O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SESSÃO DE 28 DE MAIO DE 1887 275

para a mesa um requerimento, pedindo documentos, pelo ministerio da guerra.

O sr. Bocage: - Pedi novamente a palavra para agradecer ao illustre ministro dos negocios estrangeiros as expressões amaveis e benevolas explicações que me dirigiu.

Acceito-as, porque estou absolutamente convencido de que não foi por falta de attenção para commigo que s. exa. deixou hontem de responder ás considerações que apresentei com relação á concordata de 1886.

Ácerca do que s. exa. disse ha pouco a respeito dos tres pontos a que me referi da primeira vez que fallei, peço licença á camara para fazer brevissimas considerações, que julgo indispensaveis.

Disse o nobre ministro que nas nossas possessões do Zaire não está ainda estabelecido um regimen aduaneiro, mas que muito em breve se encontrará a administração d'aquelle ponto das nossas colonias em condições acceitaveis e regulares.

Sem a menor offensa, nem a s. exa., a quem está actualmente commettida a pasta da marinha, nem ao seu antecessor, permitta-se-me no entanto que eu lastime que se tenha deixado correr tanto tempo sem dotar aquella possessão com os meios necessarios de administração, e esta falta é tanto mais deshonrosa para nós, quando vemos que um outro estado notavel pela sua imperfeita organisação, um estado perfeitamente sui generis, e em condições mais difficeis do que as nossas, o estado do Congo se acha ha muito tempo entrado em vida normal, tendo ali auctoridades civis, militares, judiciaes e um regimen aduaneiro.

Nós não temos nada!

O Zaire, não tendo a sua administração organisada, sem auctoridades e sem alfandegas, vê-se privado de todas as receitas e em uma situação completamente anarchica.

Nos territorios, outr'ora da Internacional, que confinam com os nossos, temos um cônsul, mas isto não é o suficiente, e por isso faço votos sinceros para que em breve a administração, n’aquelles pontos, assuma condições regulares.

Não estranhe a camara que eu tome algum calor, quando me refiro ao Zaire.

Sr. presidente, é quasi axiomatica uma anomalia que se dá na affeição paternal.

Os pães, em geral, querem muito aos filhos que lhes dão mais desgostos e dissabores.

A reivindicação do Zaire foi para mim motivo de grandes desgostos e continuas attribulações.

Emquanto durou essa ardua negociação a opposição ao governo de que eu fazia parte moveu-me a mais intransigente das perseguições, no intuito de difficultar a realisação d'aquelle desideratum.

Quer na imprensa, com a propalação de calumnias de que os nossos adversarios sabem aproveitar-se, quer no parlamento com discussões importantes, todos os dias a opposição progressista levantava novas dificuldades e embaraços para contrariar os meus patrioticos esforços. (Apoiados.)

Não hesitando na escolha dos meios, comtanto que se lhes afigurassem conducentes ao aniquilamento do meu intento, davam cor falsa aos acontecimentos e chegaram a exigir de mim, quando o negocio se tratava nas conferencias de Berlim, declarações imprudentes, que me poderam servir de ampla defeza, mas que era meu dever calar, e que effectivamente calei para não pôr em risco graves interesses do estado.

Não me levem estas palavras á conta de retaliação ou desforço; não é essa a minha situação. Quero apenas fazer notar que aquelles que então me censuraram por eu não ter podido salvaguardar todo o territorio que pretendiamos, esses tão zelosos, tão defensores do engrandecimento das nossas colonias deixam o territorio do Zaire em quasi completo abandono.

Quando vejo esses zelosos protectores das nossas colonias consentirem que durante quinze ou dezeseis mezes esteja o Zaire sem auctoridades, havendo um governador já nomeado pelo antecessor do actual sr. ministro da marinha, e meu collega no ministerio transacto; quando vejo que este governador está aqui sem partir ha mais de dois annos, posso dizer que o Zaire tem estado esquecido pelos poderes publicos.

Ouvi dizer que tinha ido para lá uma auctoridade, não sei qual. Ouvi tambem dizer que tinha regressado. Então porque foi e porque voltou?

Tambem não sei. De fórma que não ha auctoridade absolutamente nenhuma no Zaire, e estando as cousas d’este modo, eu creio que aquelles povos têem algum direito de acreditar que Portugal não tem o minimo interesse pelo Zaire; unicamente os commerciantes portuguezes ali estabelecidos é que representam ainda os laços que unem aquelle territorio á metropole.

Sr. presidente, desculpe-me v. exa. e desculpe-me a camara que eu trate d’este assumpto com um certo calor, que não está muito nos meus habitos.

Deixando, pois, este primeiro ponto, em que não posso declarar me por satisfeito, mas apenas animado pela esperança de que o governo estenderá as suas vistas para este assumpto e procurará occasião e modo de organisar uma administração no Zaire, como lho exige instante e constantemente o decoro do paiz que representa, e contentando-me por agora com essa esperança, passarei ao segundo ponto.

Eu devo dizer ao nobre ministro que houve uma nota trocada, se não me engano, no final da conferencia de Berlim entre o nosso representante e o embaixador francez n’aquella capital, na qual se declarou que o governo porguez não recusaria que podesse haver engajamentos nos estados limitrophes do Congo, comtanto que esses engajamentos seriam feitos com as prescripções legaes, na presença das nossas auctoridades e com as garantias que se exigem nas nossa colonias e como se tem praticado em Moçambique.

Porque foi que se deu o facto deploravel em Cabinda, que o sr. ministro lamenta tanto como eu?

Foi porque a auctoridade não estava no seu posto, porque, se estivesse, talvez o facto não tivesse tido logar.

Segundo me consta, os engajamentos ali foram feitos pelos agentes officiaes do governo do estado livre do Congo, e depois vieram elles attribuil-os ao agente ou agentes de uma empreza que tem por principal representante um famoso americano, subdito dos Estados Unidos, que na conferencia de Berlim foi um dos nossos mais encarniçados adversarios.

Esta é a versão que corre e que chegou ao meu conhecimento; póde ser que seja errada; o sr. ministro terá informações mais explicitas a este respeito.

Sobre este ponto ainda terei de fazer mais algumas observações, mas espero pelos documentos que s. exa. me prometteu e que estimaria me fossem confiados, não havendo nisso inconveniente; sujeito-me a esta restricção.

Agora com referencia ao terceiro ponto, não posso deixar de dizer alguma cousa, por mais que queira não tomar tempo á camara.

Não me parece que se possam admittir em toda a plenitude como boas as rasões apresentadas pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros em defeza da sua completa abstenção neste negocio.

Refiro-me á nomeação de um salteador arabe, Typpo-Tip, que é musulmano, e que todos sabem que é chefe das numerosas tribus que têem assolado a ferro e fogo vastas regiões da Africa central, com as suas razzias para colher escravos, servindo-se de uma parte d’estes para os auxiliarem nos seus trabalhos agricolas e como carregadores nas suas operações commerciaes, reservando a outra parte para lhe servir de moeda das suas transacções commerciaes com a costa oriental.