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supremo conselho foi uma necessidade, e appello para o testemunho do digno par o sr. conde de Mello, porque tendo o supremo conselho de justiça militar de consultar sobre os requerimentos dos officiaes era necessario ministrar-lhe todos os esclarecimentos que existem no ministerio da guerra, onde estão todos os livros e informações que podiam instruir os requerimentos dos pretendentes; acordou-se que todos os processos fossem ao ministerio da guerra, para irem d'ali ao supremo conselho instruidos com todas as informações.

Eu tornarei de passagem á primeira questão.

Vejo que se notou que na manifestação do coronel e mais officiaes do regimento de artilheria n.° 4, apparece a seguinte palavra (leu).

Esta palavra significa quasi o mesmo que o digno commandante geral de artilheria, que desejou deixar aquelle serviço, diz na sua ordem de despedida, como eu vou provar (leu).

Estas expressões, proferidas pelo veterano da artilheria, pelo nosso mestre, não podiam ser interpretadas de outra maneira. Quando se diz que se deseja que se faça saír a arma do marasmo em que tem estado, é dizer o mesmo que disse o nosso respeitavel commandante, e por isso não acho n'estas palavras cousa alguma contraria á disciplina, nem em todos os mais documentos a que se referiu o digno par.

Parece-me ter dito o que me cumpria.

O sr. S. J. de Carvalho: — Vê na defeza do illustre ministro a prova mui cabal do rigor de suas apreciações, que tratou de corroborar, pondo em frente dellas as respostas que a camara acaba de ouvir.

Finalmente, sentindo-se fatigado e que não podia continuar, mandou para a mesa a seguinte proposta, para servir de thema á discussão, na qual espera poder tomar parte:

«Tendo alguns officiaes da arma de artilheria feito publica uma manifestação collectiva em abono dos dotes moraes e qualidades militares do general commandante daquella arma;

«Considerando que taes representações ou manifestações collectivas são absolutamente prohibidas pela ordem do dia de 21 de julho de 1816 e regulamento disciplinar de 30 de setembro do 1856, por serem offensivas da disciplina do exercito;

«Considerando que o silencio do sr. ministro da guerra constitue a approvação tacita do taes manifestações:

«A camara dos pares, sentindo que as regras de disciplina e moralidade não fossem attendidas, passa á ordem do dia. = Sebastião José de Carvalho.»

N.B. Publicar-se-hão na integra os discursos do digno par, logo que os haja revisto.

O sr. Baldy: — Observa que a ordem do dia a que se referiu, e que leu o digno par, é menos uma lei do que um conselho; pelo menos, desde 1834 até hoje, sempre se fizeram d'estas felicitações, ou passaram estes attestados, sem que ninguem tenha sido reprehendido, que elle saiba. Algumas se' dirigiram a elle' orador pelos seus subordinados, quer quando foi nomeado commandante geral, quer quando foi levado ao pariato.

O orador, que ama do coração a arma de artilheria a que pertence, não podia deixar passar a aggressão que lhe parecia haver nas palavras do digno par interpellante, sem dizer duas palavras em defeza d'esses officiaes, a quem é devedor dos mais subidos testemunhos do consideração. Esta bem certo de que lhes não roçou pela idéa nem pelo coração a intenção de desvirtua-lo, quando na exposição que aqui se leu inseriram palavras de magua pelo marasmo em que se acha esta nobre arma, precedida de causas que desnecessario lhe parece referir, e que já existiam no seu tempo, como é facto geralmente sabido, o consta de igual queixa por essas ou outras palavras nas felicitações que lhe dirigiram.

Parece-lho que bem fez o sr. ministro em não suspender o general aggredido, porque não ha accusação contra elle de ter commettido, crime; e pelo que respeita á questão em que tem sua origem a discussão actual, tendo, como tem, um caracter duvidoso, preferiria que o digno par interpellante tivesse esperado que se fizesse publica a defeza do general, para que a accusação podesse por ella ser contrastada.

