DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 129
nete, a proposito de algumas questões que se têem suscitado.
Antes, porém, de entrar nessa analyse, eu aproveito esta occasião para me referir a uma asserção feita pelo digno par e meu amigo, o sr. marquez de Vallada, que sinto não ver presente.
Como, porém, nada tenho que dizer contra s. exa., não hesito em me referir a essa asserção n'este momento, procurando expor a realidade dos factos a que s. exa. de certo involuntariamente não attendeu.
Aproveito com prazer a occasião de procurar restabelecer a verdade, porque entendo que a todos os homens publicos, e principalmente aos que se assentam n'estes logares, lhes corre o dever de provar a sua coherencia politica.
Pela minha parte prezo-me de ter mantido sempre em todos os meus antecedentes politicos a mais perfeita harmonia e coherencia, e folgo de ter ensejo de o provar até á evidencia. (Apoiados.)
O sr. marquez de Vallada, antes de entrar em discussão o projecto de resposta ao discurso da corôa, e passando em revista os actos do governo, que censurou, fez uma referencia á commissão que exerci ha pouco tempo na America, e para a qual fui nomeado pelo governo regenerador. S. exa., referindo-se nos meetings que houve em Lisboa com respeito, á que tão chamada da Zambezia, disse que os ministros actuaes lá tinham estado, excepto o ministro da marinha, que então estava fora do paiz exercendo uma commissão ao serviço do governo regenerador.
Sr. presidente, é muito simples e muito facil a minha completa justificação.
Eu respeito muito o partido regenerador, assim como respeito todos os partidos, e n'elles tenho numerosos amigos, mas a minha lealdade e a verdade dos factos impõe-me o dever de declarar que nunca tive a honra de pertencer ao partido regenerador. (Apoiados.)
Entrei na vida politica, haverá vinte, annos, tendo sido nomeado governador civil do Funchal pelo sr. duque de Loulé. Então, como delegado de confiança d'aquelle governo, não podia deixar de adoptar a sua politica; e assim, fiquei filiado no partido historico que sempre tenho acompanhado em todas as phases. Depois de governador civil do Funchal fui nomeado para igual cargo em Braga, e posteriormente no Porto.
Em 1860 fez-se a fusão entre o partido historico e o partido regenerador, e eu acompanhei esse acto. Desfeita a fusão eu voltei ao tronco politico donde tinha saído, e continuei a seguir o meu antigo partido. Em 1878 occorreu-me que seria vantajoso para o paiz o desempenho de uma missão nos estados do sul da America para fazer tratados de commercio com aquelles paizes, inspeccionar os consulados que pareciam estar um pouco descurados, e para abrir novos mercados ao commercio de Portugal. O governo de então achou vantajosa a idéa que eu lhe apresentei com todo o desprendimento politico. Era então ministro dos negocios estrangeiros o sr. Andrade Corvo, e a s. exa. expuz a conveniencia d'esta commissão diplomatica que tambem alguns amigos meus lhe recommendaram. O sr. Corvo, com aquella largueza de vistas que o caracterisa e isenção partidaria que tanto o ennobrece quando se trata do serviço publico e dos interesses do paiz, comprehendeu o alcance de uma missão d'esta natureza, e não hesitou em me nomear para ella. Não houve a menor troca de palavras que dissesse respeito a politica partidaria.
O sr. Corvo: - Apoiado.
O Orador: - O illustre ex-ministro dos negocios estrangeiros, a cuja nobreza de sentimentos eu folgo de prestar homenagem n'esta occasião, não me podia propor, nem eu podia acceitar nenhum compromisso politico.
O sr. Corvo: - Apoiado.
O Orador: - S. exa. entendeu que eu poderia desempenhar aquella commissão com utilidade para o paiz e incumbiu-me d'ella.
Eu acceitei, e o modo por que me desempenhei consta de quatorze tratados que fiz com differentes republicas da America do sul, os quaes espero que ainda n'esta sessão virão ao parlamento para serem approvados e depois ractificados. Consta tambem de numerosos relatorios que estão impressos n'um livro que tem tido benévola acceitação no paiz e fóra d'elle.
Esses tratados e esses relatorios abonam, creio eu, á maneira conscienciosa por que procurei desempenhar-me do serviço que, com toda a isenção politica, me incumbira o sr. Corvo.
Está, pois, demonstrado que nenhum vinculo politico me ligou ao partido regenerador pela rasão de ter acceitado a missão a que me referi. O meu partido tambem assim o considerou, e d'isso esteve sempre seguro, tanto que constituindo governo propoz este ao poder moderador a minha nomeação de par do reino, tendo mais tarde sido convidado a fazer parte do gabinete. Portanto não ha senão coherencia no meu procedimento politico.
Passarei agora a outro ponto. O digno par, o sr. Fontes, fazendo a analyse dos actos do governo, e censurando-os, disse no fim do seu discurso: que o governo, de que eu tenho a honra de fazer parte, tinha cedido diante de tudo, e que até mesmo tinha cedido diante do seu collega da marinha, na questão da Zambezia. S. exa., posto que não se demorasse a discutir esto ponto, não deixou de fazer comprehender que a minha opinião e a dos meus collegas no gabinete eram differentes sobre a maneira de resolver essa questão, e que as minhas idéas estavam em discordancia com as do sr. marquez de Sabugosa, o qual aliás tinha procedido de accordo com os membros do actual ministerio. Assim quiz s. exa. provar que eu tinha feito passar o governo pelas forças caudinas. Ora os meus actos, n'esta questão, estão em perfeito accordo com as precedentes resoluções do governo.
Esses actos, constantes dos diplomas que firmei com o meu nome, estão, nem podiam deixar de estar, em harmonia com os actos do meu illustre antecessor, dos quaes são, por assim dizer, a consequencia.
O sr. Marquez de Sabugosa tinha julgado a questão da Zambezia atravez de um certo prisma, e foi acompanhado na sua maneira de a encarar pelos seus collegas do ministerio, sendo todos solidarios nas resoluções tomadas.
O sr. marquez de Sabugosa saiu do ministerio em perfeita harmonia com o governo, e só por um acto espontaneo da sua vontade. Sendo eu chamado para o substituir, vim partilhar a solidariedade de todos os ministros n'esta questão, e não podia pelos meus actos collocar-me em desaccordo com os meus collegas.
Eu devia fazer esta declaração, porque desde que entrei para o ministerio tenho visto que a opposição tem apreciado esta questão, alludindo sempre a desaccordo entre a minha opinião e a dos meus illustres collegas.
Comtudo, sr. presidente, o que é certo é que a opposição, n'esta sua apreciação, labora em erro, e firma-se em bases falsas.
Eu creio que não se quer fazer o confronto das minhas idéas ou das minhas palavras, com as idéas e palavras do meu illustre antecessor; só deve fazer-se o confronto dos actos officiaes.
Pois bem, se formos comparar os actos por mim praticados com os do meu antecessor, veremos que ha harmonia e não contradicção.
Os meus actos limitam-se a dois diplomas: á portaria de 26 de julho do anno passado, e ao despacho dado ao requerimento feito pela sociedade dos fundadores da companhia geral da Zambezia, com data de 3 de dezembro do mesmo anno.
O que é que se tem feito com relação á questão da Zambezia? Reconheceu-se a concessão, porque se encontraram direitos adquiridos, os quaes o governo entendeu dever respeitar,