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SESSÃO N.° 16 DE 26 DE FEVEREIRO DE 1896 151

não. O governo de 1852, composto de estadistas eminentes, presidido por um homem cheio de serviços á causa liberal, decretou em dictadura a reforma de alguns artigos da carta. Para que em tudo seja igual o precedente, decretou, tambem em dictadura, a reforma da lei eleitoral, em virtude da qual foi eleita a camara que depois veiu validar esse decreto. Que differença ha, pois, entre a situação actual e a de 1852?

O sr. Conde de Lagoaça: — Ha, a revolução.

O Orador: — Em 1852 não havia já revolução. O digno par deve saber que quando se decretou a urgencia da reforma de 1852 havia a revolução terminado mais de um anno antes, fechando-se até o ciclo dos movimentos revolucionarios em Portugal. Portanto, não existe essa differença. Quer o digno par saber onde está a differença? Está que em 1852 o partido da opposição, deposto do poder, por uma revolução, e cujo chefe estava no exilio, o pae do sr. conde de Thomar, entendeu que devia concorrer á urna entendeu que devia dar batalha politica ao governo.

Em 1852 o partido da opposição veiu tomar parte na discussão da reforma saída da mesma origem de que esta saiu. Na camara dos senhores deputados, um homem distincto e eminente, o sr. duque d’Avila e Bolama, apresentou uma questão previa sobre a origem do decreto que tinha declarado urgente a reforma da carta. A camara, por moção apresentada pelo sr. conde do Casal Ribeiro, votou que tinha pelo decreto da dictadura poderes e faculdades, para reformar a carta. Foi assim, vindo ás camaras, não desertando nem de uma nem de outra, não fugindo da urna, que a opposição procedeu n’essa epocha da nossa vida constitucional.

Aqui está a differença entre 1852 e hoje.

Não quer fatigar a attenção da camara, julgou, porem, do seu dever expor-lhe as rasões, boas ou más, que levaram o governo a fazer a reforma.

A camara a avaliará na sua alta sabedoria.

Tem-se dito que as reformas politicas foram decretadas pelo governo em seu favor e para seu proveito. Elle julga haver demonstrado á camara que foram feitas em proveito do parlamento e do paiz, e não do governo. A este o beneficio que d’aqui lhe resultou é sabido e conhecido de todos: ter de se privar do concurso de muitos dos seus amigos, tanto n’esta como na outra casa do parlamento, amigos tão leaes, tão dedicados que se sacrificaram a esse afastamento sem uma palavra sequer de censura para o governo.

Pergunta: é afastando os amigos que se criam clientelas?

Em relação á lei das incompatibilidades ha de sentir em toda a sua vida publica, por muito larga que ella seja, os attrictos, as animadversões, os azedumes que ella lhe creou.

Permittam-lhe ainda uma pergunta: Não seria, com relação á organisação daquella camara, não seria muito mais facil ao governo poder contar de antemão com a benevolencia de quarenta ou cincoenta pares? Que lucrou, po o governo, que proveito tirou de dar á camara a organisação que ali se está discutindo?

A obra do governo póde ser uma obra errada, póde ser improficua, póde ser como tem sido todas as outras reformas politicas, inutilisada por determinadas circumstancias, mas é uma obra sincera e de boa fé.

O governo não se determinou por interesses de clientella nem de partido. Determinou-se apenas pelo. desejo de robustecer o principio da auctoridade e de levantar o prestigio das instituições parlamentares.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado.)

(O discurso será publicado quando o orador o entregar.)

O sr. Conde de Lagoaça: — Começa por mandar para a mesa a sua moção de ordem:

«A camara, affirmando o seu profundissimo respeito ás instituições vigentes e á carta constitucional, passa á ordem do dia; 26 de fevereiro de 1896. = Conde de Lagoaça, par do reino.»

O nobre ministro do reino fallara admiravelmente; mas no que dizia respeito a rasoes; pelas, quaes o convencesse da necessidade de reformar a camara dos pares, nada dissera.

S. exa. era um parlamentar experimentado, um orador consagrado; eram muitos e justos os triumphos que tem obtido com a sua palavra fluente, mas, permittisse-lhe dizer que nunca ouvira discurso politico mais fraco do que o que s. exa. acabava de pronunciar.

S. exa. estivera em contradicção com todos; até consigo mesmo.

S. exa. limitarar-se a fallar ácerca do bill que já estava votado por esta casa do parlamento.

O illustre ministro, por motivo que o orador muito respeitava, não poderá comparecer n’esta camara por occasião da discussão do projecto, e aproveitara hoje o ensejo para dizer quaes os motivos que tinham levado o governo a fazer uma larga dictadura.

O orador provára até á saciedade que nenhum motivo de ordem publica podia levar o governo a entrar na dictadura.

O sr. ministro do reino, para justificar o governo de ter entrado na assombrosa dictadura que alterou o regimen parlamentar e eleitoral da camara dos senhores deputados, repetira as palavras do sr. presidente do conselho.

Perguntava á camara e ao paiz em que parte do mundo civilisado se consentiria que um ministro dissesse ao parlamento que a rasão por que fôra rasgada a lei, a constituição do estado, a rasão maxima d’esse crime politico que não se desculpava, e para o qual não podia haver perdão, tinham sido os disturbios de meia duzia de cavalheiros, aliás excellentes pessoas, mas que podiam chamar-se —se o termo era parlamentar — arruaceiros.

Então meia duzia de arruaceiros podiam influir no animo recto e justiceiro do nobre ministro do reino a ponto de o fazer desviar do caminho da legalidade?!

S. exa., que tivera energia para tantas cousas, não encontrara maneira de levar a ordem ás desgarradas ovelhas do regimento da camara dos senhores deputados?!

Fôra preciso comprometter a corôa e a camara dos senhores deputados?

Dentro da constituição do estado, já o demonstrara n’outra occasião, o governo tinha meios de evitar que a unica solução, como dissera o sr. ministro do reino, fosse a dictadura.

Mas porque não empregara o governo esses meios? Porque elle proprio se collocára na situação de não poder empregal-os. A culpa fôra toda sua.

Porque não reuniu as camaras mais cedo? De 7 de março a 1 de outubro decorreu longo tempo. Não tivesse esperado por esse dia, porque já conhecia as difficuldades, e não tivesse compromettido por fórma alguma a corôa, as instituições vigentes, e o funccionamento regular das discussões parlamentares.

O sr. ministro do reino fallára ainda ácerca do regimen eleitoral, atacando-o desapiedadamente.

Mas com que auctoridade podia s. exa. fazel-o?

S. exa. saíra d’esse regimen. N’esse regimen fôra deputado; d’esse regimen saíra ministro.

Nascera e brincara n’esse regimen quebrando carteiras.

Se eram verdadeiras as accusações que fulminara sobre o antigo regimen eleitoral, s. exa. não representava ali a vontade do paiz; estava ali por um acaso ou por um guet-apens.

O sr. Presidente: — Parece-me conveniente que o digno par não discuta a pessoa do sr. ministro do reino. (Apoiados.)

S. exa. tem completa e ampla liberdade de apreciar os actos do nobre ministro, combatel-os com toda a energia