O sr. Conde de Mello: — Não occuparei por muito tempo a camara, no que vou dizer. Eu não tinha idéa de tomar parte n'esta interpellação, mas pareceu-me não dever ficar silencioso desde que o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho começou a alludir ao supremo conselho de justiça militar, por isso que tendo eu a honra do fazer parte d'elle, me julguei obrigado a justificar a maneira porque este tribunal tem procedido sempre nas consultas que tem dirigido ao governo para a concessão de medalhas.

O primeiro decreto, ou para melhor dizer o decreto que creou estas condecorações foi acompanhado de um regulamento que d'elle fazia parte, e marcava o modo porque o tribunal devia proceder para com os requerimentos, o em vista d'estas prescripções, e das circumstancias de cada um, consultava o governo sobre a qualidade e quantidade de medalhas que se deviam conceder; porque se podem dar até tres; isto é, de cobre, de prata, e de oiro, e esta ultima até com pensão. O regulamento determinava tambem que os commandantes das armas especiaes mandassem directamente ao supremo conselho de justiça militar estas supplicas, assim como que os generaes commandantes das divisões militares o fizessem quanto ás dos officiaes que estavam debaixo das suas immediatas ordens, juntando uns e outros os seus pareceres sobre essas pretensões; isto é, se eram bem fundadas ou não.

Logo que o supremo conselho de justiça militar teve conhecimento d'estas novas attribuições que se lhe conferiam; em sessão plena, discutindo o modo porque se devia executar o regulamento, resolveu que os documentos apresentados mais ainda do que os pareceres dos generaes fossem a base em que devera fundar o seu juizo, a fim de que a paixão não tivesse parte na apreciação dos serviços. Era pois sobre os documentos, que o conselho formulou a sua consulta que subiu ao governo. O escrupulo com que o conselho supremo sempre se houve no exame d'esses documentos será reconhecido pela camara, em vista de um pequeno exemplo que eu vou citar.

Apresentou-se entre quinhentos e tantos requerimentos que foram consultados pelo primeiro methodo, o requerimento de um capitão. Esse official apresentava um attestado de assentamento de praça, porque é necessario para se conceder a medalha este attestado tirado do livro de registo; juntava a este documento as boas informações relativas ao seu serviço nos postos de alferes, tenente e capitão, e pedia a medalha correspondente aos serviços que allegava. Eu era o relator n'este processo, e examinando com a attenção devida aquelles documentos, achei tudo bom, desde o posto de alferes até ao de capitão, mas notei que havia uma lacuna desde o dia de assentamento de praça até áquelle em que tinha saído alferes; e como era expresso no decreto que desde o assentamento de praça até ao dia da concessão da medalha a conducta do militar fosse a todos os respeitos illibada, requisitei do governo as informações que faltavam, porque eu queria saber qual havia sido o procedimento do pretendente até ao posto de alferes, e disse no tribunal que emquanto se não provasse que aquelle militar tinha tido sempre boa conducta não se podia fazer a concessão que elle pedia. Effectivamente procuraram-se as informações necessarias, andou-se de corpo para corpo até que a final se achou que sendo sargento tinha tido baixa de posto porque havia commettido um crime gravissimo. A vista d'isto o tribunal consultou que não podia ter a medalha.

As consultas do tribunal foram constantemente approvadas pelo governo, e aquelles quinhentos e tantos militares que assim as pediram todos elles tiveram a medalha que na minha consciencia, e na de todos os meus collegas haviam merecido. Assim íamos procedendo quando appareceu a portaria a que se referiu o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, a qual alterou o segundo artigo do decreto, fundando-se n'uma consulta que o tribunal tinha feito subir ao governo sobre outro objecto, mas que o governo julgou applicavel ao citado artigo, dando por isso mais latitude para a concessão da medalha.

Ora, é necessario que se saibam os motivos o phrases da consulta a que o sr. ministro se referiu n'essa portaria. O caso foi este: O governo havia recebido o requerimento de um capitão de engenheiros, em que pedia o habito de Aviz, porque contava mais de vinte annos de bom serviço; tinha comtudo uma pequena nota, a qual era de que anteriormente a estes vinte e tantos annos de bom serviço, no tempo do usurpador, quando o marechal duque da Terceira chegava a Almada, elle tinha saído de Lisboa e seguido o exercito do usurpador. O tribunal chamado a dar o seu parecer, procedeu aos exames mais minuciosos, e tudo quanto ha escripto sobre a concessão do habito de Aviz aos officiaes, pela determinação da Senhora D. Maria I, alvarás, portarias, emfim tudo quanto n'esta materia foi escripto, tudo foi examinado, o d'ahi se colligiu o seguinte: que em nenhuma das disposições a tal respeito se notava que era preciso que o official que requeria o habito do Aviz tivesse tido desde o seu assentamento de praça, uma conducta tal que não merecesse a mais pequena reprehensão.

