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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO em 17 de fevereiro de 1864

Presidencia do Ex.mo Sr. Silva Sanches

Presidente supplementar

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 36 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a resposta dada por Sua Magestade ao presidente das côrtes geraes, na occasião de apresentar ao mesmo augusto senhor o auto do reconhecimento do Serenissimo Principe Real. A leitura d'este documento já se fez á camara, mas como foi transcripto na acta que se está lendo, por isso chamo a sua attenção sobre o ponto em que está o sr. secretario.

(A camara ouviu de pé a leitura do referido documento.)

Terminada a leitura, o sr. presidente pergunta á camara se queria que se declarasse ter sido ouvida com especial agrado (apoiados geraes).

O sr. Presidente: — O digno par o sr. conde de Castro, vice-presidente d'esta camara, não póde comparecer hoje á sessão por incommodo de saude, e encarregou-me de participar á camara que a deputação, que apresentou a Sua Magestade a resposta ao discurso da corôa, foi recebida com a costumada benevolencia.

Passa-se á correspondencia.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Mencionou a seguinte correspondencia.

Um officio da presidencia da camara dos srs. deputados, acompanhando uma proposição fixando a dotação de Sua Alteza o Serenissimo Principe D. Carlos Fernando, successor do throno d'este reino.

O sr. Marquez de Vallada: — Faz o mesmo requerimento que fiz a respeito das dotações das Senhoras D. Estephania e D. Maria Pia, para que este projecto seja votado por acclamação, e sem dependencia de parecer da commissão. Este projecto fixa a dotação do Principe Real, em quem se fundam todas as nossas esperanças, e cujo nascimento foi recebido com o maior jubilo pela nação.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sinto muito, sr. presidente, não poder nta occasião unir o meu voto ao do digno par o sr. marquez de Vallada, para que a proposta de lei seja já votada sem ir á commissão; e bem assim não posso approvar o referido projecto. Acho que, posto seja uma obrigação das côrtes conceder e estipular uma dotação ao Principe Real, comtudo entendo que não é no momento em que, segundo as condições da humanidade, o Principe é, como todos os outros, uma debil creancinha, que se lhe deve votar uma dotação especial para o seu estado, nem para quaesquer despezas, porque nem tem representação, nem faz despezas; é pois muito cedo para que se lhe conceda a dotação proposta.

Quando for tempo proprio não terei duvida em votar esta dotação, ou maior se for necessario, mas no momento actual é extemporanea, e entendo que, posto seja do nosso dever manter o esplendor do throno, para que não falte o preciso para a sua dignidade; todavia temos tambem outro dever que igualmente nos punge, que é olhar para o estado do paiz.

Quando, sr. presidente, se estão fazendo emprestimos quasi todos os annos, não para emprezas novas de obras publicas que venham a ser productivas, mas em grande parte para occorrer ás despezas correntes e ordinarias, que em cousa alguma se diminuem, como é pois que estas despezas se podem augmentar sem necessidade, cujo resultado serão novos impostos sobre o povo?

Tenho, sr. presidente, explicado a rasão do meu voto, por consequencia nada mais tenho a dizer senão que só votarei augmento de despeza quando for indispensavelmente necessario, e que se não possa prescindir d'ella; agora, segundo entendo, não se dá este caso, por isso não posso approvar nem a proposta do sr. marquez, nem o projecto de lei a que ella se refere.

O sr. Miguel Osorio: — Pedi a palavra quando ouvi o requerimento do sr. marquez de Vallada com o fim de o impugnar. Sinto discordar da opinião de s. ex.ª Se se trataste, como creio que é o pensamento de s. ex.ª, de uma manifestação de respeito e consideração para com o throno, e só d'isso, eu votaria como s. ex.ª, mas ha mais alguma cousa. S. ex.ª propõe o que nós não podemos nem devemos fazer. Esta camara tem por muitas vezes dado provas do seu respeito e consideração pelo throno, e n'isto não faz mais do que acompanhar o paiz nos seus mais leaes sentimentos monarchicos para com o throno constitucional, garantia da nossa independencia e fundamento das nossas liberdades. Parece-me pois que não é precisa mais esta manifestação, nem me parece que a proposta do digno par possa preencher o fim que elle deseja, pois que, quando houvesse necessidade de mais uma manifestação á esta camara, não era votando por acclamação a dotação do Principe Real, que ella se havia de basear.

As acclamações indicam a fraqueza dos argumentos, não se podem propor, podem sim nascer espontâneas. Propostas e aceites parecem mais o receio da discussão, ou o esquecimento de um dever.

Eu tenho uma opinião que quero apresentar, sr. presidente; entendo que nenhum objecto quer seja da maior ou menor magnitude se póde votar por acclamação, sem que uma commissão dê o seu parecer, sem que entre em discussão para ver se alguem o impugna, para que nós possamos emittir a nossa opinião conscienciosa. E nós vemos que já ha duvidas, pois que o sr. visconde de Fonte Arcada contesta mesmo a utilidade da dotação para o Principe Real. Eu pela minha parte não partilho essa opinião, penso que o Principe deve ser tratado conforme o seu decoro pessoal e cathegorico, e não em relação á sua idade; mas cada um póde ter a sua opinião, e o que me parece é, que os corpos legislativos devem dar solução bem pensada aos assumptos que se lhes apresentam. É por estes principios que não concordo com a opinião de s. ex.ª e não approvo a proposta do sr. marquez de Vallada, sem comtudo a querer desconsiderar, pois que respeito os sentimentos que a dictam, e porque tenho pelo throno e por tudo o que o cerca o mesmo respeito que s. ex.ª tem. Por consequencia o que me parece é que nós não devemos approvar este projecto por acclamação, e fique este aresto de occasião tão solemne, para nunca se admittir um tal principio.

E agora peço licença ao sr. marquez para fazer uma objecção; parece me que não pertencia a s. ex.ª, sempre tão respeitador do throno e dos nossos principios constitucionaes, apresentar esta proposta, que me parece que só a exageração politica póde suscitar. Recordo me que na constituinte, em França, apresentou se um projecto para pagar as dividas do rei, e n'essa occasião um dos membros que representavam as idéas mais exaltadas, propoz que se votasse por acclamação, fossem quaes fossem as dividas, sem entrar na sua origem. Como se tratava de pagar as dividas do rei, paga-se se tudo fosse como fosse. Estou persuadido que nós em todas estas questões devemos considerar o decoro do throno e a necessidade que tem de meios para sustentar esse decoro; mas devemos tambem considerar as circumstancias do paiz.

Voto pois contra o requerimento do digno par, e estimarei ver que a minha opinião não seja interpretada de outro modo, se não como desejo, de que as deliberações d'esta camara, sejam sempre tão graves e pensadas, como convem á camara dos dignos pares.

O sr. Marquez de Vallada: — Respondendo cortezmente ao cavalheiro muito estimável e amigo, o digno par o sr. Osorio, disse que, fazendo esta propostas seguiu o mesmo caminho que tinha seguido com outras proposta analogas. Dando esta manifestação que julga dever dar de respeito para com o throno, mostra o que sente pela pessoa de Sua Magestade El-Rei, como a completa aversão que tem sempre mostrado a toda a especie de adulação. Constantemente sustenta n'esta casa as regias prerogativas, e ainda ha poucos dias disse que havia de defender sempre as prerogativas do rei, reinando pela carta e com a carta; e por isso já se vê que não pertende dar uma manifestação de adulação, mas sim de respeito e consideração que deseja sempre dar ao monarcha, sem comtudo d'elle pertender nada, pois não pede cousa alguma ao soberano. Ha de continuar a dar estas provas de respeito ao rei, ás instituições constitucionaes, e á dynastia da Senhora D. Maria II, representada hoje por El-Rei o Sr. D. Luiz I.

O orador entende que, quando se apresenta uma proposta d'esta ordem, é pratica ser votada logo. Entretanto que fizesse o sr. presidente o que melhor entendesse em sua sabedoria.

Posta a votos a proposta, foi rejeitada.

O sr. Ferrão: — Mando para a mesa o parecer da commissão sobre um projecto de lei, vindo da camara dos srs. deputados que tem por objecto a dotação do Principe Real.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu.

O sr. Presidente: — Quer a camara discutir já este projecto, ou quer que se imprima?

O sr. Seabra: — Este projecto parece-lhe que não precisa de séria attenção para ser estudado, e por isso entende que póde sem inconveniente dispensar-se a sua impressão, e ser já discutido (apoiados).

