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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Sessão de 22 de maio de 1868

PRESIDENCIA DO EX.mo SR. DUQUE DE LOULÉ

PRESIDENTE SUPPLEMENTAR

Secretarios os dignos pares Marquez de Sabugosa

Visconde de Soares Franco.

As duas horas e meia da tarde, sendo presentes 28 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Não houve correspondencia.

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na ordem do dia, e tem a palavra o sr. visconde de Chancelleiros, que é o primeiro que ficou inscripto da sessão antecedente.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Mas eu não vejo presente o governo.

(Entrou o sr. ministro da fazenda.)

O sr. Ministro da Fazenda (Dias Ferreira): — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — V. ex.ª deseja a palavra antes da ordem do dia?

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu pedi a palavra, mas foi para responder ao digno par visconde de Chancelleiros, que disse que o governo não estava presente, quando um dos seus membros aqui está.

Sendo a ordem do dia a discussão do bill de indemnidade, presumo que pôde continuar a discussão, e os meus collegas, que estão n'este momento n'outro serviço publico, não tardarão em comparecer.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO BILL DE INDEMNIDADE

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Começou por declarar que a votação do bill de indemnidade era uma ficção constitucional, porque approvado ou rejeitado esse bill, nem por isso deixava o governo de ter assumido a dictadura, nem deixavam de ter a natureza de factos consummados os factos no exercicio d'ella por elle praticado.

Que por isso lhe era indifferente a questão do voto, mas que nunca lhe podia ser indifferente a questão de doutrina; que por isso usava da palavra para expor as suas idéas, e para protestar com a sua opinião contra as infracções constitucionaes que se commetteram, sem que a lei da suprema salvação publica as justificasse.

Que a concentração de poder, que a dictadura significava, era um facto anormal nas sociedades regidas pelo systema constitucional, mas que tal facto se não dava nunca sem que a sua rasão justificativa estivesse no imperio das circumstancias que o impunham como necessario. No caso actual, porém, perguntava quaes tinham sido essas circumstancias, e não as encontrava.

Que a dictadura não nascera da revolução, mas sim a revolução da dictadura, porque se a anarchia tumultuou na praça foi quando a revolução tripudiou no governo. Não se dissesse que a agitação que precedeu a dictadura tinha sido uma revolução, porque mais imponente que essa agitação tinha sido a que movera o espirito publico, quando o amplo exercicio do direito de petição trazia á camara milhares de assignaturas contra as medidas de fazenda e de administração do governo passado; e que ninguem estranhara que perante essa demonstração de opinião adversa o governo se não demittisse.

Que as representações que vieram ao seio do parlamento não eram contrarias apenas aos projectos do imposto de consumo e de reforma administrativa; representou-se tambem contra os addicionaes ás contribuições pessoal, predial e industrial, e contra a reforma da lei do sello; e que entretanto todos esses projectos se converteram em leis do estado, e os dois ultimos ainda hoje o são, e não lhe consta que o governo proponha perante o parlamento a abolição d'elles.

Que era notavel, com effeito, que ante a agitação das praças se revogassem tumultuariamente leis importantes já em execução, ao passo que ante á agitação legal do paiz, mais respeitavel como exercicio de direito e como expressão de força, essas mesmas leis eram apoiadas e defendidas pelos homens que depois as haviam de revogar, ou sanccionar com o seu voto a revogação dellas.

Foi depois d'essa agitação legal que o sr. presidente do conselho approvára a reforma da secretaria dos negocios estrangeiros. Disse que não comprehendia similhante coherencia de principios, e que tal contradicção só o poderia absolver se a dictadura que o governo se arrogou fosse uma dictadura fecunda, e não a mais esteril e menos justificada que o paiz tem visto. Assim o governo terá de pedir dois bills de indemnidade, um ao parlamento pelo que desfez, e outro ao paiz pelo que não fez.

O sr. Costa Lobo: — Sr. presidente, eu não me apresento a fallar n'esta occasião como fiador do actual ministerio, porque declaro que não posso ser ministerial por ora, visto que isso depende das medidas que o governo ha de apresentar, e que ainda não sei quaes são; tambem não venho defender todos os actos praticados pelo governo até aqui, o que venho defender são os actos que o governo praticou, e dos quaes pede que seja relevado pelo projecto de lei que está sujeito á discussão d'esta camara. Também não é da minha intenção impugnar novamente as medidas que foram revogadas e contra as quaes votei, porque hoje uma similhante discussão é inutil, e tambem porque quero seguir áquelle exemplo de cordura e prudencia, dado pelo digno par, membro da passada administração, cordura e prudencia que confirmam o conceito que todos fazem da elevação do seu espirito e da nobreza do seu caracter.

Mas, quando eu vejo que os dignos pares que têem tomado a palavra em opposição ao governo, de tal maneira têem desconhecido factos tão recentes que apenas têem quatro mezes de data; quando vejo os commentarios que sobre elles se têem feito, não posso deixar de me espantar que a memoria d'esses factos se tenha apagado tão depressa, e que a sua significação seja por tal fórma esquecida. Quando vejo que estes factos são por tal fórma interpretados (apoiados), estou quasi participando do septicismo d'aquelles philosophos que dizem que a historia é um encartado de decepções que cada historiador narra, explica e commenta a seu modo. Mas estes factos são tão recentes, que é impossivel desconhecer a sua verdade e significação. A narração d'elles é o argumento mais irrefragavel da politica que o governo tem seguido.

O que aconteceu? Tres leis foram approvadas pela legislatura passada, as quaes durante a sua discussão soffreram a mais viva resistencia da parte do paiz, que se manifestou pelas petições, reuniões e comicios populares, e por uma discussão inflammada dentro e fóra do parlamento; mas apesar d'essas tres leis terem sido approvadas, quando chegou a epocha da execução d'aquella que mais viva resistencia tinha encontrado, que era a lei do imposto do consumo, o que succedeu? A cidade do Porto, em insurreição aberta, declarou que não cumpria essa lei; e por essa occasião coincidiu com essa insurreição no Porto, uma manifestação na capital que tinha por fim oppor-se ao adiamento das côrtes. Quando a luta travada entre a resistencia e a auctoridade tinha attingido o seu apogeu culminante, quando tinha chegado ao ponto de que dependia o triumpho da desordem ou da auctoridade, o governo transacto deu a sua demissão.

Eu não quero pungir os sentimentos de nenhum dos membros da administração passada. Ha desfallecimentos a que succumbem as almas as mais robustas; ha responsabilidades que acurvam hombros os mais robustos: mas preciso dizer, para justificação de tudo quanto estou sustentando, que a cedencia d'aquelle governo n'este momento solemne,

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n'esta occasião critica, não foi uma transacção, não foi uma retirada, foi uma verdadeira derrota.

Peço agora á camara que avive bem na sua memoria as impressões que se apossaram dos espiritos de todos, por occasião da abdicação do ministerio passado, em virtude da qual, não só ficou vencido o poder executivo, mas a auctoridade parlamentar que tinha confiado ao braço d'aquelle a execução das suas opiniões. Peço á camara que avive na sua memoria as impressões que se apossaram do espirito de todos por esta occasião; as incertezas que havia a respeito dos designios e do progresso ulterior da revolução, como se temeu pela sorte das instituições, como não havia confiança na força armada, como até se levantaram murmurios desprezíveis, é verdade, mas não menos significativos, que iam embater nos degraus do throno.

Estes são os factos, e em vista d'elles pergunto eu como é que o governo, que foi chamado a tomar conta dos negocios publicos, recebeu o poder? Recebeu o poder enfraquecido, recebeu-o vencido e debilitado. E n'estas circumstancias, sr. presidente, quando dois eminentes estadistas tinham recusado tomar conta do leme do estado, queriam porventura que o governo pozesse em execução leis que tinham levantado toda esta agitação? Queriam porventura que por esta sorte se provocasse uma guerra civil de resultados duvidosos, mas prenhe de horrores e calamidades? Creio pois que se não pôde censurar o governo por ter cedido ante a expressão imperiosa, significativa e indubitavel do paiz. Por consequencia não posso deixar de sentir que os dignos pares tenham censurado o governo por ter empregado os meios dictatoriaes n'aquella occasião, quando elles eram tão indispensaveis para o socego publico.

Não posso tambem deixar de estranhar que os adversarios do ministerio venham attribuir aos actos dictatoriaes os tumultos e os motins que se deram. O argumento de que se servem é que os tumultos se seguiram á dictadura, logo foram effeitos d'esta. Post hoc, ergo propter hoc; é o sophisma que os compendios de logica mandam evitar. Os tumultos e as desordens que houve no paiz não tiveram por causa a dictadura, coincidiram com ella, e tiveram a mesma causa que a dictadura.

É que não se infringe debalde um grande principio. A violação de um principio tão importante, como é o respeito devido á lei e a obediencia á auctoridade que a representa, traz comsigo mesmo e nas suas consequencias o seu castigo. Se são alluidos os diques que reprezam a torrente, que admira que ella inunde os campos, arranque arvores, devaste as habitações? Da mesma sorte a furia popular, que é tão irracional, tão impetuosa como a torrente das aguas. Esses tumultos e essas desordens foram o effeito do peccado original da primeira insurreição contra as leis decretadas pela representação nacional. Assim como o governo não é culpado d'aquella, não pôde ser tambem responsavel por esses tumultos que d'ella se seguiram. Já aqui, n'uma das sessões passadas, censurei esses attentados e os estigmatisei devidamente. E possivel que o governo não haja sempre mostrado a energia e severidade que era necessario ostentar em casos d'esta ordem. Mas, sr. presidente, attendendo ao estado lastimoso em que o ministerio recebeu o poder, e ás circumstancias criticas em que o encontrou, confesso que não me atrevo a pedir-lhe contas demasiado estrictas do seu procedimento.

