerra, é unicamente um aviso ao governo, e especialmente ao sr. ministro do reino, para saber o muito que tem a esperar da sua reforma.

Não concordo com muitas das medidas de s. exa.; é todavia innegavel que s. exa. é hoje um dos homens de mais iniciativa e de mais alta capacidade que nós temos.

Não tenho duvida alguma em prestar-lhe esta homenagem, que é sincera e que não obedece aos cumprimentos da praxe.

Sobre o prurido das reformas direi que continue s. exa. n’este caminho, comparado a um rio caudaloso que leva adiante de si tudo quanto encontra, continue, sr. ministro do reino, que v. exa. póde fazer o que quizer, que o paiz pacientemente tudo soffrerá.

Póde v. exa. ámanhã propor a dissolução d’esta camara, que ha de ser muito bem acceita e recebida, porque não vejo por parte da camara iniciativa alguma de opposição ás medidas de dictadura e ao ataque feito á constituição da camara.

Que a camara approve a dictadura com relação ás medidas de administração, comprehende-se; mas approvar o acto praticado pelo governo com relação á propria camara, é ter muita dedicação ministerial e pouco amor á vida e á independencia, que lhe cumpre defender.

Sr. presidente, aqui cita-se sempre o que se faz lá fora; pois parece que os srs. ministros não lêem o que se passa nos outros paizes.

Vejam s. exas. o que se passa na Itália n’este momento? Lá não são só os membros da camara que se dirigem ao chefe do gabinete; são os proprios collegas que reagem contra o presidente do conselho, e que lhe dizem: «a constituição antes de tudo; respeite-se a constituição; convoque-se o parlamento».

O presidente do senado dirige-se ao presidente do conselho e diz-lhe:

«A primeira cousa a fazer é reunir a camara no tempo

Página 143

SESSÃO N.° 15 DE 25 DE FEVEREIRO DE 1896 143

marcado pela constituição para evitar serios perigos para as instituições.»

Entre nós, porém, o parlamento levanta arcos de triumpho ao governo que ataca a constituição, e nós votámos a nossa morte.

Onde está o patriotismo? Onde estão esses homens, e ainda os ha n’esta camara, que com as armas na mão atacavam os governos de outras epochas, porque não lhes davam bastante liberdade, porque a constituição de 1842 não era sufficiente? Diziam que eram governos de oppressão os d’essa epocha; e então pegava-se em armas, e agora vota-se tudo.

Pois alguns d’esses homens, dessa epocha, que ainda estão n’esta camara, levantam agora arcos de triumpho ao governo, que atacou a constituição d’esta camara e a constituição do estado! Como tudo está mudado! Como tudo emudeceu!

Diz o projecto do governo ter a pratica mostrado que a parto electiva da camara não tinha rasão de ser.

N’esta parte estou de accordo com o sr. ministro do reino. Diz s. exa. muito bem; nunca se devia ter inventado. Mas pergunto eu: quem a inventou?

Pois então o actual sr. presidente do conselho e o proprio sr. ministro do reino, quando deputados, não defenderam, com a eloquencia da sua palavra, as medidas do então presidente do conselho, Fontes Pereira de Mello?

Acharam s. exas. que era indispensavel fazer-se a reforma da camara dos pares, e como a fizeram?

Pelos meios ordinarios, e não em dictadura, entendeu-se então, mas mal, que com as idéas avançadas do tempo, e exigencias de um partido, era necessario dar a esta camara uma feição diversa?

Isto não é do seculo passado; é de hontem. São os homens da geração moderna; mas são exactamente os homens que defenderam essa reforma, que hoje vem dizer que nada do que se fez presta; que a opinião publica tem-se pronunciado abertamente contra a parte electiva da camara, que a experiencia tem mostrado que a parte electiva não tem rasão de ser, etc.

Mas, pergunto eu: quaes foram as demonstrações que essa parte electiva da camara deu, para ser condemnada pela fórma por que o foi?

Eu nunca vi senão a parte electiva acompanhar todos os governos que a elegeram. Nunca houve o mais pequeno conflicto com ella; era a guarda pretoriana, com ella é que o governo sempre contava, e não com a parte vitalicia, porque essa, dizem os governos, — tem o seu logar certo e não se sabe como votará. Quer dizer que é independente.

Portanto, quaes foram as circumstancias que se deram, depois de uma curta experiencia, para condemnar essa parte electiva?

Foi o governo quem a creou, e depois, não sei porque rasão, vem aconselhar a camara a que deve mandar passeiar a parte electiva, porque não offerecia bastantes garantias!