Ha pouco votou contra a proposta de ser este mesmo projecto votado por acclamação, porque rejeita essa fórma de votação seja em que caso for (apoiados). A camara não tem direito de fazer leis por acclamação. A acclamação quer dizer prejuizo do voto singular, é pôr uma mordaça na bôca de qualquer que deseje emittir opinião contraria á dominante; é portanto opposta a todos os principios e contra a carta. O direito da camara limita-se a dispensar a impressão e as formalidades regimentaes (apoiados). Assim não se prejudica o voto de ninguem, e qualquer que tenha duvidas, o que não julga se dê n'este coso, póde apresenta-las. O que deseja é que se proceda legalmente e conforme os principios da constituição. N'estes termos pois pace ce-lhe que é agora occasião de se dispensar a impressão do projecto para entrar já em discussão.

A camara senão consultada resolveu que entrasse já em discussão.

Entrou em discussão o

PARECER N.° 325

A commissão de fazenda, a quem foi presente o projecto de lei n.º 352, que tem por fim a fixação da dotação do Principe Real o Senhor D. Carlos Fernando, é de parecer que, na conformidade do artigo 81.° da carta constitucional da monarchia e da carta de lei de 23 de abril de 1845, que o mencionado projecto de lei deve ser approvado por esta camara, para que reduzido a decreto das côrtes geraes suba á real sancção.

Sala da commissão, 17 de fevereiro de 1864.= Francisco Simões Margiochi = Felix Pereira de Magalhães = Barão de Villa Nova de Foscoa = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão.

PROJECTO DE LEI N.° 352 Artigo 1.° A dotação de Sua Alteza Real o Serenissimo Senhor D. Carlos Fernando, Principe Real, é fixada na somma annual de 20:000$000 réis pagos pelo thesouro.

Art. 2.° A referida dotação será contada desde o auspicioso nascimento do mesmo Serenissimo Senhor, que teve logar a 28 de setembro do anno proximo findo. Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. Palacio das côrtes, em 13 de fevereiro de 1864. = Cesário Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = Miguel Osorio Cabral, deputado secretario = Antonio Eleutério Dias da Silva, deputado secretario.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi posto a votos e approvado.

-Um officio do presidente da junta do credito publico,

enviando para se distribuírem pelos dignos pares oitenta exemplares do relatorio e contas da sua gerencia do anno economico de 1862-1863 e do exercicio de 1861-1862. Mandaram se distribuir.

Outro do conselheiro enfermeiro mór do hospital de S. José, remettendo, para serem distribuidos pelos dignos pares, oitenta exemplares do relatorio e contas da gerencia do dito hospital e annexos, no periodo decorrido de 2 de novembro de 1861 a 30 de junho de 1863. Mandaram se distribuir.

Outro do digno par conde dos Arcos, participando que o seu mau estado de saude o impossibilita de comparecer na camara, sendo este o motivo por que tambem não concorreu á sessão das duas camaras reunidas no dia 11 do corrente para o reconhecimento do Serenissimo Principe Real como successor do throno.

Uma representação de Alexandre Magno de Castilho, segundo tenente da armada, pedindo que esta camara tome em consideração o que allega, quando houver de tomar alguma resolução ácerca de uma representação, que está affecta á commissão de marinha, do primeiro tenente da armado Francisco Teixeira da Silva, relativa á contagem da antiguidade.

Foi remettida á commissão de marinha. O sr. Presidente: — Não ha mais correspondencia. Tem a palavra antes da ordem do dia o sr. Osorio Cabral.

O sr. Miguel Osorio: — Pediu a palavra antes da ordem do dia para participar á camara que por incommodo repentino de saude, posto que passageiro, não póde comparecer na ultima deputação para que teve a honra de ser nomeado, e por isso não acompanhou os seus collegas, como era o seu desejo. Em segundo logar para pedir ser inscripto, a fim de apresentar um projecto de lei.

O sr. Baldy: — É para mandar para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que se peça ao governo pelo ministerio da guerra, que mande, com urgencia, a esta camara uma nota em que se declare as datas dos officios expedidos daquelle ministerio no commandante geral de artilheria ordenando lhe que organisasse os regimentos de artilheria n.ºs 1, 2 e 3, em conformidade com o disposto no decreto de 28 de dezembro de 1862, e as datas dos officios em que o commandante geral de artilheria deu parto ao mesmo ministerio de haver cumprido o que lhe fóra determinado nos officios cujas datas se pedem.

«Requeiro igualmente, que pelo ministerio da guerra, se informe esta camara se já estão liquidadas e encerradas as contas dos extinctos 1.°, 2.° e 3.° regimentos de artilheria. = José Maria Baldy.» Foi approvado.

O sr. Marquez de Vallada: — Sente não ver presente o nobre ministro da justiça, comquanto se ache nas cadeiras ministeriaes o nobre ministro da fazenda; mas não sabe bem como ss. ex.ªs entendem hoje a questão da solidariedade ministerial; e por isso e porque não quer tocar agora n'essa questão, e só desejava obter resposta a algumas preguntas que viera resolvido a fazer ao seu collega, não sabe se poderá dizer o que tencionava. Em todo o caso, deseja interpellar o sr. ministro dos negocios ecclesiasticos e de justiça, relativamente á renuncia feita pelo ex.mo e rev.mo sr. bispo de Coimbra, em consequencia da nomeação do secretario da camara ecclesiastica o sr. padre Monteiro, renuncia que foi mandada á secretaria da justiça e depois para Roma. Consta-lhe que Sua Santidade respondêra que não achava fundamento para conceder a licença para o venerando prelado abandonar a sua diocese; mas isto é nos jornaes que o tem lido, e quer saber ao certo o estado em que se acha esta questão, resolvido a fazer, por occasião de se lhe responder, as reflexões que julgar convenientes.

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — Peço a palavra,

O Orador: — Como o sr. ministro pede a palavra, folgará se s. ex.ª poder dar uma resposta satisfactoria.

Aproveito a occasião do sr. ministro estar presente, para pedir ao governo que tome as providencias convenientes, a fim de que se não repitam casos que desvirtuam o systema representativo como aquelle a que se referem hoje todos os jornaes da capital, pelo qual foi desacatada a magestade do parlamento. Torna se impossivel a emissão da opinião com a liberdade que a carta garante. Desde o momento em que no parlamento póde ser atacado impunemente qualquer representante da nação pelas opiniões que emittir em desempenho da sua honrosa missão, acabou a liberdade. Não quereria (o orador) que se chegasse a epochas similhantes aquella em que Cromwel entrou no parlamen-

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to e fez saír todos os que lá estavam. E por isso limita-se a pedir ao governo que, da sua parte, empregue a influencia moral que deve exercer sobre a sua maioria, para que scenas d'estas se não repitam. É um desdouro das instituições e do systema representativo da carta e da justa liberdade, que deve ser mantida e respeitada por todos, e principalmente pelo governo.

O sr. Presidente: — Vão ler-se os nomes dos dignos pares que hão de fazer parte da deputação que ha de ir apresentar a Sua Magestade o autographo do decreto das côrtes geraes sobre a dotação de Sua Alteza Real o Principe D. Carlos.

O sr. secretario leu, e são os seguintes:

Ex.mos srs. presidente, conde de Peniche, marquez de Niza, marquez do Pombal, marquez da Ribeira, marquez de Vallada, marquez de Vianna.

O sr. Ministro da Fazenda: — Como o digno par, o sr. marquez de Vallada, que deseja interpellar o sr. ministro da justiça sobre o assumpto que referiu, e a proposito fallou da solidariedade ministerial, julga dever observar que não lhe parece que seja opportuno tratar-se n'esta occasião d'essa materia. O governo ha de manter esta solidariedade nos casos e todas as vezes que o deva ser.

Quanto á interpellação, recorda que as praxes parlamentares são, que quando qualquer membro das camaras quer dirigir uma interpellação ao governo, manda para a mesa a competente nota... (O sr. Osorio: — Apoiado.) a qual é depois communicada ao governo, e este marca o dia era que póde vir responder a ella. Portanto póde o digno par mandar a sua nota de interpellação para a mesa, a fim de seguir os tramites devidos.

E pelo que respeita ao facto a que se referiu depois o digno par, parece-lhe que é alheio aos assumptos de que se tem que occupar esta camara (apoiados). Foi um facto todo pessoal. O sr. ministro não estava na camara n'essa occasião, mas consta-lhe que depois de fechada a sessão houve uma questão entre dois cavalheiros.;Não é pois negocio que deva aqui ser tratado (apoiados). E uma questão toda pessoal, com que esta camara e o governo não têem nada (apoiados).

O sr. S. J. de Carvalho: — Tinha pedido a palavra sobre este incidente, mas em vista das reflexões apresentadas pelo sr. ministro, não tenho nada a dizer. De fórma nenhuma póde vir aqui esta questão (apoiados).

