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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 3 DE FEVEREIRO DE 1858.

Presidencia do ex.mo sr. Visconde de Laborim, vice-presidente.

Secretarios, os srs. Conde de Mello

Visconde de Balsemão.

(Assistia o Sr. Ministro da Marinha.)

Pelas puas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 35 Dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Secretario Conde de Mello deu conta da seguinte correspondencia:

Um officio do Digno Par Bispo de Lamego participando que o estado da sua saude lhe não permittia vir á Camara. — Inteirada.

- do Digno Par Antonio Maria Osorio fazendo igual communicação. — Inteirada.

- do Presidente da Camara dos Srs. Deputados remettendo uma proposição sobre ser permittido o pagamento das contribuições, directas por encontro em concorrente quantia nos juros vencidos das Inscripções com assentamento, e a proposta do Governo e parecer da commissão de fazenda que lhe deram origem. — Á commissão de fazenda.

- da mesma Camara sobre ser auctorisado o Governo para prorogar os prazos estabelecidos na Carta de Lei de 29 de Julho de 1854 para a troca e gyro das moedas de ouro e prata mandadas tirar da circulação, bem como para mandar cunhar até a quantia de mil contos nas moedas de prata designadas na referida Lei, e a proposta do Governo e parecer da commissão de fazenda que lhe deram origem. — Á commissão de fazenda.

— da mesma Camara remettendo uma proposição sobre ser auctorisado o Governo a emittir cinco contos de réis em Inscripções de 3 por cento para com elles pagar á confraria do Santíssimo da freguezia de S. Nicoláo da cidade do Porto a quantia de tres conto; de réis entrada no Thesouro Publico; e a proposta do Governo e parecer que lhe deram origem. — A commissão de fazenda.

- da mesma Camara remettendo uma proposição sobre ser o Governo auctorisado a applicar ao pagamento de juros e amortisação de um novo emprestimo de 22 contos, que houver de contractar com a companhia Vianense para acabamento da estrada de Vianna a Caminha, a parte do rendimento da alfandega do Porto, que junto com o saldo das consignações adjudicadas á companhia Utilidade Publica prefizer a importancia daquelles encargos. — -A commissão de fazenda.

- da referida Camara remettendo uma proposição sobre ser incluida na tabella da despeza extraordinaria do Estado para o anno economico de 1857 a 1858, approvada pela Carta de Lei de 15 de Julho a addição de seis contos de réis, importancia das prestações consignadas ao pagamento da livraria do Bispo do Porto, e ao banco de Portugal por antigas dividas. — A commisão de fazenda.

- da mesma Camara remettendo uma proposição sobre a fixação da contribuição predial, e sua repartição pelos districtos no anno de 1859. — A commissão de fazenda.

- da dita Camara remettendo uma proposição sobre a suppressão do logar de Contador geral da alfandega municipal de Lisboa. — Á commissão de fazenda.

- de Antonio Lopes Vieira remettendo 100 exemplares do requerimento que os Medicos e Cirurgiões da escóla Medico-Cirurgica do Porto dirigiram na sessão passada á Camara dos Srs. Deputados. — Mandaram-se distribuir.

O Sr. Visconde de Ourem — Sr. Presidente, pedi a palavra unicamente para communicar á Camara, que certamente tem o maior interesse pelo bom nome e reputação (apoiados) de todos os seus membros, que já foi julgado no Tribunal competente o processo de syndicancia sobre os meus actos como Governador geral da India, e julgadas não procedentes as accusações que me foram feitas (muitos apoiados). Honra seja feita aos magistrados integerrimos que decidiram esta questão. Caiu a calumnia, na presença da imparcialidade e da justiça, e os meus detractores ficaram reduzidos á vergonha de que são merecedores: declaro solemnemente que lhes perdoo e os desprezo (O Sr. Marquez de Vallada — Muito bem). Já não peza sobre mim o como ostracismo que ha perto de tres annos me tinha collocado em uma posição bem desagradavel, e de ora ávante, com quanto seja o ultimo dos membros desta Camara em merecimento e intellectualidade, terei a ufania de que lhe pertenço sem mancha, assim como tenho a convicção de que tenho sempre servido bem o meu paiz (muitos apoiados — Vozes — Muito bem, muito bem).

O Sr. Marquez de Vallada começa por felicitar o Digno Par, o Sr. Visconde de Ourem, por se concluir finalmente esse famoso negocio da syndicancia, que durou tres annos — felicita-o a elle e á Camara — posto que elle Sr. Marquez, nem nenhum dos seus collegas necessitasse de que se concluisse esse negocio para poderem apreciar devidamente a conducta do Sr. Visconde de Ourem (apoiados). A reputação do nobre ex-Governador geral da India, que sem duvida imitou aquelles homens cujos serviços a nossa historia attesta, e a fama ha de sempre proclamar para gloria do nome portuguez, era um facto já por todos reconhecido; não obstante o que estima que se tivesse mostrado illibada pelo Tribunal competente.

Disse que aproveitava a occasião para dizer ao Governo, que o que se passou por esta occasião deve merecer a sua attenção. Ha um cavalheiro, o Sr. José de Cupertino Aguiar Ottolini, Procurador geral da Corôa, que é voz constante, e acaba de vêr-se, que demora os negocios por tempo que incommoda gravemente as partes, porque é quasi só para o muito que delle se exige; e que por isso pedia aos Srs. Ministros, que tenham isto em consideração, e hajam de pensar sobre a necessidade reconhecida de nomear-lhe mais ajudantes, visto que o que se passou com o Sr. Visconde de Ourem não é um facto isolado, já. tem acontecido a outros, e em objectos de alta gravidade.

É preciso dizer a verdade — e aqui diz-se toda a verdade, embora os funccionarios sobre que haja de recaír a censura não estejam presentes — aos Governos deste paiz é que cabe a responsabilidade. Nisto não se refere só ao actual Governo, é a todos os cavalheiros que se teem sentado nos bancos dos Ministros: aos que actualmente os occupam recommenda pois que resolvam quanto antes este negocio. Reccommenda isto a SS. EE. e principalmente ao Sr. Visconde de Sá, cujos sentimentos de rectidão e justiça é elle orador o primeiro a reconhecer, o que folga de dizer em testimunho da propria imparcialidade.

Disse que já que estava de pé ia mandar para a mesa a nota d' interpellação annunciada ao Sr. Ministro da Guerra, a qual é a seguinte (leu, e continuou).