Não posso agora deixar de responder a uma accusação que tem sido feita aos membros da opposição ao governo passado. Disse-se que a opposição semeou no paiz os germens da desordem (O sr. Vaz Preto: — Apoiado.), e que ellas foram devidas ás pregações e ao apostolado dos homens da opposição. Protesto contra similhante asserção. Eu pertencia á' opposição, e pelo que tenho dito e pelo que direi logo, se torna evidente que não sou partidario da desordem, nem podia ser factor d'ella. Porventura pôde censurar-se o medico por declarar ao enfermo a gravidade da molestia, e por insistir com elle para que empregue os remedios que a medicina aconselha, a fim de que a doença não progrida, e não o leve á sepultura? O meu papel na opposição era este; era sustentar os verdadeiros principios, e insistir com o governo para que os seguisse, porque já previa as consequencias que as medidas do governo teriam.

Se me é permittido, n'esta questão, fallar na minha pessoa, peço licença para lembrar á camara que na occasião da discussão da lei do imposto de consumo, eu disse que me entristecia com a previsão das desgraças que se haviam de seguir da execução d'essas leis, e que não seria poupado o sangue do povo. Portanto a opposição não é responsavel por esses tumultos, ella não fazia mais que mostrar ao governo os inconvenientes das suas medidas.

E para amenisar um pouco esta discussão, que na verdade suscita recordações desagradaveis, permitta-me o digno par que ha pouco com o seu apoiado tornou a opposição responsavel pelos tumultos, que eu lhe conte uma historia. Havia nos fins do seculo ultimo um imperador na Russia, chamado Paulo, que era excessivamente feio, e como os espelhos do seu palacio lhe reflectissem a cada passo a ingratidão da natureza, que fez elle? Mandou-os quebrar todos. A indignação contra a opposição assimilha-se á d'este imperador contra os espelhos.

Também não posso deixar de admirar que os dignos pares increpem este governo por elle ter assumido a dictadura, e ao mesmo tempo o accusem de não se ter servido d'ella com mais energia para fazer grandes reformas. Mas o governo não assumiu a dictadura por vontade, foi obrigado a assumi-la pelas circumstancias extraordinarias que se davam, e só com o fim de tomar as medidas necessarias para acabar com a agitação popular, e eu pela minha parte felicito-o por se não ter servido da dictadura para outro fim, e de outro modo. Sou inimigo das dictaduras, e não posso admitti-las senão nas circumstancias criticas, como aquellas em que o governo se encontrou.

O argumento apresentado pelo governo, que este bill de indemnidade deve ser approvado por esta camara porque tem a sancção da camara electiva, é um argumento attendivel. Isto não quer dizer que esta camara não seja livre e independente, e que tenha o seu voto sujeito ao da outra camara, mas sim que se deve attender ao facto de ter sido a indemnidade approvada por grande maioria na camara dos senhores deputados, que acaba de ser eleita pelo paiz, e que não podemos deixar de suppor que representa os sentimentos da nação. Este argumento não pôde deixar de influir no espirito da camara e na resolução que ella tem de tomar.

E necessario que nos convençamos de uma verdade, é que o paiz é adverso ás medidas que foram revogadas, e sanccionou a sua revogação. Eu sei que esta expressão todo o paiz é demasiado vaga, e pôde prestar-se a todas as asserções. É muito possivel até que o maior numero seja dos indifferentes, e dos que não tomaram parte activa n'estes acontecimentos; mas a camara sabe que em todas as sociedades o numero d'aquelles que fallam, que agitam e que tomam parte activa nos negocios é que se deve apreciar. Dos outros, porque não fallam, não se pôde conhecer o pensar; e visto que são indifferentes, sujeitam-se implicitamente á decisão dos membros activos. A camara vae votar este projecto, muitos dos seus membros estão ausentes, outros podem abster-se de votar; apesar d'isto a resolução que tomar não deve ser considerada como uma resolução da camara dos pares? O mesmo succede com o paiz; e quando se diz que o paiz não queria essas leis, diz-se a verdade.

Eu não venho aqui defender o governo em todos os seus actos. Espero as medidas que tenha de apresentar, e depois pronunciarei a minha opinião franca e leal; não me apresento aqui como ministerial, succeda o que succeder. Mas defendo o governo n'este ponto, e defendo-o segundo as minhas convicções.

Não posso porém assentir ao pensamento aqui apresentado, de que o governo deve ser sacrificado, porque representa a revolução, e porque sanccionou com actos dictatoriaes as idéas da revolução. Assimilha-se esta maneira de pensar á d'aquelles generaes da antiguidade que, para applacar a cólera dos deuses, sacrificavam alguma victima, como Agamenon sacrificou Ephigenia.

Assim tambem alguns dos nossos réis, quando queriam saldar as suas contas com o céu, mandavam accender fogueiras onde queimavam algumas dezenas de victimas offerecidas em holocausto para tranquillidade de sua consciencia. O governo não tem culpa do estado em que achou o paiz, e quando tomou conta dos negocios publicos entendeu que o que lhe competia primeiro que tudo fazer era attender á animosidade que dominava os espiritos contra as medidas que revogou; ainda digo mais: depois de dois estadistas abalisados terem sido convidados a formar um novo ministerio e terem-se recusado a faze-lo, o governo aceitando o timão do estado, merece antes agradecimentos do que censuras, por ter mantido o poder, violado e escalavrado sim, porque assim já o recebeu, mas, apesar d'isso, sobranceiro aos ataques da anarchia.

Preciso responder a uma outra objurgação que não me foi dirigida a mim, mas ao sr. ministro da fazenda, á qual respondo, não para defender s. ex.ª, que não o precisa, mas para me justificar a mim, porque tambem tomei parte n'esse acontecimento. Eu pertenci, juntamente com o sr. ministro da fazenda, a uma commissão encarregada de pedir a Sua Magestade que se dignasse não annuir ao adiamento das côrtes. Ainda que de facto eu não acompanhei essa commissão, porque, quando me foi lida a representação, não me agradou a sua redacção. Escuso dizer á camara os motivos d'esta desapprovação.

Ora, eu creio que ninguem me pôde censurar por eu ter feito parte de uma commissão encarregada de usar de um direito tão justo, como é o direito de petição, pedindo o não adiamento das côrtes; porque eu na verdade entendia que era um gravissimo erro politico n'aquella occasião.

Cessemos portanto de censurar o governo actual, que não tem culpa de successos sobre que não pôde ter imperio, e de censurar o governo passado, que já não existe, e nenhum bem nem mal nos pôde já fazer.

Eu confio mesmo que os cavalheiros que faziam parte da administração passada, quando voltarem ao poder, amestrados pelas amarguras da experiencia, prestarão serviços ao paiz, os quaes compensarão largamente as faltas que commetteram. Ha, sr. presidente, um actor principal n'este drama social. E o paiz. A esse nos devemos dirigir, a esse endereçar os nossos conselhos e censuras como membros d'esta camara.

Aqui, sr. presidente, eu quizera que a minha voz tivesse prestigio e auctoridade sufficiente para retumbar em todas as cidades, em todas as povoações, em todas as aldeias d'este paiz, declarando-lhe que o seu procedimento desde o principio d'este anno, desde a primeira insurreição contra as leis sanccionadas pelos representantes da nação, é um procedimento indigno de um paiz livre.

Já o disse n'esta camara, mas torno a repetir, porque não pôde haver excesso em repetir e escutar verdades tão fundamentaes.

As revoluções que têem por fim reclamar os direitos imprescriptiveis do homem; que têem por fim reivindicar dictames eternos da justiça; que têem por fim reentregar o homem n'aquelles fóros e liberdades, sem as quaes não pôde cumprir a sua missão, perde a sua dignidade, nem tem mesmo rasão de existencia; estas revoluções são justas e gloriosas. O homem que n'ellas toma parte, se é feliz é um heroe, se sucumbe um martyr.

Mas os attentados contra a lei, o desprezo da auctoridade, a insurreição contra os poderes publicos, promovida em nome de interesses materiaes, ainda que bem entendidos, contra o regulamento d'esses mesmos interesses, feito pelos fiscaes e mandatarios do povo; por aquelles que têem procuração da nação para curarem dos interesses do estado, que são os interesses de cada um dos seus membros; essa insurreição não tem justificação, nem desculpa. E necessario pois que façamos essa rigorosa distincção para não confundirmos inspirações de interesse com motivos nobres e elevados.

Sr. presidente, percorram-se as paginas da historia portugueza, e ver-se-ha ahi que o povo portuguez, n'aquelle tempo em que o nome de Portugal era admiravel, temido e respeitado, se sujeitou sempre sem murmurar aos subsidios votados pelas côrtes.

O primeiro exemplo de resistencia que se encontra, foi offerecido ao primeiro rei que ousou levantar o imposto sem auctorisação dos tres braços do estado. E o nome de João Mendes Cicioso, aquelle illustre vereador de Evora, que, com perigo de seus bens, de sua vida, recusou dar cumprimento a um tributo decretado por El-Rei D. Manuel; esse nome será eternamente memoravel, porque era o de um homem que attestava com heroicidade o eterno principio de justiça em materia de imposto, o qual é, que só o povo tem direito de se tributar a si mesmo, guardada a proporcionalidade dos haveres. Pois este é o unico principio inviolavel, tudo o mais quanto se refira a este ou aquelle genero de imposto, a esta ou aquella base de incidencia, a este ou aquelle modo de cobrança, são questões de conveniencia e de politica, quando muito questões de equidade, mas não são questões que constituam um principio invariavel.

