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SESSÃO N.° 17 DE 17 DE JUNHO DE 1908 5

nhores Deputados o exame da administração passada e a reforma dos abusos nella introduzidos.

É pois manifesto que, considerados estes dois artigos, é de iniciativa da outra Garoara o exame dos factos praticados durante o reinado findo, assim como é a iniciativa sobre impostos e recrutamento e a discussão das propostas do poder executivo.

A Camara dos Deputados não perdeu essa iniciativa por nenhuma disposição posterior, porque a unica que existe é a do artigo 14.° do Primeiro Acto Addicional e essa não alterou nem modificou, neste ponto, a funcção da Camara dos Deputados.

Esse artigo 14.° dispõe, é certo, que cada uma Camaras tem o direito de proceder por meio de commissões de inquerito ao exame de qualquer objecto da sua competencia e o seu § unico addiciona e amplia os artigos 36.°, § 1.°, e 139.° da Carta, mas é mester verificar em que se fez essa ampliação.

Na conformidade da Carta o poder legislativo apenas podia fazer inqueritos em dois casos, o primeiro- no caso de vacancia do Throno ou morte do Rei, que é a hypothese dos artigos 15.°, § 5.°, e 36.°, § 1.°, o segundo no principio das sessões, e somente para saber se a Constituição politica do reino tinha sido cumprida no intervallo das sessões, que é a hypothese do artigo 139.°

Não havia o direito amplo de fazer inqueritos. Inqueritos só eram permittidos naquelles dois casos restrictos.

O Primeiro Acto Addicional. facultando o exercicio do direito de inquerito a ambas as Camaras sobre objectos da sua competencia, ampliou os artigos a que se refere.

Foi nisto que consistiu a ampliação do Acto Addicional: alargou a faculdade parlamentar de inquirir a todos os assuntos da competencia das Côrtes, que até ahi estava restricta a dois unicos casos.

Foi de um grande alcance a nova disposição, porque estendeu a acção parlamentar, permittindo-lhe investigações até então hão autorizadas.

Quanto, porem, a, ficar pertencendo á iniciativa da Camara dos Deputados o inquerito ou exame dos feitos do reinado anterior, ahi não houve alteração.

Esse continuou como uma das immunidades da Camara popular.

E comprehende-se que assim acontecesse, porque a Camara dos Deputados, pela sua proveniencia, pelo modo da sua constituição, representa mais directamente do que nós a soberania da nação.

Deve pertencer-lhe, por isso, o que mais directamente tambem toca aos interesses das classes populares.

O imposto que affecta essas classes, o recrutamento que sobre ellas pesa como em serviço oneroso, o exame dos abusos de um reinado que podem ferir gravemente os direitos e as liberdades individuaes, tudo isso cae naturalmente sob a acção predominante da outra Camara.

Essa prerogativa tem a sua explicação natural na origem de onde provem a Camara dos Deputados, que é o voto dos cidadãos.

É certo que a Camara dos Dignos Pares tambem representa o país, e não o Rei que a nomeia, mas tal representação assenta mais no convencionalismo da lei, do que na expressão rigorosa dos factos.

Quem genuinamente, e sem convenções de nenhuma especie, representa o país, é a Camara dos Deputados, porque é investida na sua funcção legislativa pelo mandato directo dos eleitores.

Que admira, pois, que a Constituição lhe conferisse a preeminencia ao exame dos actos do reinado findo e a encarregasse de propor as providencias tendentes a impedir os abusos futuros?

Não é isso a consequencia lógica dos principios que caracterizam no nosso direito constitucional a funcção d'essa Camara?

Decerto que sim.

Estas razões de ordem juridica explicam perfeitamente a preferencia concedida pela Carta á Camara dós Deputados na faculdade primacial que lhe compete acêrca da inquirição sobre os factos de ordem administrativa occorridos durante o reinado extincto.

Mas taes razões são ainda corroboradas pela analyse das circunstancias historicas que rodeavam a promulgação da Carta.

A Carta de 1826 foi uma transacção entre o elemento tradicionalista e conservador, e o espirito liberal que presidira ás lutas contra o absolutismo.

A camara dos Dignos Pares appareceu com um caracter mais aristocratico do que popular.

As classes mais elevadas, as que representavam mais genuinamente as tradições de familia e os privilegios da nobreza, obtiveram todos ou quasi todos os logares nesta Camara na sua primitiva constituição.

Nem o clero foi esquecido na sua representação mais elevada, o episcopado.

A transmissão das funcções, por virtude da hereditariedade, constituia dentro d'esta camara pequenas dynastias qui muito contribuiam para que ella fosse considerada, acima de tudo, como uma camara essencialmente conservadora.

Esta foi a sua indole primitiva, que é sempre conveniente não esquecer quando se estudam as suas attribuições.

Representando, em contraposição, o elemento popular ficava a Camara dos Deputados. Natural era, portanto, que a essa Camara fossem concedidas faculdades especiaes em assuntos que mais de perto podiam affectar os direitos e regalias da classe popular.

Ahi ficou a iniciativa sobre impostos, sobre recrutamento, sobre as propostas do poder executivo e sobre o exame da administração do reinado.

Á camara dos Pares ficou em compensação a faculdade exclusiva de julgar os delictos especiaes commettidos pelos Ministros, Conselheiros de Estado ou membros da Familia Real.

Assim se distribuiam as funcções conforme o caracter assinado a cada um dos ramos do poder legislativo.

Mas, Sr. Presidente, se é certo que a analyse explicada das disposições da Carta me leva á conclusão que deixei enunciada, não é menos certo que, se recorrermos ao chamado elemento historico na interpretação da lei, elle vem corroborar que nunca foi intenção dos legisladores do Primeiro Acto Addicional privar a camara dos Deputados da iniciativa que sobre o assunto lhe confere o § 5.° do artigo 15.° da Carta.

Vejamos como nasceu e com que intuitos foi feito o artigo 14.° do Acto Addicional.

Na sessão de 4 de março de 1852 foi apresentado na camara dos Deputados o projecto da respectiva commissão sobre o Acto Addicional.

O projecto do Governo, dizia no artigo 15.°:

Cada uma das Camaras tem o direito de proceder por meio de commissões de inquerito ao exame de qualquer objecto da sua competencia.

§ unico. Fica d'este modo addicionado e ampliado o artigo 139.º da Carta Constitucional.

O projecto da commissão dizia no artigo 14.°:

Cada uma das Camaras das Côrtes tem o direito de proceder por meio de commissões de inquerito ao exame de qualquer objecto da sua competencia..

§ unico. Fica d'este modo addicionado e ampliado o artigo 139.° da Carta Constitucional.

Examinados e comparados os dois projectos observa-se:

1.° Que a commissão apenas faz uma ligeira alteração na proposta do Governo, que vem a serrem logar de cada uma das Camaras, dizer se: cada uma das Camaras das Côrtes, o que não tem importante significação;

2.° Que em ambos os projectos não se fala na ampliação ou addicionamen-