Que mandava para a mesa esta nota de interpellação, esperando que o Sr. Ministro da Guerra a tome na devida consideração, e, urgente como ella é, o que se deprehende pelo seu conteudo, haja de ter a bondade de declarar o dia em que póde vir responder-lhe.

E por ultimo requereu que o Sr. Arcebispo Bispo de Coimbra, Patriarcha eleito da Igreja de Lisboa, fosse fazer parte da commissão ecclesiastica, porque nella não ha nem um unico Prelado; e ainda que houvesse outro, parece-lhe que um varão tão respeitavel, e que espera vêr confirmado por Sua Santidade para reger esta Igre-

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ja, sendo admittido na commissão, por certo ha de ajudal-a muito com os seus auxilios, e illustral-a com as suas luzes, que elle orador é o primeiro a reconhecer, e a dar testimunho.

Se não se engana está dado para ordem do dia de hoje um projecto de lei relativamente aos officiaes que serviram ás ordens da Junta do Porto. (Vozes — Não está.) Bem, bem; senão está, talvez seja dado brevemente. Esse projecto parece-lhe que foi apresentado na Camara dos Pares pelo nobre Ministro da Marinha, antes de S. Ex.ª entrar para o Ministerio; e como S. Ex.ª está presente, desejava saber elle orador se este projecto é hoje considerado ministerial? Está que não, mas como foi apresentado por um membro do Gabinete, e leu n'alguma parte que S. Ex.ª tinha feito parte dos cavalheiros que serviram a Junta do Porto, desejaria que S. Ex.ª dissesse se o adoptou, e o Sr.'Marquez de Loulé, como questão ministerial, ou se é questão livre.

O Sr. Visconde de Ourem — Darei uma explicação.

O projecto não é ministerial. Veio da Camara dos Srs. Deputados, e teve alli origem em virtude de um requerimento.

O Sr. Visconde de Sá apresentou, quando ainda não era Ministro, alguns requerimentos, e recommendou alguns officiaes, para que, em occasião opportuna, fossem indemnisados.

O Sr. Marquez de Vallada agora vê, pelo que diz o Sr. Visconde d' Ourem, que o Sr. Ministro da Marinha não fez este projecto seu, como tinha supposto - comtudo aguarda a explicação, que S. Ex.ª houver de dar, parecendo-lhe desde já, que muda um pouco de figura este negocio.

O Sr. Ministro da Marinha — Pedi a palavra para responder ao Sr. Marquez de Vallada, mas antes disso direi, que foi com muita satisfação, que ouvi que a syndicancia relativa ao Digno Par o Sr. Visconde de Ourem tinha sido decidida como o Governo sempre esperou que o fosse. Por ora, ainda disso não tive communicação official, mas á vista do que ouvi ao Digno Par o Sr. Visconde de Ourem, temos a certeza de que o processo de S. Ex.ª, teve no Tribunal Supremo o resultado indicado.

Agora, quanto ao que disse o Sr. Marquez de Vallada, relativamente ao Ministerio publico, observarei que ainda que essa repartição não depende do Ministerio a meu cargo, e que por isso seja pouco competente para a julgar, acho que precisa de uma organisação especial, parecendo-me mesmo que junto de cada um dos differentes Ministérios deveria haver um ajudante do Procurador geral da Corôa (O Sr. Visconde d'Athoguia — Apoiado.)-

Em quanto ao terceiro ponto em que fallou o Digno Par, tenho a dizer, que esta questão, relativa aos Officiaes que serviram com a Junta do Porto em 1846 e 1847, foi trazida a esta Camara pelo Ministerio do Sr. Duque de Saldanha. Eu tinha-me abstido de fallar neste negocio, durante sete ou oito annos, por me achar nelle interessado: mas quando se apresentou aqui um projecto de lei, que julguei nocivo ao Estado por trazer em resultado o gasto de sommas enormes, como a experiencia o tem mostrado (O Sr. Conde de Thomar — Ouçam, ouçam), apresentei, como substituição um outro projecto, o qual foi rejeitado. No anno passado, porém, alguns dos Srs. Deputados apresentaram na respectiva Camara um novo projecto de lei, sobre o mesmo assumpto. Eu então, que estava servindo no Ministerio da Guerra, fui convidado a ir á commissão de guerra para dizer a minha opinião ácerca do referido projecto, e a minha resposta foi, que me abstinha de dar opinião, porque eu era interessado na questão. Depois veiu o projecto á discussão da Camara dos Srs. Deputados, e abstive-me tambem de fallar, mas a final foi rejeitado o projecto da commissão, e um dos membros daquella Camara apresentou então, como substituição a esse projecto, aquelle que eu tinha aqui apresentado; e perguntando-me,. se eu como Ministro da Guerra, apoiava a nova proposta, respondi, que eu como Ministro da Guerra não podia rejeitar um projecto que eu tinha apresentado como membro do Corpo legislativo. O projecto passou naquella Camara com modificações, veiu para esta, e, foi mandado á commissão de guerra, cuja maioria apresentou o parecer que está para se discutir. Agora a Camara fará o que julgar conveniente. E dizendo que esta questão não é ministerial, tenho respondido ao Digno Par.

Quando a commissão de guerra formulou o seu parecer sobre elle, o Digno Par que é o respectivo Presidente, convidou-me a ir á commissão, chegando ahi, mostrou-se-me o parecer já assignado por dois ou tres membros da commissão. Em vista disto disse eu, que nada tinha a expôr, porque a commissão de guerra já havia assentado no parecer que tinha a apresentar, e que nessas circumstancias escusava o seu illustre Presidente de me dar o trabalho de ir alli (riso). Quando chegar pois a discussão votarei em conformidade com o que propuz como membro desta Camara. Como a opinião de cada um deve ser livre, mantenho como Ministro aquella que emitti como Par.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Pedi a palavra antes da ordem do dia para ter dois pareceres da commissão de petições, e para apresentar um requerimento.

Agora vou fazer leitura dos parecer (vozes — Não precisa, mande-os para a mesa). Pois bem, ahi vão.

Em 9 de Maio de 1857 fiz eu nesta Camara o seguinte requerimento (leu).

E este requerimento filo eu quando pelos papeis publicos vi que na outra casa do Parlamento havia sido apresentado um projecto de lei sobre a subrogação por inscripções dos bens de raiz dos estabelecimentos pios, etc.. porque entendi naquella occasião, e ainda hoje entendo, que para se tractar convenientemente e com certeza de causa esta questão, que envolve muitos interesses, era da maior necessidade que soubéssemos que capitães já possuem em inscripções estes estabelecimentos, sem o que não me parece que seja possivel fazer-se com acerto cousa alguma.