Mas, sr. presidente, se se póde offerecer resistencia a uma medida authenticada pela representação nacional, ás leis sanccionadas segundo as determinações da constituição e as exigencias da philosophia liberal a mais escrupulosa, pergunto que differença ha entre um paiz livre e um paiz governado pela força. Eu acreditava que n'um paiz livre a lei devia ser objecto d'aquella veneração particular, que um philosopho chamava o culto da segunda magestade, emquanto que no paiz despotico a lei é um grilhão supportado com impaciencia. Eu julgava que n'um paiz livre cada cidadão era um mantenedor austero da lei, emquanto que no paiz do despotismo elle está em insurreição aberta, ou em conspiração secreta contra ella. E, senão, procurae na carta do mundo as nações livres e as escravisadas, e verificareis o que digo. Vede os Estados Unidos. Ali a lei é acatada com respeito igual ao de uma Divindade, e cada cidadão é um vigia incansável, um fiscal severo da lei.

Lançae agora os olhos para alem das fronteiras e vereis um exercito sempre formado em linha de batalha, e todavia, a cada instante se ouvem os rebates da insurreição. Essa é, sr. presidente, a distincção característica dos paizes livres, o obediencia á lei e o respeito á auctoridade.

Não desejo por mais tempo cansar a attenção da camara, por isso vou terminar dizendo que nos dêmos pressa em approvar este projecto de lei, porque por esse modo vamos apagar a memoria de factos, cuja principal responsabilidade pertence a um agente, de quem ella se não pôde exigir, e de quem nós somos os mandatarios. Esse é o paiz.

Eu espero porém, que elle não se recusará apagar aquelle imposto que é o preço da nossa liberdade. E ainda que na epocha em que vivemos não se ouça senão o grito da religião positiva do interesse, ainda que agora, apesar de ser, quasi seja necessario affrontar o ridiculo para appellar para os sentimentos mais nobres da natureza humana, ainda que nós vivemos n'uma epocha, em que se o proprio Camões cantara:

Eu d'esta gloria só fico contente

Que a minha terra amei e a minha gente,

seria apupado, e dir-se-ía logo, que elle trazia de olho, do unico olho que elle tinha, algum logar no conselho ultramarino: apesar de tudo, eu não duvido incorrer no ridiculo por dizer que eu acredito que n'este paiz ha ainda sufficiente pundonor, para que ninguem recuse pagar o preço que custou a conquista da liberdade, que eu acredito que o egoismo não tem lançado tão profundas raizes n'esta terra, que haja alguem que se recuse a pagar o imposto, de que depende não já a prosperidade da nação, mas a sua existencia como nação que tenha direito a existir.

Em conclusão, sr. presidente, eu voto a proposta de indemnidade ao governo.

(O orador não reviu este discurso.)

O sr. Rebello da Silva: — Associa-se completamente ás expressões com que o digno par que acabava de fallar terminou o seu discurso. Associa-se á interpretação perfeitamente logica e racional que deu aos actos praticados. Associa-se ao appelo que fez, para a sisudeza, para a cordura, e para a devoção patriotica do paiz, que não deve ter menos a peito do que os dignos pares o pagamento d'essa divida de honra, contrahida para obtermos a nossa liberdade e nacionalidade.

Raras vezes é licito a um paiz opprimido, a quem a liberdade foi absorvida, a quem os direitos mais sacrosantos foram espoliados; raras vezes, repetia, a um paiz n'estas circumstancias é licito o oppor a sua resistencia aos males que o affligem. Entre nós essa resistencia deu-se uma vez, e em uma grande epocha da historia, quando vergávamos debaixo de um jugo estrangeiro, que durou mais de sessenta annos. Depois de nos terem enfraquecido todas as liberdades e direitos, o até mesmo quasi que o direito da saudade, quando nos queriam sugar as ultimas gotas de sangue, n'esse dia o paiz disse não, e como era o paiz unanimemente que o pronunciava, esse não foi mantido, e depois assegurado por um tratado, que firmou a nossa independencia como nação.

Elle orador concebe facilmente a impaciencia em que a

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camara deve estar de que estes trabalhos se não encerrem sem que, pela mutua cooperação dos poderes do estado, e pela sincera coadjuvação do paiz, nos vejamos entrados no caminho das verdadeiras e uteis reformas; mas se essa é a vontade da camara, como todos reconhecem, tambem igual é o desejo d'elle orador em a acompanhar no seu empenho.

O fim para que pediu a palavra, e com que esperava occupar por alguns minutos a attenção da camara, foi para explicar as rasões por que dá o seu voto ao projecto em discussão, e para caracterisar quanto possa os motivos que dictaram o seu procedimento a respeito do algumas medidas que votou na sessão passada, procedimento de que não está arrependido; porque, para si, os principios sobre que assentam as leis que votou, são tão bons hoje como o eram hontem.

Se na epocha em que os poderes absolutos viam rastejar a seus pés os aulicos que cortejavam os seus actos, só tinha cabimento a lisonja, na epocha em que o povo é soberano, é preciso que ella não tenha esse cabimento; é necessario que se diga a verdade ao povo como ao rei. A verdade pois ao rei e ao povo, e a verdade que é preciso dizer ao povo, é que necessitámos reformar a nossa administração e carecemos do verificar por salutares economias, reformas sensiveis; que não podemos prescindir de um imposto dividido com igualdade e justiça, e finalmente que precisámos pagar uma grande divida que contrahimos para termos liberdade, como temos, para termos civilisação, para emfim gosarmos todos os beneficios que nos trouxe essa liberdade.

Portanto elle orador não lisonjeia o povo nem o paiz, porque elle carece menos de quem o lisonjeie do que do quem lhe firme o principio da auctoridade e da segurança.

N'esta camara foram discutidos, na ultima sessão, differentes projectos do lei, vindos da outra casa do parlamento, os quaes foram approvados por uma camara que tinha sido eleita debaixo dos auspícios de um governo que não era áquelle que havia tomado a iniciativa d'essas medidas. Refere-se á camara dos senhores deputados, que ultimamente foi dissolvida. Via-se pois que essa camara não podia ser suspeita no apoio que dava ao governo de então. Elle orador teve a honra de ser relator do alguns d'esses projectos, e comquanto não os julgasse a expressão final sobre o assumpto a que elles se referiam, reconheceu todavia que encerravam uma certa ordem de principios geraes, adequados e em harmonia com os ultimos melhoramentos interessados na governação publica do estado.

O que era a lei do imposto de consumo? Era uma medida pela qual, depois de se ter pedido ao imposto directo o que por elle se não podia realisar sem muitas desigualdades, se procurava conseguir uma receita mais corta e segura, sendo ao mesmo tempo mais igual e equitativa para todas as classes na justa e devida proporção, estando já em parte ensaiadas pelas administrações municipaes, de que ellas sempre derivaram um dos seus melhores rendimentos, uma das suas maiores garantias, para muitas vezes obterem meios com que podessem mais promptamente realisar melhoramentos reclamados pelas necessidades dos mesmos municipios.

Essa lei pois, como outras que foram revogadas, tinham vindo aqui nas melhores intenções, mas o desejo do maior acerto, a ponto de se querer logo de repente chegar em tudo ao estado do perfeição absoluta, foi um sentimento que se teve mais em vista do que o conhecimento pratico das circumstancias peculiares nas differentes povoações e no geral do paiz (apoiados).

D'aqui é que nasceram todas as tentativas para explorar nas nossas difficuldades com certas doutrinas que se estabeleceram.

Ora, elle orador entende que é da necessidade mesmo do nosso systema politico, que todas as medidas tenham adversarios, ou boas ou más, é preciso sempre que haja a discussão (apoiados); mas d'isto á maneira como se inverteram os principios, como se envenenou a indole da missão, como se proclamou (por todos os modos, sempre mais ou menos reprehensiveis) a negação absoluta do imposto, e por consequencia a negação de governo e de ordem social, corre-se uma distancia immensa. (Vozes: — Muito bem.)

Pede a Deus que não seja assas rigoroso no modo de fazer caír a responsabilidade sobre aquelles que na sua imprudencia e imprevidencia, cuidando crear sómente obstaculos aos seus adversarios, crearam abrolhos com que depois tivessem de se encontrar na estrada que atravessassem (apoiados).

Não nos illudamos; a crise é bem melindrosa e difficillima, porque, como bem mostrou o digno par o sr. visconde de Chancelleiros, ha ainda um vasto plano de agitação publica, e sempre que o governo queira reassumir o prestigio da auctoridade e a realidade do poder, ha de encontrar mais ou menos fortes as explosões d'esses rastilhos que se não podem julgar ainda extinctos. (O sr. Visconde de Chancelleiros: — -Apoiado, apoiado.)

Elle, orador, não é apostolo das economias exageradas, nem tambem é o cerbero fiscal. Quer que os governos possam atravessar todas as difficuldades, e ás vezes a exageração de economisar tambem occasiona difficuldades; quer portanto sómente as economias sensatas, justas e prudentes, aconselhadas pelos bons principios e justificadas pelo imperio das circumstancias, attendendo-se a ellas com serenidade e com sinceridade (apoiados). Quer sobretudo, e sempre primeiro que tudo tambem, que a auctoridade, n'este como em muitos outros pontos, não attenda a rasões de politica em que imperam ou podem imperar as paixões, e não quererá jamais que a auctoridade receba reclamações incompetentes, vindas de logares onde não é licito intervir por fórma alguma na governação do estado (apoiados). Não se pôde consentir que qualquer grupo ou mesmo uma qualquer povoação pretenda dominar com a sua vontade illicita os poderes publicos, tendo a pretensão desvairada de causar algum constrangimento ou ás camaras ou ao governo (muitos e repetidos apoiados).

