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188 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

podia supprir, - que tão pouco Ministro é, que para pouco ou nada pode servir.

Dito isto, vou fazer a recapitulação da minha anterior oração, recordando que mandei para a mesa, e analysei, os telegrammas trocados entre o Sr. Presidente do Conselho e a nossa legação de Paris, acêrca da questão dos tabacos, e similarmente procedi com relação á troca de notas entre as chancellarias portugueza e franceza, concernentemente ao mesmo assumpto.

Da analyse que fiz conclue-se que o Sr. Presidente do Conselho Conhecia, de longa data, a preferencia exigida em Paris para a effectivação da emissão das obrigações dos tabacos, por par te da finança cosmopolita e seus adherentes. Reilhac for ever - é a divisa ali predominante, tudo deixando suppôr que Reilhac é apenas um rotulo l'homme de paille, o testa de ferro de entidades de diversa categoria. Reilhac é a mola real da projectada operação, tão cubiçada - em certas espheras.

É fora de duvida tambem que, a despeito das suas affirmações em contrario, o Sr. José Luciano teve conhecimento d'essa preferencia, e com ella se amoldou, em todo o ponto, e com ella, triste é recordal-o, comprometteu os mais caros interesses do paiz, e deixou n'um farrapo a dignidade nacional.

Se tivesse trabalhado, aberta e lisamente, para a liberdade dos tabacos, como eu desejo e sustento, ter-se-hia conseguido esse desideratum reparador das nossas finanças e do brio nacional, porque, para tal fim, appareceram as facilidades representadas pela proposta da casa Hambro e pela dos banqueiros dos Estados Unidos.

Em logar d'isso, o Sr. Presidente do Conselho provocou, pelo seu imprudente telegramma, a intervenção do Governo Francez na nota diplomatica, cuja summula se reduz á affirmativa de que a consignação dos tabacos não é penhor sufficiente para os obrigacionistas, que desejam ter partilha na administração do monopolio. O Sr. José Luciano, sem reclamar contra tão deprimente imposição, disfarçada em conselho dito amigavel, formulou o artigo 8.° Só contrato, estabelecendo a séde da companhia em Paris. Contra esta vergonha nacional protestei eu aqui, em abril; e do artigo 8.° foi riscada essa indicação, mas capciosamente se occultou onde devia ser a sede da companhia exploradora.

Conforme se observa, e consoante a letra da emenda feita ao alludido artigo, a sede social pode estabelecer-se em Paris, como primitivamente se designou.

Não ha affirmação mais completa de quanto o Sr. Presidente do Conselho está enfeudado á Companhia dos Tabacos. N'essa sua orientação, compromette fundamentalmente a dignidade, o brio e o decoro nacionaes, e os interesses financeiros do paiz.

Quero crer, Sr. Presidente, que, a despeito da indifferença publica, o Sr. José Luciano ha de ser forçado a sahir do Ministerio, custe o que lhe custar.

A questão dos telegrammas e das notas diplomaticas representa o golpe de misericordia, depois da longa via dolorosa por elle já percorrida, e ainda não concluida. Haja em vista a recente publicação das actas da commissão de fazenda da Camara Electiva, é as referencias feitas pelas Novidades, de hontem, com respeito aos documentos secretos relativos ao emprestimo de D. Miguel, e reunidos em collecção com a data de 1852.

Procurarei voltar mais tarde a esta questão, porque o jornal que a levantou tem indiscutivel auctoridade no assumpto.

Se ao Sr. Presidente do Conselho restasse um vislumbre de bom criterio S. Exa. devia tomar a iniciativa em pedir a exoneração do Gabinete, Expiaria assim, devidamente, os seus erros e os transtornos que tem causado ao credito e bom nome do paiz.

Nós somos os alliados da Inglaterra, e é a França que sobre nós está exercendo a pressão de que exclusivamente são alvo as nações que vivem alheadas da representação nacional, que se dirigem por oligarchias, que não se fiscalizam reciprocamente.

Nem o exemplo viril da Venezuela, por mim tão invocado, tem calado no espirito dos governantes, a fim de patentearem que a autonomia do povo portuguez não é uma palavra vã.

Protesto, Sr. Presidente, de novo, contra semelhantes normas de administração, que nos deprimem e exautoram; e recordarei ainda que, na sessão anterior, occupando-me da ai ta magistratura, facil me foi comprovar quanto ella se afasta do trilho direito, quando sancciona latrocinios eleitoraes, como o da Azambuja.

Posto isto, seja-me licito lembrar que o Sr. Conselheiro Beirão citara na quarta feira Aristides, a proposito do Sr. Presidente do Conselho.

É fora de duvida o facto historico narrado pelo Digno Par, concernentemente ao laponio que pedira a esse grego illustre, sem o conhecer, para inscrever o proprio nome na concha - a lista da epoca - com que o camponio devia votar o ostracismo para com Aristides, realçado pelo cognome de Justo.

Que paridade porém pode ter o Aristides de 500 annos antes de Christo, o Aristides Justo, com o Sr. José Luciano da actualidade, cuja affixada injustiça nos seus actos politicos é patente e manifesta?

O lapão eleitor, respondendo a Aristides, que lhe perguntava por que queria mal a esse homem, dizia muito expressivamente: Estou farto de ouvir falar n'elle. Com o Sr. José Luciano não poderia succeder outro tanto, porque o labrego que a tal respeito fosse consultado teria de responder: «Estou farto de ouvir, politicamente, falar mal d'elle, com inteira razão».

Mas, Sr. Presidente, ainda outros acontecimentos se deram, por essa epoca, que estão em pleno antagonismo com os hodiernos.

Aristides era o chefe do partido conservador. O seu antagonista, Themistocles, era o chefe do partido popular. E tão bem se fiscalizavam um ao outro,, que a intransigencia foi até ao ostracismo, promovido por Themistocles contra o seu rival.

O rotativismo actual, em que o Sr. José Luciano tem logar mareante, é muito differente de tudo isto.

Sr. Presidente: a Historia conta-nos que Aristides se congraçara com Themistocles, voltando de novo á Grecia quando esta corria o perigo de sossobrar. Xerxes, o rei dos persas, invadira-a e hostilizava-a por terra e por mar. Por mar, em Salamina, levaram os gregos a melhor, impulsionados pelos dois chefes politicos, que se reconciliaram nas aras da patria. Por terra, nas Thermopilas, Leonidas, rei de Sparta, foi historicamente homerico. Reduzido á ultima extremidade com as forças exiguas de que dispunha, repelliu com altivez e orgulho as offertas de Xerxes, do throno helenico, em troca da sua submissão.

Pouco depois, apoiado apenas por trezentos spartanos, Xerxes enviava-lhe novo emissario, que o intimava: - Entrega as armas.

- Vem buscal-as, respondeu Leonidas.

Que comparação tem este facto heroico, com o proceder do Sr. Presidente do Conselho?

É elle proprio que entrega as armas sem lh'as pedirem, quando procura pagar a Reilhac, quando intenta dar supremacia á finança cosmopolita na administração de um negocio tão interno, tão portuguez, como é o dos tabacos.

Mas ha mais. Xantipo, pae de Pericles, tambem foi um notavel d'essa epoca. Pericles, que lhe succedeu, legou o seu nome ao seculo em que existiu, e em que as artes, as letras, especialmente a poesia, attingiram os voos mais elevados.

Que semelhança pode ter um seculo d'estes, que engrandece e consagra, com a actualidade, em que o Sr. José Luciano tudo deprime, tudo gafa -