Portanto, requeiro agora que novamente o meu requerimento, feito em 9 de Maio de 1857, seja approvado e remettido ao Governo. Desde 9 de Maio de 1857 até 3 de Fevereiro de 1858 parece-me que tem havido tempo, e mais do que tempo para serem remettidos á Camara estes esclarecimentos, que eu julgo o Governo já deve ter, porque sendo elles de maxima importancia, e estando os estabelecimentos pios submettidos á fiscalisação do Governo, mal se póde conceber que taes esclarecimentos não existam no Ministerio dos Negocios do Reino. No entanto, existam ou não existam, o que é certo é que fiz este requerimento em 9 de Maio de 1857, e até este momento não me consta que tenha sido satisfeito, e assim não posso deixar de repetir e insistir para que igual requerimento seja agora approvado pela Camara e remettido ao Governo; pedindo que seja declarado urgente.

Tendo sido declarado urgente, entrou em discussão o requerimento, que é o seguinte:

«Requeiro que se peça, pelo Ministerio do Reino, uma relação do capital em inscripções possuido no continente do Reino por todas as Camaras municipaes, corporações religiosas, irmandades, confrarias, e estabelecimentos de caridade; especificando a mesma relação a parte desse capital havida por subrogações de bens de raiz, ou adquirida por doações ou por qualquer outro meio. Camara dos Pares, 3 de Fevereiro de 1858. = Visconde de Fonte Arcada.»

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente — Vai lêr-se o requerimento do Sr. Marquez de Vallada.

«Desejo que o Sr. Ministro da Guerra informe a Camara dos Dignos Pares, sobre o que se passou em Guimarães, por occasião do suicidio de um sargento do batalhão de caçadores n.º 7; negando-se os ecclesiasticos a resarem-lhe as preces da Igreja, e forçando o Commandante ao Capellão do corpo a resar essas preces: offendendo desta arte o direito canonico, que é lei do reino.

«Desejo que o mesmo Sr. Ministro informe a Camara dos Dignos Pares do Reino, sobre o que se passou entre o referido Commandante e a irmandade do Carmo, por occasião da concessão que fez o Governo da igreja dos Carmelitas de Guimarães, mandando o Commandante pôr sentinellas na igreja, com armas carregadas; oppondo-se a que a irmandade tomasse posse da igreja, e resistindo ás ordens do Governo. Camara dos Pares, 3 de Fevereiro de 1858. = Marquez de Vallada, Par do Reino.»

O Sr. Marquez de Vallada — Peço a urgencia.

O Sr. Presidente — A Camara conhece muito bem quaes são os preceitos do Regimento a este respeito, e creio quererá que se sigam agora. O artigo 59.°, in fine, determina muito expressamente, que se não dirija ou leve á execução qualquer interpellação sem previa annuencia da Camara. No entretanto algumas vezes tem-se aqui praticado o contrario.

O Sr. Marquez de Vallada: o que requer é que se faça ao Sr. Ministro da Guerra a communicação de que deseja interpellar S. Ex.ª, e por conseguinte que o Sr. Ministro responda se póde ou não vir aqui para esse fim.

Approvou-se que se remettesse com urgencia a nota de interpellação.

O Sr. Conde de Thomar: depois de ter pedido que o Digno Par o Sr. Patriarcha Eleito de Lisboa faça parte da commissão de instrucção publica, onde S. Ex.ª com as suas luzes e conhecimentos poderá prestar valiosos serviços, e um auxilio aos seus collegas naquella commissão; passou a pedir á Mesa que haja de communicar ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino que tem de dirigir uma pergunta a S. Ex.ª sobre os planos ou projectos que o Governo nesta sessão intenta apresentar ao Parlamento sobre instrucção publica, e principalmente sobre instrucção primaria; reservando-se para então dizer os motivos que o levaram a fazer esta pergunta: e requereu a urgencia.

«Requeiro se participe ao Sr. Ministro do Reino, que desejo dirigir-lhe uma pergunta sobre instrucção publica, e principalmente saber se o Governo tem alguns projectos de instrucção publica, e designadamente sobre instrucção primaria, para serem discutidos na corrente sessão legislativa. Camara dos Pares, 3 de Fevereiro de 1858. = Conde de Thomar.»

Remettida com urgencia.

O Sr. Conde de Bomfim — Sr. Presidente, quando eu pedi a palavra tencionava limitar-me a pedir a V. Ex.ª, que com a maior brevidade possivel desse para ordem do dia os pareceres n.ºs 82 e 82-A, a respeito da antiguidade dos officiaes do exercito, de que alli se tracta, e que se julgam estarem lesados, mas a quem vai fazer justiça o projecto de lei vindo da Camara dos Srs. Deputados, sobre que recaíram os pareceres que deixo referidos.

No parecer que eu assignei em separado dos outros membros da commissão de guerra, parece-me que patenteio a muita justiça que assiste áquelles officiaes, justiça que estou inteiramente convencido não será negada por nenhum membro desta Camara. Mas como o correr do tempo faz ás vezes esquecer certas circumstancias que é necessario lembrar, permitta-me o D. Par que primeiro fallou hoje sobre este objecto, que eu diga, que nesse projecto de lei não se tracta sómente dos officiaes que serviram a Junta do Porto, mas que se tracta de outros muitos, isto é, posso mesmo dizer, que a maior parte daquelles a quem aproveitará o projecto não foram preteridos por terem servido a Junta, tendo-o sido aliás em 1851, como farei vêr quando este objecto entrar em discussão. Assim entendo que nada ha mais justo do que fazer agora a uns e outros o que já em iguaes circumstancias se praticou com tantos outros que haviam sido preteridos por motivos politicos.

Nestes termos limito-me a pedir a V. Ex.ª que, a não estar já dado para ordem do dia o projecto a que me refiro, V. Ex.ª o queira dar na primeira occasião que julgue mais propria, a fim de que se não demore a resolução de um assumpto que joga com os interesses de benemeritos officiaes a quem é necessario attender.

O Sr. Presidente — É necessario que eu advirta ao Digno Par, que tenho dado para ordem do dia os projectos de lei, segundo a sua numeração ou ordem, pela qual me foram apresentados na Secretaria, e tinha já tenção de dar esse projecto, a que o Digno Par se refere, para ordem do dia da primeira sessão.