O sr. Presidente: — V. ex.ª tinha tambem pedido a palavra antes da ordem do dia.

O Orador: — Não tem assistido ás ultimas sessões por motivo de doença, e isso privou-o da occasião de mandar para a mesa uma nota de interpellação por vezes annunciada em relação ás eleições de Villa Real. Podia manda-la hoje, mas não o faz, porque pésa sobre o seu espirito uma circumstancia importante. Esta questão tem sido agitada na outra casa do parlamento; mas do que a imprensa tem dito a tal respeito, chegou a convencer-se que ha por parte do governo idéa de adiar a questão até que se saiba o resultado da syndicancia que, segundo se diz, o governo mandou fazer. Para elle, orador, não é isto official, e não póde continuar a ver pospor questões gravissimas, como aquella a que se referiu, e que a camara, como parte dos poderes publicos, deve considerar sem demora, pois é uma questão de principios, essencialmente de principios.

Não tem por isso duvida alguma em mandar para a mesa um requerimento, no sentido de que seja convidado o sr. ministro do reino a vir a esta camara dar explicações relativas ao assumpto de que se trata. S. ex.ª, segundo lhe consta, está na outra casa do parlamento; pede por isso á mesa que queira convidar, o nobre presidente do conselho e ministro do reino, a que venha a esta camara para o fim indicado, e a que declare se póde vir já. Era muito conveniente que s. ex.ª viesse quanto antes, pois este negocio tem levantado muitas apprehensões no espirito publico, e esta camara deve estar anciosa de ouvir as explicações de s. ex.ª sobre elle. Formulando o seu requerimento, que lhe parece escusado escrever, disse que o concebia n'estes termos:

«Requeiro que pela mesa Beja convidado o sr. ministro do reino a vir já a esta camara dar explicações sobre as eleições de Villa Real.» Uma voz: — Já?

O Orador: — Já, sim senhor. Lembro-me que na sessão passada, em um negocio relativamente pequeno, na questão do Douro, o digno par o sr. José Izidoro Quedes, mandou para a mesa uma nota de interpellação, e depois exigiu que pela mesa se convidasse o ministro respectivo a vir a esta camara responder. A camara esperou que o sr. ministro viesse dar as explicações exigidas. Vejo entrar o sr. José Izidoro Quedes, o que estimo, pois s. ex.ª póde dar testemunho do que acabo de dizer. O digno par insistiu para que fosse convidado o governo a vir dar explicações sobre a questão do Douro, a camara esperou que o ministro viesse, este veiu e deu as explicações. Assim pois, se a camara esperou então, tambem agora póde esperar.

Concluiu pedindo ao sr. presidente que pozesse á votação o seu requerimento.

O sr. Presidente: — Queira o digno par escreve lo e manda-lo para a mesa.

O sr. S. J. Carvalho: —Lê e manda para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que pela mesa seja convidado o sr. ministro do reino a vir a esta camara dar explicações sobre os acontecimentos de Villa Real com relação á questão eleitoral d'aquelle districto. = Sebastião José de Carvalho.»

Foi admittido á discussão.

O sr. Osorio Cabral: — Peço a V. ex.ª o obsequio de tornar a mandar lêr na mesa o requerimento. O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu.

O sr. Osorio Cabral: — Sr. presidente, as palavras do digno par, que tendem a apresentar a sua opinião ácerca d'este requerimento, fizeram-me pedir a palavra, e eu sinto ver-me na necessidade de a pedir em todas estas questões que se apresentam. Não é desconsideração pela camara, é a necessidade que sempre tem um membro, que entra de novo no parlamento, de se explicar para assim conhecerem os seus collegas, quaes são as suas idéas.

Parece-me que isto era mais materia de uma nota de interpellação, do que requerimento, para que pela mesa se convidasse o sr. ministro do reino a vir aqui dar explicações que se desejam ouvir, ou então eu não entendo nada de praxes parlamentares.

O espirito do regimento não póde ser outro, senão o de qualquer digno par formular as suas propostas ou notas de interpellação sobre que deseja ouvir o governo, e este depois apresentar-se com aquella franqueza e lealdade com que os membros dos governos representativos costumam tratar as questões nos parlamentos.

Portanto, parecia me que se seguiria melhor caminho se o digno par, com aquella franqueza e lealdade com que costuma entrar em todas as questões, formulasse a sua nota de interpellação, desejando ouvir o governo a este respeito.

Os factos têem sido discutidos na outra casa do parlamento; os documentos estão quasi todos publicados, e por isso parece-me que as explicações são faceis de dar por parte dos srs. ministros, quando se sigam os tramites parlamentares e as praxes sempre adoptadas nos corpos legislativos. Portanto, sr. presidente, parece-me que esta minha opinião é aceitavel, tanto mais quando eu entendo que todos os dignos pares o que desejam e o que querem é que as discussões corram plácidas, tranquillas e com verdadeiro conhecimento de causa, a fim de assim poder abrir ao governo o campo conveniente e necessario para vir aqui dar as explicações, como elle as entender, principalmente em questões d'esta gravidade.

O caminho da proposta não me parece conveniente, e em harmonia com o que as praxes parlamentares indicam, parecia-me que devia ser considerada como nota de interpellação.

Ouvi tambem dizer ao meu amigo e nobre collega, o sr. Sebastião José de Carvalho, que era necessario que a camara esperasse pelo sr. ministro do reino, para vir aqui hoje emittir a sua opinião a este respeito. Parece me que foi isto o que disse o digno par.

Não vejo isto na proposta, e se não entrou assim no animo de 8. ex.ª não fallarei mais n'esse ponto...

O sr. Presidente: — Direi a V. ex.ª que na proposta não está nada d'isso.

O Orador: — Então n'esse caso nada mais tenho a dizer, concluindo que entendo dever ser considerado como uma nota de interpellação.

O sr. S. J. de Carvalho: — Não entra na questão de ser ou não este requerimento considerado uma nota de interpellação; se a camara o considerar assim não se opporá. O seu fim era não annunciar esta questão com a formula de interpellação, para não vir o adiamento indefinido da resposta do sr. ministro; por isso é que deseja que s. ex.ª venha responder já; se não poder vir já, mandará dizer quando vem.

Observou que tinha dito o digno par que estava presente o governo, e que o sr. ministro da fazenda não duvidava de certo tomar a responsabilidade d'esses factos; mas que apesar de s. ex.ª estar presente, ainda o não disse; põe mesmo duvida que a tome, porque estava presente o governo n'esta camara, quando sè fallou na questão de Villa Real, perguntou-se quem tomava a responsabilidade d'aquelles acontecimentos, e nenhum dos srs. ministros respondeu, nenhum disse quem era o responsavel.

O nobre orador teme que se queira illudir a opinião publica; que se queira illudir a esperança do parlamento, principalmente com o adiamento indefinido de uma questão tão grave. Esta camara não o póde consentir, e se o consentir, elle orador, ao menos ha de protestar sempre contra isso.

O que pede é que seja expedido pela mesa o seu requerimento ao sr. ministro. Se s. ex.ª não poder vir, dirá quando vem; se vier hoje, espere-se. Se não vier hoje, virá outro dia para responder a essas preguntas. Mas que não se levante a sessão sem que a mesa expressa um officio ou aviso para que o sr. presidente do conselho venha responder.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente o governo não quer sophismar principio nenhum constitucional, e está prompto a responder por todos os seus actos. Portanto parece me menos bem cabida a apprehensão do digno par, que deu a entender que o governo poderia de alguma maneira esquivar-se a responder á interpellação de s. ex.ª

Estou intimamente convencido que o meu collega, o sr. ministro do reino, se apressará a vir a esta camara para responder á interpellação do digno par. Parece-me que a camara fará n'este ponto a devida justiça ao meu collega.

O governo não vive do sophismar, vive pela verdade.

N'esta questão ha dois pontos distinctos; ha um sobre a validade das eleições municipaes, este acha se fóra da alçada do parlamento e do governo, por isso que compete aos tribunaes administrativos julga-lo; e ha outro que é relativo aos actos praticados pelos agentes do governo, pelos quaes este é responsavel. Portanto n'esta parte o governo ha de tomar a responsabilidade que lhe compete, e responder ás interpellações que lhe forem feitas. O meu collega já disse na outra camara que, pelo que respeita aos actos das auctoridades, havendo asserções e documentos encontrados, julgára opportuno mandar proceder á syndicancia a fim de conhecer a verdade dos factos. Effectivamente assim o fez, não obstante dizer-se que o magistrado nomeado para syndicar se recusára a isso, o que não é exacto. Porque o nobre duque de Loulé de certo não teria dito ao parlamento que tinha encarregado um magistrado de fazer esta syndicancia, se effectivamente se desse o caso que elle tivesse declinado a incumbência.

