SESSÃO N.° 16 DE 9 DE JUNHO DE 1908 3
Se dois ou mais concorrentes valorizarem as obras em zero - limite da desvalorização em face da forma como está redigido o programma e da possibilidade juridica - qual será o preferido?
Outra pergunta, Sr. Presidente: se a installação electrica é feita por conta do adjudicatario, que alcance se pode attribuir á clausula 14.ª do programma, onde se diz que as facturas dos materiaes para as obras da referida installação serão verificadas pelo Ministerio das Obras Publicas? Se o adjudicatario tem a mais ampla liberdade de acção para adquirir os materiaes da installação, sem que, com isso, nada tenha o Governo, qual é o fim, a vantagem ou o pensamento que presidiu á exigencia das facturas serem verificadas pelo Ministerio das Obras Publicas?
Já ouvi dizer que esta verificação tinha por fim apurar se o excedente da valorização, que tem de ser entregue ao Governo e empregado em melhorias do theatro, era ou não exacto.
Não creio, porem, que seja esse o sentido da clausula.
Desejo que o Sr. Presidente do Conselho informe a camara sobre se esta questão da verificação das facturas é apenas uma excrescencia do programma.
No caso de o candidato valorizar, por exemplo, a installação em 3 contos de réis, terá que dar ao Estado 6 contos de réis, que é a differença para os 9 contos de réis que o programma estabelece como limite da valorização.
O adjudicatario é obrigado a pagar esses 6 contos de réis no momento da assinatura do contrato ou conserva-os até mais tarde?
A este respeito o programma é omisso.
Eu entendo que a quantia deve ser paga precisamente no momento de assinar-se o contrato.
No caso contrario, qual a garantia com que fica o Governo?
Outro ponto:
O funccionamento de uma empresa theatral está sujeito á contribuição industrial, que incide sobre duas categorias de pessoas: sobre o empresario e sobre os artistas. A lei impõe ao empresario a responsabilidade pela contribuição industrial correspondente aos artistas, de quem elle é o primeiro fiador para com o Estado.
Por effeito do programma, o empresario fica sujeito a essas disposições tributarias, ou cria-se algum beneficio em seu favor? Não é quantia insignificante.
A quasi totalidade dos artistas que constituem a companhia do Theatro de S. Carlos são estrangeiros e, justamente na occasião em que deveriam pagar essas contribuições, estão fora de Portugal.
Ora, as nossas estações fiscaes não se encontrarão em condições de exigir taes pagamentos a artistas que podem então estar espalhados pelos mais diversos países do mundo.
Como garantir, nesse caso, o pagamento da contribuição industrial dos artistas?
Qual a caução? Qual a fiança d'esse pagamento exigido pelo Governo ao adjudicatario?
Taes as perguntas a que desejo obter resposta.
(O Digno Par não reviu).
O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Ferreira do Amaral): - Eu estava bem longe de suppor que o contrato do Theatro de S. Carlos pudesse ser assunto para occupar duas sessões.
O Sr. Luciano Monteiro: - Se houvesse mais algum assunto a discutir...
O Orador : -- Eu ouvi em silencio o Digno Par, por isso tenho direito a que S. Exa. me ouça da mesma forma.
Da outra vez que S. Exa. se referiu ao contrato do Theatro de S. Carlos, passou-me um attestado pouco lisonjeiro.
Agora sou eu o primeiro a affirmar que realmente não tenho a intelligencia precisa para responder prontamente a todas as interrupções que o Digno Par queira fazer-me.
Sr. Presidente: tinha-se negociado um contrato que eu suppunha mais vantajoso que qualquer outro.
Como, porem, se dissesse que esse contrato era contrario alei, e como eu só desejo que a lei se cumpra, pôs-se de parte esse contrato e abriu-se o concurso, estabelecendo-se nelle, tanto quanto possivel, as mesmas condições. Copiou-se ipsis verbis o que, sem inconveniente, podia copiar-se.
Era para o Governo questão principal que a luz electrica no theatro se installasse por conta do empresario, porque, segundo informações officiaes, os apparelhos electricos que existiam achavam se em estado tal que se não podia continuar a fazer uso d'elles; e uma nova installação importaria em cerca de 41 contos de réis.
Nestas condições, se o Governo obtivesse a installação dentro da quantia de 9 contos de réis, teria feito uma grande economia, libertando assim o Estado de mais despesas, que em alguns annos attingiram, só em concertos, muito perto de 9 contos de réis.
Foi por isso que se estabeleceu que seria preferido aquelle dos concorrentes que, por menor preço, realizasse as obras da installação electrica.
Se houver quem valorize as obras em zero, será preterido por quem as valorizar em menos um.
A fiscalização das facturas não pode ter o fim a que se referiu o Digno Par.
Ella de forma alguma pode prejudicar os concorrentes, e por isso se copiou do contrato negociado.
A quantia que o adjudicatario offerece ao Estado ser-lhe-ha exigida quando o Governo entender.
Se o Governo fará bom ou mau uso d'esta faculdade é uma questão que só pode ajuizar-se pelo grau de confiança que no Governo tiver o julgador.
Mas, francamente, estar sempre a duvidar da honestidade dos Governos é assaz desagradavel para quem faz o sacrificio de acceitar a missão de governar, e já não pouco tem custado essa duvida ao nosso credito de país civilizado.
O Sr. Luciano Monteiro: - Peço a palavra.
O Orador: - V. Exa. está no seu direito; e nem eu pedi a V. Exa. a sua benevolencia, nem posso estranhar o contrario.
O Digno Par, com quem mantenho as melhores relações de amizade, deve comprehender que, se alguma das suas palavras me não tivesse maguado, eu não teria respondido com certa vivacidade.
Aprecio muito os discursos do Digno Par, e tenho muito gosto em responder-lhe, mas, francamente, parece-me que temos Theatro de S. Carlos a mais. (Apoiados).
O Sr. José de Azevedo Castello Branco: - Não se admire V. Exa. Em se tratando de cantoras ou cantores os homens perdem a cabeça.
O Orador: - Mas eu é que não estou já em idade de apreciar o genero. (Riso).
Uma outra pergunta fez o Digno Par.
Responderei que, segundo o contrato, não ha isenções de contribuição como até aqui tem havido para todas as empresas: nem era preciso falar-se nisso nas condições do concurso. Se a intenção do Governo fosse conceder essa isenção, é que era necessario mencioná la, como nos ultimos contratos se mencionara.
Por ultimo tenho que dizer ao Digno Par que me esperam na outra Camara para responder a um aviso previo sobre instrucção publica.
Se o Digno Par entende que a questão do Theatro de S. Carlos é de tal