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direito. Quer dizer a reclamação é, em todo o caso, pedir justiça.

Ora, não precisavamos, nem precisa a camara de saír do proprio regulamento disciplinar em que a palavra reclamação não é empregada em outro sentido, para conhecer que não ha analogia entre as reclamações que a lei condemna, e as felicitações que são objecto da accusação ao sr. ministro.

E se é sabido que os textos de uma lei se devem entender uns pelos outros, se é sabido que as palavras antecedentes e subsequentes fixam o verdadeiro sentido dos termos; desde que se reconhecer, como é dever, a força d'esta regra, ver-se-ha que no proprio regulamento existem todos os elementos para se avaliar o que são reclamações, ao que ellas tendem, e o objecto sobre que devem versar. Desde o momento em que pelo proprio regulamento se conhecer esse principio, o principio contrario contraria manifestamente a lei. Ora vejamos o que diz o regulamento. No § 5.° do capitulo 1.°, encontra-se a disposição seguinte:

«Não é permittida reclamação ou queixa de inferior para com superior senão depois de cumprir as ordens recebidas. Se porém, independentemente da reclamação ou queixa, o inferior entender que por conveniencia do serviço, convem fazer alguma observação ser-lhe-ha esta permittida, obtendo para isso previa licença do superior se estiver presente.»

Suppõe ordens recebidas, e que estas ordens affectavam a pessoa á qual ellas tinham sido dadas, e por consequencia lhe deram o direito a reclamação ou queixa. Não basta isto, sr. presidente, os artigos 54.°, 55.° e 56.° continuam no mesmo sentido, e o artigo 51.° com igual phrase não póde ter differente interpretação, sem dar ás mesmas palavras da lei significação diversa, o que seria absurdo.

Ora, sr. presidente, depois de uma explicação tão clara, depois de se dizer de mais a mais no artigo 52.°, quaes são os objectos sobre que podem ter logar as reclamações individuaes, de uma maneira tão explicita que não deixa duvida sobre o espirito e significação da palavra reclamação, a consequencia é que não póde de maneira alguma entrar em duvida a significação d'esta palavra.

Mas, sr. presidente, não é sómente isto, para que esquecer a disposição da carta constitucional? A carta constitucional dá tambem a significação da palavra reclamação, fazendo-a sinonima de requerimentos ou queixas. Abramos a carta constitucional, no artigo 145.°, § 28.°, e ahi se diz igualmente da maneira mais explicita, que todo o cidadão tem direito de dirigir reclamações, ou requerimentos, ou queixas ao poder legislativo ou executivo.

Ora aqui tem, sr. presidente, como eu acho sem rasão estar a insistir sobre a duvida da significação da palavra reclamação, tornando-a synonyma de felicitação. Aqui esta, sr. presidente, a rasão fundamental tirada não só do sentido litteral e obvio das palavras, mas do espirito do proprio regulamento, e da carta constitucional; e este o motivo porque eu assevero que não ha a menor analogia entre o facto das felicitações e as reclamações que estas leis prohibem.

Mas, sr. presidente, se tal é a intelligencia da lei, passemos a considerar o facto, e ver se elle esta comprehendido ou não na sua disposição. Chamem-lhe protestações, chamem-lhe felicitações, chamem-lhe expressões de sentimento ou de sympathia, como quizerem, a verdade é que naquelles documentos ha felicitações de differentes maneiras, ou papeis de differente ordem: uns felicitam pelo seu despacho para general de brigada o individuo a que se tem alludido, outros felicitam-o por ser nomeado commandante geral da artilheria, e uma só vae mais adiante porque o felicita tambem pelo facto da sua eleição para deputado, e apresenta as esperanças que têem os signatarios de que elle vá promover o adiantamento da arma de artilheria, em harmonia com o progresso da epocha, confiando nas suas luzes e energia.

Dividiram-se os differentes pensamentos que têem aquellas felicitações, e ainda mais entendeu-se que a preconisação de que ali se falla, referia-se á pasta da guerra, quando unicamente se dirigiam ao eleito do povo para advogar o desenvolvimento do corpo de artilheria, e a sua prosperidade, na camara electiva.