O Sr. Conde do Bomfim — Muito bem; mas eu não pertendi dirigir a V. Ex.ª a mais leve censura.

O Sr. Margiochi — É para lêr um parecer da commissão de fazenda (leu).

Tem voto dos Dignos Pares os Srs. Barão de Chancelleiros e Felix Pereira de Magalhães.

Leram-se os pareceres da commissão de petições.

O Sr. Visconde de Benagazil — Parece-me que esses dois pareceres da commissão de petições devem ficar sobre a mesa, porque não merecem a pena da impressão, resolvendo a Camara sobre elles n'uma das proximas sessões. Creio mesmo que esta tem sido sempre a pratica.

Ficaram para segunda leitura.

O Sr. Conde de Linhares — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para dirigir uma pergunta ao Sr. Ministro da Marinha; e com quanto eu devesse primeiro usar do meio de annunciar a minha interpellação, não o fiz; porque estando agora presente o Sr. Ministro, e persuadindo-me eu que elle me póde talvez responder facilmente, e desde já, pois creio se acha para isto sobejamente habilitado, entendi que annuindo S. Ex.ª, seria melhor expôr eu logo a questão, ficando ao seu arbitrio responder-me em seguida, ou n'uma das proximas sessões, caso o Sr. Ministro assim o prefira.

Sr. Presidente, S. Ex.ª nomeou ha mais de um anno uma commissão, da qual eu fiz parte, para propôr um projecto de refórma da antiga reorganisação da Escóla de Construcção Naval, escóla esta que deve fazer parte do systema de estudos de applicação, destinado a completar, por assim dizer, a nossa excellente Escóla Polytechnica, e a dotar desta sorte o nosso paiz de um pessoal technico que mereça na verdade o nome de Corpo dos Engenheiros de Marinha, e do qual, a meu vêr, carecemos absolutamente. Os membros da mencionada commissão, da qual sou eu o unico insignificante, possuidos do maior zêlo, e até de enthusiasmo, occuparam-se desde logo em elaborar com o maior cuidado, desejo de acertar, e brevidade possivel, um projecto de organisação da Escóla de Applicação para os Engenheiros de Marinha destinada a completar com o quarto curso da Escóla Polytechnica o curso geral do Engenheiro; tambem a commissão elaborou e estudou cuidadosamente a organisação de um curso para os mestres ou constructores propriamente ditos, e que se não devem de maneira alguma confundir com os Engenheiros de Marinha; e, finalmente, tambem existe nestes trabalhos o plano para a creação do quadro dos Engenheiros, e organisação do Corpo de Engenheiros de Marinha.

Foram pois, Sr. Presidente, apresentados todos estes trabalhos a S. Ex.ª; porém perguntado em outra parte o Sr. Ministro por um cavalheiro membro da commissão, se tencionava apresentar á approvação do Corpo legislativo este plano de organisação, respondeu S. Ex.ª que ainda não tinha tido tempo de examinar esses papeis; e que com quanto formasse um juizo favoravel destes trabalhos attendendo aos seus auctores, que S. Ex.ª julgava competentes na materia, comtudo se não podia ainda comprometter a apresental-os; porém que, ou estes ou outros tendentes ao mesmo fim, seriam brevemente propostos á approvação das Camaras por S. Ex.ª

Sr. Presidente, o cavalheiro a que alludo satisfez-se naturalmente com esta promessa; porém como haja mediado um anno, eu estou certo que S. Ex.ª já deve ter a sua opinião formada; e como não vejo apparecer no logar proprio estas e outras promettidas reformas, ainda que fossem só em projecto; como tambem S. Ex.ª não usou da auctorisação que tinha para reformar o Arsenal da Marinha, e mais repartições do seu Ministerio, desejo saber se o Sr. Ministro está disposto a apresentar ainda nesta sessão legislativa o plano de refórma da Escóla de Construcção Naval, e organisação do Corpo de Engenheiros de Marinha proposto pela commissão nomeada por S. Ex.ª, ou outro tendente ao mesmo fim; aliás, Sr. Presidente, a meu pesar serei obrigado, e desde já me comprometto a fazel-o, a apresentar este projecto usando do meu direito de iniciativa. Espero, pois, pela resposta do Sr. Ministro, que tomo a liberdade de rogar a S. Ex.ª seja bem clara e terminante; isto é, desejo saber se o Sr. Ministro está ou não resolvido a propôr ao Parlamento o projecto da commissão que nomeou.

O Sr. Ministro da Marinha — O projecto para a refórma da Escóla de Construcção Naval não está esquecido. No entanto é certo que tendo o Corpo legislativo o anno passado auctorisado o Governo a reformar as repartições do Ministerio da Marinha, com a restricção de que a despeza que houvesse de fazer-se não excedesse a que se faz actualmente, entendeu-se que se devia sobreestar na adopção do projecto para a refórma da Escóla de Construcção, em quanto se não concluissem os trabalhos de outros projectos de refórma nas repartições de Marinha, e que prendem com as Escólas Naval e de Construcção, como, por exemplo, um sobre os trabalhos do Arsenal, outro sobre promoções, e outros sobre outros objectos; mas todos esses projectos ou trabalhos estão parados até que se possam combinar de modo que a despeza de todos não exceda a que hoje se faz, e para isto é necessario em uma parte diminuir-se uma verba para se augmentar em outra.

O projecto, para o qual concorreu o Digno Par com as suas luzes está de certo muito bom; mas

já disse, em relação á despeza é necessario pólo em harmonia com outros projectos tambem relativos ao Ministerio da Marinha.

O Sr. Conde de Linhares — Eu sou o primeiro que faço toda a justiça ao Sr. Ministro da Marinha, porque reconheço as suas boas intenções, e o saber e talento com que S. Ex.ª dirige a repartição a seu cargo, mostrando o maior zêlo e interesse pelo augmento da nossa marinha, e pela prosperidade das nossas possessões ultramarinas.

Mas permitta-me o nobre Ministro que eu diga, que com quanto esse projecto, para o qual eu trabalhei e concorri alguma cousa, sobre organisação da escóla de instrucção naval, tenha uma certa ligação, que se não póde duvidar que tem, com outros projectos de refórma do Ministerio da Marinha, é isso quanto a mim a razão principal, pela qual eu entendo que deve esse projecto ser trazido quanto antes ao Parlamento.