Neste sentido consultou o governo, dizendo que não encontrando nenhuma disposição nos referidos decretos e alvarás, que inhibisse os officiaes de obterem estes premios, por terem uma vez commettido uma falta, comtanto que nos ultimos vinte annos o seu comportamento fosse bom; entendia que tendo aquelle official merecido a confiança do governo para o promover a alferes, passar depois a tenente, e finalmente a capitão, desempenhando commissões importantissimas de que fóra encarregado pelo governo, que se lhe deviam contar os vinte annos de serviço da epocha que tinha feito o seu requerimento, em que apresentava não só vinte annos de bom serviço, mas vinte e cinco; e que emquanto á sua saída de Lisboa, que reputava um crime, sem que o supremo conselho de justiça militar quizesse lavar esta nodoa, fazia comtudo a observação de que tendo saído do collegio militar, e sendo seu pae um acérrimo defensor do usurpador, tinha ido com elle para fóra da capital, mas que na primeira occasião que teve, abandonou logo as bandeiras da usurpação. O governo conformou-se com esta consulta e concordou em que a contagem devia ser feita pelo modo porque o conselho consultara, por isso veiu com aquella disposição dizendo: que tantos annos de bom serviço, ainda que houvesse uma prisão correccional, que não importasse infamia, isso não seria obstaculo para a concessão da medalha.

Recebida esta - portaria no supremo conselho de justiça militar, o qual n'este caso só é um tribunal consultivo, e por isso não lhe incumbe ver se um decreto póde ser revogado por uma portaria, porque o que lhe cumpre é executar as ordens do governo, deu cumprimento a esta portaria.

Passado pouco tempo veiu a segunda portaria, que, como disse o sr. Sebastião José de Carvalho, era para avocar todos os requerimentos e documentos que estavam no supremo conselho, mas que já estavam em principio de processo, outros que ainda não estavam vistos pelos relatores, e na epocha a que s. ex-a se referiu foram mandados ao sr. ministro mais de mil, e entre elles aquelle a que alludiu o digno par, do general Lobo á Avila, de que a sorte fez com que eu fosse relator.

Repetirei aqui francamente o que. disse já no principio d'isto, a que não chamarei discurso, porque o não é. Eu disse que o supremo tribunal de justiça militar tinha estabelecido que a base para se apreciarem os serviços dos militares não seria a informação do commandante, e portanto devia fazer obra pelos documentos que provassem o bom serviço e não pelas informações desses commandantes; mas que o caso aqui era differente, porque este processo fôra examinado pelo sr. ministro da guerra, e s. ex.ª é aquelle que, como ha pouco disse, tem o poder de conformar-se ou recusar o parecer do supremo tribunal de justiça militar exarado na sua consulta, e quando o sr. ministro da guerra na remessa d'estes processos diz que acha o requerente com direito ás tres medalhas, tem claramente demonstrado o que tencionava fazer a este respeito, não podendo por isso ter applicação a resolução que o conselho tomára a respeito dos pareceres dos generaes que acompanharam os requerimentos dos seus subordinados.

Já disse que a sorte me fez 'ser relator d'este processo; á vista d'elle, disse eu, e repito agora, que não podia considerar o sr. ministro da guerra no mesmo caso em que nós considerámos os generaes de divisão e os commandantes das armas especiaes, porque s. ex.ª estava n'um caso especial, porque era a quem competia apreciar a nossa consulta e apresentar a sua proposta a Sua Magestade para a graça ser conferida; e neste caso, por haver uma commissão especial fóra do supremo tribunal de justiça militar que examinava os documentos, eu entendia que as attribuições que se haviam conferido ao tribunal para este caso tinham caducado, mas que não desejando estabelecer conflictos com o governo, que me limitava a mandar escrever na consulta palavra por palavra a opinião do sr. ministro, e que a assignaria como relator. O conselho assim entendeu tambem, e assim o fez; e como a medalha de oiro é uma excepção, e esta excepção não vinha mencionada, tendo-se aliàs examinado escrupulosamente os documentos, entendi eu e os meus collegas que a medalha que devia ser dada a este official era a medalha de prata, e n'este sentido lavrou-se esta consulta (leu).