Quiz assentar a questão nos bons verdadeiros termos, mas entendo que não é occasião opportuna de a tratar; nem a camara quererá, antes de communicada a nota de interpellação e seguidos os tramites legaes, entrar n'ella. O que disse é simplesmente para que a camara saiba que da parte do governo se tem procedido regularmente, e que não ha a menor duvida em tomar a responsabilidade que lhe póde competir, e que apenas a nota de interpellação seja communicada ao meu collega elle se apressará em vir responder.

O sr. Izidoro Guedes: — Nos termos em que está formulado o requerimento parece lhe este regular, porque esta camara está no seu direito perguntando nu governo o uso que elle faz das attribuições do poder executivo; e não é só do seu direito, é tambem do seu dever.

Mas que a proposta não póde ser considerada senão como interpellação, e que não vê motivo para o digno par o seu amigo o sr. Sebastião José de Carvalho dizer, como disse, que venha já aqui o governo responder.

Que sendo, como é, interpellação, os termos são outros, parecendo lhe que não ha urgencia, nem a patria corre perigo em que a interpellação não tenha hoje logar.

Que nem a proposta está concebida em termos de tal urgencia, nem quando o estivesse camara a podia approvar sem parecer precipitada, e sem se desviar das praticas da mesma camara e da sua indole pausada e reflectida.

Que o assumpto da interpellação não era novo, que ha mais de um mez o digno par auctor da moção aqui fallou n'elle, que na discussão do discurso da corôa, occasião propria para se apreciar o assumpto, nada se disse ácerca d'elle; que não via portanto nenhum facto novo para se exigir que o governo fosse convidado a vir hoje mesmo á camara entrar n'um tal assumpto.

Que todos o» membros da camara desejavam de certo occupar-se d'elle, e que elle orador pela sua parte não tem a menor idéa de o querer adiar; que deseja ao contrario que seja tratado quanto antes, mas sem se dar a esta discussão nenhum caracter de precipitação.

Que approvando portanto a proposta, não póde concordar nos commentarios, ou nas observações que fez o digno par; que vota a proposta nos termos, em que está escripta, que não a desviam da marcha ordinaria, embora o convite seja feito com urgencia; que não foi só esta a rasão que o moveu a pedir a palavra, mas tambem o haver dito o seu illustre collega, que se tinha apresentado um precedente, em que elle orador tinha sido o que requerera que o governo aqui viesse logo responder.

Pede perdão ao digno par por dever dizer-lhe que com quanto elle orador pedisse n'uma occasião solemne, em que povoações inteiras no Douro estavam na mais viva agitação que o governo fosse convidado a vir com urgencia á camara informa-la do estado em que estava aquella parte importante do paiz; se bem se recorda não se votou que o governo viesse immediatamente e no mesmo dia; pois que entrando n'esse momento o nobre visconde de Sá da Bandeira, este informou a camara de que o nobre duque de Loulé estava a chegar á camara, e foi por isso que ella ficou alguns momentos esperando a presença do presidente do conselho; e não se dando as mesmas circumstancias quando mesmo o precedente existisse, elle não era applicavel ao caso presente.

O sr. Marquez de Niza: — Disse que o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, na primeira vez que fallou, deu a entender que o seu desejo era requerer que se convidasse o sr. presidente do conselho para vir em acto continuo, immediatamente, responder á pergunta que lhe desejava fazer. Entretanto o digno par não formulou assim o seu requerimento. Ouviu depois fallar o digno par o sr. Miguel Osorio e agora o sr. Isidoro Guedes, os quaes lhe parece terem dado diversa interpretação ao requerimento de s. ex.ª O que pedia pois ao digno par era, que formulasse bem claramente o seu requerimento, para que depois não haja duvidas sobre a sua interpretação; aliàs receia que a votação fique duvidosa.

Pede portanto ao digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, que se a sua intenção é que o sr. presidente do conselho venha aqui já para responder á pergunta de s. ex.ª, formule o seu requerimento n'este sentido, clara e explicitamente, para não dar logar a ambiguidades.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o requerimento do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, para que os dignos pares se possam bem compenetrar do seu sentido. O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu o. O sr. Presidente: — A camara acaba de ouvir lêr o requerimento do digno par. Parece-me que não diz que o sr. ministro do reino seja convidado a vir aqui immediatamente.

O sr. S. J. de Carvalho: — Explicando o sentido do seu requerimento, disse que aquillo que queria pedir era, que o sr. ministro fosse convidado já, e a camara esperasse pela resposta de s. ex.s Se o nobre ministro não podesse vir, designasse o dia em que o deviamos esperar. Mas se alguns dignos pares entendem que o sentido do requerimento está ambíguo ou duvidoso, tratará de o formular mais terminantemente, e foi mesmo para isso que pediu agora a palavra. Requer que seja convidado o sr. ministro desde já; e pede ao digno par, o sr. secretario, a bondade de acrescentar estas palavras ao requerimento.

O sr. Izidoro Guedes: — Pede perdão ao digno par para declarar que, se o requerimento de s. ex.ª é tal como está, se é para o governo, ou o sr. presidente do conselho aqui vir quando puder, não duvida votar por elle; se porém o seu sentido é para estarmos em sessão permanente até que

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a. ex.ª venha, então com licença do digno par ha de votar contra.

O sr. S. J. de Carvalho: — Envia-se já, e espera-se a resposta.

O Orador: — Isso não póde ser.

O sr. S. J. de Carvalho: — A dignidade da camara assim o requer.

O Orador: — A dignidade da camara exige que, convidado um ministro a vir aqui responder immediatamente, sejam cumpridos os seus desejos; e em que posição se colloca a camara, se o sr. ministro por qualquer inconveniente não vier? Concluia-se a seu ver, muito bem, alterando se o requerimento, ou dando-se-lhe o sentido obvio que offerece, e não a intelligencia forçada, segundo o desejo de cada um. Isto é, que seja convidado desde já o sr. presidente do conselho a vir a esta camara com urgencia, mas não se declarando quando.

O sr. Rebello da Silva: — Eu não pedi a palavra sobre este assumpto, direi comtudo poucas palavras ácerca d'elle.

Julgo que a intenção do digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, é exprimir o desejo de que este negocio se trate com urgencia; o desejo da camara, segundo o que ouvi no correr da discussão, é igualmente que o sr. ministro não falte; parece-me portanto que o melhor a fazer, é enviar a s. ex.ª a nota de interpellação, e o nobre ministro dirá quando póde responder. Não nos achámos em um caso de suprema salvação publica, em que a camara deve declarar a sessão permanente. Creio que o sr. ministro, depois d'este debate acatará a propria dignidade vindo aqui, ou declarando em que dia póde apresentar-se.

Mas eu tinha pedido a palavra para mandar para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que seja convidado com urgência o sr. ministro das obras publicas para responder sobre a interpellação que desejo dirigir-lhe ácerca do seguimento que s. ex.ª se propõe dar á questão da liberdade dos vinhos do Douro.

«Sala da camara, 17 de fevereiro de 1864. = O par do reino, L. A. Rebello da Silva.»

Era este o fim principal para que eu estava inscripto.

O sr. S. J. de Carvalho: — O digno par que acaba de fallar abunda exactamente nas idéas d'elle Orador. S. ex.ª entende que o governo deve ser convidado já, porque elle por dignidade propria ha de responder se póde ou não vir. Parece-lhe pois que não póde haver inconveniente em esperar a resposta do sr. ministro; e isto não quer dizer que ficámos em sessão permanente á espera de s. ex.ª (Vozes: — Não está na outra camara). Isso é que nós não sabemos (Uma voz: — Já saíu do edificio). Pois póde ser que agora esteja. Eu peço a V. ex.ª que ponha á votação o meu requerimento, acrescentando-lhe a phrase que lhe vou acrescentar, pedindo permissão para assim o fazer.

O sr. Miguel Osorio: — Não sei se depois do requerimento ter sido apresentado na camara póde soffrer qualquer alteração sem o consentimento d'ella? O requerimento, na minha opinião, é já do dominio da camara, V. ex.ª porém sr. presidente, que tão sabiamente dirige os trabalhos, deliberará o que julgar conveniente e justo. Acerca do debate tenho ainda a dizer duas palavras.