Para a nossa Marinha têem-se construido ultimamente alguns, ainda que poucos e pequenos, vasos de guerra, e ainda o anno passado se votou uma certa somma para ser applicada á construcção de algumas embarcações que nos são indispensaveis, ainda mesmo que só servissem em estabelecer a communicação com as nossas possessões ultramarinas; mas na occasião em que se tracta de verificar estas construcções futuras, e quando S. Ex.ª o Sr. Ministro tem de approvar ou não tantos planos para as levar a effeito, é necessario que exista alguma cousa regular a respeito do corpo de Engenheiros de Marinha; porém faltando essa organisação que se propõe do projecto que já foi apresentado, o Governo achar-se-ha sem ter quem o possa auxiliar ou dirigir sobre este ou aquelle plano ou systema de construcção, porque ainda mesmo que se queira, como quero, suppôr muita capacidade no Inspector do Arsenal, e nos demais officiaes de Marinha empregados nas respectivas repartições, ou mandados em commissão, não se póde nunca entender que a unica opinião delles seja sufficiente para a escolha de um plano, ou que sirva de indicação sufficiente para o Sr. Ministro com segurança adoptar uma ou outra construcção. Não basta mandar construir um navio de tanta quilha e de tanta força, etc... é necessario que se saiba que especie de navio é; quem apresenta o plano é o engenheiro que lá está em Inglaterra, no caso de se mandarem comprar os navios em Inglaterra, e por conseguinte nós não temos aquém pedir a responsabilidade; mas é necessario que tenhamos esse individuo, ou individuos, competentemente' habilitados, e responsaveis por aquillo que se faz. S. Ex.ª não pertende por certo ser Ministro da Marinha, Major-general, e demais a mais constructor naval.

Hoje está-se construindo no nosso arsenal um pequeno vapôr, mas quem é que ha de responder pela boa construcção, boa escolha do plano, ou vantagem deste vapôr?.... Ninguem! E isto porque falta a repartição competente que tracte desta especialidade. Qualquer vantagem que houvesse em apresentar, como deseja o Sr. Ministro, um systema geral de reformas á sancção do Parlamento, é muito menor que o perigo em que se acha o serviço da nação a tal respeito, deixando subsistir um estado de cousas similhante, isto no momento em que se acha votada uma somma consideravel, attendendo ao costume, para construcções navaes: diz S. Ex.ª, que o projecto tende a augmentar a despeza publica, e eu respondo que este augmento de despeza é tão diminuto, que me envergonho de o citar, e peço licença para dizer ao Sr. Ministro, que o que seria para lamentar é que por falta de Engenheiros o sacrificio dos 800:000$000 votados fosse em pura perda, se os navios comprados forem mal escolhidos, mal construidos, e não satisfizessem ao que nós esperamos e desejâmos.

Sr. Presidente, entenda-se bem, eu não digo que tal aconteça, e mesmo espero que não; porém, dado o caso, quem é responsavel?.... Espero pois que o Sr. Ministro apresente com a possivel brevidade um systema de refórma, acabando por uma vez com esta impropriamente chamada Escóla de Construcção, e que ahi vegeta a um canto da sala do risco do arsenal, sem lentes, sem alumnos, e sem aulas, não produzindo nada, e servindo só para vergonha nossa, e para tristissimo monumento da nossa incuria nas questões de verdadeiro interesse para o paiz. É necessario, Sr. Presidente, que isto acabe, e se querem desde já uma economia, acabem com esta prova material do nosso desmazelo, embora não organizem outra; esta seria uma economia acceitavel, e não aquella de negar um diminutissimo ordenado a dois lentes, que será a maior despeza do projecto proposto. Insisto, pois, em que o nobre Ministro me diga se está resolvido a apresentar quanto antes este projecto de refórma, porque quando a isto S. Ex.ª se não comprometia, eu então, usando do direito que tenho de iniciativa, apresental-o-ei, torno a repetil-o, não esperando encontrar embaraços pelo que respeita ao augmento de despeza, que, se a houver, é muito pequena, por isso que quando se tractou de formular o projecto, foi logo a primeira condição, que os membros da respectiva commissão adoptaram, de não augmentarem a despeza, a fim de que o mesmo projecto podesse passar, condição esta, a que sempre me sujeito de muito má vontade: em objectos de utilidade publica não gosto de economias.

Torno a pedir ao nobre Ministro que se apresse a apresentar aquelle projecto, assim como os outros projectos que S. Ex.ª diz ter promptos para resolver todas as questões importantes, e ainda pendentes, que foram apresentadas na commissão de inquerito ao Ministerio da Marinha; e o nobre Ministro, que referendou o Decreto que organisou a Escóla Polytechnica, deve certamente, e mais do que ninguem, ter muito gosto em a completar, dotando o paiz das competentes escólas de applicação, sendo destas uma, e não a menos importante, a Escóla de Applicação dos Engenheiros de Marinha.

O Sr. Ministro da Marinha — Em quanto ao

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primeiro ponto relativamente á escóla de construcção naval de que fallou o Digno Par o Sr. Conde de Linhares, tenho a dizer que a questão reduz-se a tempo, mais mez menos mez, pois que se tracta dessa refórma. Estou pois de accôrdo com muitas das reflexões que o Digno Par fez, e devo dizer por esta occasião, que intendo, que as despezas com as differentes repartições do Ministerio da Marinha devem ser reduzidas á menor verba que seja possivel, a fim de que se possa augmentar convenientemente a verba para as construcções navaes [apoiados); pois até agora tem pelo contrario havido sempre a tendencia para augmentar a despeza com o pessoal, deixando uma verba escaça para a despeza do material (apoiados). Esta é, sem duvida, uma das razões porque temos poucas embarcações de guerra, e é preciso mudar de systema se queremos obter melhor resultado (apoiados).

Concordo plenamente com o Digno Par em quanto diz, que para termos constructores habeis devemos fazer escolha dos individuos mais habilitados e com maiores tendencias para o estudo da architectura naval, e manda-los visitar os melhores estaleiros estrangeiros para depois virem executar os trabalhos de que precisâmos, a fim de não continuarmos na dependencia dos outros paizes. O Governo de Portugal alguma cousa tem feito a este respeito, pois que tem mandado por differentes vezes alguns individuos a estudar diversos ramos das sciencias em paizes estrangeiros; e com relação á marinha assim se tem praticado, mandando-se a Inglaterra engenheiros constructores e alguns operarios. De tudo isto se espera obter bom resultado para as nossas futuras construcções navaes.

