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SESSÃO N.° 15 DE 30 DE AGOSTO DE 1905

moraveis Côrtes que fizeram uma constituição mais liberal ainda que a constituição republicana dos Estados Unidos da America, houve um Deputado que sustentou que a melhor lei de liberdade de imprensa era nenhuma lei de liberdade de imprensa.

Hoje, em Portugal, nenhum Par ou Deputado poderia fazer semelhante afirmação, sem ficar logo considerado republicano vermelho.

Pois sendo corrente e proclamado nas proprias Côrtes, que o paiz não elege, que quem elege é o Governo, não será selvagem negar ao paiz até o direito de desabafar pela imprensa?

A primeira cousa de que o povo portuguez precisa nas circumstancias em que nos encontramos, é que o deixem falar á vontade.

Nem a chamada lei das rolhas, nascida de um projecto verdadeiramente liberticida, que levantou contra Costa Cabral o paiz inteiro, pôde supprimir o jury nas questões de imprensa!

Que vontade não teriam de morrer outra vez Herculano ou o Garrett se uma subversão das leis naturaes os trouxesse de novo ao mundo, e vissem os seus artigos de imprensa sujeitos ao criterio de um policia?

Estamos mil vezes peor que no antigo regimen, no tempo em que o absolutismo era instituição official em Portugal, porque a censura então era exercida por uma corporação de que faziam parte homens os mais distinctos da capital!

Os trabalhos litterarios não estavam á mercê do policia mais ignaro.

Ainda havia uma corporação que por privilegio especial era isenta de fiscalização official, que era a Academia Real das Sciencias!

Os livros de Paschoal José de Mello, o primeiro jurisconsulto do seu tempo, senão o primeiro de todos os tempos em Portugal (Apoiados), se não fora o privilegio que tinham os socios da Academia Real das Sciencias de imprimir sem censura provia, não teriam visto a luz da publicidade, por causa das suas opiniões acêrca dos direitos do imperante civil circa sacra.

Se ha momentos em que o paiz com a publicidade corre perigo, suspendem-sem as garantias por decreto.

Agora suspender todos os dias as garantias como meio ordinario de administração, ter os jornaes á mercê do mais reles beleguim, poderá admittir-se na Turquia.

Mas, em Portugal, é pelo menos vergonhoso.

Pois ha receio de que os jornaes em Portugal, em plena paz, ponham em perigo a segurança publica, ou a segurança seja de quem for?

Entende o Sr. Ministro da Justiça que em vez de punir os crimes de imprensa, é melhor começar por prevenil-os!

Mas então tambem a policia ha de andar todos os dias a apalpar as algibeiras dos lisboetas para ver se levam alguma arma com que possam attentar contra a vida do seu semelhante; e assim tornaremos a justiça exclusivamente preventiva!

Ora, a justiça é essencialmente repressiva. Os poderes publicos abatem-se, quando entram n'um caminho que é contra a lei e contra a razão.

A portaria de 4 de dezembro de 1904, salvo o meu respeito pelo seu auctor, de nada serve, porque é contra lei expressa. Interpretar as leis é attribuição exclusiva das Côrtes; e a referencia da mesma portaria á celebre lei de 13 de fevereiro era bem dispensada.

Nas affrontas ás liberdades sempre especializamos a liberdade de imprensa porque é essa a que se ouve melhor, e á liberdade de imprensa que principalmente se atiram os Governos, porque é essa a que se queixa mais alto.

A imprensa é o clarim de guerra, é a sentinella vigilante de todas as outras liberdades. Por isso todos os dias lamentamos as offensas ou os ataques á imprensa, e nos esquecemos de velar pelas outras liberdades politicas e civis.

Pois não temos hoje uma só liberdade, quer constitucional quer individual, que não esteja á mercê do poder executivo!

O proprio direito de propriedade está sacrificado aos caprichos dos Governos.

Sabe a Camara de quem são hoje as propriedades desde Sacavem até Cascaes?!

São do Ministerio da Guerra; e em parte do Ministerio da Marinha, do Ministerio das Obras Publicas e até do Ministerio da Fazenda.

Hoje por uma portaria, ou por um simples despacho, qualquer Ministro constitue uma servidão na propriedade alheia. E qual é a causa de tudo isto ? E que nós temos Governos de oppressão, e não Governos de opinião; e o peor é que já nos familiarizámos com esse estado.

No relatorio que precede os tres memoraveis decretos de 16 de maio de 1832, que reorganizaram a administração, a fazenda, e a justiça, Mousinho da Silveira, o primeiro rovolucionario portuguez em materia economica, dizia ao Imperador: e Senhor. O systema de opprimir para governar não acabou com Filippe II, e tem governado constantemente o reino".

Effectivamente os publicistas não conhecem senão dois meios de governar. Ou a oppressão, ou a opinião. E indiscutivel que entre nós não governa a a opinião: logo governa a oppressão!

Com cerca de oitenta annos de vida constitucional, é triste. Mas é o que é.

Não se governa hoje de espada desembainhada e de baioneta calada, porque não é preciso. Mas as liberdades não estão menos opprimidas pela falta d'esses meios violentos.

Não damos hoje um passo para qualquer acto da vida civil sem a intervenção da auctoridade publica.

Começa pela base do systema representativo. Em regra, ninguem é sequer recenseado sem attestado do regedor e do parocho ou de outro elemento official.

Para as mais pequenas cousas, é preciso attestado do administrador do concelho e da Camara Municipal.

E quem for eleiçoeiro poderá dizer as dificuldades com que lucta para obter esses attestados o eleitor, que não é da politica de quem está de cima.

Emfim já chegámos á perfeição de serem os Ministros que despacham os officiaes de diligencias, que foram sempre nomeados pelo Presidente da Relação sobre proposta, do juiz de direito da comarca!

Os unicos funccionarios que os Ministros ainda não nomeiam, são os andadores das almas! (Risos).

Por ora, estas nomeações são feitas pelas irmandades.

Para isto teem concorrido não só os Governos, mas todos os cidadãos portuguezes da escola do - não me importa -.

E a conclusão de estarmos vivendo ha largos annos com a maxima de que cada um cuida de, si e ninguem de todos!

Vou terminar.

Pedi a palavra unicamente para dizer a minha opinião a respeito da questão dos tabacos, que é pelo regimen da liberdade.

Mas pelo correr da discussão vi-me obrigado, bem contra minha vontade, a entrar n'outra ordem de considerações, do que peço desculpa á Camara. (Vozes: - Muito bem).

(S. Exa. foi muito cumprimentado).

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - O Sr. Veiga Beirão é a favor ou contra?

O Sr. Veiga Beirão (depois de uma pequena pausa): - A favor.

O Sr. Presidente:- Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Francisco Beirão: - Se não fosse o grande respeito que tenho pelo Sr. Presidente e a consideração que me merece a Camara, começaria por accentuar o serio embaraço em que me encontrei para responder se me inscrevia a favor ou contra, porque ainda,