Aqui para todos ha um unico caminho que é o dever. (Vozes: — Muito bem.) Toda e qualquer outra manifestação deve ser repellida pelos poderes publicos que a não reconhecem, que não podem nunca reconhecer. O governo está no parlamento, não pôde estar, nem ha de estar nas praças publicas ou nos comicios illegaes (apoiados).

O governo d'este paiz não pôde estar senão onde a carta constitucional o collocou (apoiados repetidos).

Para attender a quaesquer queixas, quando sejam fundadas, lá está providenciado...

(Aparte do sr. visconde de Fonte Arcada que não se ouviu.)

O digno par tem rasão; a camara muitas vezes não considera o direito de petição, mas tambem é preciso ver como o direito de petição se apresenta, e por isso desejara que este direito fosse regulado de accordo com o direito do reunião, para acabarem de uma vez para sempre todas as excentricidades com que em nome de direitos sacratíssimos se fazem invasões no principio da auctoridade.

Portanto o direito de petição é unicamente formado para interesses queixosos, com a devida obediencia dos poderes publicos, poderem ser attendidos ou não, segundo a justiça que tiverem, mas devendo ser sempre respeitado; mas o direito de petição não são os tumultos, nem as matrizes rasgadas e queimadas, nem a força publica ultrajada, nem o escarneo das instituições, nem a usurpação dos deveres que competem aos poderes legaes. O direito de petição não é a revolução, mas a estrada franca que nos abriu o caminho da liberdade com a segurança de todos os direitos. Até aqui bem; d'aqui por diante nada. Espera pois que digam os -poderes publicos (O sr. Presidente do Conselho: — Apoiado.) nada, se não querem que de concessão em concessão, de sacrificio em sacrificio, de fraqueza em fraqueza, se chegue ao dia de se appellar para o recurso da força que faz derramar o sangue. Por consequencia, firmeza e energia, que não quer dizer a força bruta, mas que é o que se precisa para não nos vermos obrigados a enlutar novas paginas da nossa historia, como faz votos que não aconteça (apoiados).

Elle, orador, não é exaltado por economias, nem entende que ellas só resolvam as difficuldades; entende sim que ellas devem ser um facto ordinario do administração e o reconhecimento das necessidades publicas, e feitos pelos poderes do estado com aquella cordura e sisudez com que devem proceder sempre os homens d'estado.

O imposto está nas mesmas circumstancias, ninguem o lança por vontade, e elle, orador, confessa que assim lho aconteceu quando o votasse, porque sabia que sem elle não se podia attenuar esse grande deficit, que não é obra do ministerio passado nem dos que o antecederam, mas que é o resultado da conquista das nossas liberdades e dos nossos melhoramentos (apoiados).

O deficit é tudo isto! Imaginam corta-lo, destruindo a arvore frondosa do emprego mania, façam-no muito embora, e oxalá que o façam, mas respeitem os direitos, não reduzam á miseria aquelles que tem minguados ordenados que mal lhes chegam para viver, ou cerceando as despezas necessarias ao desenvolvimento do paiz, e que são precisas se quizermos viver vida de nação independente e civilisada. O que se pôde fazer é a reforma dos serviços publicos, organisar os methodos do expediente do systema burocrático, e ao mesmo tempo aperfeiçoar o systema das nossas contribuições, 'o invocar as faculdades do paiz, porque sem ellas não é possivel conseguir isto.

Vota portanto pelo bill de indemnidade, porque é um facto cousummado, o logo depois do constituido o ministerio actual teve a honra de dizer ao sr. presidente do conselho as rasões que tinha para não approvar a situação creada em 1 de janeiro d'este anno; e unia d'estas rasões era encarregar do poder aquelles que tinham apostolado contra as doutrinas do imposto, que o tinham guerreado, e que tinham, abraçado o principio da economia como unico meio de melhorar o estado do paiz, e esperar depois pela confissão explicita de que elles não tinham podido acalmar as. paixões.

Esta foi a rasão por que disse que não podia dar o seu apoio ao gabinete. Esse gabinete foi uma transição, e julgou necessario revogar as medidas que foram approvadas pelas duas casas do parlamento. Faz votos com o digno par Costa Lobo, para que nunca mais, para felicidade d'este paiz, e para continuar a ser respeitado, se torne a levantar nas praças publicas o veto que tende a destruir completamente as leis votadas nas instancias competentes, approvadas pelo parlamento e sanccionadas pelo poder moderador, quando estavam abertas as vias constitucionaes, porque era o ultimo anno da legislatura.

Para derrubar qualquer governo, quando não representa uma doutrina, basta a convicção de que elle não serve para isso. Vota pois o bill de indemnidade, cede á impaciencia justa que a camara tem, para que o governo, por meio da sua approvação, possa cumprir a sua promessa, e apresentar ao parlamento as providencias com que o sr. ministro da fazenda espera poder acudir ao melhoramento do paiz. Faz votos para que s. ex.ª se não engane, e para que quando vier pedir sacrificios ao paiz não encontre hoje as mesmas difficuldades e tempestades que encontrou o ministerio transacto.

Pela sua parte, elle orador, não ha de pedir ao governo que faça aquillo que não deve fazer; ha de apoiar as medidas que entender que deve apoiar, e ha de combater aquellas que julgar que devo combater com a força e desafogo proprios do homem que ambiciona o melhoramento dos negocios publicos. Deseja completamente que os srs. ministros administrem as cousas publicas até ao ponto em que confessem que não podem continuar a gerir os negocios publicos pelos principios sustentados pela agitação, mas estimará muito que possam atravessar as difficuldades para entrar no Capitólio.

Oxalá o governo possa collocar-se á altura da sua missão; oxalá que o paiz possa juntar mais uma pagina honrosa á sua historia, e que todos se encontrem d'aqui a um anno com os horisontes mais desanuveados (apoiados).

Vozes: — -Muito bem.

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, eu faço um grande sacrificio em usar hoje da palavra, não só porque me sinto incommodado, mas porque vejo que as minhas expressões magoam os srs. ministros, e eu não quero affligi-los; pelo contrario desejava ve-los satisfeitos e alegres, comtanto que os seus actos contentassem e alegrassem tambem a nação; deixaria pois ss. ex.ªs em paz o doce enleio a que aspiram, se um dever imperioso não me obrigasse a cortar por todas as considerações, e a satisfazer a elevada missão que está inherente ao logar que occupo no parlamento.

O posto de honra que me foi confiado não o abandonarei jamais, pelo contrario empregarei todos os esforços, todos os recursos e todas as condições, embora pequenas, com que a Providencia me dotou para o consertar dignamente.

Sr. presidente, pareceu-me na ultima sessão divisar que o sr. ministro da fazenda se affligia um pouco com a aspereza da phrase, com a severidade de expressão com que eu pretendi descrever rigorosamente, e manifestar ao publico com as cores as mais expressivas, as paginas gloriosas da incoherencia da sua vida politica; sinto e lamento a afflição e magua do s. ex.ª, e qualquer bom coração poder-lhe-ia levar consolações o lenitivo, se os factos conforme a sua natureza, se as imputações conforme a sua gravidade, se os precedentes conforme a sua contradicção, podessem prescindir da phrase que os designe, que os aponte, que os evidencie ao publico com toda a seriedade, e taes quaes elles são.

E convicção minha, desde que me conheço, que a verdade se deve dizer com franqueza e lealdade, sem rodeios nem atavios, simples e singela qual a sua natureza e essencia, embora não agrade muito a ss. ex.ªs, embora não chegue suave nem soe harmoniosa aos ouvidos de ss. ex.ªs, embora os echos d'esta casa não a repitam com um som sonoro e vibrante. Se ella viesse coberta de flores, rodeada de arabescos, vestida loucamente, talvez ninguem a conhecesse! Por isso eu não sei se admire mais no sr. ministro da fazenda a modestia e humildade quando fallou dos seus talentos, recursos e sciencia, se o arrojo, coragem e desassombro de se sentar n'aquelle logar, e tomar sobre si tão espinhosa o difficil tarefa, não tendo confiança na sua pessoa, e tendo mostrado á camara a sua insufficiencia. Esta contradicção flagrante e tão visivel, que ninguem deixa de ver o apreciar, traz-mo no espirito o convencimento de que a phrase quando não é franca e leal, não exprimo o pensamento dos que a proferem, o só serve para occultar e encobrir intenções menos nobres, e se a phrase fosse parlamentar diria interesseiras e de refalsada hypocrisia. E tanto isto é assim, que as phrases de s. ex.ª não se demoraram muito em demonstrar a justeza d'esta proposição. Que queria o sr. ministro exprimir e significar quando dirigindo-se a mim me dizia que deixasse esta questão esteril, que a abandonasse, o aguardasse as medidas do fazenda, o que n'essa occasião supplantasse o meu adversario e reduzisse a pó os seus argumentos?! Isto significava a vaidade occulta de orgulho refreado querendo disfarçar-se debaixo das formas e dos trajes de singeleza e modestia, e expandindo-se agora em rajadas de presumpção, e impulso do ousadia, arremessando-me a luva convidando-me para a discussão das medidas de fazenda. As medidas que s. ex.ª vae apresentar podem ser muito más, e serem sustentadas tão brilhantemente pelo talento que pareçam boas. Isto dá-se não poucas vezes quando ao talento não se junta a moralidade e honradez, o não poucas vezes acontece tambem que essas faculdades nobres e brilhantes em logar de serem uteis aos povos, dirigidas pelos maus instinctos, e talvez pelos defeitos da organisação lhe sirvam só de açouto e flagellos.