Foi a primeira vez, que com pesar meu, sendo relator de um processo não mereci a consideração do governo (apoia' dos). Aqui não ha o desejo de atacar, nem de defender, o que faço é narrar simplesmente um facto (apoiados). Coube-me por sorte examinar este processo, que é desagradavel para mim, porque sendo eu o relator, e tendo até proposto que fosse copiada na consulta a opinião do sr. ministro, porque era quem devia julgar boa ou má a consulta, e propor a Sua Magestade o que julgasse conveniente, fizesse depois uma cousa muito agradavel para o agraciado, porque é melhor a medalha de oiro do que a de prata, mas contraria ao que o supremo conselho de justiça militar julgou que os actos praticados por aquelle official mereciam (apoiados). Se julgou bem ou mal não sei, mas posso asseverar, que julgou em sua consciencia, e demais, conformando-se com a opinião do sr. ministro, como acabo de demonstrar, não tenho mais nada a dizer, esta é a historia verdadeira do que se passou; fizemos obra por portarias, porque nos julgámos obrigados a isso, e o supremo conselho de justiça militar sobre a materia sujeita, não é senão um tribunal consultivo (apoiados).

Mas agora quanto á outra questão, permitta-me o sr. ministro o a camara tambem, que diga mais algumas palavras, que se não são relativas ao objecto de que acabo de tratar, prendem comtudo a outro que eu tenho obrigação de attender como general, que tenho a honra de ser, e como official empregado n'uma posição tão alta como a de vogal do supremo conselho de justiça militar, tendo por isso que estar ao corrente das leis. Eu sinto muito discordar primeiro com o sr. ministro da guerra, e em segundo logar com o nobre general Baldy, em relação á sua opinião a respeito das felicitações.

No meu entender ha certificados e ha felicitações, que são umas mais admissiveis do que outras; eu entendo que as felicitações que recebeu o sr. general Baldy no seu quartel, de mão para mão, as podia guardar na sua gaveta, como s. ex.ª disse que fizera, porque não offendiam nem do modo mais remoto a disciplina militar (apoiados). Mas não entendo do mesmo modo as felicitações que se mandam publicar pela imprensa, de um certo modo ameaçadoras (apoiados); e eu considero que a ordem do dia do marechal Beresford, de 26 de julho de 1811, a que se referiu o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, contém os verdadeiros principios de disciplina, e que embora não esteja em uso, como não esta ainda revogada, estimaria muito que o sr. ministro da guerra a mandasse pôr em pratica, porque, por mais que se diga, eu sou da opinião que os officiaes militares, que estão servindo debaixo das ordens de um commandante, não têem aquella liberdade de acção que se deve permittir a todos os outros cidadãos (apoiados).

Eu já fui commandante de um corpo, e lembro-me que uma vez, tratando-se de eleições, o general que me commandava exigiu de mim que fizesse votar os meus officiaes n'um lista que me apresentou; respondi-lhe, e tenho vivas muitas testemunhas, que não fazia aquillo que censurava nos outros, e que entendia que para ter força no meu regimento não devia exigir senão o que os outros tinham obrigação de cumprir, e aquillo não era serviço militar; aceitei a lista para mim, mas declarei que não a impunha aos outros.

No quartel soube-se isto, e os officiaes vieram procurar-me e disseram-me que estavam promptos para fazer o que eu quizesse, porque era o seu commandante. Ora isto é o que se faz sempre, e por consequencia é necessario evitar que se manifestem os desejos dos superiores, porque desgraçadamente a nossa classe militar não é tão abastada que possa desprender-se da posição que occupa para dizer que se recusa a uma cousa que sabe que é do agrado do seu commandante. Para bem da disciplina peço ao sr. ministro da guerra que mande pôr em vigor o que ainda não esta