Se o governo ha de vir já, ou logo, se ha de vir, ou mandar dizer quando vem, isso é uma questão que só a elle pertence. Que nós havemos de esperar por uma resposta, isso é que é um facto, mas o que tambem é verdade é que nós não devemos aqui estar á espera que o governo formule uma resposta declarando se vem já ou quando vem. Eu ouvi aqui fallar em dignidade do governo em responder immediatamente, e na dignidade da camara em esperar que elle se apresente a responder. Eu pela minha parte pertendo declarar, que o que me parece da dignidade da camara é não collocar o governo em posições forçadas. Difficilmente mantem a sua dignidade quem não cura da doa mais. O meio mais facil de obter respeito e consideração, é respeitar os outros. Que faria esta camara se o governo se não apresentasse immediatamente? Consideremos a consequencia dos passos que damos para os não darmos precipitados.

Sr. presidente, peço perdão a V. ex.ª e á camara se fallei um pouco mais alto do que o meu costume, e em conclusão direi: se apparecesse um requerimento para se pro-rogar a sessão estando o sr. ministro presente, declaro que havia de votar por elle, mas não estando presente, não posso admitti-lo, quando de mais a mais o requerimento não é claro, distincto e preciso, por isso que temos duvida sobre o que elle quer dizer. O auctor do requerimento diz = a intelligencia que eu dou á minha moção é esta =; vem depois outro digno par e diz = a intelligencia que eu dou ás palavras do requerimento é esta =. De sorte não sabemos o que o requerimento quer dizer. Pela minha parte não quero ter a vaidade de apresentar á camara a minha opinião, como unica a seguir; ella sabe melhor do que eu o que ha de resolver. O que me parece é que a questão não póde continuar sem uma nova decisão da camara.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o additamento que o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, fez ao seu requerimento.

Leu-se e foi admittido á discussão.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu faço tenção de votar pelo requerimento do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, porque entendo perfeitamente qual a intelligencia que lhe dá o digno par, seu auctor. Nada pois direi mais a este respeito, limitando me tão sómente a fallar ácerca de algumas expressões que foram proferidas pelo sr. ministro da fazenda. Eu não sei se escrevi exactamente as suas palavras, e por isso peço a s. ex.ª que me emende, se errar.

O nobre ministro disse, a respeito das celebres eleições de Villa Real, que o governo tinha mandado syndicar sobre o que se havia passado; que a questão da validade da eleição da camara municipal pertencia aos tribunaes, e que esta camara nada tinha isso; mas o caso não é só este. Parece-me, sr. presidente, que desgraçadamente está começando uma epocha similhante a outras antigas, que eu não quero recordar á camara. Eu vejo nas obrigações que nos são impostas pela carto, a nós membros do corpo legislativo, que devemos promover o bem geral da nação, e vigiar pela guarda da constituição. Para que o possamos fazer é necessario que tomemos conhecimento de tudo que se passa no paiz. Estes acontecimentos de Villa Real têem dado brado em toda a parte, têem se feito sentir de um a outro angulo do paiz. Não ha pois duvida que as garantias constitucionaes são desprezadas, e que o cidadão quando quer usar de um dos direitos mais sagrados que lhe confere a carta, não o póde fazer; é necessario que se saiba como isto é. Eu estimo muito que o digno par se lembrasse de fazer o seu requerimento para que a camara, como parte do poder legislativo, tome conhecimento, que lhe cumpre, d'estes factos, como ramo do poder legislativo, o velar sobre a guarda da constituição.

Sr. presidente, é para mim uma grande tristeza o ver que se vão repetindo acontecimentos d'esta ordem; o que isto mostra é o desprezo que se tem pelas garantias constitucionaes do cidadão, e que se fechem os olhos ás consequencias que podem resultar d'este desprezo.

Sr. presidente, é notavel que sendo os actuaes ministros conhecidos pelos esforços que outr'ora fizeram, até com a espada na mão, para sustentar os direitos inherentes á qualidade de cidadão de um paiz livre, pondo-se á frente da reacção armada contra quem os desconhecia; o que só póde ser desculpável para conservar illesos estes mesmos direitos; é notavel, repito, que façam agora o mesmo que antigamente combateram!

Sr. presidente, os partidos vivem das suas convicções, da estabilidade das suas opiniões e dos seus principios. A liberdade da eleição era o principio invocado pelo partido representado hoje por pessoas que consentem todos estes excessos, irregularidades e attentados de que nos queixámos contra essa mesma liberdade. Eu não sei, na verdade, como é que os partidos, aberrando constantemente das suas convicções e da sua profissão de fé politica, podem existir e merecer conceito. Urge pois que se procure pôr termo a este desgraçado estado de cousas, que póde transtornar a ordem publica, de que tivemos desgraçados exemplos.

Tendo pois expressado assim a minha opinião, não posso deixar de votar por este requerimento, com o additamento que lhe fez o seu auctor.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, peço a V. ex.ª que mande lêr o additamento. (Satisfeito, proseguiu.)

Estou disposto a votar o requerimento do digno par, o sr. S. J. de Carvalho, emquanto annuncia ao sr. ministro do reino uma interpellação sobre os acontecimentos que tiveram logar por occasião das eleições no districto administrativo de Villa Real. Estou disposto a votar esse requerimento, porque me parece regular, mas voto-o no sentido litteral e obvio do que significam as suas palavras, sem os commentarios estranhos que acaba de lhe fazer o seu auctor. Entendendo que V. ex.ª ha de executar a deliberação da camara pela maneira por que está concebido o mesmo requerimento. Agora o que não estou disposto a votar é o additamento.

N'esse additamento diz se: «que o sr. ministro do reino communicará á camara, com urgencia, se vem ou não. Isto alem de menos delicado e menos conforme á regra da boa cortezia que a camara de certo ha de querer guardar para com o sr. ministro do reino, parece-me que não está em harmonia com os principios constitucionaes. O exigir do sr. ministro uma resposta affirmativa ou negativa é impor de certo modo uma coacção moral. Se os poderes politicos são iguaes, segue-se que nem o poder executivo é superior ao poder legislativo, nem este é superior aquelle, portanto esta camara que é apenas um dos ramos do poder legislativo, não póde determinar a um ministro, que compareça immediatamente, nem exigir d'elle que dê uma resposta similhante. Por consequencia eu votarei contra esse additamento. Mas ha mais. Esse additamento não póde ser votado pela camara senão na supposição de que o sr. ministro não quer vir, o que a camara não póde suppôr. Entendo que s. ex.ª ha de vir, e quanto antes, pela sua propria dignidade, como disse o sr. Rebello da Silva; mas o entender que o sr. ministro ha de vir, não nos auctorisa a exigir d'elle que dê immediatamente uma resposta. Se houvesse um caso extraordinario de que dependesse a salvação da patria, então poderia a camara constituir-se em sessão permanente e esperar pelo sr. ministro, porque a salus populi é a suprema lei, e na presença d'ella, salta-se por todas as formalidades, mas para o caso que se dá, tanto podemos tratar d'elle hoje como ámanhã ou em outro dia. Por consequencia voto pelo requerimento, mas contra o additamento.

O sr. Marquez de Vallada (sobre a ordem): — Acostumado a pedir a palavra quasi sempre depois do sr. Ferrer para contrariar, com a devida cortezia, a s. ex.ª... O sr. Ferrer: — Faz-me sempre esse favor... O Orador: — Porque respeitando, como respeita, a sua pessoa, estamos quasi sempre em desaccordo. O sr. Ferrer: — Menos agora...

O Orador: — Agora tambem (riso), não podia faltar a isso n'esta occasião.

Tem guardado silencio durante esta discussão, mas agora julgou dever pedir a palavra para dar uma explicação, e fazer uma ligeira observação em resposta ao sr. Ferrer.

Parece lhe que s. ex.ª não avaliou devidamente a proposta do sr. S. J. de Carvalho. Todos acreditam que o sr. presidente do conselho deseja vir responder não só a esta, como a qualquer outra interpellação que se lhe dirija; mas s. ex.ª tem mais obrigações a desempenhar e quer-se que elle venha aqui com urgencia responder.

Não crê que a palavra urgencia seja offensiva. Muitas vezes se tem pedido n'esta camara a urgencia de diversos requerimentos, e nunca se julgou que fosse isso desconsideração para a pessoa que a propõe nem para o ministro que tem de responder; por consequencia o sr. S. J. de Carvalho, pedindo a urgencia, não quiz desconsiderar a entidade governo, nem a pessoa do sr. presidente do conselho. Os membros da opposição, tanto d'esta como da outra casa, costumam frequentemente pedir a urgencia de propostas e requerimentos de similhante natureza, porque todos sabem, por experiencia, que muitas vezes certos negocios sendo adiados equivalem a ser abandonados. O sr. Ferrer, como liberal sincero e rasgado, permitta-se a expressão, que foi introduzida ha annos no nosso diccionario, dará por certo todo o peso e valor a que a liberdade seja mantida nos actos eleitoraes. E esta uma questão momentosa que se deve aqui tratar, e s. ex.ª não póde deixar de | reconhecer quaes foram as rasões em que se baseou o sr. S. J. de Carvalho para pedir a urgencia d'este negocio.