É uma grande verdade o que dizia um celebro escriptor francez. Fallo de Montesquieu. Dizia elle nas suas judiciosas considerações, ácerca dos differentes governos, que a base do governo representativo era a honra e a moralidade. Assim devia ser, porque sem estes dois elementos, sem honra e sem moralidade os povos não encontram garantia segura em qualquer poder por mais bem organisado que esteja, ou em qualquer funccionario por mais talento que tenha. Um ministerio immoral pôde defender brilhantemente medidas que vão de encontro aos interesses da paiz, e pelo seu talento dar-lhe a côr que ellas não tem, e fazer parecer o que ellas não são; assim como o contrario é possivel com um ministro muito integro, apresentar medidas muito convenientes e uteis, e comtudo mal sustentadas o mal defendidas. Oxalá que estes acontecimentos se não dessem, que fossem apenas raros phenomenos; infelizmente o nosso paiz é prodigo n'estes exemplos bem pouco edificantes.

Como entendo que nas crises publicas a vaidade, o amor proprio e o orgulho são sempre maus conselheiros, e por isso devemos evita-los, desde já declaro solemne e terminantemente que, quando se apresentarem aqui na tela da discussão essas medidas tendentes a reorganisar as finanças e a melhorar a fazenda publica, que, como poder, conforme os meus recursos, conhecimentos e intelligencia, as' avaliarei: se as julgar boas, vota-las-hei, porque nunca fiz' opposição acintosa, e se as julgar más, combate-las-hei, tanto pela palavra como pelo voto, que será a expressão fiel da minha apreciação.

Sr. presidente, quando eu fallei nas leis que foram revogadas pelo acto dictatorial, referi-me á reforma da secreta-

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ria da fazenda, e por essa occasião mostrei o que ella significava. O sr. ministro respondeu-me que elle tinha todo o direito de nomear delegados do thesouro e escrivães de fazenda, como muito bem quizesse. '

Sr. presidente, eu não contestei o direito ao sr. ministro ida fazenda de nomear os empregados. Essa nomeação é permittida a s. ex.ª pelo logar que desempenha; mas s. ex.ª «também não póde contestar o direito que eu tenho de vir aqui pedir respeito e acato á lei, o protestar contra a sua infracção. Não protesto só, censuro aspera e acremente o procedimento arbitrario de s. ex.ª, embora não goste nem da minha phrase, nem dos meus gestos, nem da rasão com que fallo.

O illustre ministro infringiu, a lei, nomeando dois delegados do thesouro, quando effectivamente se oppunham a, isso disposições que estavam em vigor e que depois foram revogadas para attenuar e minorar a sua grandissima responsabilidade.

Eu não fallei em escrivães de fazenda porque, embora no procedimento do sr. ministro para com o escrivão de Castello Branco se revelo a pouca attenção e cuidado de s. ex.ª para que os logares sejam bem desempenhados por funccionarios intelligentes e honrados, não houve comtudo prostergação de alguma disposição vigente; mas visto s. ex.ª -chamar-me a este campo, vou contar á camara e a V. ex.ª este facto altamente significativo, e que revela as tendencias do sr. ministro.

Havia em Castello Branco, na repartição de fazenda, um -empregado habil, intelligente, honrado e carregado de serviços, que foi despachado para o logar vago de escrivão de fazenda d'aquella comarca, por transferencia do que, lá estava, para a Guarda, proposto pelo inspector de contribuições directas, que reconhecera que o serviço não podia ser bem feito, nem era muito decoroso que aquelle funccionario ali se conservasse, havendo repetidas occasiões em que tinha do funccionar conjunctamente com seu irmão delegado do procurador regio. Bastante resistencia offereceu o sr. Feio (pronuncio o seu nome porque o quero registado e bem conhecido do publico pelo que merece). Repito, bastante resistencia offereceu o sr. Feio a aceitar o logar, mas como este logar era importante e melindroso do exercer, era necessario, para ser bem desempenhado, um homem de rigido tempera, habil e com experiencia do serviço, o que se encontrava tudo no sr. Feio; portanto as insistencias continuaram, e o sr. Feio, a muito custo, cedeu; parece que pressentia já que o seu sacrificio lhe acarretaria outros. Desempenhou o logar como era de esperar, e a sua severidade de principios e rigidez de caracter dava garantias a todos, e não consentia que a fazenda publica fosse defraudada; teve a infelicidade porém de caír no desagrado do um grande proprietario influente para com o sr. ministro da fazenda, e cujo proverbial aproveitamento da politica para se favorecer assim nas contribuições é muito conhecido; não lhe corriam porém as cousas como desejava e aproveitou-se da tibieza do sr. ministro para exigir aquella grande arbitrariedade, para não lhe chamar escandalo. Notem V. ex.ª e a camara que este acto irregular foi sanccionado pelo ministro, apesar dos honrosos documentos que estão na repartição da fazenda, que attestam os seus relevantes serviços e todas as asserções que eu deixo exaradas a este respeito. E estava o sr. ministro dentro do arbitrio das suas attribuições esquecendo os serviços prestados por esse homem e transferindo-o? Os serviços premiam-se assim? Os interesses publicos zelam-se por esta fórma? Parece-me que em taes circumstancias o acto do sr. ministro é um abuso do poder. Notem V. ex.ª e a camara, a força dos documentos e o peso dos serviços era tão grande que apesar de não poder domar a consciencia rebelde do sr. ministro, obrigava comtudo a procurar certa regularidade querendo que algum -empregado superior propozesse aquella immerecida transferencia. E sabe a camara quem fez a proposta? Não foi o delegado do thesouro do Castello Branco, a quem competia, mas sim o proprio delegado do thesouro da -Guarda, a quem não pertencia, e que se rebaixava ao ponto de vir pedir o contrario do que já tinha pedido, desdizendo-se de tudo o que escrevera. Era este proprio delegado do thesouro que tinha feito a proposta quando era inspector das contribuições directas em Castello Branco e Guarda para que fosse transferido de Castello Branco para a Guarda aquelle que hoje propõe novamente para Castello Branco Quem devia ser transferido, não digo transferido, mas demittido, era o delegado do thesouro que engana o sr. ministro, faltando ou agora, ou n'outra occasião, á verdade.

Aqui está como as cousas se passaram. S. ex.ª chamou-me a este campo e aproveitou-me para mostrar qual a confiança e o credito que devem merecer ás suas palavras quando significam os seus bons desejos de bem fiscalisar a arrecadação dos dinheiros publicos, e de que o serviço seja bem regulado, expedido e executado por empregados habeis o dignos. Essa triste historia o patenteia com toda a evidencia. Se o illustre ministro trata os empregados carregados de serviços por esta fórma, que ha a esperar? Que incentivo têem elles para serem fieis ao seu dever? Que garantias e que penhores dão á sua fidelidade e bom desempenho? Este systema não é possivel, não se justifica. Concluido este incidente vou responder a outras considerações do sr. ministro da fazenda que disse, para eu justificar a approvação das leis que tinham sido abolidas pela dictadura, e que eu considerava beneficas e boas, devia tirar a prova, propondo-as pela minha iniciativa.

Sr. presidente, não sou tão destituido de senso que queira fazer sobresaír e prevalecer a minha opinião e auctoridade, • que é pequena e insignificante, quando acabo de ver que a outra camara approvou a revogação d'essas leis; muito principalmente tendo eu declarado que repor cousas no seu antigo estado era impossivel e traria gravissimos inconvenientes; comtudo permitta-me V. ex.ª que diga que essa revogação não significa nada contra a verdade dos seus principios, contra a justiça das suas doutrinas e contra o adiantamento das idéas que n'ellas estavam consignadas. Todos nós sabemos que quando se pretende plantar em qualquer sociedade doutrinas novas, que cortam por muitos interesses e por muitos abusos, é necessario uma luta immensa para as levar por diante e fazer triumphar, chegando-se muitas vezes a derramar torrentes de sangue.

A luta constante entre interesses creados e os novos que os vão substituir, entre as idéas de hontem e as de hoje, entre o passado e o futuro, é um phenomeno que se não é novo, está na ordem das cousas. Quanto não nos têem custado essas conquistas da liberdade e da civilisação de que hoje gozámos! Mas, sr. presidente, se o governo não tivesse interferido directa e poderosamente nas eleições, então poderia o seu argumento colher, por isso que a camara electiva era a genuina expressão da manifestação do paiz; mas desde o momento em que o governo interferiu n'ellas, e interferiu pelo modo que se viu, desde o momento que as auctoridades, como governadores, civis, administradores de concelho e regedores, intervieram com todas as suas forças e recursos nos actos eleitoraes, pelo que foram profusamente remunerados pelo governo com honras o distincções, não se pôde considerar a camara dos senhores deputados como a genuina expressão do paiz, mas filha de actos de vontade dos srs. ministros. Os governos não devem abusar do logar que occupam, devem respeitar os principios constitucionaes e de direito publico, e regular-se por elles, é não introduzir jamais no regimen representativo a negação d'esses principios nos actos mais solemnes de um povo livre = as eleições =. Os governos devem fazer eleições com o seu partido, e não pelas auctoridades, cuja missão é manter n'esse caso a ordem e a liberdade da uma; se tem o apoio do partido mais forte, mais poderoso da nação, elle se apresentará cem maioria nas camaras; se pelo contrario elle é fraco e impotente e não tem a adhesão do paiz, elle não póde nem deve constituir governo, e o governo n'esse caso que abusa da força para se sustentar é réu de lesa-sociedade.

