O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

116 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

que entendo as economias de outro modo, sei que estou atrazado das inspirações da situação; e note a camara como sou orgulhoso, comprazo-me de não ser da opinião do maior numero, se o maior numero é ainda d'essa opinião. Vejo a torrente despenhada, mas não quero segui-la. Quando descansar no seu leito, e bater a hora da reflexão, sei que de tantas ruinas alguma cousa util tornará a renascer.

As crises financeiras são communs, e todas as nações as têem atravessado. A gloria de Pitt foi vencer uma das mais graves. Sir Robert Peel lutou com outra, e saíu triumphante. Não ha já quasi hoje combinações que não estejam ensaiadas, e todas se reduzem por fim á reducção da despeza, ao augmento do imposto, e á attenuação dos encargos da divida. As economias pois devem representar uma parte do plano, mas seria absurdo querer que ellas só por si o constituissem. É da acção de todos os meios empregados que ha de nascer a solução (apoiados).

Antes de janeiro de 1868 pediam-se caminhos de ferro, e desenvolvimentos em larga escala, dizia-se o paiz rico para cada concelho representar uma unidade municipal na lei administrativa de 1867; mas quando se alludia a recorrer aos contribuintes para engrossar a receita, a opulencia desapparecia, e as povoações declaravam se arrastadas e quasi miseraveis. Era a sabida repugnancia de todos os povos e de todos os tempos ao imposto. O que sinto é que se especulasse com ella politicamente, e que para apressar a queda de um ministerio se não duvidasse affirmar ao paiz que as difficuldades aggravadas do thesouro se venciam sem mais imposto, que a nação não devia nem podia pagar mais, e que na despeza publica as reducções feitas com desassombro chegariam á eliminação do deficit. Funestas maximas! Perigosas illusões! Mal previam os que as divulgavam e faziam d'ellas arma de destruição, que semeavam estas tempestades contra si, e que as responsabilidades das falsas doutrinas íam caír sobre elles com todo o peso de rapidos e tristes desenganos! (Apoiados.)

O ministerio actual subiu ao poder como representante e como executor do principio das economias immediatas, profundas e inexoraveis. Não se gravou outro lemma nas suas bandeiras, nem a opinião lhe dictou outras exigencias. Entregou-lhe o orçamento e suas verbas, e disse lhe: corta, supprime, destroe! A auctorisação de 9 de setembro de 1868 abriu o primeiro periodo d'esta dictadura, d'esta campanha; os actos promulgados depois de 23 de janeiro de 1869 fecharam o segundo. Pouco importava que se demolisse, que se arrasasse, que se esterilisasse tudo. O que se ía verificar não era se as reformas satisfaziam a verdadeira economia, mas quantas dezenas de contos se riscavam por meio d'ellas. O que se queria e sonhava era declinar o sacrificio e o imposto, embora se convertessem os serviços mais uteis em desertos, embora se condemnasse a civilisação quasi Como uma temeridade, o ensino publico, o desenvolvimento intellectual, e os progressos moraes quasi como uma luxuosidade ociosa, embora se esterilisassem os esforços de muitos annos quasi em um dia sem vantagem e sem compensação. Acabe tudo, atropelle-se e desabe tudo, mas não haja imposto. Era o moto. (Muitos apoiados.)

O governo deixou-se levar da torrente impetuosa, ou seguiu-a muito de mais, mas honra lhe seja, não foi tão condescendente com o erro e a exageração como se esperava. Demoliu, annullou e inutilisou bastantes cousas uteis que bastaria reorganisar e fazer modestas, mas não matou o orçamento nem podia, porque a necessidade combate-se, mas não se mata, e os gastos reproductores da civilisação não se supprimem sem grande desequilibrio. Decretaram deducções aggravadas nos vencimentos dos funccionarios. Qual foi o resultado? 360:000$000 réis de menos na despeza publica, mas o rendimento das alfandegas nos tres mezes de março, abril e maio foi menor, do que em 1868, 134:000$000 reis! Assim é que os principios castigam os que os offendem.