O sr. José Izidoro Guedes, de accordo com as suas idéas, já n'outra occasião tratando-se de uma proposta d'elle orador, era sentido mais lato do que a do sr. Sebastião José de Carvalho, foi a primeira pessoa que se levantou para a combater. Teve isto logar por occasião da queda do ministerio da regeneração. Esta proposta porém era diversa; n'ella pedia se aosr. duque de Saldanha que viesse dar explicações sobre a demissão do ministerio, e o sr. José Izidoro Guedes levantou-se e combateu a proposta. Ora, ainda que a proposta do sr. Sebastião José de Carvalho tem um caracter diverso, sendo conforme ás idéas do orador, não póde deixar, de accordo tambem com o seu proceder, de votar pela sua approvação.

O sr. Marquez de Niza: — Não crê que esteja na intenção do digno par fazer progredir a discussão tão longamente que se não possa votar hoje este requerimento; mas a hora está adiantada e receia ver chegada a occasião de terminar a sessão sem que elle seja votado; por consequencia pede que o sr. presidente consulte a camara se quer prorogar a sessão até se votar o requerimento do sr. Sebastião José de Carvalho.

Consultada a camara assim o resolveu. O sr. Ferrer: — Sr. presidente, é para dar uma breve resposta ao sr. marquez de Vallada, pois s. ex.ª declarou que quasi sempre está em opposição com o que eu digo; e certamente n'esta occasião foi por esse espirito de contradição que me quiz combater. Não levo a mal esta antithese, antes folgo com a discussão a que ella dá logar.

Sr. presidente, se o additamento do sr. Sebastião José de Carvalho fosse para o sr. ministro do reino vir com urgencia responder á interpellação, entendo que íhso podia a camara votar; mas não é isso o que se pretende. Peço ao sr. marquez de Vallada que note, que o additamento o que quer é que o sr. ministro do reino haja de dar com urgencia uma resposta a esta camara se vera ou não. Isto não póde ser; não é conforme com as leis da cortezia, e é alem d'isso uma especie de coacção moral, como já disse. Isto não me parece parlamentar; por consequencia, combati o additamento por estar concebido n'este sentido.

O digno par, o sr. marquez de Vallada, suppoz que eu combati a urgencia da interpellação do digno par; são cousas muito diversas. Portanto, declaro ainda que voto pelo requerimento para se verificar a interpellação, e se quizerem, votarei mesmo com urgencia; mas o que não posso votar é que se exija do sr. ministro do reino que mande uma resposta se vem ou não vera. Isso, repito, não é parlamentar; fica á delicadeza do ministro dar ou não essa resposta, mas não é decente exigi-la. A resposta mais urgente que o sr. ministro póde dar, quer o digno par saber qual é? E a presença do sr. ministro n'esta casa.

O sr. Eugenio de Almeida: — Solicita a permissão necessaria para justificar em poucas palavras um pedido que vae fazer, e é, que a camara por meio de uma votação auctorise a mesa, que merece sempre a confiança da camara, para dar a essa proposta que se está discutindo, uma redacção que seja a mais conveniente; de outra fórma parece ser isto interminável, por isso mesmo que n'esta discussão tem entrado já a luta das paixões e do amor proprio que ha em todos os seres humanos, tomando assim um caracter que não deve ter, e que o seu alcance não comporta (apoiados). Pela sua parte declara, que a fórma da proposta ou requerimento que está sobre a mesa merece a sua approvação, tanto maior, na proporção que for mais moderada, mais urbana e mais cortez; porque elle orador, é dos que entendem que uma das primeiras necessidades d'este paiz é que o seu governo esteja revestido de auctoridade e dignidade; e assim, se ha quem esqueça estes principios, se ha fóra d'aqui quem deseje levar o governo a tal ponto de aviltamento, que nos cubra a todos de pejo e vergonha, não póde por fórma alguma querer que esta camara pratique um acto, que com quanto nunca possa em qualquer caso ter similhante alvo, entretanto possa ter uma interpretação similhante.

E por isto que diz que a fórma mais urbana, mais cortez e mais moderada, é aquella que merece a sua mais completa approvação. Ora, conhecendo a mesa perfeitamente quaes são as formas de que se deve usar em taes requerimentos ou propostas, e estando ella sempre superior a qualquer sentimento de paixão ou de amor proprio mesmo, é evidente que a mesa nos dá todas as garantias de que redigirá a communicação do modo que for mais conveniente para se expedir.

Uma voz: — Muito bem.

O Orador: — Em verdade parece mal cabido que pretenda justificar as expressões do digno par que se senta a

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seu lado, o sr. Sebastião José de Carvalho, mas crê que effectivamente se entende que as suas expressões revelavam alguma impaciencia; que pelo menos lhe parecia que estando o sr. presidente do conselho na outra camara, apenas lhe constasse que se manifestava aqui a vontade de o ouvir, elle seria bastante cortez para ter a condescendência de se apressar a apparecer ainda hoje na sala das nossas sessões. Esta foi a interpretação que o orador deu ás observações do digno par; outros porém entenderam outra cousa: mas pela sua parte não póde deixar de dizer que um convite ao governo para que appareça n'uma das camaras com a maior urgencia, a fim de dar certas explicações, é a cousa mais parlamentar que é possivel; é conforme com os estylos e praticas seguidas em todos os parlamentos, inclusivamente no parlamento inglez, que é sempre aceito por modelo, e ahi até se marca o dia em que o governo hade dar as explicações; se elle acha incompatibilidade com outras occupações de serviço, se não está esclarecido para poder logo satisfazer, ou em fim se acha um inconveniente que o impossibilite para essa occasião, promette satisfazer indicando outro dia (apoiados).

Mas o que lá se não vê é que a resposta fique indefinidamente adiada (apoiados). Aqui fazem se as communicações, pede-se a solução ou resposta a questões ás vezes da maior gravidade e espera se dias, mezes e até annos! Consultem-se as actas d'esta camara e da outra, e ver-se-ha que se podem talvez contar aos centos, senão mesmo aos milhares, as notas de interpellações dirigidas ao governo, que ficam sem resposta alguma d'elle! Similhante situação é inaceitável emquanto existir entre nós o governo constitucional, que amo, que todos amam, e que é o unico adequado, mais proprio e conveniente para este paiz.

É necessario que os poderes publicos sejam respeitados na esphera das suas attribuições; mas quando vê empregar certas palavras lisonjeiras, acompanhadas de certos actos irrisórios, lembra lhe Christo com a canna verde, sempre escarnecido por aquelles que o saudavam como Rei da Judea. E um papel justamente que não póde querer que seja aceito pelo parlamento: não o permitte o conhecimento do proprio dever, a obrigação que impoz o juramento que prestou cada um dos dignos pares, e finalmente o sentimento da propria dignidade.

Ouviu o sr. ministro da fazenda dizer que esta questão se reduzia a dois pontos, ou se dividia em duas partes: uma a legalidade das eleições municipaes de Villa Real, outra que dizia respeito aos agentes responsaveis do governo. Quanto á primeira disse s. ex.ª, e com rasão, que ha os tribunaes competentes que hão de conhecer d'esses factos; arredou por consequencia a competencia e jurisdicção da camara sobre esse ponto, e, a seu ver, fez bem; quanto porém á segunda parte disse que o governo tinha mandado proceder a uma syndicancia para verificar se os actos de que são accusados os seus agentes são verdadeiros. O governo procedendo assim, tambem andou bem; crê que ninguem o nega, porque ninguem quererá que elle deixe de procurar defender-se e justificar-se, mas o que elle não póde é tirar d'esse facto pretexto para deixar adiado indefinidamente o dar conta de todos esses actos ás camaras que assim o exigem em virtude do direito que o parlamento tem de pedir a responsabilidade do governo (apoiados).

Assim o orador receia que as palavras do sr. ministro da fazenda signifiquem por antecipação a resposta que o sr. ministro do reino dará; isto é, que tendo mandado proceder a uma syndicancia sobre actos de diversos agentes responsaveis para com o governo, não póde informar a camara! È portanto para protestar contra esta dilação do exercicio do direito parlamentar que pediu a palavra, e conclue por indicar o que lhe parece mais conveniente para acabar bem a questão que tem occupado a camara sobre a fórma de redigir uma communicação, proposta ou requerimento que devendo ser dirigido ao governo, parece que a mesa, tomando esse encargo da redacção, é quem melhor póde evitar qualquer inconveniente e satisfazer a todos (apoiados. — Vozes: — Muito bem).

