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110 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES NO REINO

cio da liberdade em todas as suas manifestações, um longo periodo de tranquillidade affirmára a confiança nas instituições, e uma folha das mais lidas e conceituadas na Europa, a Independencia belga, citava este pequeno reino como um modelo de sisudeza e de aptidão constitucional. Os progressos acompanharam em todas as espheras do seu desenvolvimento esta epocha de prosperidade relativa, e a era das revoluções parecia encerrada para sempre. Esta pagina de tanto proveito e de tanta honra para o paiz, cubriu-se de repente de uma beta negra, e uma agitação afflictiva, seguida de dolorosas apprehensões e sobresaltos substituiu os dias de paz e de acção regular e fecunda. Foi necessaria ou inutil, esteril ou vantajosa essa agitação?

Quando se liquidarem os encargos legados por ella o futuro o dirá. Hoje é cedo ainda para a opinião desapaixonada a sentenciar.

Mas o que de certo póde asseverar-se é que Portugal, o paiz pequeno e exemplar, que dentro de seus estreitos limites fazia a inveja de outras potencias, e que a imprensa liberal apontava como digno da sua autonomia, esqueceu em poucos mezes algumas das grandes qualidades que mais o recommendavam, um dos titulos mais nobres que podia invocar no conselho das nações. Esperemos que o impeto momentaneo acalme, e que esta pouco feliz, mas rapida transição, signifique apenas um curto parenthesis aberto na sua historia constitucional. Cuidemos do presente para segurarmos o porvir; e não olvidemos que os povoa pequenos se conservam pela madureza e sabedoria de suas resoluções (apoiados}.

No horisonte os pontos negros de hontem são hoje nuvens densas e escuras já em muitas partes; o trovão soa ao longe, e a tempestade póde desfechar de um momento para outro sobre a Europa... Velemos por nós, advertidos. A falsa confiança é o maior dos perigos.

O amor e a pratica das instituições são o escudo mais forte dos povos livres. As formulas constitucionaes não são vãos preceitos, nem se costumam os subditos impunemente a vê-las infringidas. Observadas nos conselhos da corôa, nos comicios populares, e em todos os actos da vida publica, hão de conquistar á bandeira nacional de 1834, alçada pelo Imperador, a força e o prestigio indispensaveis para tremular respeitada sobre a cupula do edificio laboriosamente construido pela geração dos fortes, e cimentado com tanto sangue portuguez.

Rogo á camara que, tomando em consideração tudo isto, lance os olhos sobre os factos passados, e aprecie o que occorreu nos ultimos mezes e o que está occorrendo, e compare os successos de hontem com os de hoje, e queira notar se o que está consignado nos decretos, de que nos occupâmos, e que o parecer diz que hão de continuar em vigor emquanto não forem revistos, encerra um attentado inexplavel; ou se, relevado o excesso da sua origem, será mais prudente absolve-lo e aceitar o facto consummado.

Não condemno em absoluto as dictaduras, mas inspiram-me sempre repugnancias. Filhas da necessidade muitas veses só ella e os resultados as podem justificar. As dictaduras não se inventam nem se forjam a capricho, surgem armadas e poderosas do seio dos acontecimentos. O que foi a de 1834? A organisação moderna e liberal tirada do canos da luta. A de 1836? A expressão da soberania nacional contra a suspeita de uma restauração do passado. A de 1801? Um protesto da opinião maguada e impaciente. Nem todas as epochas admittem dictadura, e nem todas as estaturas são talhadas para a obra titanica, cujas responsabilidades resumem. Era indeclinavel em 1868 uma dictadura mesmo parcial inaugurada a pretexto de realisar o pensamento das economias? Por mim entendo que não. Acho o remedio peior do que a enfermidade, a abdicação dos poderes legaes muito mais grave do que o risco de um ou dois mezes de demora. Convocando as côrtes dentro de trinta dias o governo evitaria a usurpação, se quizesse evita-la, e teria feito bem. Appellára para o paiz, devia esperar pelos seus representantes, e ouvi-los. Ferir direitos, demolir instituições, atropellar principios são actos sempre de perigoso exemplo e arriscada justificação. Catilina não batia ás portas de Roma, e se bateu depois a...a culpa foi da dictadura que poz a revolução no governo.

