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164 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

trance, apresenta uma lei phantastica sobre direito de associação e um projecto sobre liberdade de imprensa que provocou em Portugal um movi mento de protesto como não se via ha 54 annos; e S. Exa., que fôra chamado a reivindicar- para os cidadãos portuguezes o livre exercicio dos direitos individuaes, a primeira, vez que os encontrou em situação de manifestarem taes direitos, não os tratou como em 4 de maio: tratou-os com as patas da cavallaria.

O Sr. Teixeira de Sousa: E com tiros.

O Orador: - Ora é uma tal conducta que merece elogio ?

O que merece elogio é a forma rapida como S. Exa. voltou aos seus principios, e isso devido talvez ao seu temperamento nervoso, um tudo nada irrequieto.

Passando a analysar o projecto em discussão, encará-lo-ha por uma maneira alegre e, portanto, sem arrebatamentos ou movimentos de indignação.

O projecto foi tomado a serio pelo Sr. Hintze Ribeiro. Pelo Sr. Julio de Vilhena foi tomado a serio, mas com a nota da indignação. O primeiro d'estes Dignos Pares chamou-lhe uma obra má, e o segundo uma obra inutil.

Para elle, orador, o projecto, perdoem-lhe o plebeismo, não passa de um entalão (Risos); um entalão politico e juridico.

Na primeira phase da sua ebullição liberal, e n'um dos peridos da sua mais forte ebullição intellectual, o Sr. Presidente do Conselho abriu o seu primeiro centro politico.

Que fez S. Exa., ao inaugurar esse centro? ao cozinhar o grande paté do seu programma?

Distribuiu liberdade para a direita e para a esquerda, direitos individuaes para a direita e para a esquerda. Distribuiu "liberdade para todos os lados.

Aos olhos de reformador messianico do Sr. João Franco não escapou, para arredondamento do periodo depois dos direitos da palavra, da reunião, o direito de associação, e por isso S. Exa. o mandou incluir no seu programma e redigir a respectiva proposta.

No tempo em que o Sr. Presidente do Conselho era capitão-mor, costumava elle, orador, chamar ao Sr. Pereira e Cunha o poder legislativo de S. Exa.

Mas o Sr. Pereira e Cunha, tendo de ir exercer no Egypto outra magistratura, foi substituido.

Aos aro s primaveris, que eram o principal encanto de S. Ex.a, outros succederam, porem, para identicas funcções, estes com o aspecto de alguma cousa que lembra um dezembro, um janeiro ou um fevereiro. (Riso).

E então, tirando-se o que já estava regulamentado por lei, e que era o que respeitava montepios, associações de soccorros mutuos, caixas economicas, associações de classe, sociedades anonymas, associações de caracter religioso, emfim, a parte economica, religiosa e commercial, os principia liberaes à outrance da Rua Garrett, ficaram reduzidos a um projecto de lei que unicamente abrange as associações politicas. (Apoiados).

Quando S. Exa. teve a peregrina ideia de chamar ao direito de associação um direito originario, o cavalheiro que o ajudava, exclamou cheio de satisfação:- Eu bem dizia ha muito tempo que o direito de associação estava precisado de um João Franco. (Riso).

Ora .a verdade é que o direito de associação é extraordinariamente derivado e que a ideia de liberdade, comprehendendo apenas o que se não prohibe, é uma ideia relativa.

S. Exa. lembrou se decerto, ao falar no direito originario, da forma como esse direito se exercia entre os homens primitivos.

Mas os homens d'essas epocas remotissimas, não tendo ainda noções abstractas, nem sabendo derivar do instincto da defesa individual o principio da defesa collectiva; não formando a concepção da divindade mais que como uma nevoa de sonho, de que só mais tarde havia de gerar-se a ideia de Deus, não podiam sequer pensar no direito de associação.

A camara está a ver como se exerceria esse direito entre os homens primitivos, quer elles habitassem as margens dos lagos da Europa central, quer as cavernas escuras e profundas das montanhas

A Camara está a ver esses homens reunidos, discutindo o estatuto da, sua associação, sob a presidencia de um dos mais importantes troglodytas da região. (Riso).

Pelo projecto em discussão - escusado é dizê-lo- esse direito originario fica pertencendo unicamente aos clubs politicos. Tudo o mais continua como estava.

A verdade é que, com licença ou sem ella, mas á sombra da tolerancia e da lenidade do nosso temperamento politico, variadissimos clubs de propaganda democratica se fundaram em Lisboa e Porto, e em outros pontos do paiz. E, que conste, só uma vez o illustre estadista Fontes Pereira de Mello tentou acabar com os clubs republicanos.

Pretendeu-se sujeitar esses clubs á approvação dos estatutos, mas os elementos avançados provocaram um movimento de tal ordem contra as pretensões de Fontes, que este eminente estadista teve de recuar, continuando as cousas como estavam.

É facto que, em Portugal, ás cousas para os republicanos não correm como na França para os monarchicos, o que provem do temperamento excepcional, do caracter meridional do portuguez.

Portugal é um paiz extraordinariamente .cioso do que elle suppõe ser a sua liberdade.

Excepcionalmente malleavel, o temperamento portuguez é por isso mesmo impressionista. N'este ponto nenhum povo o excede, como nenhum o excede tambem em promptidão de intelligencia. E essas caracteristicas é que fizeram de Portugal um povo de emprehendedores, arrojando-o nos seculos XV e XVI para o caminho das navegações, que nos levaram a desfazer á bruma tenebrosa que fechava o Oceano e a emprehender o maior de todos os descobrimentos: o descobrimento da terra.

Mas ha uma cousa que o povo portuguez não consente que pretendam modificar-lhe: é a sua maneira de ser. Com lei ou sem lei, com estatutos approvados ou não, com tolerancia ou sem ella, no dia em que quizerem impedir o funccionamenio dos clubs democraticos, a Monarchia morre.

Para provar a grande malleabilidade do portuguez, bastará recordar como elle se adaptou" á circulação fiduciaria; acceitou-a sem a menor perturbação, o que não succedeu, por exemplo, na Austria - Hungria quando n'este paiz se deu facto identico.

Portugal constitue, pois, um povo tão malleavel como o marfim ou o cautchu; mas não lhe peçam cerceamento de liberdades nem o ataquem no que elle suppõe ser um direito, o seu amor proprio ou a sua intolerancia, porque, então, levantar se ha tão poderoso que quem apparecer na sua frente terá de succumbir.

O projecto que se discute não pode, portanto, ser applicado a ninguem, a não ser á colligação liberal. (Risos).

Não sabe elle orador como ella se esqueceu de fazer a participação da sua existencia ao governador civil.

A colligação liberal é a fraternização de dois grupos politicos, do grupo regenerador - liberal e do grupo progressista.

O facto de se terem colligado esses dois grupos não exceptua o exercicio do direito de associação.

Pode se dizer que a colligação liberal é uma associação que tem por fim, a conquista do poder.

Não ha duvida nenhuma que a colligação liberal tem de participar ao Sr. governador civil que existe, porque entre os parciaes do Sr. José Lu-