O sr. Presidente: — Para informação á camara, cumpre-me dizer que se mandou indagar se o sr. presidente do conselho estava na outra camara, e a resposta foi negativa.

Agora segue-se com a palavra o digno par o sr. Izidoro Guedes.

O sr. Izidoro Guedes: — Todos estão concordes na mesma idéa de ouvir as explicações do governo; a divergencia é unicamente sobre os meios que se devem empregar para conseguir tão fundado desejo. A pressa é que, a seu ver, tem prejudicado o proprio intento (apoiados), pois effectivamente se tem gasto muito tempo só com a questão de fórma. E agora, que se sabe que o sr. presidente do conselho já não está no edificio, ainda menos póde perceber para que seja bom insistir em que se espere pela resposta de s. ex.ª Assim, concordando com algumas das idéas do digno par, o sr. José Maria Eugenio, entende (o orador) que tudo se deve reduzir a um convite ao governo, para elle vir responder logo que o serviço publico lh'o permitia. O governo não póde, não deve e de certo não ha de querer recusar se a isso (apoiados).

Agora o que não sabe é se a mesa quererá aceitar o encargo que lhe quer commetter o digno par, o sr. José Maria Eugenio, nem mesmo se o auctor da proposta convirá n'isso; e portanto mando para a mesa outra proposta que, se for admittida, será votada conforme a camara achar que merece.

É a seguinte:

«Proponho que o governo seja convidado, com urgencia, para vir a esta camara, logo que lh'o permitta o serviço publico, para ouvir e responder á interpellação annunciada sobre os negocios eleitoraes de Villa Real. = Guedes

Foi admittida.

O sr. Rebello da Silva (sobre a ordem): — Parece-me que depois de tão longa discussão, o melhor arbitrio é o que propoz o digno par o sr. José Maria Eugenio; a mesa que tome sobre si o avisar o governo pela fórma que sabe ser a intenção e o desejo da camara, isto é, com a urgencia que o caso exige, mas respeitadas todas as conveniencias. O adiantamento da hora nos aconselha mesmo a não pro-seguir; hoje nada mais podemos fazer do que determinar que esta questão se trate na sessão seguinte (apoiados), a qual peço se verifique o mais breve possivel. Avise-se o governo, use-se de toda a deferencia, e estou seguro de que seremos correspondidos; e se o não fossemos seria então o momento de recorrer aos meios que os corpos colegislativos empregam para fazerem respeitar as suas resoluções. Requeiro pois que a sessão seguinte tenha logar o mais breve possivel.

O sr. S. J. de Carvalho: — Surprehende-o a susceptibilidade do digno par o sr. Ferrer; surprehende-o todo este rigor de attenções e deferencias para com a entidade governo! O seu requerimento está condemnado como sendo contrario ás formulas, mas o orador está no seu direito de formular o seu requerimento no sentido que lhe parece mais conforme com a urgencia do caso, urgencia que aliàs tem sido reconhecida por todos; e portanto não deixa de o surprehender tudo isto e a resolução que se quer tomar para abreviar o primeiro dia de sessão, visto que hoje não se póde conseguir cousa alguma, e não se póde, note-se bem, pelos embaraços que.se oppozeram ao requerimento. Mas, elle orador, tambem já sabia, quando mandou para a mesa a sua proposta, que tudo cabia nos limites, isto é, que o sr. ministro nunca se declarava habilitado; por consequencia não se pense que faz questão do requerimento. Basta ter-se levantado sobre elle esta discussão para que o paiz saiba que esta camara deseja ver aqui o sr. ministro do reino (apoiados). Disse ha pouco o sr. ministro da fazenda, por parte do governo, que o seu collega havia de apresentar-se n'esta camara por sua dignidade propria para responder á interpellação; esta declaração de s. ex.ª é bastante para, elle orador, ficar satisfeito. Pois era possivel que depois dos oradores ministeriaes, como o sr. José Izidoro Guedes e outros, terem dito que a dignidade do governo ficava offendida se o sr. presidente do conselho se recusasse a vir a esta camara dar as explicações que ella tem direito de pedir, e o sr. presidente do conselho havia de deixar de dar explicações de que deve ter conhecimento o publico irritado contra o modo como se fizeram as eleições municipaes de Villa Real? Não póde ser.

Disse o orador que não tem vindo a esta camara por ter estado doente, como já declarou no principio da sessão, mas se tivesse assistido á discussão da resposta ao discurso da corôa suscitaria esta mesma questão, porque não acha, como a camara entendeu então, que a resposta ao discurso do throno seja um mero cumprimento dirigido ao chefe do estado, mas sim a occasião mais propria para apreciar a politica do governo. Portanto não havia de deixar passar todos os factos que tiveram logar nas eleições de Villa Real sem interpellar o governo sobre elles, e pedir explicações mui categoricas. Mas não póde vir aquella sessão, nem a outras, pelo motivo que já disse: vem hoje cuidando que o sr. ministro do reino estaria presente; como porém s. ex.ª não compareceu n'esta casa, fez um requerimento para se convidar s. ex.ª a vir aqui com toda a brevidade. E de notar que sabendo o sr. presidente do conselho o desejo que o orador tem de ouvir as suas explicações, não tivesse vindo da-las, pois não sabe como s. ex.ª possa referir se ás suas palavras; comtudo é possivel que, conhecendo a anciedade que tem o orador, e o espirito da camara que se impressionou com esta idéa, s. ex.ª venha quanto antes responder á interpellação; portanto quer o seu requerimento seja refundido como indicou o digno par o sr. José Maria Eugenio, ou modificado como propoz o sr. José Izidoro Guedes, é claro que o sr. ministro do reino não póde vir hoje a esta camara, mas é natural que sabendo o que se passou n'esta sessão se resolva a vir aqui no sabbado, que, segundo o requerimento que fez o seu illustre collega e amigo, o sr. Rebello da Silva, será o primeiro dia de sessão. Em vista d'isto pede licença á camara para retirar o seu requerimento, declarando que a discussão que tem havido não foi esteril, e que d'ella póde resultar a vinda de s. ex.ª (apoiados).

A camara conveio em que o digno par retirasse o seu requerimento, e leu-se o do sr. José Izidoro Guedes.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu não tenho duvida nenhuma de votar pelo requerimento do digno par com tanto que se retire a segunda parte—logo que permittir o serviço publico =. Nós conhecemos que é urgentissimo que o sr. presidente do conselho venha a esta camara dar essas explicações; mas a segunda parte annulla a primeira porque s. ex.ª póde ter outros objectos urgentes de que tratar, e por consequencia não vir a esta camara com a brevidade que julgamos urgentissima.

Eu peço a V. ex.ª que tenha a bondade de tornar a mandar lêr o requerimento do digno par o sr. José Izidoro Guedes.

Osr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu.

O Orador: — Eu voto pela primeira parte sómente.

O sr. Izidoro Guedes (sobre a ordem): — O digno par que acabou ha pouco de fallar declarou que prescindia do seu requerimento, porque era inutil depois da discussão que tem havido. Agora vê com admiração que quando na sua proposta se indica que o governo seja convidado para vir aqui responder á interpellação do digno par, possa alguem impugnar que isso seja sem prejuizo do serviço publico. Pois se o pensamento da camara é que haja com brevidade a discussão da proposta, como poderá a proposta deixar de ser approvada quando está concebida nos termos convenientes da urgencia? Pois esta palavra urgência nao significa o pensamento de todos os oradores? O digno par ha de concordar em que quando se faz qualquer convite aos ministros, com urgencia, como se tem manifestado pela discussão, aquella expressão—logo que o permitta o serviço publico— não é senão para guardar aa conveniencias publicas porque, não sendo assim, havia de marcar-se já o praso em que o sr. presidente do conselho devia apresentar se n'esta casa. Parece-me portanto a proposta curial e expressiva, porque quer dizer que compareça com urgencia e immediatamente, sem prejuizo do serviço publico.

Quem póde assegurar que o serviço publico não inhiba o sr. presidente do conselho, e tambem ministro dos negocios estrangeiros, de comparecer ámanhã n'esta camara? A proposta portanto quer dizer que s. ex.ª venha o mais breve possivel, e logo que o serviço publico lh'o consinta; e n'este sentido não ha demora.

O orador pergunta que interesse partidario, ou outro qualquer poderá haver em mais um ou dois dias de demora para esta discussão?

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a palavra sobre o modo de votar.

