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SESSÃO N.° 16 DE 1 DE SETEMBRO DE 1905 189

até attingir o extremo da perseguição feroz á emissão do pensamento?

A censura previa está na ordem do dia, infelizmente.

Contra ella se insurgiu, na ultima sessão, o Sr. José Dias Ferreira, affirmando que a situação em que se encontra a imprensa é mais deprimente, mais violenta, do que na epoca do absolutismo legal.

Pascoal José de Mello pôde, na vigencia d'esse regimen, escrever a Historia do Direito Civil Portuguez, em que se affirma que a soberania regia não é illimitada. A Mesa Censoria, composta de sete homens dos mais distinctos, deixou circular a affirmativa, contra a qual se insurgiram varios admiradores do direito divino, e designadamente Antonio Pereira de Figueiredo.

Nem por isso porém Pascoal José de Mello Freire dos Reis deixou de gozar, em vida, e depois da morte, do respeito dos poderes publicos, e da estima dos seus concidadãos.

Stokler, fazendo-lhe o elogio funebre na Academia Real das Sciencias, em presença do Principe Regente, teve a hombridade de reconhecer que Pascoal José de Mello cultivara a boa doutrina, quando assegurava que a soberania regia não era illimitada.

Aprendam n'este exemplo os cortesãos da actualidade.

Sr. Presidente: a censura previa mereceu tambem a condemnação do Digno Par o Sr. Francisco Beirão, na sessão anterior.

Eu tinha-o convidado a pronunciar-se, visto S. Exa. ter presidido ás assembleias da Associação dos Advogados, e ter-se abstido de votar a consul em que, unanimemente, aquella corporação se pronunciou contra o procedimento de que é alvo o jornal republicano O Mundo.

A este convite respondeu o Digno Par, declarando-se conforme com a opinião dos seus collegas.

Attentem os Srs. José Luciano e Ministro do Reino n'este parecer insuspeito, qualquer que for o prisma por que for encarado.

O Sr. Presidente do Conselho tem tanto a consciencia de que procede illegalmente, que ousou convidar os representantes da imprensa a annuirem a collaborar na regulamentação da respectiva lei. Procurava assim conseguir que elles fossem enforcados por persuasão.

Não obteve porem resultado esta tentativa cavillosa, e a imprensa, felizmente, não conta mais esta falta no seu passivo, que, diga-se de passagem, bastante carregado se encontra.

Sr. Presidente: eu já disse, e repito agora, que o silencio dos Srs. Presidente do Conselho e Ministro do Reino, em presença das perguntas categoricas que lhes fiz, determinaram que eu insistisse no assumpto, e continuo insistindo até que tenha resposta condigna e adequada.

A censura previa tem acção sobre o theatro, e sobre á imprensa.

Sobre o theatro, abafa iniciativas, prepara o obscurantismo, e prejudica fundamentalmente os escriptores e os seus numerosos collaboradores, de especie varia.

Sobre a imprensa periodica, os prejuizos, não são inferiores, de ordem moral, intellectual e financeira.

Contra taes processos, insurge-se o § 3.° do artigo 145.° da Carta Constitucional, que diz textualmente:

Todos podem communicar os seus pensamentos por palavras e escriptos, e publical-os pela imprensa sem dependencia de censura, comtanto que hajam de responder pelos abusos que commetterem no exercido doesse direito, nos casos e peta forma que a lei determinar.

Pelo que respeita á imprensa, ha mais a considerar o artigo 2.° da lei de 7 de julho de 1898, assim concebido:

O direito de expressão do pensamento pela imprensa será livre e como tal independente de censura ou caução ....

Ha nada mais claro e convincente?

Só o Sr. Ministro do Reino parece não o entender, visto as vagas desculpas que balbuciou, quando o chamei a capitulo.

Affirmou S. Exa. que mantem as disposições que encontrou estabelecidas, e por esta, forma pretende desculpar-se, quando se condemna em absoluto.

Patenteou-se o Sr. Ministro impotente para reformar a lei, e até para derogar o decreto de 19 de setembro de 1902, que dá foros de autocracia á Bastilha da Estrella.

Mas diminuir-se até ao extremo de não poder modificar disposições de policia é, na verdade, para causar lastima.

É preciso ser-se zero Ministro, para se cahir tão fundo.

Mas quem é o responsavel por taes disposições?

Quem é que lhes dá execução?

Para o saber, solicitei na sessão anterior esclarecimentos, que constam d'este requerimento:

«Requeiro que, pelo Ministerio do Reino, me sejam enviados, com urgencia, os seguintes documentos:

1.º Copia das instrucções, ou disposições pelas quaes se amolda a policia, a fim, de exercer acção preventiva - censura, leitura previa, apprehensões, etc., - para com a imprensa periodica, devendo n'esta minha requisição attender-se mais a estes preceitos:

a) É feito avulso, pelo corpo de policia, ou juizo de instrucção criminal, semelhante serviço?

b) Não o sendo, quaes são os censores ou fiscaes a que elle está confiado?

2.° Identicos esclarecimentos peço concernentemente á acção policial nos theatros restrictiva da emissão de pensamento».

É certo que as disposições a que se allude no requerimento são illegaes, como illegal é a censura, como illegaes são os censores, como illegal é tudo que tem participação n'este attentado magno. Mas, desde que elle se pratica, saiba-se ao menos por quem, e em que condições. É por isso que eu mais uma vez pergunto: - Quem é o responsavel pelas instrucções com que a policia exerce a leitura censoria, em geral, e a do Mundo em especial? Quem são os censores?

É indispensavel que sejam designados, que se lhes possa apreciar a incompetencia. A Mesa Censoria do absolutismo legal era constituida por sete criticos idóneos. Na actualidade, em pleno despotismo real, mascarado pelo parlamentarismo degenerado, a policia exerce a mais cruel e ignara dictadura. Que torpeza!

Parece, Sr. Presidente, que nos bancos ministeriaes se presta effectivamente culto á formula Il n'y a que des princes et des choses.

Se assim é, afigura-se-me que o Governo não envereda por bom caminho.

Nunca a perseguição aproveitou honestamente, senão ao perseguido. O silencio foi sempre refugio dos criminosos.

O que recommenda o funccionario, desde o mais elevado ao mais infimo, é o respeito pela lei.

Na vida particular a consideração e a estima só se adquirem pelos actos dignos e meritorios que cada um pratica.

Esta norma é igualmente applicavel, desde o primeiro cidadão até ao ultimo, desde o Rei ao humilde pastor.

Pode a perseguição ao Mundo alterar estas formulas de apreciação e de conceito?

Não pode, indubitavelmente; e, se não, entremos na apreciação circumstanciada do assumpto, notando em primeiro logar que esse jornal, essencialmente digno e honrado, está sujeito ao regimen dos suspeitos. Sobre elle exclusivamente impende a censura previa, com desprezo patente pelo § 12.° do artigo 145.° da Carta Constitucional, que determina: