DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 125
intelligencia, zêlo e dedicação inexcediveis pelos negocio publicos.
Aproveitou aquelle funccionario para o seu trabalho os elementos estatisticos, annualmente compilados pela direcção; geral a seu cargo, e que ali se conservam archivados e desconhecidos, não se havendo publicado cousa alguma sobre o assumpto posteriormente aos notaveis mappas de Fradesso da Silveira.
Pelo Annuario sé verá em que circumstancias pouco felizes se encontra a administração das nossas contribuições directas, administração que padece de um mal que todos os ministros da fazenda se têem esforçado por debellar, ou, pelo menos, restringir, Espero, por meu lado, que alguma cousa conseguirei das providencias administrativo que caibam nas minhas faculdades e eu possa tomar sobre o assumpto.
Mas, se até hoje se não têem podido obter os indispensaveis melhoramentos n'este ramo do serviço fiscal, ninguem exija de mim que consiga; em mezes o que ministros tão competentes e com tantos recursos de sciencia administrativa e actividade não poderam até hoje alcançar.
Sr. presidente, desculpe v. exa. e a camara esta nova divagação. Estava-me referindo ao imposto indirecto e argumentando n'este campo com o sr. Antonio de Serpa, que via n'elle o nosso principal recurso financeiro á explorar. Diz-se em verdade que ás contribuições indirectas têem uma vantagem muito grande porque o contribuinte não reclama, quer dizer, o contribuinte torna-se victima inconsciente do que é por vezes uma grande iniquidade, e tal qualificação merecem em alguns casos estes impostos. Devemos nós, porém, que temos perfeito conhecimento d'essa iniquidade, sustentar, aggravar e tornar ainda mais difficeis as condições das classes pobres, porque d'ahi resulta maior receita para o thesouro e um modo mais facil de cobrança para os governos, porque não levanta contra elles difficuldades politicas? Pela minha parte entendo que não. O direito, por exemplo, que actualmente recae entre nós sobre o bacalhau, um dos generos que constituem a principal alimentação do pobre, e que attinge 40 por cento do seu valor no mercado, produz em verdade uma receita para o estado de cerca de 500:000$000 réis, mas eu por mim hão posso deixar de entender que é uma necessidade impreterivel elevar os impostos directos para tornar mais suave o peso d'aquelles que vão recaír nos generos mais necessarios para a vida das classes pobres, e se não tenho procurado introduzir até agora uma modificação qualquer n'aquelles direitos é porque as circumstancias do thesouro não poderiam supportar n'este momento o consideravel desfalque que seria à consequencia d'essa modificação, pelo menos nos primeiros annos. E a este respeito ainda recordarei os grandes fastos da historia economica da Inglaterra, a que já em outra parte me referi, factos que se consubstanciam em um nome venerando, o de sir Robert Peel. Este homem d'estado, por tantos motivos illustre, restaurando em Inglaterra o imposto sobre o rendimento, fel-o sobretudo para alliviar os tributos que affectavam as classes pobres. Creio que não foi outro o intuito d'aquelle illustre financeiro, d'aquelle espirito levantado, d'aquelle amigo como não houve outro melhor das classes desvalidas, d'aquelle homem ante cuja memoria se devem curvar reverentes todos os que têem a peito o melhoramento da sorte d'estas classes.
Portanto, sr. presidente, em meu entender nós não podemos deixar de envidar todos os nossos esforços para chegarmos hão só ao equilibrio das nossas finanças, mas tambem a melhorar o systema das nossas contribuições, e não podemos nem devemos estar unicamente adstrictos á esperança de que venha de quando em quando uma aragem benefica do Brazil, e com ella uma modificação nos cambios, que traga como consequencia uma prosperidade momentanea e necessariamente facticia.
É preciso mais alguma cousa, porque se d'essa aragem nos podem provir uns certos annos de bem estar, tambem podem succeder a esses annos periodos de amargas difficuldades, como por mais de uma vez tem acontecido.
Sr. presidente, peço desculpa á camara se fallei com maior calor do que pedia o assumpto do debate; teve esse facto origem na convicção profunda que me anima; asseguro porém que não estava no meu animo offender as susceptibilidades do digno par que me precedeu, ao qual folgo de prestar a homenagem da mais profunda consideração e do grande apreço em que tenho a sua illustração e eminentes qualidades.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - O nosso regimento determina que seja alternada a ordem porque usem da palavra os oradores inscriptos para tomar parte em qualquer discussão; para o que determina que os dignos pares que pedem a palavra devem declarar n'esse acto se é pró ou contra.
O sr. Serpa usou da palavra contra, seguiu-se o sr. ministro da fazenda a favor, e agora estão inscriptos os srs. conde de Valbom e visconde de Chancelleiros.
Pergunto ao sr. conde de Valbom em que sentido pediu a palavra?
O sr. Conde de Valbom: - Contra.
O sr. Presidente: - E o sr. visconde de Chancelleiros?
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Eu não posso ainda definir se fallarei contra ou a favor.
Se para v. exa. me, dar já a palavra é preciso que eu me inscreva contra fal-o hei. (Riso.)
O sr. Presidente: - N'esse caso quem tem a palavra em primeiro logar é o sr. conde de Valbom, que foi quem a pediu primeiro.
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Então inscrevo-me a favor. (Riso.)
O sr. Barros e Sá: - Peço a palavra a favor.
O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Mando para a mesa um pedido de auctorisação para que o digno par o sr. D. Luiz Daun e Lorena possa accumular, querendo, as funcções legislativas com as que exerce de governador civil de Lisboa.
Leu-se na mesa e foi concedida a licença pedida.
O sr. Presidente: - Vae ler-se uma mensagem vinda da camara dos senhores deputados.
Leu-se na mesa:
Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei, que auctorisa o governo a despender no actual anno economico, em obras de edificios publicos e de portos e rios 100:000$000 réis alem das verbas destinadas para as mesmas obras, no decreto de 28 de junho de 1879.
Ás commissões de fazenda e obras publicas.
O sr. Conde de Valbom: - Sr. presidente, em má occasião me coube a palavra, porque estamos já no fim dá sessão e vou succeder a dois distinctos oradores.
Encetarei; todavia, o meu discurso, offerecendo á consideração da camara algumas reflexões, embora me encontre n'uma situação difficil.
Sr. presidente, quando se trata de crear receita para occorrer aos encargos impreteriveis da governação do estado, sempre ponho de parte a politica, porque entendo que quaesquer conveniencias partidarias devem ceder o passo aos interesses do paiz.
Tenho, pois, o proposito de occupar-me do assumpto que debatemos com inteira imparcialidade, isento de quaesquer paixões, e unicamente inspirado pelo desejo de servir a causa publica no limite das minhas faculdades.
Apresentando-se por parte do governo o alvitre de arrematar o real de agua, em vez de empregar a administração directa do estado, como um dos meios tendentes a resolver as nossas difficuldades financeiras, forçoso é fazer uma apreciação, quando, menos rapida, do estado da fazenda publica para verificar até que ponto a idéa d'este