O Orador: — Concluindo, pede que se ponha á votação a sua proposta, porque a explicação que deu ha de convencer a camara de que não está nas suas intenções adiar de modo algum a discussão que se deseja.

O sr. Eugenio de Almeida: — Vê que esta discussão progride com demora, e parece-lhe até que se torna inutil o fazer communicação alguma por escripto. Estão aqui presentes dois srs. ministros que têem ouvido os desejos da camara, e se elles se dignassem de encarregar-se de transmittir estes votos ao sr. presidente do conselho, talvez não será preciso mais cousa alguma.

O sr. Izidoro Guedes (sobre a ordem): — Não acha nenhuma vantagem em se prolongar esta questão, e como a sua proposta está em discussão, a camara póde rejeita-la, mas elle orador não a retira.

Antes de pedir ao governo que venha immediatamente, é necessario considerar bem os limites do direito da camara, e se ella tem os meios de conhecer e evitar o abuso com que o governo poderia proceder se achasse a proposta exigente de mais. No parlamento inglez, como bem disse o digno par o sr. Eugenio de Almeida, fixa-se o dia para qualquer moção, mas isto faz-se de accordo com o governo, e quando este declara que não póde comparecer, a discussão não tem logar. Parece-lhe que haveria mau uso nas deliberações da camara se ella exigisse que. o governo, pondo de lado o serviço publico, viesse immediatamente a esta camara para tratar de um assumpto que não é novo, nem tem urgencia.

N'estes termos não lhe parece que haja rasão para o digno par julgar que esta proposta foi formulada com pensamento reservado. Acamara fará o que entender; mas elle, orador, não póde retirar a sua proposta, embora haja de ser rejeitada.

O sr. Ferrer (sobre a ordem): — Vou mandar para a mesa um requerimento, e declaro que não tomarei muito tempo á camara (leu).

Parece-me que todos concordam n'isto, porque é a pratica de todos os parlamentos, e o que se deduz da discussão que tem havido n'esta casa, e não digo mais nada para o sustentar. O meu fim é sómente dar uma fórma, fazer uma redacção aceitavel ao requerimento do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho.

Vozes: — Votos, votos.

REQUERIMENTO

Requeiro que o governo seja convidado a vir, com urgencia, responder á interpellação do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, sobre as eleições de Villa Real.

= Ferrer.

Admittido, e entrou em discussão.

O sr. Izidoro Guedes: — Não percebe bem a differença que ha entre o seu requerimento, e a proposta do sr. Ferrer, para que o governo seja convidado com urgencia, e pergunta se essa urgencia se dá mesmo quando o serviço publico o impossibilite?

O sr. Ferrer: — Está entendido que não.

O Orador: — -Se se entende bem, que quando se convida com urgencia o governo, é sem prejuizo do serviço publico, então não tem a menor duvida em adoptar a proposta do digno par porque ella é igual á d'elle orador, embora difira na redacção. ¦

Em vista d'isto, cede e pede licença á camara para retirar a sua proposta (apoiados).

Foi retirada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, uma vez que o digno retirou o seu requerimento, não tenho duvida, e cedo da palavra.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Ha unicamente sobre a mesa a proposta do sr. Ferrer que é a seguinte (leu).

Approvada.

O sr. Presidente: — Vae ler-se uma proposta do sr. Rebello da Silva.

Leu-se e foi approvada.

O sr. Marquez de Vallada: —Mando para á mesa a seguinte nota de interpellação:

NOTA DE INTERPELLAÇÃO

Desejo interpellar o sr. ministro dos negocios ecclesiasticos e de justiça, relativamente ao conflicto que existe entre o governo e o sr. bispo de Coimbra, sobre a nomeação do secretario da camara ecclesiastica.

Camara dos pares, em 17 de fevereiro de 1864.— O par do reino, Marquez de Vallada.

Mandou-se expedir.

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O sr. Ministro da Fazenda: — Tambem mando para a mesa o seguinte:

REQUERIMENTO

Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos dignos pares do reino permissão para que o digno par Joaquim Larcher possa accumular, querendo, o exercicio de conselheiro do tribunal de contas e vogal do conselho - geral das alfandegas, com o das funcções legislativas.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, 17 de fevereiro de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Foi approvado.

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal) (sobre a ordem): — Sr. presidente, o governo tem a maior vontade de responder á questão que ha pouco se ventilou sobre as eleições de Villa Real, mas como a camara approvou que se respondesse á interpellação do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, e o seu requerimento foi retirado, é necessario agora para o governo responder que a interpellação seja formulada tremo deve ser.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, uma cousa é estar retirada a proposta do sr, Sebastião José de Carvalho, e outra é ser considerada como apagada ou annullada a sua interpellação, porque o digno par adiante a retirou na presença de outras tendentes ao mesmo fim. Alem de que no Diario de Lisboa ha de apparecer a resolução da camara; e portanto se não subsiste a proposta para ser votada, subsiste a idéa, o objecto em todas as propostas posteriores — ama interpellação do sr. Sebastião José de Carvalho sobre as eleições do districto de Villa Real.

Ninguém combateu a proposta da interpellação do digno par. O que se discutiu foi a fórma. Isto é se a interpellação devia ser já; se devia a camara ficar em sessão permanente; se devia exigir-se resposta com urgencia do sr. Ministro ou se elle devia vir quando o serviço publico lh'o permittisse. Tudo isto foi objecto de differentes propostas.

Já se vê, sr. presidente, que toda a questão foi sobre a fórma. A essencia da interpellação ficou sempre intacta. Todos os oradores e proponentes estiveram sempre concordes em reconhecer o direito do digno par para annunciar a sua -interpellação.

Eu não quero interpellar. Quem interpella é o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho. O requerimento vae em meu nome, mas para a interpellação do sr. Sebastião José de Carvalho porque eu não posso requerer senão em meu nome. Porém a camara comprehende que o meu fim foi dar» uma fórma aceitavel ao requerimento do digno par para a sua interpellação.

Agora parece-me que não póde haver duvida nenhuma em que o objecto, para o qual o sr. ministro do reino é convidado a responder, consiste nas eleições de Villa Real.

O sr. S. J. de Carvalho: — O orador tinha declarado que era requerimento anão interpellação a nota que mandou para a mesa, e pediu depois licença para retira-lo, porque tinha produzido o effeito que desejava, uma vez que por parte do governo se declarou, em vista do mesmo requerimento, que o ministro se apresentaria n'esta camara para dar as explicações que se exigiam. Entretanto como a camara Votou a proposta do sr. Ferrer, que não se refere a esse requerimento, não tem duvida nenhuma de mandar parai a mesa a parte que se refere á interpellação, e diz o seguinte (leu).

O sr. Visconde de Soares Franco: — Mando para a mesa dois pareceres da commissão de marinha para poderem ser impressos e dados para ordem do dia. Aproveito esta occasião para pedir a V. ex.ª e á camara que o sr. visconde de Sá seja reunido á commissão de marinha e do ultramar na primeira sessão.

O sr. Presidente: No mesmo officio que te enviar ao sr. ministro do reino se indicará o objecto da interpellação. A ordem do dia para.a sessão seguinte, que será no sabbado, visto não poder haver sessão na sexta feira pela solemnidade do dia, será a apresentação do pareceres de commissões e algum incidente que occorra.

O sr. Miguel Osorio: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente; — Tem a palavra.

O sr. Miguel Osorio: Pedia a V. ex.ª, podendo ser, que desse para ordem do dia da proxima sessão os pareceres que foram apresentados agora pelo sr. visconde de Soares Franco.

O sr. Presidente: — Mandam-se imprimir para serem distribuidos a entrarem em discussão. Está levantada a sessão. Eram quasi cinco horas.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 17 de fevereiro de 1864

Exmos. srs. Julio Gomes da Silva Sanches; Marquezes, de Alvito, de Niza, de Ponte de Lima, de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Alva, da Louzã, de Mello, de Peniche, da Ponte de Santa Maria, de Rezende, de Rio Maior, do Sobral; Bispo de Vizeu; Viscondes, de Benagazil, da Borralha, de Condexa, de Fonte Arcada, de Fornos de Algo ares, da Vargem da Ordem, de Soares Franco; Barões, de S. Pedro, de Foscoa; Mello e Carvalho, Seabra, Pereira Coutinho, Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, F, P. de Magalhães, Ferrão, Margiochi, Moraes Pessanha, João da Costa Carvalho, Aguiar, Ferreira Pestana, Braamcamp, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, José Lourenço da Luz, Baldy, Eugenio da Almeida, Rebello da Silva, Luiz de Castro Guimarães, Vellez Caldeira, Miguel Osorio, Miguel do Canto, Sebastião José de Carvalho e Ferrer.

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