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12 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

temente, funccionando como tribunal, julgou pelo crime de peculato e condemnou um antigo Ministro da Coroa, em onze meses de prisão, que foram integralmente cumpridos.

Já vê, Sr. Presidente, que, se pequei e peco, faço-o na melhor companhia. Á Italia sobeja a autoridade, em assuntos como os que estamos versando, para poder servir de modelo.

Mas não é preciso sair do reino para mostrar ao Digno Par quanto elle se afastou das boas praxes e normas, por que temos de nos pautar.

Citando o artigo 15.° da Carta e o seu § 5.°, attribuiu-os para exercicio da Camara electiva, quando assim não é. Figuram elles no titulo IV, intitulado do Poder Legislativo, e são concebidos por esta forma:

" Art. 15.° É da attribuição das Côrtes:

.............................................
§ 5.° Na morte do Rei ou vacancia do Throno, instituir exame da administração que acabou, e reformar os abusos nella introduzidos.

São as Côrtes, note-se bem, isto é, as duas Camaras, que disfrutam essas attribuições, e não apenas a Camara dos Senhores Deputados, como o illustre orador, por equivoco, assegurou.

Confirmação similar se encontra no artigo 14.° do Primeiro Acto Adicional de 5 de julho de 1852, e cuja letra é a seguinte :

"Art. 14.° Cada uno a das Camaras das Côrtes tem o direito de proceder, por meio das commissões de inquerito, ao exame de qualquer objecto da sua competencia.

§ unico Ficam d'este modo addicionados e ampliados os artigos 36.° e 139.° da Carta Constitucional".

Pelo que fica transcrito se reconhece, indubitavelmente, que aã duas Camaras se encontrara equiparadas, sem reservas nem subterfugios, na missão de inquiridoras.

Affirma o Digno Par que os legisladores de 1852 não pretenderam expropriar a outra Camara da regalia de syndicante.

E quem o contesta?

Eu, pela minha parte, limito-me a assegurar que, segundo a letra e o espirito do citado artigo 14.°, apenas se equipararam attribuições. O facto citado pelo Digno Par, de que Vicente Ferrei* só na ultima redacção da lei introduzira no § unico, retro-referido, o artigo 36.° e seu paragrapho, não contradiz a minha affirmação. Esta Camara não lhe oppôs reparos, e outro tanto succedeu na Camara electiva, quando a modificação foi conhecida. Todas as circunstancias se conjugam, pois, para collocar em pé de igualdade as duas casas do Parlamento.

Entende ainda o Digno Par que o apuramento das responsabilidades criminaes e civis, por intermedio d'uma commissão parlamentar, não passa de uma fantasia da Carta.

Contesto, permitia S. Exa., semelhante asserção. O apurada pela commissão politica de inquerito em 1879-1880 contradiz em absoluto essa affirmativa. Attribuir desde já omissões a trabalhos que teriam de se realizar importa em suspeições, que só é licito levantar quando derivem de actos notoriamente conhecidos. Num ponto, porem, estou de acordo com o Digno Par, e vem a ser quando promette fazer uma Constituição nova. Não será ella, por certo, amoldada pelas aspirações ultra liberaes. Todavia, representará, seguramente, um melhoramento, perante a Carta caduca, que hoje vergonhosamente vigora.

O Digno Par, cuja erudição é conhecida, citou João Jacques Rousseau, não o considerando, a despeito do seu profundo sentir humanitario, um bom inspirador de Constituições.

Conforme Herbert Spencer assegura na sua Sciencia Social, quem, em regra, mais lê, é quem possue poucos ou nenhuns livros. O Digno Par constitue excepção á affirmativa do grande philosopho britannico. Possue escolhida livraria, e dedica se á leitura dos livros que a exornam.

Por seu turno, citarei Pitt, para lembrar que elle cumpria á risca as promessas que fazia sem discrepancia alguma. Este facto originou dizer-se, como proverbio, que não se desculpa quem governa ao abrigo de promessas que se não cumprem.

Tenha presente o Digno Par este conceito, para que não falte a elaborar uma nova Constituição, quando vier a presidir aos Conselhos do Governo. Para então, reserva o Digno Par a doutrina consubstanciada no artigo 38.° da Constituição de 20 de marco de 1838, o qual é d'este teor:

Art. 38.° Cada uma das Camaras, no principio das sessões ordinarias, examinará se a Constituição e as leis teem sido observadas.

Nada tem a oppor a estes orthodoxos. preceitos, e unicamente notará que o Digno Par se esqueceu de citar o artigo 39.°, o qual completa o anterior, nos seguintes termos:

Artigo 39.° Cada uma das Camaras tem o direito de proceder, por meio de commissões de inquerito, ao exame de qualquer objecto da sua competencia.

Consoante se observa, e convem registar, na Constituição de 20 de março de 1838 as attribuições inquiridoras eram identicas para as duas Camaras.

O Deputado Castello Branco, citado pelo illustre orador, bem fez; em apresentar a proposta que apresentou - apesar do seu mallogro - para ser examinada a administração do reinado da Senhora D. Maria II. Era positivamente constitucional e utilmente fiscalizadora.

O segredo profissional, com que o Digno Par tropeça, para se levar a bom termo a inquirição, desappareceria com a adopção da minha proposta que nesse sentido previdencia.

Do mesmo, modo, não tem razão de ser a objecção apresentada de que são privativas da Camara electiva as accusações cujo julgamento compete aresta Camara. Isto não é positivamente assim. O artigo 37.° estatue effectivamente o seguinte:

Art. 37.° É da privativa attribuição da Camara dos Deputados decretar que tem logar a accusação dos Ministros de Estado e Conselheiros de Estado.

Já vê o Digno Par que a acção privativa da Camara electiva incide apenas sobre os Ministros de Estado e Conselheiros de Estado.

Outros poderiam ser, portanto, os responsaveis apurados; e, em todo o caso, a doutrina geral estabelecida preceitua igualdade de attribuições ás duas Camaras, na materia sujeita.

Passou depois o Digno Par a versar o negocio dos adeantamentos, assegurando que nelles residem duas questões:- uma de ordem civil, e outra de ordem politica. E eu addicionarei mais uma: -a de ordem criminal.

Note-se, porem, que as responsabilidades de ordem criminal só teem de ser exigidas aos vivos, porque aos mortos cabo serem exclusivamente julgados pela Historia, a qual saberá conjugar todos os factores, para formar o seu juizo recto, imparcial e justo.

Para apurar os adeantamentos, insurge-se o Digno Par contra os inqueritos parlamentares, e alvitra, em logar d'esse expediente salubrizador, estes tres processos: - entregar a questão ao Tribunal de Contas, ou ao tribunal criado pelo artigo 5.° da proposta de lei acêrca da lista civil; ou ainda a um tribunal arbitral.

Sou absolutamente contrario ao parecer do Digno Par.

A syndicancia parlamentar é, no meu entender, o recurso a todos preferido. Nenhum dos outros pode ter cabimento, e nomeadamente o juizo arbitral, para que é de costume appellar unicamente quando as duas partes estão em litigio.

Ora poder suppor que entre o Chefe do Estado e o Governo não haveria acordo na liquidação das suas contas importaria numa affirmação em todo o ponto desfavoravel ao credito das duas partes desavindas. Não é licito haver discordancia s entre as duas partes contratantes, em assunto de tão expressiva magnitude.