O que se vê é que entre nós, infelizmente, ha o prurido de reformar. Não ha ministro nenhum que, passando pelas cadeiras do poder, não queira deixar o seu nome vinculado a uma reforma; e como o sr. ministro do reino tambem queria fazer reformas, lembrou-se então de reformar a camara dos pares. Pergunto, porém, a s. exa.: a camara dos pares fica em melhores condições do que estava? Não, evidentemente.

Sr. presidente, eu não voto este projecto porque o reputo inconstitucional, e para demonstrar a minha proposição, se quizesse, não tinha mais do que fazer um extracto das opiniões expostas no livro do sr. conde do Casal Ribeiro, e assim mostrava do modo mais eloquente que o projecto é inconstitucional.

Este projecto é um ataque á constituição do estado e ataca a dignidade da corôa.

O projecto primitivo, como ainda agora acabei de dizer, dava a solução de qualquer conflicto entre as duas casas do parlamento ao Rei.

Esse decreto sobre a reforma da camara foi apresentado a Sua Magestade, e por elle ficou sabendo o chefe do estado que ficava por essa reforma o arbitro de qualquer conflicto parlamentar, com o que o Rei concordou.

O governo entendeu que devia dar ao chefe do estado attribuições excepcionaes, e depois sujeitou este projecto á apreciação da camara dos senhores deputados, que entendeu, e muito bem, que as camaras é que são soberanas e representam o paiz, e modificou esse decreto na parte em que o Rei era o arbitro em caso de conflicto entre as duas camaras.

E pergunto eu agora: Pois o governo queria transformar o chefe do estado em chefe de partido?

Em que situação ficava o chefe do estado quando se desse qualquer conflicto?

Ou havia de ir com a opinião do governo e ser partidario do governo A ou B, ou então havia de votar contra, e decidindo contra, evidentemente retirava a sua confiança ao ministerio.

O chefe do estado nunca póde ser partidario deste ou d’aquelle governo, e é sempre inconveniente envolver a corôa em questões partidarias. O chefe do estado é o fiel da balança, e com a sua imparcialidade faz o que mais convenha aos interesses da nação, e não se póde inclinar mais para o governo A do que para o governo B.

Sr. presidente, este projecto, permitta-me o nobre mi nistro do reino que lhe diga, é inexequivel, não lhe quero chamar absurdo, mas é inexequivel.

Como é que o governo comprehende uma camara de pares com numero fixo?

Desejo que o nobre ministro do reino, que eu vejo tomar apontamentos, me explique o seguinte: dado o caso que o governo preencha as vagas que póde preencher pela nova organisação da camara, pergunto, qual é a situação em que fica o governo que vier depois de s. exas.?

Não creio que s. exas. supponham que hão de ficar eternamente n’essas cadeiras.

Esse governo vem á camara dos pares e acha naturalmente um exercito, mas um exercito inimigo que de todos os pontos o ataca. E que ha de fazer esse governo?

Vae ao chefe do estado e diz-lhe: «Nós não podemos governar sem maioria, não podemos nomear pares que a lei o não permitte; por isso damos a demissão. Isto não é pratico. Ou então permitta Vossa Magestade que lhe proponhâmos uma nova reforma da camara dos pares». É fatal esta solução.

Desejava saber como é que s. exa. entendeu poder tornar exequivel esta reforma de uma camara vitalicia com numero fixo.

Não voto este projecto porque o julgo inexequivel.

A camara que o vote, se se quer suicidar. Só no nosso paiz se dará este caso; porque lá fóra, em todas as nações cultas, vejo eu que o parlamento reage sempre quando lhe querem atacar as suas prerogativas. São todos por um e um por todos. Aqui é o que se vê.

Pelo projecto era discussão ficará a camara dos pares reduzida a uma perfeita chancella do governo.

Outra observação me occorre, sr. presidente, observação que aliás a todos occorre; é a seguinte:

Onde é que o governo, que affirma o seu proposito de assegurar as instituições, viu que para isso era necessaria a reforma da camara dos pares? Então a camara dos pares tem sido até aqui um perigo para as instituições?!

Eu perguntarei ainda: onde é que os governos e as instituições monarchicas têem achado o seu melhor esteio? Foi sempre na camara dos pares.

E como é então que o governo foi atacar o elemento mais conservador do paiz! (Apoiados.)

É isto o que eu não comprehendo. Comprehendia-se

Página 144

144 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

sim, que os srs. ministros quizessem reformar um elemento desordeiro. Mas este não é o caso.

