SESSÃO N.° 19 DE 20 DE JUNHO DE 1908 5
recção suprema do seu partido. E sobre o que a mim, Sr. Presidente, o Digno Par referiu, nada mais tenho a dizer.
Por ultimo, terei de occupar-me de algumas das affirmações contidas nos discursos do Digno Par Sr. Alpoim, a cujos dotes intellectuaes e politicos tenho sempre dedicado a minha admiração. Não pode S. Exa. ter razão de queixa contra mim.
Quando nos congregámos num bloco constituido por todos os partidos monarchicos, o Digno Par encontrou sempre da minha parte as melhores disposições para com S. Exa., o Digno Par pugnando por ideias mais radicaes, levado pelo seu temperamento mais impressionarei; eu conservador, mais frio, menos impressionavel, mas conservando-me sempre a seu lado com toda a lealdade. Por isso estranhei profundamente o discurso de S. Exa.
O Digno Par tem no país uma elevadissima posição, é chefe de um partido que tem direito a governar, e quando se tem essas responsabilidades não se pode falar como S. Exa. falou. O Digno Par menos parecia chefe de um partido, do que um tribuno de uma assembleia popular.
Dir-se-hia que eu, Sr. Presidente, fizera ao Digno Par qualquer accusação; porventura accusei S. Exa. de ter relações com o partido republicano?
De modo algum. Estava no seu direito. E não obstante o Digno Par dirigiu-me palavras bem amargas.
Nunca defendi, quer por palavras, quer por escritos, a abdicação do Rei D. Carlos, como tambem nunca sustentei que o partido regenerador fosse incompativel com o fallecido Monarcha.
Eu entendia, Sr. Presidente, e entendo que um Rei que acceita condições impostas por um partido é um Rei que abdica, como abdica um partido que acceita condições impostas por um Rei. Nessas condições, os partidos não passariam de um bando de mercenarios, sujeitando-se a tudo pela posse do poder. Mas isto não quer dizer que eu tivesse sustentado a abdicação de El-Rei D. Carlos: nunca tal defendi.
Tambem não provoquei a revolução. Empreguei todos os meus esforços, sim, para que as Côrtes se reunissem no dia 2 de janeiro e o Digno Par Sr. Alpoim sabe muito bem, porque commigo fez parte do bloco, quaes eram até os principaes pontos doutrinarios a discutir nesse congresso nacional. Se aquelle dia tivesse sido de gala nacional, não teria sido de luto o de 1 de fevereiro.
Desisti da minha, ideia, é certo, mas quando reconheci, principalmente depois da entrevista do Rei D. Carlos com Galtier, que a execução d'ella podia ser perigosa num momento em que a exaltação dos animos tocava o auge.
A minha attitude era effectivamente de opposição franca, como provam os factos, o d'isso aqui tenho os documentos, mas era uma attitude perfeitamente pacifica e liberal.
A frase: "Isto ou termina por um crime ou por uma revolução", era uma frase de simples previsão dos acontecimentos, ditada pela apreciação das circunstancias historicas do nosso e de outros países. Avisar não era fazer a revolução. E eu, Sr. Presidente, avisei o Governo de então. E quanto á moção de 8 de dezembro, ella não implicava incompatibilidade com o fallecido Monarcha: era apenas uma moção de combate que por todos podia ser votada. A outras reuniões não assisti, d'ellas não posso ter a responsabilidade.
Resta-me referir-me á declaração classificada pelo Digno Par Sr. Arroyo de promessa de adeantamentos futuros.
O que disse, Sr. Presidente, foi que, se a Casa Real se encontrasse na im-minencia de ser arrastada aos trihunaes, aqui ou no estrangeiro, se o Rei não tivesse recursos e se as circunstancias fossem urgentes, eu não teria duvida, para evitar tal escandalo perante o país e perante o estrangeiro, em fazer um abono, vindo seguidamente ás Camaras dar conta do meu acto.
Foi isto o que eu disse, e foi a isto que se chamou - adeantamentos futuros !
Creio bem, Sr. Presidente, que, se qualquer dos Dignos Pares que me increpfim por esse motivo, tivesse a responsabilidade de uma situação politica, havia de fazer exactamente o que eu disse. E, se assim não procedesse, não se desempenharia da missão que incumbe a um verdadeiro homem de Estado.
Não prometti, pois, adeantamentos. Affirmei, sim, Sr. Presidente, um principio em relação a casos restrictos e com a sancção parlamentar.
Mas senti profundamente o que o Digno Par Sr. Alpoim disse, como interpretação da minha attitude. O que desejo é que usem para commigo da mesma justiça que por minha parte aos outros dispenso.
Tenham todos a coragem das suas opiniões, expondo-as franca e desas, sombradamente, perante o país e perante o Rei, sem outra preoccupação que não seja o cumprimento integro dos deveres civicos.
Sr. Presidente: fui mais extenso do que desejava.
Tinha pedido a palavra, para dar algumas explicações e, afinal, tenho occupado por bastante tempo a attenção da Camara.
Vou concluir.
Não desejo voltar a este debate, que, aliás, se não circunscreveu á proposta do Digno Par Sr. Baracho.
Adduzi os argumentos que, no meu entender, demonstram a impossibilidade da approvação da proposta do Digno Par.
Não me arreceio do debate politico, mas só o acceitarei nesses termos quando elle seja nitidamente posto. Tratarei do assunto politico quando elle venha á discussão; mas não ha de ser á vontade de S. Exas.
Os Dignos Pares voltam se para mim como se eu fosse o chefe do Governo.
S. Exas. trazem-me á lembrança a passagem de uma tragedia de Shaks-peare, o Rei Lear.
Dizia um dos personagens d'essa tragedia:
A natureza deu ao homem dois olhos e um nariz. Os olhos para olharem para os lados, e o nariz para cheirar para a frente.
O meu antigo amigo o Sr. Baracho olha para um lado, e vê o partido regenerador, olha para outro lado e vê o partido progressista ; mas o seu fino faro descobre á frente o Governo, e é a elle que S. Exa. se dirige nos seus discursos, e é a elle que reclama providencias que julga uteis para o país.
Com os Dignos Pares Srs. Arroyo e Alpoim dá-se exactamente o contrario.
Um dos olhos de S. Exas. vê efectivamente o partido progressista, outro descobre o partido regenerador; mas o seu olfacto só lhes depara em frente a minha modesta individualidade.
Sou eu o chamado á discussão; é a minha pessoa que é discutida; sou eu o interpellado, como se eu fosse o Governo. Pois é esta situação que não acceito. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem. Muito bem.
O Sr. Sebastião Baracho: - O Digno Par Sr. Julio de Vilhena foi essencialmente amavel para commigo, attribuindo-me dotes e talentos que não possuo, o que não obsta a que profundamente me penhorem as suas referencias elogiosas, mormente por partirem de quem tem situação excepcional, como politico e como vernaculo cultor das letras patrias. Correspondidas, pela forma que deixo exarada, as attenções do Digno Par, dir-lhe-hei que Shakespeare tropeçava uma ou outra vez, o que não é para admirar. Homero tambem dormitava. Quer isto dizer que, comquanto eu combata sempre de frente os meus adversarios, não o faço agora com a intensidade com que o podia fazer, quando- alvejo o Governo ; e elle nada tem de me agradecer esta minha attitude. A razão é obvia. Amoldo-me para isso, pelo dito clássico da velha de Siracusa: - Pode vir outro peor.
Posto isto, notarei que o Digno Par Sr. Julio de Vilhena, ainda hoje foi