Quanto ao navio a vapôr e hélice que se está construindo actualmente no Arsenal da Marinha, foi simplesmente uma experiencia que quizemos aqui fazer desde já, pois que para termos operarios e necessario crea-los, o que sómente se obtém por meio da pratica. O navio que se está fazendo é construido pelo risco de um navio francez que esteve no Téjo o anno passado, as suas machinas deverão ter a força de cincoenta cavallos. Os cilindros para esta machina já se acham fundidos, e esta operação', a primeira que se fez neste Arsenal, teve o melhor resultado.

A marinha hespanhola já tem conseguido fazer as construcções dos navios de vapôr nos seus arsenaes; nós tractamos agora de alcançar o mesmo fim; e se por ventura não sairmos bem desta primeira experiencia não se perdeu tudo, porque se ganha o exercicio, e com o conhecimento pratico, fazendo-se as emendas precisas ha-de-se tambem um dia chegar a obter o resultado que se procura (apoiados).

Em um dos proximos paquetes se esperam algumas machinas para melhor se habilitar o Arsenal, para as construcções de machinas a vapôr. Tempo virá ainda em que possamos tirar das nossas colonias africanas, quanto a construcções navaes, tanto proveito como antigamente tirávamos do Brasil, acontecendo então que muitos dos nossos navios eram construidos no Pará, na Bahia, e em outras partes com as bellas madeiras que por lá havia. É sabido que depois que isso se acabou apenas em Gôa e Damão é que se tem feito alguma construcção, e essas muito demoradas. Ha mais de um anno tive participação da India de que uma corveta que se está construindo em Damão não tinha podido progredir na sua construcção por falta de fundos; em consequencia desta communicação mandei estabelecer uma prestação mensal de 230 libras sterlinas, que tem sido paga regularmente, mas a morosidade do trabalho tem sido grande em consequencia de haver a Companhia da India mandado comprar em Bombaim, Surrate e outros portos toda a madeira propria para construcções navaes.

Aproveitarei ainda a occasião para dizer, que no anno passado foi mandado vir de New-York um navio carregado de madeira para o Arsenal: veio com effeito madeira de excellente qualidade de pinho e de Carvalho. Custou uns vinte contos de réis.

Calculando o custo de cada pé cubico desta madeira, achou-se, que posto no Arsenal, foi menor do que o pé cubico da madeira do pinhal de Leiria posto na Vieira.

Direi ainda á Camara, que dos tres navios de guerra encommendados em Inglaterra um deve estar brevemente em Lisboa, é uma corveta de 1:400 a 1:300 tonelladas, monta 20 peças de 32 e um rodizio de 68; além deste está alli em construcção outro navio de 1:043 tonelladas. e está ajustada uma outra corveta da primeira classe.

Assim, havendo cuidado, perseverança, bom systema de administração e boa escolha de individuos para estes trabalhos, convenientemente preparados com o estudo e a pratica, é de esperar que vamos successivamente restaurando a nossa marinha militar, augmentando-a até que dentro de alguns annos ella chegue ao ponto em que é preciso que esteja com relação ás nossas circumstancias.

O Sr. Visconde de Ourem — É sómente para rectificar algumas das asserções do nobre Ministro da Marinha, que eu muito gostei de ouvir, expondo as suas idéas relativamente ás circumstancias da. nossa marinha de guerra, e á necessidade de a augmentar; assim como não menos me foi agradavel o que disse o Digno Par, e nosso novo collega o Sr. Conde de Linhares.

Disse, porem, o Sr. Ministro da Marinha, que tendo-se mandado para a India os meios convenientes para se continuar a construcção da corveta Damão, não se tinha achado madeira, porque a companhia ingleza tinha comprado toda a que havia em Bombaim, e nos portos do norte. Ora, o que é certo é que as peças mais essenciaes para o acabamento da referida corveta Damão, como pão de volta para fechar a prôa, e outras, deixei-as eu já compradas nos portos do sul, quando saí de Gôa: agora as madeiras necessarias para acabar a construcção de que se tracta, parece-me que se acharão nas nossas mattas de Gôa e Damão; havendo só a circumstancia de que, como as mattas deste ultimo estabelecimento estão encravadas nas terras inglezas, não se poderão dalli extrair algumas madeiras, sem pagarem grandes direitos. Por este motivo representei eu ao Governo a conveniencia de conseguir do Governo inglez, que nos fosse mantida a prerogativa que tinhamos, quando nos foram cedidas as aldeas da Pragana, Nagar, Aveli, de transportarmos de Damão para as ditas aldeas, e vice-versa, todos os generos que quizessemos, sem pagar direitos ao dominante; condição com que as provincias adjacentes a Damão foram tomadas pela companhia ingleza; ou então que se fizesse uma troca de territorio com a dita companhia, de modo que de Damão para a Pragana se passasse, sem ser por paiz estranho. Isto, porém, nunca se conseguiu, com quanto o Sr. Conde de Lavradio, com quem tive uma correspondencia muito activa, auctorisado pelo Governo, fizesse todas as diligencias possiveis, e tractasse o negocio, como costuma tractar todos os de conveniencia publica. No estado das cousas, os objectos mais insignificantes que se transportam de Damão para a Pragana, e vice-versa, pagam direitos nas alfandegas inglezas, porque fomos destituídos do privilegio que tinhamos, e assim vem a custar mais as madeiras das nossas mattas, postas em Damão, do que sendo compradas em Bombaim, ou nos portos do Guzarate.

Agora, pelo que diz respeito a Gôa, digo que tambem convém muito que lá haja um arsenal de marinha estabelecido, como eu informei o Governo; sendo certo que antigamente havia uma disposição para que todos os annos saísse do arsenal de Gôa uma fragata. Quando eu dalli saí não deixei a quilha de uma fragata no estaleiro; mas comprado o pão proprio para a quilha de um brigue, que devia ser feito pelo modelo do brigue Téjo, e as disposições necessarias para se fazer a construcção, as quaes disposições executou o Conselho do Governo, pregando na quilha do alludido brigue o primeiro prégo o seu digno Presidente. Todavia, o meu illustre successor no governo não se julgou com sufficientes meios pecuniarios para continuar a construcção, que mandou parar; mas eu peço ao nobre Ministro da Marinha que a mande continuar, mesmo para entreter os operarios necessarios para taes obras no nosso porto de Gôa, pois de outro modo desertam para os portos do sul, e do norte, e quando precisarmos fazer algum fabrico nos nossos navios de guerra ou mercantes, não temos operarios.

