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278 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

sem auctorisação do parlamento, convido o governo a comprehender este acto no bill de indemnidade que tem de apresentar ás camarás, para o relevarem da responsabilidade em que incorreu, pelas medidas decretadas dictatorialmente na ausencia das côrtes.

Eu, dando conhecimento á camara da minha moção, quero evitar que se supponha que eu, pedindo a palavra sobre a ordem, tinha o intuito de escalar a palavra, e não mando a minha moção para a mesa, por isso que o pensamento d’ella se acha na moção apresentada pelo digno par, o sr. Thomás Ribeiro. Eu estimaria muito poder votar essa moção, se ella não estivesse, como já. disse, revestida de um caracter, politico pela sua redacção, caracter que s. exa. disse lhe não queria dar, mas que, talvez pela força da sua posição e dos seus habitos, s. exa. lhe deu sem querer.

S. exa. quer que o governo traga a concordata á camara, o que elle nem ninguem póde já fazer.

Eu desejo apenas que o governo regularise o facto com a constituição por um bill de indemnidade, eis a differença.

Este convite meu tem por fim esclarecer um ponto de direito publico, para mim duvidoso, ou para mim não duvidoso, segundo as idéas que tenho, mas duvidoso para muitos e até para o governo durante a negociação, isto é, saber se o governo não tinha a necessaria auctoridade para poder sanccionar a concordata sem ouvir o parlamento. (Apoiados.}

Sr. presidente, eu não estou a fazer politica nem estou a acompanhar a opposição, visto que ella vota a resposta ao discurso da corôa, estou emittindo a minha opinião e fallando segundo a minha consciencia; assim, cumpro o meu dever e não crio difficuldades ao governo.

É por isso que a minha proposta era redigida com caracter individual, eu não fallo em nome da camara, eu é que convidava o governo, não a camara. Ha pontos em que não é permittido a ninguem deixar de manifestar a sua opinião, especialmente quando se está convencido que não é a um certo poder que compete este ou aquelle acto. N’este caso estou eu.

.Respeito muito a auctoridade do governo, respeito muito a auctoridade e competencia do digno par, negociador da concordata, o sr. Mártens Ferrão, que foi, diga-se com franqueza, quem indicou ao governo este caminho que a elle repugnava; respeito muito a auctoridade dos jurisconsultos, mas no exercicio da minha posição parlamentar, e conhecedor mal ou bem do direito publico portuguez, entendo por outra forma o que está estabelecido na carta, e a minha consciencia, n’estas materias, não póde sujeitar-se á auctoridade.

Já aqui se estabeleceu uma como necessidade de se fallar nos caracteres das pessoas a quem nos referimos. Deploro que se entrasse n’este caminho.

Releve-me a camara esta minha franqueza. Nós, no exercicio das nossas funcções e com a liberdade absoluta de apreciarmos os actos que se nos apresentam, não podemos estar a attender a que o acto é d’este ou d’aquelle individuo, nós não podemos de maneira nenhuma estar a sacrificar a nossa intelligencia á intelligencia alheia.

Nós podemos dizer que o sr. Mártens Ferrão procedeu em contrario do que nós pensâmos, embora o respeito e consideração que é devido a s. exa.

Eu sou insuspeito. Eu sou amigo do sr. Mártens Ferrão desde que frequentámos as aulas da universidade, a nossa amisade tem sido ininterrupta ha muitos annos, e por isso, já se vê, que eu, quando censuro a concordata, quando faço algumas censuras á maneira por que se procedeu neste tratado, não tenho em vista incommodar o sr. Mártens Ferrão nem faltar ao respeito que lhe é devido. Eu tambem respeito a Santa Sé, como todo o catholico deve respeitar; por discutir os seus actos não lhe falto ao respeito.

Nós não precisamos de fallar das virtudes e talentos incontestaveis do Santo Padre para lhe dizermos que não concordâmos com a sua opinião, quando elle trata de potencia a potencia com o governo de Portugal.

O assumpto de que se trata não é nenhuma definição dogmatica, nem um acto religioso, é uma questão politico-religiosa; o Santo Padre não trata dos seus interesses ainda que se exceda contra os nossos direitos, por isso em nada atacamos o seu caracter. O Santo Padre é virtuoso, creio bem, mas a que vem isso? Quantos Santos Padres virtuosos tem havido?

Muitos.

Pio IX, que eu tive a honra de conhecer, que me apresentou a Sua Santidade o nosso ministro de então, que eu não vejo presente, o sr. conde de Alte, tratou-me com benevolencia e tinha um carater tão sympathico, que quem o conhecia ficava possuido de um sentimento de respeito e veneração por elle.

Pois o asceta, o rigoroso Gregorio XVI não era virtuoso?

Hoje não entram na Igreja senão Pontifices virtuosos.

O tempo dos Papas maus, que não eram virtuosos, dos Borgias e dos Innocencios X, que governava a igreja por intermedio da sua propria cunhada, com quem vivia, já acabou, felizmente.

A Igreja, como tudo, resente-se dos costumes civilisados da epocha.

A Igreja é uma creação divina que existe no mundo, mas é composta e governada por homens.

Os homens que compozeram a Igreja não são os que a compõem agora; porque, a final ainda que se insurjam contra a civilisação moderna o effeito benéfico della nos costumes é innegavel, era impossivel subia hoje ao solio pontificio um homem que se não distinga pela sua virtude.

Sr. presidente, os homens da Igreja hoje são mais civilisados e portanto mais virtuosos, porque a instrucção é o maior incentivo da moralidade.

Mas porque o Papa é virtuoso, segue-se que havemos de acceitar todas as suas imposições. Não.

Graças á Providencia vemos hoje, no solio pontificio Leão XIII, que succedeu a Pio IX, a Gregorio XVI, a Pio VI e VII, e a tantos que têem occupado a cadeira de S. Pedro e pelas suas virtudes.

Ponhamos porém de parte as virtudes de Papa e as graças e os grandes favores que lhe devemos, que eu infelizmente não conheço, porque no fim de contas elle tratou comnosco como de potencia a potencia, procurou conveniencias para a Igreja na India, assim como nós tratámos das nossas.

E deixemo-nos de elogios.

Releve-me a camara estas expressões, porque eu estou farto de ouvir elogios. Não faço nem elogios nem censuras. Uso do meu direito, discutindo como entendo.

Ha trinta annos que estou n’esta camara e nunca offendi ninguem e hei de usar plenamente do meu direito sem fazer elogios nem censuras a ninguem; mas já que está em uso fazer elogios e eu tive de entrar n’este caminho, permitta-me a camara que eu faça um posto que me custe fazel-o, por estar presente a pessoa a quem me dirijo; os elogios na presença das pessoas, como diz o nosso proloquio são offensas, porque põem em relevo a vaidade de cada um. Esse elogio é feito ao sr. arcebispo resignatario de Braga, e sua exa. ficará sabendo que eu não o faço-senão pela satisfação que me causou ver o desasombro com que s. exa. fallou; não posso deixar de o louvar pelo honroso e nobre acto de s. exa. vir aqui discutir a concordata. O elevadissimo discurso que s. exa. apresentou chamou a minha attenção.

Não era elle necessario para conhecer os seus meritos e o seu patriotismo, que de longa data o conheço.

Mas admiro o seu desprendimento e louvo a sua dignidade em vir, inflexivel ainda, em uma idade em que outros já têem perdido completamente a energia, vir ao parlamento defender as suas opiniões e as prerogativas da