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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 133

que muita gente tem aos impostos de consumo, suppondo-se que elles vão principalmente recaír sobre o povo. Em geral o imposto de consumo não fere de preferencia as classes menos abastadas. Qualquer que seja o imposto, directo, indirecto, de taxa especial, vae apparecer encorporado no preço do objecto sobre que recáe. Quando esse encargo não consente que o objecto alcance o preço remunerador, elle deixa de se produzir, se as reclamações por parte dos lesados e a justiça esclarecida dos poderes publicos não reduzem aquelle encargo ás devidas proporções.

Todos os impostos causam no momento em que se estabelecem um certo abalo, uma certa perturbação, mas depois, pelo decurso do tempo, com a repercussão, as cousas chegam a equilibrar-se e voltam ao seu estado normal, repartindo-se por todos, mais ou menos, o peso do novo encargo, em virtude da elasticidade economica da sociedade, que o assimila.

Em presença d'estas considerações, abonadas pelas doutrinas dos mais modernos e auctorisados economistas, eu julgo que o imposto de consumo não é tão mau como se pretende. Paga-se sentindo-se menos porque se encorpora em pequenas doses no preço dos objectos que compramos, produz avultadas receitas porque se alastra pelas grandes massas, e tem a vantagem de crescer sem que seja preciso augmentar as taxas, porque vae acompanhando o desenvolvimento da riqueza social.

Esta opinião, que sustento aqui, não é sómente filha das minhas convicções formadas pelo estudo reflectido; é fundada na opinião de economistas dos mais distinctos. Adam Smith, Baudrillart, Ricardo, Fontenay, nos seus bellos escriptos publicados no Jornal dos economistas; Thiers, no seu livro sobre a propriedade, todos sustentaram esta mesma opinião.

Já duas revoluções quizeram abolir, o imposto de consumo, e um anno depois foi elle restabelecido. Recordemo-nos do que se passou em França em 1848, e na Hespanha em 1868.

O imposto de consumo é um imposto de civilisação, é um imposto necessario nas sociedades modernas, e que acompanha o desenvolvimento da sua riqueza mobiliaria. Se não veja-se como está sendo explorado em differentes nações, e até na Allemanha, que o sr. ministro tanto cita. (Riso.)

O sr. Ministro da Fazenda: - Tambem o digno par já a cita.

O Orador: - V. exa. tem sobretudo predilecção por aquelle estado d'onde copiou a inadmissivel proposta do imposto de rendimento, e ha na Allemanha estados muito mais bem administrados financeiramente e que devem servir mais para exemplo do que a Prussia, que se resente ainda da sua organisação feudal.

Na Belgica, por exemplo, os impostos de consumo interno - não fallo nos impostos indirectos em geral, que comprehendem os que se cobram nas alfandegas - estão em relação á receita total d'aquelle estado na rasão de 22 por cento. Na Inglaterra, essa relação é de 33 por cento; na França, de 26 por cento; no conjuncto dos estados da Allemanha, de 25; na Italia, de 22; na Hollanda, de 36; nos Estados Unidos, nação que é a mais adiantada em liberdade, de 44 por cento -aquelle estado vive quasi exclusivamente do imposto indirecto; e na Hespanha, de 14 por cento.

Convem recordar que, n'este ultimo paiz, o imposto de consumo interno rende 16.600:000$000 réis, quando em Portugal rende apenas 758:000$000 réis. Considerando a relação de população, area e riqueza que se dá entre os dois paizes, não se justifica tal disparidade. O que nós pagâmos de imposto de consumo interno pouco excede a 3 por cento. Isto mostra quanto está mal explorada entre nós esta fonte de receita. Se formos comparar a nossa pauta de consumo interno, com a pauta dos outros paizes, ainda mais nos convenceremos d'esta verdade: não digo já tanto com relação as taxas, mas no que toca aos artigos que concorrem ao mercado e estão sujeitos ao imposto.

Foram estes mesmos principios, que eu sustentei n'um modesto livro que escrevi sobre administração, e no qual me occupo da resolução da nossa questão financeira debaixo do ponto de vista administrativo, tanto no que dia respeito ao estado, como aos districtos e ás camaras municipaes, porque é impossivel desligar estes assumptos: e de os não terem harmonisado é que têem nascido muitos e graves inconvenientes na administração publica.

Não se póde resolver a questão financeira do estado, sem ao mesmo tempo se procurar resolver a questão das finanças municipaes. Póde o estado explorar os mesmos impostos locaes que as municipalidades exploram? É d'essa exploração dupla que em grande parte tem resultado de certo a diminuição que se nota no rendimento de alguns impostos que pertencem ao estado. Quando as camaras municipaes carregam muito em certos artigos, o thesouro publico tem mais difficuldade em cobrar a taxa que lhe compete, porque a materia tributavel está exhaurida, ou pelo menos fatigada.

N'esse meu livro, a que acabo de me referir, e que um orador distincto, de grande talento e muitos conhecimentos, cujas opiniões politicas, aliás não partilho, teve a bondade de citar na outra camara a proposito da discussão da arrematação do real de agua - alludo ao sr. Rodrigues de Freitas; n'esse livro modesto, como disse, estabeleci eu e demonstrei com o estudo do modo de ser das nossas municipalidades e dos recursos de que dispõem, conformando-me com os principios geralmente adoptados em todas as nações e defendidos pelos escriptores mais auctorisados n'esta materia, que era necessario limitar ás localidades a faculdade de tributar. É conveniente que o estado explore principalmente as contribuições do consumo, que são aquellas que devem produzir maior rendimento, pois acompanham o desenvolvimento da riqueza publica, offerecendo ao mesmo tempo mais facil cobrança, e se deixe aos municipios a exploração das contribuições directas locaes. É esta uma distincção indispensavel no que diz respeito á faculdade tributaria dos concelhos para que não pretendam tirar um rendimento superior ao que elle póde dar do imposto indirecto local, e em todo caso para que não difficultem ao estado o obter mais alguma cousa d'esse imposto, nem desequilibrem, pela anarchia tributaria, as relações economicas e commerciaes entre os differentes centros da população do paiz, creando nos mercados condições inteiramente diversas para certos productos, o que difficulta e complica todas as transacções.

Sr. presidente, o que se está vendo nas nossas municipalidades, principalmente nas provincias do norte? De que vivem ellas? Vivem do imposto indirecto, do imposto de consumo. As municipalidades dos districtos do Alemtejo nas provincias do sul, vivem principalmente do imposto directo; e as municipalidades das provincias centraes têem quasi que equilibradas estas duas fontes de receita. Ha districtos, ha concelhos onde o proprietario mais abastado não paga nada para a municipalidade, o que acontece, sobretudo nos districtos de Aveiro e Vianna. E vou explicar a rasão.

N'estes districtos, e em alguns concelhos em especial, ha só impostos de consumo para occorrer ás despezas municipaes.

Ora o imposto de consumo pesa sobre a venda a retalho; e quem compra n'estas condições é o povo. O consumidor em grosso, os ricos e abastados, não pagam nada. Quem paga é quem vae comprar ás lojas. E como não ha addicionaes ao imposto directo, tambem por este lado nada pagam. Estes taes concelhos são o paraizo dos proprietarios ricos.

Esta situação anormal existe, e é necessario que acabe. Esta oligarchia local não deve continuar.

Não se diga, pois, que se vae favorecer o povo com a arrematação do real de agua, sem comprehender o consumo em grosso, em vez de estabelecer os addicionaes ás contribuições directas nos concelhos onde não existem;