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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 155

tamento, disse entretanto de mim para mim: se o governo se esqueceu de que n'este paiz existe a agricultura, não vamos nós dar-lhe occasião a que se lembre d'ella para que a opprima, com mais algum vexame; (Riso.) elle que só se lembrou de que ella existia para a proteger e beneficiar com a arrematação do imposto do real de agua, com o imposto de rendimento, a ser assim, se o governo ignora a existencia da agricultura tanto melhor para ella. Conservemol-o n'essa illusão. (Hilaridade.) Conformava-me porém, repito, com o pensamento da proposta do digno par; tel-o-ía dito desde logo se não julgasse inutil significar o meu apoio a uma proposta que por todos os lados da camara devia ser acceita. O que porém não podia suppor é que a commissão a julgasse comprehendida no projecto de resposta ao discurso da corôa, que se não referia á agricultura em nenhuma palavra, em nenhuma phrase, em nenhum pensamento de todo elle.

Que porém a commissão julgasse esta proposta comprehendida no espirito da redacção do projecto, vá; pode comprehender-se isso facilmente depois das explicações do sr. duque d'Avila. O mesmo se entende com o additamento do sr. bispo de Bragança, pedindo a Deus que se amerceie de nós e que o auxilio da Divina Providencia concorra comnosco em defeza dos sagrados interesses da patria.

Mas a proposta do sr. visconde de Seabra, essa, como hei de eu julgal-a implicitamente comprehendida na resposta ao discurso da corôa?

Como podia o seu auctor, que se apresentou aqui com a vehemencia de um tribuno, apostrophando acceso em colera o governo, suppor que a commissão havia de pegar do seu additamento e enfeixal-o com todos os raios d'essa colera n'um periodo de redacção mansa e pacifica como o do parecer que a mesma commissão mandou para a mesa? Nem o sr. visconde de Seabra o podia suppor, nem eu tão pouco, nem commigo e com s. exa. muitos dos dignos pares que me estão ouvindo.

Aqui, tem v. exa. a rasão da minha surpreza e a justificação do epitheto com que na sessão passada qualifiquei o trabalho da commissão.

Folgo de ver que sobre elle, pela declaração do sr. presidente do conselho, se levanta a questão politica. Assim teremos que a votação de resposta ao discurso da corôa, não terá apenas a significação banal de um mero cumprimento dirigido ao chefe do estado. Significará mais do que isso: a affirmação dos verdadeiros principios constitucionaes, e um protesto solemne contra a infracção de todas as praxes do systema parlamentar, commettida pelo governo com a geral reprovação de todos os homens sensatos e liberaes. (Apoiados.)

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Eu não tinha pedido á palavra para responder ao digno par sr. visconde de Chancelleiros, porque, como v. exa. sabe, a pedi logo que s. exa. soltou as primeiras palavras; mas já que a pedi, alguma cousa direi com relação ás reflexões que o digno par acaba de fazer.

Primeiro que tudo permitta-me v. exa. e a camara que eu proteste bem alto contra as phrases em que o digno par affirmou com persistencia notavel que o actual governo é um governo possoal.

Aonde vae s. exa. procurar as provas de similhante asserção?

Pois não temos nós, durante a existencia do actual ministerio, recebido as manifestações mais favoraveis da opinião publica e do parlamento?

Houve porventura já alguma indicação constitucional que nos obrigasse a deixar estas cadeiras?

Quando saíu do poder o ministerio presidido pelo sr. Fontes, o sr. visconde de Chancelleiros censurou-o asperamente, porque tinha saído do poder sem que indicação alguma constitucional lh'o aconselhasse, e porque se havia sumido
por um alçapão!

Como quer s. exa. hoje que nós, sem nenhuma d'essas indicações, e por um simples capricho, ou por um impeto de mau humor, abandonemos os nossos logares?

Em que temos nós infringido quaesquer principios ou praxes constitucionaes?

Qual é o acto da nossa vida publica, com que s. exa. possa documentar a accusação que nos faz de governo pessoal?

Governo pessoal, porque?

Peço ao sr. visconde de Chancelleiros que junte á sua affirmação os factos em que se firma, para a formular perante o parlamento.

Nós temos em nosso favor as maiorias parlamentares, temos consultado o paiz por duas Vezes e por essas duas vezes o paiz nos tem dispensado o seu apoio.

(Susurro.)

Eu peço a v. exa., sr. presidente, que mantenha a ordem. Não póde ser permittido que se offendam ou perturbem aqui quaesquer direitos, quer do governo, quer dos membros d'esta casa.

O sr. Visconde de Chancelleiros: - A ordem está mantida.

O sr. Presidente: - Não me pareceu que a ordem fosse alterada; mas posso assegurar a v. exa. e á camara, que, escudando com o regimento, hei de procurar sempre manter a ordem, e cohibir quaesquer manifestações. (Apoiados.) Se as galerias intervierem, immediatamente farei applicar a disposição do regimento.

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Folgo se me enganei; e folgo por mim, pela camara e por todos nós.

Dizia eu ao sr. visconde de Chancelleiros, que, tendo maioria no parlamento é consultado por duas vezes a opinião publica, recebendo sempre testemunhos de confiança, não havia indicação constitucional que nos podesse determinar a abandonar estas cadeiras. Quando nos faltar o apoio das maiorias parlamentares, quando nos convencermos de que a opinião publica seriamente manifestada, nos retirou a sua cooperação, o governo sabe o que deve fazer, e preza-se de saber cumprir os seus deveres. (Apoiados.)

Este governo é um governo pessoal! Porque? Não comprehendo tal asserção. É necessario que s. exa. a prove e explique.

Tem-se dito mais de uma vez que nós viciámos a representação nacional. Como? Onde estão as provas?

A camara dos senhores deputados, que é a competente para verificar ás suas eleições, não teve que occupar-se de nenhum protesto serio formulado por parte da opposição. D'aqui se deprehende bem a pressão que exercemos sobre os eleitores. Todos sabem que o processo eleitoral correu regularmente, e que na camara dos senhores deputados não houve nenhuma eleição contestada, e apenas algumas duvidas levantadas por parte do sr. Julio de Vilhena com relação a uma assembléa de Lisboa.

Como se póde n'estas condições dizer que o governo é um governo pessoal?

Sr. presidente, se se examinarem os registos da correspondencia emanada do ministerio do reino e até os registos telegraphicos, por elles se verá que, ainda nas vesperas das eleições, expedi as ordens mais terminantes para que se mantivesse a todo o custo a liberdade da urna e a tranquillidade publica. Se n'um ou n'outro ponto houve algum excesso, eu não podia deixar de o condemnar.

Já tive occasião de ler, n'uma outra sessão, uma circular confidencial, na qual dizia aos governadores civis, que o governo desejava manter a paz e a ordem eleitoral, até com o sacrificio das suas conveniencias politicas.

Se não publicava essas ordens no Diario do governo, para não ser taxado de espectaculoso, dava-as confidencialmente, para serem cumpridas, como quem estava disposto a pedir a responsabilidade a quem as infringisse.

Se eu procedia do modo que deixo indicado, não me parece que, só por meras suspeitas, se possa vir accusar, pe-