Sr. presidente, continuando nas suas observações o sr. ministro da fazenda declarou aqui que o programma de s. ex.ª era o programma do governo. N'este caso dirijo-me ao sr. conde d'Avila, como presidente do conselho, e pergunto a s. ex.ª se está resolvido a acabar com o conselho ultramarino, com o conselho das obras publicas, com o conselho do instrucção publica, com o tribunal de contas, e a fazer muitas outras reformas exaradas n'aquelle programma. A camara e o paiz carece de uma declaração categorica de s. ex.ª, porque deseja saber para onde nos leva, já que não podemos descobrir claramente d'onde vem.

E certo que o sr. ministro da fazenda apresentou o seu programma, e que o sr. presidente do conselho ficou surprehendido quando teve conhecimento d'elle, e que o reprovara então; espero portanto que s. ex.ª nos declare se hoje mais compenetrado d'aquellas doutrinas reformadoras, d'aquelles principios economicos os aceita,.o restituída a homogeneidade e harmonia ao ministerio, toma como programma governativo o do sr. ministro da fazenda, que elle disse hontem ser o programma do governo. Se o governo está n'essa resolução estima-lo-hei muito, porque assim se dissolverão certos elementos heterogéneos que existem entre o gabinete, e havendo mais unidade de pensamento, de vistas e do intuitos, poderá have-la tambem de acção, do actividade e de energia.

Sr. presidente, o illustre ministro da fazenda dirigindo-se a mim, na continuação do seu discurso, disse que não sabia com que direito eu vinha pedir reformas economicas, tendo apoiado um gabinete que as não tinha feito. Pedi-as com o direito com que as tenho pedido sempre, em nome das crenças e dos principios que constantemente tenho seguido.

Desde que tomei assento na camara dos senhores deputados, d'onde passei para está, pedi-o com o direito de um homem coherente em toda a sua vida publica, pedi-o com direito de quem sabe corajosamente combater os inimigos, assim como não lisonjeio os amigos nos seus dias de prosperidade; pedi-o com direito de quem conhece o seu dever, o tem o desvanecimento de, em todas as circumstancias, expor com lealdade e franqueza as suas opiniões. Eu em geral votei sempre, contra qualquer argumento de despezas, as minhas doutrinas e as minhas votações estão ahi bom registadas, e os meus discursos nas ultimas sessões da camara dissolvida provam claramente e de sobejo a exactidão e justeza das minhas asserções; pedia 'também então economias e reformas, e disse sem rebuço a verdade aos homens que estavam no poder, e que apoiei verdadeiramente do coração n'aquelles pontos em que entendi que devia apoiar, e não nos que julguei contrarios ás minhas idéas. Oxalá que elles tivessem seguido os meus conselhos, o attendessem as minhas apprehensões e presentimentos, que provavelmente occupariam ainda aquellas cadeiras. Infelizmente fui propheta. Votei sempre segundo as minhas convicções e a minha consciencia.

Chamo a attenção da camara sobre o objecto que vou tratar, e no qual pretendo, não digo desmentir s. ex.ª, porque a phrase soar-lhe-ia mal, mas mostrar que foi pouco feliz na justificação que deu inexacta e que não o absolve das suas contradicções.

Quando eu na ultima sessão me referi aos factos da vida publica de s. ex.ª, factos que estou no meu direito de avaliar, não para mostrar que s. ex.ª é digno ou indigno de se sentar n'aquellas cadeiras, mas para tirar dellas inducções e bases para reconhecer o grau de credito e confiança que s. ex.ª pôde merecer ao publico, o valor e estimação que podemos dar ás suas palavras e asseverações, contei o que se tinha passado em Coimbra.

Disse s. ex.ª que era inexacta a minha narração, repito hoje de novo o que disse, confirmo o que asseverei, e provoco o sr. ministro a negar os factos que foram do dominio do publico, e que fizeram recaír sobre s. ex.ª grande desfavor. Nega, ou pôde negar s. ex.ª que quando se reuniu a commissão do partido historico e regenerador, s. ex.ª tratava comnosco e fazia-nos propostas sobre candidaturas, e ao mesmo tempo dirigia-se ao sr. Julio Gomes da Silva. Sanches, se já não tinha feito com elle um pacto, e regulavam de commum accordo as candidaturas? Nega s. ex.ª que tomou uma grande parte nas eleições contra a fusão que tinha elogiado? Não preciso trazer documentos authenticos a este respeito, basta apenas dizer que os factos posteriores mostraram cabalmente á evidencia o que era e o que valia o sr. José Dias que soube ser proposto pelo governo e conseguiu conjunctamente o apoio da fusão, sendo eleito por unanimidade.

Eu, sr. presidente, não traria para aqui factos nem documentos particulares. Não os devia trazer ainda que estivesse auctorisado para isso, nem mesmo carecia d'elles porque os factos se encarregaram de me justificar; mas se acaso houvesse duvidas sobre o que eu disso, deixaria que o publico, que conhece bem os precedentes de nós ambos, e que conhece perfeitamente a nossa vida respectiva, decidisse entre a minha affirmativa e a negativa do sr. ministro. Mas deixemos o sr. José Dias com o seu passado, e continuemos nas apreciações que offerece o projecto em discussão.

Sr. presidente, o sr. visconde de Chancelleiros, meu collega e amigo, quando estabeleceu as verdadeiras doutrinas, e mostrou o que foi a dictadura e o que devia ser, confirmou-me no juizo que fiz ácerca dos srs. ministros e da sua comparação.

N'essa occasião referiu-se ao sr. ministro da marinha, e confirmou mais ainda o que eu pensava a respeito de s. ex.ª, e por isso lamento novamente o ver o nobre ministro sentado n'aquellas cadeiras; porque, ainda que eu não conheço pessoalmente s. ex.ª, tenho comtudo ouvido fallar com louvor na sua passada carreira, na sua muita intelligencia, actividade o energia; o consta-me que acha resistencia nos seus collegas, e serios desgostos por não poder satisfazer condignamente á missão que tomou sobre seus hombros, e fazer brilhar a sua fecunda iniciativa.

O nobre ministro não tem podido fazer o que desejava, o que as circumstancias pediam, e o que o paiz clama em altos brados; as peias que lhe têem lançado os seus collegas são mais robustas e fortes do que os deveres que lhe tinha creado um passado glorioso.

Não sei se é verdade, mas o que corre no publico é que s. ex.ª, o sr. ministro da marinha, tem tido muitos desgostos, porque as suas medidas não têem tido a approvação dos seus collegas, procurando por essas medidas talvez satisfazer as exigencias do paiz.

O sr. Ministro da Marinha (Rodrigues do Amaral): — Se V. ex.ª me dá licença, sr. presidente, eu desejo simplesmente declarar que não posso continuar a ouvir estas affirmativas que está fazendo o digno par, porque entendo que ellas offendem a minha dignidade. Declaro que tem havido sempre harmonia entre mim e os meus collegas, e que se eu pretendesse propor algumas medidas de cuja conveniencia e opportunidade estivesse convencido, e se os meus collegas se oppozessem a isso, eu sabia perfeitamente o caminho que devia seguir, que era pedir a minha demissão, e nunca me deixaria levar pelo sentimento da conservação no ministerio, abdicando as minhas convicções.

O Orador: — Sr. presidente, vejo pela declaração do sr. ministro da marinha que as proposições que avançou o sr. visconde de Chancelleiros eram exactissimas; peço portanto desculpa a s. ex.ª de me ter Aludido com o seu passado, e de me convencer que, ministro da revolução, lhe satisfaria as aspirações. Revolução que houve só depois que o sr. conde de Avila formou o gabinete; então trepudiava ufana e orgulhosa n'aquellas cadeiras, emquanto a anarchia desvairada e escandalosa o fazia nas praças. Este estado de cousas, esta exaltação fomentada das altas regiões que os ministros occupavam, parecia, ou acreditavam pelo menos elles, que lho dava força, o portanto promoviam essa excitação contra os seus adversarios, que por uma mal entendida abnegação tinham abandonado o posto de honra que lhes tinha sido confiado; mas quando essa agitação e effervescencia tinha tomado outro rumo, ella até ali rasoavel, justa e justificada, tornava-se inadmissivel, miseravel e criminosa. Então acutilava-se o povo, invadia-se o asylo do cidadão, e prendiam-se os agitadores, esquecendo o sr. ministro da fazenda os seus velhos e antigos camaradas. Lembra-me a este respeito o exemplo de um cidadão grego que aconselhava o communismo como o regimen mais apropriado para a republica a que elle pertencia, e para levar a effeito esta nova instituição, dizia elle que era necessario primeiro queimar todos os papeis de dividas publicas e particulares; e exclamava em seguida com grande enthusiasmo que nunca tinha visto um fogo tão brilhante e de cores tão vivas. A mesma admiração e o mesmo enthusiasmo que tinha aquelle illustre patriota pelo brilho d'aquelle fogo e pela viveza d'aquellas cores, tem tambem hoje o sr. ministro da fazenda pelas cutiladas no povo e pelas prisões dos seus velhos amigos e companheiros!