Peço, pois, ao Sr. Ministro que attenda á necessidade de conservar o arsenal de marinha de Gôa, pelas razões expendidas, e que mande activar a construcção do brigue, cuja quilha está no estaleiro. Pela minha parte terei grande prazer que se ultime o dito brigue pela fórma do brigue Téjo, que era um brigue de força com boas qualidades, e que foi condemnado em Gôa, onde devem existir todas as cercas que mandei tirar.

O Sr. Marquez de Vallada disse que pedíra a palavra outra vez, porque lhe esqueceu requerer ao Sr. Presidente, que tivesse a bondade de mandar avisar o Sr. Ministro da Fazenda, de que deseja fazer-lhe uma pergunta sobre negocio de grave interesse social. Não é uma interpellação; é uma pergunta a que S. Ex.ª póde responder — sim ou não — addicionando-lhe apenas quatro ou cinco palavras. Como acha urgente esta pergunta, requer que se mande avisar quanto antes aquelle Sr. Ministro.

O Sr. Visconde de Balsemão — Pedi a palavra para declarar, que o Sr. Conde de Rio Maior me pediu participasse á Camara, que não podia comparecer por incommodo de saude.

O Sr. Ferrão — Mando para a Mesa um parecer da commissão de fazenda.

Leram-se na Mesa os pareceres apresentados pelos Srs. Margiochi e Ferrão.

O Sr. Presidente — Vai votar-se o requerimento dos Dignos Pares o Sr. Marquez de Vallada, e o Sr. Conde de Thomar, para que o Sr. Patriarcha eleito fique pertencendo á commissão ecclesiastica, e á de instrucção publica.

Foi approvado o requerimento.

O Sr. Presidente — Fica, portanto, o Sr. Patriarcha pertencendo ás duas commissões: á de negocios ecclesiasticos, e á de instrucção publica.

ORDEM DO DIA

Discussão do parecer (n.° 95.)

A commissão de marinha e ultramar examinou o projecto de lei n.º 82, que veiu da Camara dos Srs. Deputados, que tem por fim restituir ao quadro effectivo dos Officiaes de fazenda da armada o primeiro oficial de fazenda reformado, Filippe José da Silva Landal.

A commissão considerando, que o mencionado empregado foi reformado sem ser julgado incapaz do serviço activo, sem o haver requerido, e como remuneração de serviços, e sem ter dado provas de incapacidade moral para exercer o seu emprego, pois que continuou a servir e ainda actualmente serve de archivista dos cartorios da Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Ultramar e da contadoria do mesmo Ministerio, com uma gratificação além do seu ordenado; por estes motivos entende, que o referido projecto de lei n.º 82, deve ser approvado por esta Camara.

Sala da commissão de marinha, em 13 de Janeiro de 1838. = Conde do Bomfim — Visconde de Athoguia — Visconde de Ourem.

PROJECTO DE LEI N.° 82.

Artigo 1.° É o Governo auctorisado a restituir ao quadro effectivo dos Officiaes de fazenda da armada o primeiro Official de fazenda reformado, Filippe José da Silva Landal, que havia sido reformado por Decreto de 30 de Junho de 1847, e que actualmente está servindo de archivista dos cartorios da Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e da contabilidade do mesmo Ministerio.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 4 de Julho de 1857. = Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado, Secretario — D. Antonio da Costa, Deputado, Secretario.

O Sr. Visconde de Ourem ainda que não ouviu impugnar o projecto, como vê que os Dignos Pares se acham possuídos de algumas duvidas, pela falta de conhecimento das circumstancias que se dão para elle ser approvado; julga conveniente expôr essas circumstancias, pois que foi por ellas que a commissão entendeu que devia approvar o projecto.

Este individuo que pertencia ao corpo dos Officiaes de fazenda da armada, foi aposentado sem ser examinado nem pela Junta de saude, nem porque o tivesse requerido, mas segundo se suppõe, por proposta verbal do contador de Marinha, e apesar de jubilado continuou a exercer o seu logar, percebendo não só o seu respectivo soldo, mas até uma gratificação, o que prova que está capaz do serviço, e de passar ao quadro dos Officiaes de fazenda, não resultando augmento de despeza.

O orador tambem lamenta e deplora que muitas vezes se reformem empregados, sómente para ficar o logar para outro (apoiados), porque deste modo a despeza augmenta sempre, mas na especie em questão, é um facto consummado.

É esta a explicação que entendeu devia dar á Camara, pois que approvando-se este projecto pratica-se um acto de justiça.

O Sr. Conde de Thomar lamenta ter de dizer algumas palavras sobre projectos desta ordem, que' podem ser consideradas como opposição ás pretenções que se apresentam dos differentes requerentes, que apparecem numa e n'outra casa do Parlamento; mas falo em cumprimento dos seus deveres, e porque não é opposição ás pessoas, mas sim o interesse que tem pelas cousas.

Tomando em consideração as expressões que acaba de proferir o Digno Par o Sr. Visconde de Ourem, vê a Camara que a fazenda publica continua a ser desbaratada, e que não ha meio de lhe dar remedio, porque acaba de dizer-se, que contra a Lei foi aposentado um individuo, que agora se pede para ser restituido ao seu logar: quer isto dizer que haverá logares duplicados, fructo de uma illegalidade praticada por um Governo, que não sabe qual é, porque aqui não se consideram os individuos que exercem o podér, mas os actos desse podér.

Não é possivel que se possam organisar nunca as finanças do paiz, em quanto se continuarem a praticar factos desta natureza. Se ficar a qualquer Governo a liberdade de podér aposentar os funccionarios, contra o determinado na Lei, e depois porque se não observaram as regras prescriptas na Lei, tornarem-se a mandar para o quadro; em quanto se fizer isto, assim como votarem-se 20:000$000 réis de subsidio para um theatro e gastarem-se 40; em quanto o Governo vier a esta casa dizer que o programma foi mal feito, que tratará de o emendar e depois mandar um commissario arranjar companhia para esse theatro; que esperança póde haver de que se organisara as finanças? O tempo em que se fallava de grandes desperdicios, vê-se hoje que figuravam n'uma escala muito mais diminuta do que a que hoje se apresenta. Hoje que as nossas necessidades teem crescido prodigiosamente, é que se quer que a Camara voto despezas com que o paiz não póde. Em rigor é só isto o que o orador vê neste projecto. Deseja saber se elle é da iniciativa do Governo, ou de algum Sr. Deputado.

O Sr. Visconde de Ourem — Este projecto teve origem na Camara dos Srs. Deputados, por um requerimento do proprio interessado, foi ouvido o Governo e deu as informações precisas.

