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100 DIARIO DA CAMARAA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Estas mesmas circumstancias tornam bem dura a posição de quem, para cumprir com os seus deveres, tem de abafar os sentimentos do seu coração.

Estou certo de que ss. exas. me fazem a devida justiça e que as minhas considerações e opposição deixarão ficar inalteraveis as nossas relações.

Dadas estas singelas explicações, de que peco desculpa á camara, começarei por fazer uma narração retrospectiva dos factos politicos que têem occorrido, por isso que d'elles resulta uma gravissima responsabilidade para quem assumiu o poder em consequencia d'estes mesmos factos, porque pela apreciação d'estes factos, e das consequencias que elles envolvem, é que nós temos de apreciar os actos do governo em relação á tarefa que assumiram e aos compromissos tacitos que fizeram com a nação pelas circumstancias em que os governos caídos deixaram o poder.

Sr. presidente, v. exa. e a camara lembrar-se-hão de que, apesar das ligações politicas, muito cordiaes e sinceras, que tinha com o ministerio da fusão, que me regosijo de ter apoiado, e que apesar da parte activa que tomei na fusão, posto que como soldado d'aquella união politica, não renego a responsabilidade de tal acto, e ainda hoje tenho a convicção de que concorri para uma ligação muito conveniente para o meu paiz, porque d'ahi se poderiam tirar importantes resultados, como se tiraram, e consequencias que ainda hoje são proficuas, se d'ellas soubermos tirar todos os beneficios politicos, sendo um d'elles, e não pouco importante, acabar-se a opposição pessoal que por tanto tempo prejudicou a causa publica.

V. exa. e a camara, repito, hão de lembrar-se de que, apesar d'essas ligações politicas, eu, quando vi que as medidas que o segundo ministerio da fusão tinha apresentado á camara não eram convenientes á boa administração publica, e que tinham não só graves defeitos fundamentaes, mas muito principalmente graves defeitos de occasião, eu as vim combater.

Infelizmente, sr. presidente, as minhas palavras que n'essa occasião não foram attendidas na camara foram quasi prophecias, porque eu e o sr. conde de Samodães, que commigo combateu as mesmas medidas, prophetisámos, apesar do dictado que diz ninguem ser propheta na sua terra.

Disse então que aquellas medidas se não podiam executar, e injustos eram os governamentaes que diziam que a opposição creava dificuldades; as difficuldades não provinham da opposição, mas sim da multiplicidade de interesses com que se ia arcar, interesses respeitaveis alguns, e outros filhos, sim, de prejuizos e más apreciações, mas dignos de attenção pela dificuldade que iam levantar contra o fim principal, que era o imposto.

Devia se procurar que o paiz encarasse com animo pacifico e socegadamente os grandes sacrificios que se lhe íam impor; não era portanto a opposição parlamentar que tinha culpa de se não executarem as medidas, havia de ser o paiz que não estava nas circumstancias de as aceitar.

Ainda assim, sr. presidente, louvores merecem os homens que estavam no governo, que foram os primeiros a faltar claro ao paiz, mostrando-lhe a necessidade de pagar os seus encargos, e pela tenacidade com que defenderam esta idéa á custa mesmo da sua popularidade. Louvores ainda merecem pela maneira por que obedeciam aos dictames de parlamento legitimamente constituido, e pela execução que davam ás leis que tinham sido votadas pelo parlamento depois da maxima discussão e de maduro exame dos corpos a quem competia faze-lo.

Errar é proprio do homem; é forçoso confessar esta triste condição da nossa natureza; não é porém isso um defeito que traga incompatibilidade politica; defeito e ser pertinaz no erro, e esse defeito não pede ser lançado ao rosto dos homens que então tinham o poder, pois que o largaram com grande abnegação.

O governo, a quem tantas censuras foram feitas por largar o poder, praticou uma acção digna da maior consideração publica, abandonou a governação do estado logo que viu a inopportunidade de executar fielmente a missão de que o tinham encarregado, logo que viu que lhe faltavam todos os elementos para poder caminhar com desassombro e harmonisar o sentimento geral do paiz com a confiança do parlamento. Elogios pois se devem fazer, e nunca censuras por largar o poder com abnegação, muito principalmente por se não querer fazer pressão em nenhum dos elementos constitutivos do governo, largando-o á menor indicação de feita de confiança de qualquer d'esses elementos, qualquer que seja, porque todos são igualmente respeitaveis; assim não se falseiam as instituições, antes pelo contrario se robustecem.

Direi que a queda desse governo não trouxe graves difficuldades, porque a sua queda tirava os pretextos para a perturbação da ordem e trazia o ensejo de se modificarem as medidas contra as quaes se agitava o paiz; não são os homens que caem que trazem difficuldades para o paiz; elles deixam-nas, e aos homens que lhes succedem no poder, cumpre reconhecer se podem arcar com ellas senão não aceitem o poder em taes circumstancias, porque da não aceitação não lhes provem responsabilidade.

Foi substituido aquelle governo por outro a que presidia o digno par conde d'Avila. Na ausencia de s. exa. não posso nem devo fazer apreciações completas dos actos do seu governo, que, posto tivesse homens por todos os titulos respeitaveis, infelizmente foi presidido por s. exa. o menos competente para dirigir a situação precaria em que o paiz se achava. Era possivel que esse governo inspirasse confiança a uma revolução (se tal nome lhe compete, e que eu duvido empregar, posto que a veja sanccionada por toda a imprensa), a uma agitação, direi, contra medidas que s. exa. tinha votado, e contra um governo que s. exa. não só tinha apoiado, mas que tinha servido como empregado de confiança?

S. exa. que partilhava da impopularidade do ministerio caído compromettia a situação e os seus collegas. A prova do que eu digo está em que a agitação do paiz foi mais forte logo que s. exa. subiu ao poder, até ali apenas existia no paiz um mal-estar geral que se manifestou com o estabelecimento das novas medidas que elle julgava prejudicar os seus interesses e atacar os seus foros. Essa agitação foi pacifica e legal, e não se excedeu em parte alguma, senão no momento em que o governo não teve força para separar os patriotas dos anarchistas e fazer cumprir a lei. É por isso que eu digo-os homens que sobem ao poder devem primeiro ver se têem forças para desempenharem as funcções de que se encarregam. Esta situação pois, fraca como era, achou-se immediatamente em circumstancias de conhecer que não tinha elementos para poder governar, e a parte moderada do paiz, a parte conservadora, aquella que mais desejos tem de que exista a ordem, vendo que o governo tinha abandonado as suas tradições para se entregar ás massas revolucionarias, deixou de confiar n'elle: e nem por isso obtinha s. exa. a confiança que procurava nos homens da revolução que principiavam a mostrar não ter confiança no homem que tinha seguido sempre a estrada viciosa e condemnada das emissões de fundos sem crear verba destinada para pagar os juros d'essas emissões; systema pessimo de administração, por mim aqui sempre condemnado. Debalde procurava o ministro da fazenda d'esse ministerio, o sr. José Dias Ferreira, crear receita e organisar a fazenda, a influencia que o ministro do reino queria ter na situação tirava a popularidade ao governo e sem ella a reforma não podia marchar.

Mas a maior das desgraças foi que este, ministerio, julgando que podia obter a força de que necessitava, pelos meios de que costumam lançar mão os governos que não querem largar o poder, falsificando ou antes falseando a representação nacional, influindo o mais directamente possivel em todas as eleições, procurou arranjar uma maioria que o sustentasse e lhe désse força; tal foi porem a lição