Já o disse e repito. Os srs. ministros não fizeram a situação. Ella é que os fez a elles. Aceitaram o seu mandato, constituiram-se executores da opinião em grande parte desvairada, mas predominante, e deram-lhe foros e sancção de governo. Como João sem Terra, os seus barões impozeram-lhe a magna carta, não das liberdades, mas das restricções. Ouviram ao redor de si o clamor de ecce! de Tolle! E cumpriram a triste missão. Foram os ministros do programma de janeiro, programma filho da praça publica, das suas paixões, das suas exagerações, dos seus equivocos. Se não podem lavar as mãos como Pilatos do sacrificio dos innocentes, podem ao menos dizer quem lhes dictou a sentença. Lançaram se nos braços da popularidade, e foram para onde ella os arrastou. Não tiveram tempo para reflectir, para combinar, para reconstruir por um plano regular. Deram lhe um camartello a cada um, apontaram-lhe os edificios votados á quéda, e demoliram. Nada mais (apoiados). Nada mais! E foi immenso. O futuro o dirá.

As economias sisudas, perseverantes e pensadas devem ser a tendencia e a inspiração, não só d'este, mas de todos os governos. Quero as, affirmo-as, recommendo-as como uma necessidade e um dever financeiro e moral. E n'esse campo ha muito a fazer ainda. As economias verdadeiras fazem-se sem ruido e sem ostentação, porque são actos naturaes de bom regimen. Rever, as despezas, cortar as superfluas, eliminar as menos urgentes, e conservar e augmentar até as reproductivas deve ser a preoccupação constante dos poderes publicos. Mas as falsas economias que matam com as verbas destruidas a riqueza ou a cultura nascentes, que arruinam os serviços uteis, que decepam a arvore carregada de fructos, significam desperdicios e não reducção; e é pessimo faze-las só pela popularidade ephemera, cujos applausos de hoje ámanhã se converterão em imprecações. Não vale a pena demolir só para levantar nuvens de poeira e amontoar acervos de ruinas. As tristes acclamações á obra de barbarie são a primeira condemnação d'ella.

Essa popularidade não a quero para mim, já o declaro. Os sorrisos fagueiros dessa opinião não me tentam. Prevejo a reacção logo que se acalmem as apprehensões de agora. Apenas dos bancos da corôa se annunciar que a crise financeira está vencida, e que o espectro do deficit deixou de apavorar o thesouro; prevejo, ouso affirmar, que a austeridade de hoje se ha de relaxar, e que os cerberos das economias hão de emmudecer. Cuidado com esse dia! Os ministros verão n'elle outra vez as escadas, os atrios e as salas das secretarias apinhadas de pretendentes, hão de tornar a pedir-lhes a infracção das leis e a elasticidade do orçamento como obsequios pessoaes, e a plebe esfaimada dos requerentes renovará as antigas invasões. Somos assim.

Exagerâmos a apprehensão e exagerâmos a confiança. N'esse dia é que as economias de agora hão de ser processadas, e auguro já d'aqui que muito pouco applaudidas. Permitta Deus que os poderes publicos saibam oppor então a resistencia necessaria, e se não deixem levar das facilidades usuaes. Ponham n'esse dia sentinellas ao orçamento, porque o caminho que percorremos estes annos não se trilhará de novo senão para nos perdermos completamente (muitos apoiados). Não encarreguem o credito de saldar todos os encargos, e não creiam tambem que a elasticidade do imposto é illimitada. Os sacrificios pedidos agora custaram o preço que sabemos. Se não nos moderarmos a outros iguaes ou menores podem custar uma revolução social (apoiados repetidos).

Sentinellas vigilantes, pois, ao, orçamento, nas horas de prosperidade, se quizermos evitar a repetição das horas de amargura!

Não posso associar-me á injustiça das accusações que lançam sobre alguns gabinetes a culpa e responsabilidade do estado presente. A censura posthuma é facil. Era mais generoso confessar a verdade, e dizer que esses gabinetes encetaram o meio das economias, revelaram a gravidade das circumstancias e não recuaram diante do dever de pro-