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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 119

Esta hypotheca é especialissima. Póde-se dizer ainda que os subscriptores de obrigações eram individuos que concorreram para a execução das obras do palacio. Sem duvida. Os seus nomes são bastante conhecidos para que se não possa discutir este facto. Mas isso nada envolve contra a justiça da pretensão. Pois ha uma sociedade que levanta um emprestimo, diz se aos subscriptores d'este emprestimo que venham buscar os seus titulos; os subscriptores, que são credores d'aquella sociedade, em logar de dar dinheiro dão o debito da sociedade, cousa que se pratica em todo o mundo quando se dão taes circumstancias; pois o subscriptor havia de dar o dinheiro da subscripção para immediatamente o receber em troca do seu debito, e um facto que em parte alguma nunca produziu a nullidade de um contrato, póde produzi-la aqui? Por consequencia é insustentavel a idéa, apresentada pelo sr. ministro da fazenda, de que não havia senão um contrato provisorio. Havia, pelo contrario, contrato definitivo e realisado.

Sr. presidente, se torno a insistir n'este ponto é por ver que as minhas asserções, apresentadas quando fallei na sessão passada, foram de tal modo interpretadas pelo sr. ministro que me fez a honra de responder, que parecia que eu não soubera ler o que está aqui n'este papel. E eu acreditei tanto nas palavras do sr. ministro, que na duvida se estaria em erro, mandei logo, pelo telegrapho, perguntar se effectivamente o contrato não estava feito. Responderam-me que estava feito; e tanto que até a sociedade do palacio de crystal tinha pago o primeiro e segundo semestres de juros e amortisação d'este emprestimo com a companhia utilidade publica e outras. Por consequencia o contrato é sacratissimo, feito á sombra da lei. Se nós vamos d'esta fórma atacando direitos sagrados, caminhamos para a bancarota. Creio que ninguem tem a coragem de decretar a bancarota; ella faz-se por si, e quando ella apparece, sujeitâmo-nos todos os credores do estado a uma lei geral e commum. Agora decretar-se a bancarota para o palacio de crystal, e ficarem todos os outros credores recebendo os seus creditos por inteiro, parece-me de alta injustiça; e eu duvido que a camara, onde poucas vozes se levantaram contra a lei pela qual se concederam os direitos que hoje invoca a seu favor a sociedade do palacio de crystal, onde nem mesmo o sr. visconde de Chancelleiros, que hoje louva e approva os actos do governo, se bem me recordo, se levantou sequer para protestar contra as concessões áquella sociedade, sanccione essa injustiça. Por consequencia esta quasi unanimidade da camara n'aquella occasião denota, que não foram motivos politicos que levaram a votar esta lei, foram falsos principios de economia publica; foram principios que o sr. conde de Samodães hoje apresentou muito bem, mas que n'esse tempo não agradavam ao sr. visconde de Chancelleiros nem a muitos dignos pares, porque consideravam muito importante uma empreza d'aquella ordem; mas hoje, sr. presidente, esses mesmos homens censuram o palacio de crystal, o que me parece injusto; e a camara ha de votar de certo as disposições do decreto a que alludo, e a rasão por que hoje as vota é porque não quer fazer questão politica do bill, doutrina esta que eu não partilho, e que me parece não tem precedentes.

Os dignos pares fallam contra o bill, mas votam por elle, e por isso muito bem disse eu, que a maioria da commissão que o examinou era mais opposição do que eu, e ainda ha bem pouco se deu aqui o facto singular de não haver quem se inscrevesse a favor do parecer, porque todos fallavam contra, mas votavam por elle.

Se não fosse considerar a posição que a camara tomou, e a declaração feita pelo sr. conde de Samodães, que não votaria de modo nenhum que se d'esse de novo o subsidio ao palacio de crystal, eu mandaria uma proposta para a mesa, a fim de que o decreto a elle relativo fosse separado d'esta serie de medidas, pois a camara tem obrigação de olhar esta questão com toda a sisudez, porque é uma grave injustiça contra a propriedade particular a disposição do referido decreto.

Faz-se uma lei, sr. presidente, expressa sobre este objecto; sobre esta lei fez-se o contrato, e o contrato em virtude d'este decreto fica nullo.

Ora, sr. presidente, se qualquer não póde, nem deve faltar á fé dos contratos, uma nação muito menos o póde fazer.

1:206-IMPRENSA NACIONAL-1869