Trilhâmos uma nova estrada! Permitta Deus que ella nos leve aonde queremos e precisamos ir. Não é de agora a minha repugnancia ás dictaduras. Não formei hoje a theoria em nome da qual as combato. Em 1866, quando as commoções europeas traziam os animos assustados, alguem cuidou que seria util lançar-se o paiz nos braços de uma dictadura gloriosa pelo nome e pelo prestigio da pessoa. Em um jornal escrevi o meu voto em contrario, e não vejo rasões para me arrepender d'elle. Eis o que disse então: "A dictadura seria monstruosa e absurda. Quem a chama? O que a exige? Precisâmos de reformas, de actos viris, de mais autoridade no poder, ou de mais vigor no principio de auctoridade? Em nossa mão está obte-los sem saír da carta. Constitua-se a liga dos que são capazes de querer e de poder, e combata-se a seita dos relaxistas. A regeneração do paiz não se tira de um jacto da cabeça de um homem, e a nação toda sabe mais do que essas usurpações ephemeras, que nos apontam como refugio derradeiro. Não é necessario volvermos a segunda infancia tomando tutor, e requerendo a fustigação amoravel de alguns mezes, ou de alguns annos de silencio, de obediencia passiva e de exautoração moral". (Apoiados.)

Foi o que escrevi em 1866. Em 1869 repito o mesmo.

Não fórmo libellos, nem imponho culpas. Manifesto opiniões antigas.

O governo viu em um incidente parlamentar motivo ou pretexto para usar da arma da dissolução. Já não era pequeno abalo para circumstancias tão criticas. Dentro de um anno duas dissoluções e duas eleições!... Em outra parte deu-se o nome de golpe de estado a muito menos. Entendeu a corôa dever preferi-lo á camara.

Se a consciencia publica e a sua o decidiram a conservar-se fez bem. Mas tudo em tão melindroso lance o aconselhava, interposto recurso perante o paiz, e acabando de saír de uma dictadura legalisada como lhe conferira a auctorisação de 9 de setembro; tudo o aconselhava, repito, a não espaçar a nova convocação, a reunir immediatamente os comicios, e sobretudo a não mudar a fórma da eleição, a não tocar na organisação do tribunal que o devia julgar. Seguiu infelizmente a estrada opposta, optou pela dictadura, e os perigos com que lutou foram o fructo da sua deliberação.

O mau exemplo é contagioso. A revolução nas espheras do poder provoca a revolução das praças. A lei desacatada pelos seus guardas naturaes perde-se o respeito com facilidade (apoiados).

Não accuso os srs. ministros de auctores das agitações e dos transtornos que deplorâmos. Não foram culpa d'elles nem do gabinete que os precedeu, nem mesmo dos anteriores. Os males de que nos queixamos, a enfermidade de que padecemos conta largos annos de existencia. É velha, é quasi chronica. Digamos a verdade, e só a verdade (muitos apoiados).

Foi obra do passado, é o resultado das illusões do paiz, das illusões dos parlamentos, das illusões dos governos (apoiados repetidos).

Não foram os ministros de hontem nem são os de hoje que fizeram a situação perigosa em que nos vemos, foram as illusões de todos, foram as seducções e as facilidades do credito, quando se contavam por centenas de milhares de contos as sommas despendidas, as que nos cavaram os precipicios por baixo de caminhos juncados das flores mais vivas da esperança. Emprehendemos trabalhos herculeos para as forças, devorou nos a impaciencia de alcançar em poucas jornadas os que nos levavam grande distancia, e imaginando que os melhoramentos compensam logo os sacrificios, accumulámos os deficits, sacámos annualmente so-