Terminaria aqui o meu humilde discurso com estas observações ao sr. ministro da fazenda se não tivesse que responder ainda ao sr. presidente do conselho, o que farei o mais succintamente para não fatigar a camara.

O sr. conde d'Avila offendeu-se por eu dizer que s. ex.ª era um delegado do governo em Madrid; s. ex.ª perguntou se era algum official de diligencias! Não parece rasoavel a susceptibilidade de s. ex.ª, e muito menos motivo para se escandalisar. Pois o que era em Madrid s. ex.ª senão um delegado do governo, e um delegado de confiança? Não

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executava s. ex.ª ali as ordens do governo? Não pedia e não recebia instrucções d'elle? Que representava ali então s. ex.ª? Fazia politica por sua conta e risco ou cumpria as ordens que lhe davam? Provavelmente era s. ex.ª que dava ordens.

Diz s. ex.ª tambem que = fez sacrificio enorme em aceitar aquelle cargo, e que está sempre prompto a faze-los para prestar serviços ao seu paiz =; por esta maneira de fallar eu julguei que s. ex.ª quando prestava serviços ao seu paiz era gratuitamente, mas não é; é generosamente remunerado, mas apesar d'isso o sr. conde d'Avila é tão modesto que ainda julga sacrificio. O nobre presidente do conselho é o homem dos sacrificios, sacrificios por tudo. Que grande, que enorme não foi o sacrificio, e que serviço tão relevante não recebeu o paiz quando s. ex.ª foi agraciado com a gran-cruz da Torre e Espada. Este immenso sacrificio fe-lo naturalmente para tirar os escrupulos e deferencias do governo que não queria talvez que o seu representante em Madrid deixasse de ter aquella distincção, visto haver na legação em Madrid um addido com um grau d'aquella ordem superior ao que então tinha s. ex.ª; fez s. ex.ª muito bem em condescender. Embora o sacrificio fosse grande, a generosidade de s. ex.ª para com o ministerio d'aquelle tempo é louvavel, pois a fineza quem a recebia era o ministro que dava e não aquelle que aceitava a graça!

Disse tambem o sr. presidente do conselho que = o sr. visconde de Seabra não tinha de que se demittir porque não vencia ordenado como reitor da universidade =. Se o sr. ministro das obras publicas se não tivesse demittido dos seus cargos, vencia porventura agora os ordenados por esses cargos? Parece-me que não. Por consequencia o que eu quiz fazer bem patente, e note a camara, foi que o sr. ministro das obras publicas deu um exemplo de moralidade e uma lição severa aos seus collegas, ensinando-lhes o caminho desassombrado a seguir, e a sacrificar esses interesses pessoaes e mesquinhos, cuja conservação na actualidade ataca a dignidade e respeitabilidade d'aquelles que os guardam.

O sr. ministra das obras publicas tomou conta da pasta que lhe foi confiada demittindo-se de todos os empregos que tinha. S. ex.ª não conservou emprego ou commissão alguma, de fórma que, largando o logar de ministro, fica completamente destituido do seu ordenado e interesses; mas a sua consciencia fica pura o elevada; não succede porém outro tanto com os seus collegas, que conservam os logares que podem, o commissões que nunca reunem, e que na verdade não sei para que sirvam. O ministro das reformas e das economias porque não começa por si, e porque não se demitte, e não dissolve commissões que não se reunem, e que apenas servem para s. ex.ª estar em Lisboa?

O sr. presidente do conselho disse ainda que eu tinha vindo aqui trazer inexactidões que eram da minha lavra. Não sei que inexactidões fossem essas. Eu(disse que o sr. conde d'Avila tinha approvado a reforma dos estrangeiros, e que a sua correspondencia assegurava que a reforma de administração civil e lei do consumo tinham sido bem recebidas e elogiadas em Hespanha. Não sei se isto é inexacto, mas se s. ex.ª declara não ser assim, eu peço desde já, e faço um requerimento, para que toda a correspondencia trocada entre o sr. conde d'Avila e o sr. Casal Ribeiro, que não seja reservada, seja remettida com brevidade a esta camara. E então ver-se-ha se é exacto ou não o que eu digo. Se não é exacto, não resulta d'isso desfavor algum a s. ex.ª, assim como não o resulta sendo-o. O favor e o desfavor que recáe sobre o sr. conde d'Avila provém-lhe dos seus actos. O que não julgo muito airoso é haver um homem do idéas oppostas ao governo, exercendo um logar de confiança do mesmo governo, em vez do pedir a sua demissão, e de vir pugnar pelas suas idéas, combater o governo, e sustentar as representações que fazia o paiz n'aquella occasião. E pouco me importava que pedisse a demissão brutal ou delicadamente, o seu dever era pedi-la.

Agora sobre este ponto é que eu chamo a attenção da camara. O sr. presidente do conselho, continuando a responder-me disse: «O que o digno par queria, era que eu resolvesse a questão de fazenda, para me fazer guerra, e depois os meus adversarios aproveitarem-se do que eu tinha feito». Não importa que o paiz soffra, e que os povos sejam esmagados com impostos, o que importa é que os adversarios de s. ex.ª não possam tirar utilidade do que elle fez, e basta que s. ex.ª se utilise do que os ministros anteriores fizeram, tirando vantagens das leis relativas a finanças. De fórma que o sr. conde d'Avila, tendo na sua mão resolver a questão de fazenda, preferiu o mal do seu paiz, a poderem os adversarios utilisar-se dos seus estudos, locubrações e serviços.

Diz ainda o sr. presidente do conselho que eu vim aqui injuriar o ministerio com as minhas verrinas. Se é injuriar o dizer que s. ex.ª foi retrogrado, que foi conservador e collega do sr. conde de Thomar, que depois fez parte de outro ministerio mais avançado, e em seguida parto de todos os ministerios em que pôde entrar; se é injuriar dizer que, sendo s. ex.ª de idéas inteiramente oppostas ao ministerio transacto, não devia ter aceitado áquelle cargo para depois guerrear os ministros decaídos a todo o transe; se -é injuriar o admirar os nobres actos praticados pelo sr. ministro das obras publicas, e fazer o parallelo com os dos seus collegas; se é injuriar apresentar as contradicções do sr. ministro da fazenda, que dizia hoje uma cousa na camara dos senhores deputados e em seguida calcava aos pés tudo que havia dito; se é injuriar fazer narração exacta e singela dos actos da vida publica do sr. ministro da fazenda, de fórma que o paiz avalie a sua procedencia, as suas doutrinas e as suas acções; se é injuriar notar os despachos inconvenientes do sr. ministro da justiça, sem se attender nem ao merito nem ás habilitações nem aos serviços; se é injuriar o mostrar todas estas incoherencias para o paiz saber o que tem a esperar dos actuaes srs. ministros, confesso que injuriei o governo.

Sr. presidente, se injuriar é combater a dictadura, mostrando que o ministerio actual não devia revogar aquellas medidas desde o momento em que pôde apresentar-se perante um parlamento, e que lhe dava grande maioria, confesso ainda que injuriei o governo.

Sr. presidente, se durante esta discussão eu pronunciei alguma palavra ou phrase menos parlamentar, não era minha intenção faze-lo, e por homenagem á camara não tenho duvida em a retirar, porque o meu fim é tão sómente expor, como devo, com toda a lealdade, as minhas opiniões perante a camara e o paiz.

Sr. presidente, concluirei dizendo, que as apprehensões do sr. Visconde de Chancelleiros, sem duvida exageradas, depois das declarações do sr. presidente de ministros, não podem ter rasão de ser, porque nada ha a receiar logo que o sr. conde d'Avila declarou que o paiz está socegado. Nem podia deixar de ser assim! S. ex.ª, lido como é na historia da antiguidade, foi ahi buscar lição para se dirigir nas difficeis circumstancias em que nos achámos. Similhante a Pyrrho, que ao ver as legiões romanas assolar todo o universo e levar o imperio a todas as partes do mundo, só pôde obstar a essa terrivel e calamitosa invasão, rodeando-se de sessenta elephantes, que auxiliaram vigorosamente o seu exercito por tal fórma, que as armas romanas soffreram pela vez primeira um revés: tal o sr. presidente do conselho, aguardada a proporção entre as aguerridas legiões romanas e as desordenadas phalanges populares, encontrou tambem um elephante e pô-lo ao peito. E bastou que lh'o vissem para que os tumultos populares serenassem e o paiz repousasse fascinado por áquelle talisman.

Este grande sacrificio do nobre conde d'Avila, as contradicções flagrantes do illustre ministro da fazenda, a profusão de graças o despachos do sr. ministro da justiça, os actos dictatoriaes sanccionados, o poder de quantos elephantes existem, e podem existir, tudo isto é pouco, é nada, para pôr dique á torrente das idéas e á manifestação da verdade.

(Os srs. Marquez de Niza e Moraes Carvalho pediram a palavra.)

O dr. Presidente do Conselho de Ministros (Conde d'Avila): — Sr. presidente, pedi a palavra sobre a ordem unicamente para dar algumas explicações á camara sobre alguns factos que referiram os dignos pares, os srs. visconde de Chancelleiros e Vaz Preto, os quaes são completamente inexactos.

Não é verdade, sr. presidente, que eu tivesse vindo de Madrid de proposito para approvar a lei da reforma da secretaria dos estrangeiros, como affirmou o sr. visconde de Chancelleiros.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Eu não disse que s. ex.ª veiu de proposito de Madrid para votar a lei da reforma da secretaria dos estrangeiros, mas sim que tinha votado essa lei.

