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150 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

de se manterem nos estrictos limites d’aquillo que era justo, conveniente e necessario para a causa publica.

Não se considera melhor, antes peior do que os seus antecessores; por isso julga-se absolutamente incapaz de evitar aquillo que homens tão eminentes, como os que governaram o paiz, no periodo largo de 1870 a 1885, não poderam evitar.

N’estas circumstancias, está convencido que a illimitação depares vitalicios havia de reproduzir as antigas scenas das fornadas, mais aggravadas ainda, porque os homens de governo, hoje, têem menos resistencia e energia do que os antigos, e os nossos costumes, a todos os respeitos, estão mais flacidos, frouxos e moles.

Qual seria o unico motivo que poderia justificar o numero illimitado de pares? Seria a possibilidade de modificar a camara quando circunstancias politicas importantes o determinassem.

Como se fazia essa modificação? Por meio das fornadas. Ora em 1881 tinham-se feito duas fornadas e o governo ficou sem maioria. O remedio era, pois, inefficaz.

Dá-se ainda a circumstancia capital de que elle, o que julga acima de tudo importante, é que a camara seja constituida de modo a que não possa ser modificada á vontade de qualquer governo, quando esteja pendente uma questão de alta importancia politica.

Dirão que d’ahi póde resultar o inconveniente de um conflicto da camara dos pares com a dos deputados, mas deve, mas póde admittir-se que esta camara se determine por motivos alheios á rasão da sua propria existencia?

O senado do imperio brazileiro era composto de numero limitado de senadores vitalicios. O facto da nomeação ser feita pelo Imperador sobre uma lista multipla em nada modificava o principio da limitação do numero.

O senado brazileiro funccionou durante sessenta annos, sem levantar conflictos com a outra camara.

Confia no bom criterio dos dignos pares. Decerto reconhecem que elle quiz o numero fixo para evitar o abuso das fornadas successivas, inconvenientissimo sempre, e principalmente n’uma epocha em que as paixões politicas estejam excitadas.

Bem sabe que em Inglaterra o numero de pares não é limitado, mas os costumes politicos de Portugal não são os da Inglaterra. Lá não se fazem fornadas, lá não tem sido necessario reformar a camara dos lords, porque as nomeações para membros d’essa camara só são feitas pelo chefe do estado, como premio de serviços relevantes e exccpcionaes.

O que, porém, se vê, e é occasião de o dizer ali, é que em quasi todos os paizes, quando as camaras altas se põem em conflicto com as camaras populares ou teem de ser renovadas a miudo, se a sua constituição o permitte, ou são ameaçadas na sua propria existencia, como acaba de succeder era França.

Comprehende-se que não possa deixar de ser assim.

Quando uma casa do parlamento se acha só em campo contra a marcha politica. e administrativa do governo, não deve ser ella que a possa impedir, nem impedir que as leis necessarias sejam votadas, só pela sua resistencia e querendo impor a sua vontade.

Foi assim, embaladas por esta idéa, que as opposições de 1884 entenderam que podiam impor-se.

Uma cousa só haverá, uma unica, que contra esta reforma com numero fixo se possa apresentar, não como argumento, mas como base de vaticinio seguro: é que, tendo sido excluida a parte electiva d’esta camara, ficando a camara com numero fixo e sendo preenchidas todas aã vagas por proposta do governo que fizesse a reforma, nenhum outro se poderia tão cedo manter, se ella quizesse fazer politica contra elle.

Mas, para que esse vaticinio se realisasse, era preciso que o actual governo faltassse ao seu empenho de aperfeiçoar o regimen parlamentar, e em vez d’isso tivesse o egoismo de propor elle ao chefe do estado o preenchimento de todas as vagas de pares do reino.

Não o fará.

Imaginar isso seria cuidar que os dirigentes da actual situação pretenderiam governar aqui, não só quando estivessem no poder, mas mesmo quando fossem opposição.

E seria injusto attribuir esse proposito ao actual governo que timbra em provar a lealdade com que invoca a conveniencia do paiz e das instituições, que deseja bem servir.

Affirma bem alto, perante os dignos pares, que o governo, de que tem a honra de fazer parte, proporá, sim, o preenchimento de vagas existentes n’esta camara, mas só de parte d’ellas.

Dirá mais: aquelles que teem a responsabilidade desta reforma, se pretendem influenciar aqui, é pedindo aos seus amigos que não venham provocar n’esta camara questões politicas, pois o que desejam é que esta camara seja um instrumento de ordem e de correcção á natureza mais accentuadamente politica da camara popular.

Não se póde dizer que se quer para esta camara uma organisação em circumstancias d’ella funccionar como camara de ponderação e revisão, para no dia immediato desmentir essas palavras.

O orador, tendo-se referido á possibilidade de conflicto politico entre as duas casas do parlamento, passou em seguida a tratar da resolução das divergencias que se podem levantar na apreciação de um dado projecto de lei.

Dando-se algum conflicto parcial entre a camara dos pares e a dos senhores deputados, o projecto que se discute estabelece no seu artigo 5.° a maneira de o resolver por forma efficaz, o que não existia na legislação anterior. N’essa legislação, havia já, uma commissão mixta de pares e deputados, para resolver, mas não chegando ella a um resultado, não se podia caminhar.

Agora, porém, pelo artigo 5.° do projecto em discussão, estabelece-se da maneira a mais clara e positiva qual o meio porque se ha de resolver esse conflicto. Quando a commissão de pares e deputados não chegar a resultado algum sobre o assumpto que se tratar, poderá qualquer das duas camaras pedir a reunião das côrtes geraes.

O indispensavel é que a camara dos dignos pares tenha sempre uma feição differente da camara dos senhores deputados.

Assim uma poderá servir de correcção á outra, mas correcção que de modo nenhum oifende os melindres de qualquer d’ellas.

Uma poderá modificar as paixões, o espirito partidario da outra.

É á falta do eleitor que se deve attribuir a instabilidade das nossas leis eleitoraes, e mesmo ultimamente a da organisação d’esta camara.

Se em Portugal o eleitor soubesse fazer uso do direito que a lei lhe dá, como acontece, por exemplo, em França e em Inglaterra, e se os actos eleitoraes fossem o que deviam ser, não haveria conflictos, porque não os podia haver sobre a maneira de interpretar o modo de sentir do paiz, e até mesmo a reforma que estamos descutindo não teria de ser publicada. Mas, infelizmente, em Portugal não têem tido os governos que sáem das eleições, mas as eleições que sáem dos governos.

É para desejar que esta deficiencia do nosso organismo politico e social se vá modificando lentamente.

Ia terminar o seu discurso, antes, porém, devia referir-se a accusações feitas á inconstitucionabilidade e illegabilidade da reforma parlamentar.

Os que accusavam o governo por esse facto esqueciam-se que á Inglaterra, o paiz clássico de liberdade, tinhamos nós ido buscar a palavra com que se designa a lei que releva a responsabilidade do governo por ter assumido a dictadura. Não lhe consta que bill seja palavra portugueza.

Mas foi, porventura, o actual governo que inaugurou o meio dictatorial para reformar a carta? Todos sabem que