De maneira que o governo, para cortar certas difficuldades com que luctava, e a que esta camara era completamente estranha, fez esta reforma em dictadura; com o que não resolveu nem resolve nada.

Eu nunca approvaria uma reforma da camara dos pares, mesmo sobre bases conformes com as minhas idéas, feita em dictadura; mas, emfim, se esse fosse o meio de manter ás instituições, ainda poderia dar-lhe o meu voto.

O que, porém, o governo fez é injustificavel.

Sr. presidente, a rasão por que eu não desejo tomar mais tempo á camara com a discussão d’este projecto, é porque entendo que na realidade não vale a pena discutil-o a fundo; por isso que o governo que vier, seja elle qual for, ha de fazer necessariamente uma outra reforma da camara dos pares.

Sr. presidente, ha innovações neste projecto que realmente não «e explicam.

O que quer dizer nomear b governo delegados especiaes para tomarem parte nas discussões de determinados projectos de lei?

Pois então os srs. ministros passam a si proprios o diploma de incapacidade?

Sc o governo pretende ser auxiliado nas discussões de certos projectos, faça o que fazem outros paizes.

Crie o governo os logares de sub-secretarios d’estado representados pelos secretarios geraes, cargos politicos e não vitalicios como succede entre nós.

Vermos, porém, entrar n’esta casa uru official de secretaria ou um cavalheiro qualquer, que não pertence ao parlamento, para tomar parte nas discussões de determinados projectos, parece me que não é cousa muito regular e que o ministro abdica da sua alta posição e vexa a camara.

Isto não é serio.

Faço justiça aos srs. ministros.

S. axas. acceitando o logar em que estão foi porque se julgaram com a necessaria competencia e capacidade para defender os projectos que elaboram e apresentam ao parlamento.

Não sei, pois, o motivo por que se estabelece no projecto que s. exas. poderão nomear delegados para tomar parte na discussão de alguns projectos.

Não comprehendo.

Sr. presidente, a hora está a dar, e declaro que não desejo ficar com a palavra reservada.

O sr. Presidente: — V. exa., querendo concluir o seu discurso, póde continuar a fallar.

O Orador: — Eu não mando emendas para a mesa, porque sei que serão rejeitadas.

Depois do que se passou n’esta casa com relação ao projecto de resposta ao discurso da corôa e ao bill de indemnidade, é evidente que a camara marcha de accordo com o governo. Somos só tres, inutil luctar contra a força do numero.

Terminando, peço ao governo que modifique alguns dos artigos do projecto, principalmente o que diz respeito ao numero de pares do reino, e tambem o que trata da nomeação de delegados especiaes para tomarem parte nas discussões de determinados projectos de lei.

Este artigo deve ser eliminado.

Esta innovação será uma cousa muito bonita, mas não me parece decorosa nem para o parlamento, nem para o governo.

Tenho dito.

É lido na mesa um officio ao ministerio das obras publicas, acompanhando uns documentos pedidos pelo digno par o sr. conde de Thomar.

Foram mandados entregar a s. exa.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — O digno par o sr. conde do Bomfim tinha pedido a palavra para explicações, mas eu não posso conceder a palavra a s. exa., porque já deu a hora.

O sr. Conde do Bomfim: — Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se me concede a palavra.

O sr. Presidente: — A hora já deu, e por isso eu vou encerrar a sessão.

O sr. Conde do Bomfim: — N’esse caso, peço a v. exa. que me inscreva para o primeiro dia de sessão.

O sr. Presidente: — Fica inscripto o digno par.

A proxima sessão será ámanhã, 26 do corrente, e a ordem do dia a continuação da que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e tres minutos da tarde.

Dignos pares presentes a sessão de 25 de fevereiro de 1896

Exmos. srs.: Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Condes, de Bertiandos, do Bomfim, de Carnide, de Gouveia, de Lagoaça, de Macedo, de Magalhães, de Thomar; Visconde de Athouguia; Moraes Carvalho, Serpa Pimentel, Arthur Hintze Ribeiro, Cau da Costa, Ferreira Novaes, Palmeirim, Cypriano Jardim, Sequeira Pinto, Costa e Silva, Margiochi, Gomes Lages, Baptista de Andrade, José Maria dos Santos, Pessoa de Amorim.

O redactor = Urbano de Castro.

Rectificação

Na sessão n.º 14, de 21 de fevereiro, na pag. 128, linha 7.ª onde se lê «era possivel a exteriorisação criminal», leia-se «era punivel a exteriorisação criminosa».

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×