O Orador: — Aceito a explicação do digno par, mas não foi assim que s. ex.ª se exprimiu. O sr. Casal Ribeiro fez-me a honra de me dizer que tencionava mostrar-me a reforma da secretaria dos estrangeiros antes de a apresentar ao parlamento, e de certo tinha essa intenção, porque as nossas relações eram então muito cordiaes, o sinto muito que o não tivessem continuado a ser; mas a culpa não é minha, não cheguei porém a ver esse projecto; mas achando-me no reino quando esta camara se occupava d'elle, dei-lhe o meu voto, não o nego.

Fallou tambem o sr. Manuel Vaz em ter eu recebido a gran-cruz da Torre e Espada, e pareceu ter tido em vista mostrar que eu a havia solicitado. Appello para o testemunho do sr. Casal Ribeiro, então ministro dos negocios estrangeiros debaixo das ordens de quem servi, a fim de declarar se eu por qualquer meio, directa ou indirectamente, fiz sentir o desejo de possuir aquella tão subida distincção.

O sr. Vaz Preto: — Eu não disse isso.

O Orador: — O digno par o que mostrou em todo o seu discurso foi que o seu fim era unicamente aggredir o presidente do conselho.

Uma voz: — E a todos.

O Orador: — Mas especialmente a tres dos ministros, fazendo excepções e parallelos que me abstenho de qualificar.

O digno par deu a entender que eu tinha solicitado aquella condecoração, quando fui inteiramente estranho á sua concessão. Eu caí das nuvens quando o digno par o sr. Casal Ribeiro, então fazendo parte do ministerio, me fez a honra de se dirigir a minha casa, e me apresentou a carta de uma augusta personagem em que se me annunciava a merco de que se trata. Não esperava, nem por certo merecia tamanha honra. Não digo isto por modestia, porque tenho a fortuna de me conhecer.

Havia ainda um outro facto a que tinha de referir-me e de que me não recordo, porque não tirei apontamento algum.

(Interrupção do sr. Vaz Preto que se não ouviu.)

É verdade; é a respeito da noticia que enviei de Madrid para Lisboa, segundo diz o digno par. Disse s. ex.ª que eu tinha escripto para Lisboa, quando me achava na capital do reino vizinho, dizendo que havia sido ali muito bem recebida a noticia de terem sido approvados aqui os projectos de lei do imposto do consumo e da reforma administrativa. Se o disse, como o digno par affirma, é verdade; porém eu, não tenho idéa de ter escripto similhante cousa. No entanto, o digno par o sr. Casal Ribeiro, que se acha presente, tem a minha correspondencia particular, e pôde ter a correspondencia official quando deseje, e talvez s. ex.ª se lembre do que lhe escrevi a este respeito. Mas ainda que

eu tivesse escripto a noticia a que se referiu o digno par, o sr. Vaz Preto, não sei a que proposito vinha isso para a sua argumentação.

Por agora não tenho mais nada a dizer. Agradeço á camara a condescendencia que teve em me ouvir e reservo-me para responder mais tarde aos discursos dos dois dignos pares, que me obrigaram a dar agora estas explicações á camara.

(O orador não reviu a nota d'estas explicações.)

O sr. Casal Ribeiro: — Pedi a palavra sobre a ordem, e não tenho moção alguma a apresentar. A camara me desculpará este artificio, reflectindo que o illustre presidente do conselho appellou para o meu testemunho, sobre alguns pontos a que se referiu, e embora o meu testemunho não seja necessario, porque ninguem duvidaria das affirmativas de s. ex.ª em materia de factos que lhe dizem respeito, não posso eu parecer que me recuso ou deixo de apressar-me a dizer o que sei a tal respeito.

S. ex.ª referiu-se a tres pontos: o primeiro diz respeito á gran-cruz da Torre e Espada que lhe foi dada em 1866. Sobre isto direi á camara que esse acto foi uma graça que partiu da munificencia do soberano, o não houve da parte do nobre ministro a menor solicitação; e direi mais: foi-lhe conferida com muita satisfação por parte do governo que a propoz, e com o convencimento de que ella era um condigno galardão do merito e dos serviços prestados por s. ex."-

Quanto ao segundo ponto, que é sobre o juizo que s. ex.ª podesse formar sobre o imposto do consumo e reforma administrativa, direi que não me recordo que o nobre ministro, official ou particularmente, me escrevesse de Madrid a tal respeito; e mesmo s. ex.ª não se achava em Madrid, mas sim em París, quando foram approvadas aquellas medidas. Emquanto eu tive a honra de me sentar n'aquellas cadeiras, nunca tive motivo para acreditar que a politica do governo do que eu fazia parte deixasse de merecer a approvação do actual nobre presidente do conselho; porém não me recordo do que s. ex.ª manifestasse por qualquer maneira na sua correspondencia a sua opinião especial sobre as leis de imposto e administração.

Quando eu tive a honra de apresentar ao parlamento o projecto de reforma do ministerio dos negocios estrangeiros já se achava, se bem me lembro, o nobre ministro no paiz; mas a vinda de s. ex.ª não teve por motivo essa reforma. Eu deixei plenamente, e como era natural, á livre apreciação do s. ex.ª o vir ou não vir tomar o seu logar n'esta casa, na sessão de 1867.

O illustre ministro preferiu vir, e effectivamente veiu, para Lisboa assistir ás discussões da camara. Da outra casa do parlamento veiu depois o projecto por mim ali apresentado, e a que acabo de referir-me; o illustre ministro, depois de unia apreciação sisuda, como s. ex.ª costuma sempre fazer a respeito de todos os negocios publicos, aceitou essa medida, e deu-lhe o seu voto de certo, porque não a encontrou prejudicial aos interesses do paiz.

São estas as declarações que tenho a fazer sobre este assumpto; não as fiz porém por as julgar necessarias, mas por que me pareceu do meu dever faze-las quando o meu nome era invocado pelo sr. presidente do conselho.

O sr. Vaz Preto (sobre a ordem): - Parece-me inutil esta discussão; mas direi sempre duas palavras sómente para explicar o rectificar as minhas expressões, que parece não terem sido entendidas; fallando dos sacrificios do sr. conde d'Avila, disse que s. ex.ª tinha solicitado aquella insignia. Disse que era mais um sacrificio de s. ex.ª, e que o governo, naturalmente, tivera escrupulo em que s. ex.ª, o sr. conde d'Avila, fosse como nosso representante para a corte de Madrid, havendo na legação um addido com grau superior ao que s. ex.ª tinha antes de obter a gran-cruz.

Ora, emquanto á questão sobre que eu podia que viesse a esta camara toda a correspondencia que não fosse reservada, não vale a pena insistir, fazendo effectivo o requerimento que cheguei a annunciar.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. visconde de Fonte Arcada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu desejava que V. ex.ª me dissesse quanto falta para dar a hora.

Vozes: — Estão mais oradores inscriptos.

O sr. Presidente: - V. ex.ª póde fallar, porque, se não acabar o seu discurso, fica com a palavra reservada para continuar na sessão seguinte.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Ouço dizer que está quasi a dar a hora, e n'esse caso não valerá a pena.

Uma voz: — São pouco mais de quatro e meia.

O sr. Presidente: - Se V. ex.ª não quer fazer uso da palavra, então seguir-se-ha o orador que está immediatamente inscripto.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu não renunciei da palavra. Se V. ex.ª quer que eu falle...

O sr. Presidente: — Eu não tenho empenho nenhum. Quem se segue é o sr. visconde de Chancelleiros.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Eu não me atrevo a usar da palavra, porque já fallei por mais de meia hora, e esperava ouvir primeiro os srs. ministros, que, aliás me não consta" que se inscrevessem. Entretanto o que me parece é que ss. ex.ªs comprehenderam talvez melhor do que eu a verdadeira conveniencia que pôde haver d'este debate, que parece vir a ser, o deixar para melhor occasião o responder ao que se tem dito, porque essa occasião não virá longe, quando se apresentem as novas medidas que hão de ser submettidas ao nosso exame e consideração. Então é provavel que ss. ex.ªs se occupem ainda de algumas observações que ultimamente aqui se fizeram, e eu pela minha parte terei tambem occasião de responder. Por isso se não fosse o ter eu já fallado, e estarem inscriptos outros meus collegas que ainda não fallaram, eu pediria para um requerimento, attendendo á circumstancia que notei, de

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que o objecto de que trata o projecto de lei em discussão são factos consummados, e, qualquer que seja a votação, o resultado é sempre o mesmo, porque não tem significação politica (apoiados).

N'estes termos creio que a camara desejaria mais encerrar o debate (muitos apoiados).

Então se V. ex.ª me dá licença, á vista da demonstração da camara, requeiro que se julgue a materia discutida (apoiados repetidos).

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara.

Deu-se por discutida a materia.

O sr. Conde de Samodães: — Peço a palavra para uma explicação.

O sr. Presiãente: — Depois da votação é que têem logar as explicações.

O sr. Conde de Samodães: — Muito bem.

(Os srs. ministros retiraram-se da sala.)

O sr. Presidente: — Na conformidade da pratica seguida, a votação parece que devia ter logar por artigos; presumo porém que a materia não o comporta, podendo por consequencia haver uma só votação (apoiados). Se não ha reclamação alguma contra esta maneira de propor, vou pôr á votação o parecer com o projecto de lei.

Posto o projecto á votação, foi approvado.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã será a segunda parte da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram perto de cinco horas.

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