SESSÃO N.° 17 DE 20 DE AGOSTO DE 1897 221
tugal se visse na necessidade de estabelecer a moeda papel por falta de oiro, exactamente no momento em que no paiz havia a maior quantidade de oiro que jamais possuirá em tempo algum da sua historia? Porque, mesmo no tempo das minas do Brazil, se estas tinham produzido 391:000 contos de réis de oiro, isso fôra em duzentos e vinte annos, n'uma media annual de 1:800 contos de réis, e todos sabem que todos os annos era a maior parte exportada ou para Inglaterra, para saldar o excesso de mercadorias que d'ali importavamos, ou para Roma, para pagar as magnificencias de Mafra e da capella de S. João Baptista, ou as veleidades da patriarchal.
Para profundar o seu estudo, percorreu de novo as estatisticas, tanto as nossas como as inglezas, mez a mez, e então a luz fez-se completa no seu espirito.
Desde 1886 até 1889 as exportações mensaes de oiro para Inglaterra são insignificantes. Ha muitos mezes em que não se dá exportação alguma, e a maior exportação mensal, que se verificou, é de 3:000 libras em março de 1886 e de 3:100 libras em novembro de 1888. O anno de 1890 começa ainda sem nenhuma exportação em janeiro, e com uma exportação insignificante em fevereiro.
Mas de março de 1890 em diante, a corrente de exportação adquire grande intensidade. Logo em março é de 142:690 libras, desce em abril a 40:000, mas sobe em maio a 338:391, em junho a 377:166, em julho a 300:757 e continua a ser grande em todos os restantes mezes do anno de 1890. Em 1891 continúa a corrente com a mesma intensidade em janeiro, em que se exportaram 194:527 libras, dá um enorme salto em fevereiro, passando para 418:200, continua em março a ser de 107:020 e em abril de 110:396, até que em maio rebenta a crise. Repete, ao examinar esta estatistica a luz raiou no seu espirito. Ella demonstrava que em fevereiro de 1890, ultimo mez do periodo de fraca exportação monetaria, e em janeiro de 1891, mez que precedeu a grande exportação de fevereiro de 1891, se deviam ter dado acontecimentos graves, para justificar essas correntes perturbadoras da circulação. Não encontrou n'essas datas nenhum acontecimento economico de importancia no paiz; mas não foi difficil descobrir que ellas coincidiam com o ultimatum inglez de fevereiro de 1890, com a revolução do Porto de 31 de janeiro de 1891.
E então convenceu-se de que a crise monetaria não fôra devida a causas economicas; mas ao panico que aquelles acontecimentos politicos causaram e á desconfiança que as cousas portuguezas produziram sobre tudo fóra do paiz. Na sua opinião a maior parte do oiro, que saiu de fevereiro de 1890 a abril de 1891, representava o capital estrangeiro que fugia espavorido e, em parte, ainda que muito menos, um começo de emigração do capital portuguez.
Mas não foi ainda assim a falta que esse oiro produziu no paiz, o que occasionou a crise monetaria, porque á corrente de exportação n'esse periodo corresponde outra em sentido inverso, de importação.
Era o governo e o banco de Portugal, que usando dos seus creditos no estrangeiro, procuravam luctar contra a exportação do oiro. Luctaram e venceram, porque de facto, n'esse periodo o stock do oiro no paiz não diminuiu, augmentou em 1:569 contos; mas venceram só a emigração do oiro, o que não poderam vencer foi o desapparecimento interno, o que não poderam vencer foi esse panico injustificado, em consequencia do qual a fome do oiro era geral no meio de uma abundancia de oiro nunca vista no paiz. Era o usurario morrendo de fome junto do seu thesouro.
Sustentou com argumentos historicos, que simples acontecimentos politicos podem dar logar ás mais graves crises economicas.
Citou o que succedeu em Inglaterra em 1812 com a simples noticia de que Napoleão saíra da ilha de Elba.
Referiu a crise gravissima de 1861, nos Estados Unidos, em que a lucta pelo oiro, em resultado de se ter aberto o conflicto entre os estados do Norte e os do Sul, por causa da abolição da escravidão, coincidia com um enorme desafogo economico, porque a America era credora da Europa por quantias valiosissimas em consequencia das grandes exportações de farinhas e trigos, seguindo se a uma colheita de algodão de uma abundancia sem precedentes.
Expoz o que se deu no decurso da guerra civil, que se originou d'aquelle conflicto. O agio do oiro soffria as variações não das difficuldades economicas, mas dos acontecimentos politicos, subia com as más noticias do theatro da guerra, chegando ao maximo de 186 por cento em julho de 1864, descia como a confiança que as victorias inspiravam, chegando por occasião da paz a approximar-se do par. Aqui, tal é a influencia das causas moraes nas questões monetarias, a reacção favoravel foi superior ao que comportavam as circumstancias economicas dos Estados Unidos, que só em 1879 poderam supprimir o curso forçado depois de ter durado dezeseis annos.
Estes exemplos extranhos arreigavam no seu espirito a convicção de que só a causas politicas e não a causas economicas fôra devida a crise de 1891; mas, querendo estudar o problema por todas as faces, procurou examinar, para as combater, todas as objecções que se poderiam apresentar contra a sua opinião.
Assim, a primeira objecção seria esta: Ao tempo de crise havia effectivamente muito oiro, mas havia muitos compromissos para com o estrangeiro e a crise deu-se pela impossibilidade manifesta de os satisfazer; e a comprovar esta objecção ha o facto incontestado da enorme exportação de oiro logo em seguida á crise, representando um saldo contra de 36:256 contos de réis até ao fim de 1893.
Mostrou que houve outras causas que obrigaram á exportação do oiro e que a não determinariam, se a crise se não tivesse dado.
Assim comprou se prata e rodelas de cobre, compras desnecessarias sem a crise monetaria. E custaram, perto de 7:000 contos de réis em oiro.
As conversões de 1892 e 1893, levaram, oiro para compra de divida externa. Por baixo, póde calcular-se esta exportação em 5:000 contos de réis.
A transformação do commercio de importação que se fazia por compras a praso geralmente de tres mezes, passou a fazer-se a prompto pagamento e representaria o pagamento immediato da quarta parte da importação total calculada em 40:000 contos de réis ou seja de 10:000 contos de réis. Como, porém, nem todas as compras seriam a praso, e nem todas as que o eram deixariam de o ser depois da crise, calculou a exportação do oiro por este motivo apenas em 3:000 contos de réis.
A emigração do capital portuguez foi tambem consideravel. Até ao fim de 1893 computou-a em 11:500 contos de réis.
E o banco de Portugal por fim teve de satisfazer 5:873 contos de réis que devia ao estrangeiro, mas que era apenas o uso de creditos que tinha aberto em seu favor, e que portanto não seriam exigiveis de prompto se a crise se não tivesse dado. Outros bancos e banqueiros estariam nas mesmas circumstancias, calculando o orador muito por baixo em 7:000 contos de réis o total do oiro importado para fazer face á totalidade de exigencias d'esta ordem.
Todas estas verbas sommavam 33:500 contos de réis de oiro, que não saíria do paiz se não fosse a crise.
Respondeu depois á objecção de que a crise monetaria quando se não tivesse dado em 1891, teria rebentado no anno seguinte com a bancarrota do estado.
Sustentou que pelo contrario a bancarrota do estado se não teria dado sem a crise monetaria.
E percorrendo um a um os annos economicos desde 1891-1892 até 1895-1896, verificado os deficits que se