O orador — E estas informações foram remettidas para esta Camara e acham-se na secretaria? (O Sr. Visconde de Ourem — Sim, senhor, foram examinadas pela commissão.) À vista disso parece ao orador, que a commissão devia dizer qual foi a causa da apresentação; pois segundo ouviu dizer parece ter sido dada por proposta vocal do contador de Marinha. (O Sr. Visconde de Ourem — Essa informação é da Secretaria de Marinha.) O orador lamenta muito que os negocios publicos corram por esta fórma; pois é possivel que haja uma secretaria que dê uma informação, dizendo que não sabe a razão porque um individuo foi aposentado?! E lamentando que assim seja, chama a attenção do Sr. Ministro da Marinha, sobre o andamento deste negocio, para que se não repita. Não se atreve a votar contra o projecto porque é uma justiça que se faz a este individuo, mas deplora que se tragam ás Camaras objectos desta natureza.

O Sr. Ministro da Marinha — Como disse o Sr. Visconde de Ourem a commissão ficou satisfeita com as informações que se deram; e se o Digno Par o Sr. Conde de Thomar fizesse attenção ao artigo 1.°, veria que esta aposentação teve logar no tempo de excitações politicas; data de 30 de Junho de 1847, e por isso não admira que se fizesse obra por informações verbaes. Actualmente só se tracta de fazer justiça a esse individuo, e sem que por ella se augmente mais a despeza.

O Sr. Presidente — Como ninguem mais tem a palavra, vou pôr á votação o projecto.

Foi approvado, tanto na generalidade como na especialidade, e a mesma redacção.

Entrou em discussão o parecer (n.° 84).

A commissão de fazenda tendo examinado o projecto n.º 92, vindo da Camara dos Srs. Deputados, a fim de ser auctorisado o Governo a conceder a Joaquim Candido de Moraes um titulo de renda vitalícia pela importancia do rendimento do officio de Escrivão do extincto Tribunal da Relação do Porto, é de parecer, que pelos ponderosos motivos em que se fundou a commissão de fazenda daquella Camara, deve o referido projecto ser approvado, para ser convertido em Lei, obtendo a Sancção Real.

Sala da commissão, 10 de Julho de 1857. = Visconde de Castro — Visconde de Algés = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão — Barão de Chancelleiros.

PROJECTO DE LEI N.° 92.

Artigo 1.° É o Governo auctorisado a conceder a Joaquim Candido de Moraes um titulo de renda vitalícia, pela importancia do rendimento legalmente approvado, do officio de Escrivão do extincto Tribunal da Relação do Porto, na proporção marcada no artigo 2.° do Decreto de 16 de Janeiro de 1834, e nos termos da Lei de 22 de Julho de 1853.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 10 de Julho de 1857. — Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado, Secretario = Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario.

O Sr. Visconde de Athoguia (sobre a ordem - Desejava saber se o Sr. Ministro da Marinha, que se acha presente, poderia dizer-lhe se este projecto é da iniciativa do Governo: que talvez não devesse fazer-lhe esta pergunta por se tratar de um assumpto que não é da sua repartição; mas que não obstante se decidiu a fazel-a, porque podia ser que podesse dar-lhe uma resposta satisfactoria.

Disse, que quando se oppõe a qualquer projecto que vai beneficiar qualquer individuo, não é pelo desejo de impedir esse beneficio, mas para evitar más consequencias: e por isso é que desejava saber se o Sr. Ministro póde informar a Camara se este projecto é da iniciativa do Governo ou não.

O Sr. Ministro da Marinha — Não me acho habilitado para informar o Digno Par, o melhor seria ouvir o Sr. Ministro da Repartição competente, adiando-se agora este projecto.

O Sr. Presidente — Os Dignos Pares que approvam o adiamento, queiram levantar-se.

Foi approvado.

Entrou em discussão o parecer (n.° 73).

Foi presente á commissão de fazenda o projecto de lei n.º 71, vindo da Camara dos Senhores Deputados, tendo por fim augmentar as prestações aos egressos que completarem sessenta annos de idade, applicadas as regras estabelecidas no Decreto de 20 de Junho de 1834, e applicada assim a Lei de 24 de Julho de 1856, sem que todavia as prestações augmentadas por esta fórma deixem de ficar sujeitas ás reducções decretadas posteriormente ao mesmo Decreto; e a commissão tendo por incontestavel que a classe dos egressos, por muitos motivos de rigorosa justiça e de humanidade, são dignos da contemplação do Legislador, e considerando que a idade provecta exige o proposto melhoramento de subsidio, ainda que pouco importante, se sê abstrair das circumstancias menos prosperas do Thesouro, é de parecer que o mesmo projecto devo ser approvado a fim de subir á Sancção Real.

Sala da commissão, em 3 de Julho de 1857. = Visconde de Castro = Barão de Chancelleiros — Francisco Simões Margiochi — Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão — Visconde de Algés.

PROJECTO DE LEI N.° 71.

Artigo 1.º As prestações dos egressos, desde que completarem sessenta annos de idade, serão augmentadas segundo as regras estabelecidas pelo Decreto de 20 de Junho de 1834 para aquelles que, nessa época, estavam nas circumstancias de gosar da prestação maxima; ficando todavia as prestações assim augmentadas sujeitas ás reducções decretadas posteriormente.

Art. 2.º Fica explicada por este modo a Lei de 24 de Julho de 1856, e revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 27 de Junho de 1857. — Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado, Secretario = Antonio Pequitto Seixas de Andrade, Deputado, Secretario.

Approvado sem discussão, e a mesma redacção.

O Sr. Presidente — A proxima sessão terá logar na sexta-feira, sendo a ordem do dia os seguintes projectos n.°s 82, 82 A e 95.

Levantou a sessão eram quatro horas da tarde.

Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 3 de Fevereiro de 1858.

Os Srs.: Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, das Minas, de Ponte de Lima, e de Vallada; Patriarcha Eleito; Condes: das Alcaçovas, d'Alva, dos Arcos, de Arrochella, da Azinhaga, do Bomfim, de Linhares, de Mello, de Paraty, da Ponte de Santa Maria, do Sobral, e de (Thomar; Viscondes: d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castellões, de Castro, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres, de Laborim, de Ovar, de Ourem, e de Sá da Bandeira; Barão da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Ferrão, Margiochi, Silva Carvalho, Larcher, Silva Costa, Izidoro Guedes, Silva Sanches, e Brito do Rio.

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