188 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
naturalmente para possuir um tão precioso monumento, porque é certo não se encontrarem facilmente no paiz reliquias de seculos tão remotos. Alem d'esta, encontram-se no interior da igreja, no claustro e nas paredes dos corredores muitas outras lapides, algumas das quaes apesar de muito antigas, n'um bello estado de conservação.
Para dar á camara uma idéa perfeita, tanto quanto possivel, das preciosidades archcologicas encerradas no convento, citarei ainda um monumento de valor inestimavel; sem duvida um dos melhores, senão o melhor que o nosso paiz possue da epocha da dominação romana.
Forma este monumento uma pedra de finissimo marmore branco medindo approximadamente 2 metros de comprido, terminada era cada extremo por antigas mascaras de comedia.
Um outro motivo architectonico, uma cabeça de carneiro, se bem me recordo, divide a pedra em dois paineis, contendo cada um d'elles cinco ou seis figurinhas esculpidas em alto relevo representando scenas de theatros d'aquellas epochas. O estado de conservação do monumento é perfeito.
Pois este monumento foi ha poucos annos arrancado da parede onde estava embutido, e encaixotado para figurar em uma das exposições que ultimamente tiveram logar. Fez-se isto por ordem, não sei de quem, nem tão pouco sei que repartição do estado concedeu tal auctorisação; em todo o caso, sr. presidente, o monumento figurou na exposição e, o que é mais para admirar, por não ser commum em Portugal, é elle ter voltado ao sitio de onde saíra.
É certo, porém, que voltou, porque eu lá o vi no anno proximo passado mettido ainda no caixilho que se fez para a sua remoção.
Hoje não sei se ainda lá existirá!
São estas as considerações que tinha a fazer com respeito ao convento de Chellas, e, terminando, peço ao nobre ministro da guerra, com toda a instancia, que empregue toda a sua boa vontade e energia para que as quatro ou cinco casas que estão indevidamente na posse das missões ultramarinas passem para o ministerio da guerra como é letra expressa da lei, a fim de serem destinadas a depositos da nova fabrica da pólvora, e que igualmente seja entregue a igreja á irmandade do Senhor Jesus do Bomfim, para depois de convenientemente separada ser novamente aberta ao culto.
Aproveito a occasião de estar com a palavra e achar-se presente o sr. ministro da fazenda para lhe agradecer a fineza das respostas dadas por s. exa. a umas perguntas que eu tive a honra de lhe dirigir n'uma das anteriores sessões.
São duas as respostas:
Pelo teor da primeira, reconheci ter uma das commissões ultimado os seus trabalhos e entregue o respectivo relatorio no ministerio da marinha, em 15 de outubro de 1891.
Para boa intelligencia de v. exa. e da camara, passo a lel-a na integra: «Por decreto de 28 de novembro de 1889, foi nomeada uma commissão para apresentar um projecto do arsenal e suas dependencias: Esta commissão foi reconduzida por portaria de 2 de maio de 1890 e apresentou em l5 de outubro de 1891 as conclusões dos seus trabalhos, indicando os terrenos da Outra Banda entre o pontal de Cacilhas e a Margueira, para as installações do arsenal, que precisavam de uma area de 32 hectares, segundo a mesma commissão.
«Em portaria de 12 de novembro de 1895, foi enviada uma nova commissão para indicar as installações necessarias a fazer no local escolhido, para construcção e reparações de uma esquadra, nos termos do decreto de 20 de março de 1890, com o respectivo orçamento e periodo para a execução dos trabalhos.»
Sendo pois certo ter a commissão, a que me refiro, terminado os seus trabalhos, mando para a mesa um requerimento redigido da fórma seguinte:
«Requeiro que, pela secretaria d'estado dos negocios da marinha e do ultramar, seja enviada a esta camara, com a possivel brevidade, copia do relatorio, parecer e conclusões da commissão nomeada por decreto de 28 de novembro de 1889, reconduzida pela portaria de 2 de maio de 1890, e que foi encarregada da escolha de um local apropriado para a construcção de um novo arsenal de marinha, tendo sido os respectivos trabalhos entregues no ministerio da marinha em 15 de outubro de 1891.
o Sala das sessões da camara dos pares, em 17 de agosto de 1897. = Fernando Larcher, par do reino.»
Eis agora o teor da segunda resposta:
«Existe por conseguinte apenas a commissão de 12 de novembro de 1895 que ainda não concluiu os seus trabalhos; mas já procedeu aos primeiros estudos, isto é, fez executar um levantamento hydrographico abrangendo a superficie calculada necessaria, entre o pontal de Cacilhas e o Caramujo, e começou-se em seguida com a sondagem geodesica do que se fizeram uns quatro furos. Tendo-se approximado o inverno suspenderam-se os trabalhos, que ainda não recomeçaram, nem a commissão tem reunido por não ter presidente, que em tempo pediu a exoneração.»
Em consequencia das ultimas linhas d'esta resposta parece-me poder-se deprehender claramente ter o governo abandonado, por agora, pelo menos, a idéa da construcção de um novo arsenal de marinha capaz de responder ás necessidades do fabríco ordinario e grandes concertos de que por vezes carecem os navios modernos, de maneira que continuaremos a não ter no paiz um estabelecimento official onde se possam construir, nem ao menos concertar navios de guerra de ferro e aço.
A camara não ignora que ao nosso arsenal de marinha, á excepção do cruzador D. Amelia, cuja construcção está começando, nenhum navio de moderno systema se tem construido.
Nem para reparações de importancia ali ha proporções. Tudo encommendâmos ao estrangeiro, até as reparações dos navios. É d'isso prova irrecusavel terem chegado ha pouco de Inglaterra a corveta Affonso de Albuquerque e a canhoneira Rio Lima, tendo estes navios ali recebido o fabrico de que careciam.
E comtudo parece-me que com um pouco de boa vontade mesmo dentro das forças do nosso orçamento, nós podiamos ir tratando de construir a pouco e pouco um novo arsenal, que nos libertasse, pelo menos para os concertos, da tutela estrangeira tão pesada ás vezes de supportar.
Como já não vejo presente o sr. ministro da marinha, eu pediria que qualquer dos seus illustres collegas presentes me fizesse o favor de lhe transmittir estas minhas considerações.
Não cansarei mais a attenção da camara e termino, pedindo desculpa do tempo que lhe tomei.
Foi lido na mesa e expedido o requerimento mandado para a mesa pelo digno par e acima transcripto.
O sr. Ministro da Guerra (Francisco Maria da Cunha): - Sr. presidente, effectivamente por carta de lei de 6 de junho de 1882 foi o governo auctorisado a applicar o extincto convento de Chellas á fundação de um collegio filial das missões ultramarinas, para n'elle se ministrar o ensino primario e secundario aos alumnos que se propozessem a seguir os estudos superiores e ordenação ecclesiastica no collegio central das missões ultramarinas, havendo uma secção para ensino agronomico e de artes fabris dos individuos que pretendessem acompanhar os missionarios e ensinar aos indigenas as artes mechanicas.
Por decreto de 23 do agosto de 1883 foi de facto concedido aquelle edificio e suas dependencias ao collegio de Sernache do Bomjardim, com aquelle fim; como, porém, não fosse utilisada a concessão, havendo passado seis an-