Ora, veja V. ex.ª a differença de uma e outra cousa, e como o espirito de sophisma chega a inverter as idéas, destacando-as umas das outras.

O sr. S. J. de Carvalho: — Peço a palavra sobre a ordem.

O Orador: — Sr. presidente, terão estes documentos alguma relação com as reclamações, segundo as leis as definem no citado regulamento e artigo da carta constitucional? De certo que não, sr. presidente, porque n'este caso não se reclama contra injustiça, nem se pede justiça; o que se diz unicamente é que felicitam aquelle general pela sua elevação. Ora isto de certo não tem nada com direitos offendidos ou a reclamar.

O que elles esperam não é individual, o que elles esperam, com relação á arma de artilheria, é a satisfação do desejo commum do exercito, é a sua prosperidade e adiantamento.

E é com esta idéa de progresso, com esta tendencia que temos sempre para o melhor, e para o desenvolvimento dos corpos a que pertencem, que elles pedem ao Seu commandante que ponha em pratica toda a sua energia, talento e qualidades. E será isto crime? Ninguem, com fundamento legal o poderá asseverar.

Mas se isto não é crime, estará a irregularidade que accusam nas declarações feitas para destruir os boatos da imprensa? E que boatos? Os boatos que todos sabemos, porque todos devem ter lido e saber que se disse que a officialidade de artilheria estava disposta a fazer uma demonstração pacifica para patentear a repugnancia com que via no commando geral da arma o general que diziam carregado de graves imputações.

Ora, dados estes boatos, teriam os officiaes de artilheria o direito de reclamarem contra elles?...

O sr. Marquez de Vallada: — Peço a palavra.

O Orador: — Teriam algum obstaculo nas leis disciplinares, ou para protestarem contra similhantes boatos, ou para fazerem essa declaração pela imprensa? De certo que não. E a rasão é, porque sendo essencialmente obrigados a prestar obediencia ao seu commandante, e vendo que se propalava a idéa de que elles contrariavam esta regra de disciplina e se queria fazer com que se acreditasse que elles desconheciam a auctoridade suprema que o tinha nomeado, elles quizeram assim mostrar que eram essencialmente obedientes.

Sr. presidente, para se avaliar esta questão é preciso ter sempre em vista a ponderação dos poderes, é preciso reconhecermos e reflectirmos que estamos n'um governo mixto, aonde a divisão e a harmonia dos poderes é a base fundamental do systema.

Pelo artigo 75.°, § 5.°, da carta constitucional, compete ao poder executivo, note-se bem, nomear os commandantes das forças de terra e de mar, e demitti-los quando o bem do estado assim o pedir. Nomeado o general alludido para o commando geral de artilheria, qual era a obrigação dos officiaes? Prestar-lhe obediencia, e não só obediencia, mas consideração e respeito, porque são estes os principios fundamentaes da disciplina militar; mas os principios fundamentaes que estão não só estabelecidos no n.° 6.° dos artigos de guerra, mas até no proprio regulamento disciplinar, que não é mais do que o desenvolvimento d'essa mesma materia.

Diz elle a este respeito: capitulo I, n.° 3.

«A subordinação constitue a essencia do serviço militar. A obediencia dos inferiores para com os superiores fórma a base da subordinação. N.° 4. Todo o militar é obrigado a obedecer promptamente ás ordens dos seus superiores, concernentes ao serviço, executando-as literalmente sem a minima hesitação ou replica.

Mas, será sómente isto? Muito mais do que isto, sr. presidente, o n.° 14 diz: «Alem da subordinação no que toca ao serviço militar, os superiores tem direito á consideração e respeito dos inferiores em toda a situação.

Aqui se vê pois que os officiaes, nomeado o seu commandante geral, quem quer que fosse, em virtude do exercicio do poder soberano, não tinham só de prestar-lhe obediencia, tinham de prestar-lhe consideração e respeito; e consideração e respeito em qualquer situação que elle estivesse, mesmo no que não fosse tocante ao serviço militar, porque assim o diz o n.° 14 do mesmo regulamento.

Ora, sendo isto assim, sr. presidente, obrariam os officiaes de artilheria em harmonia com esta disposição e com o proprio artigo da guerra? Que fizeram elles naquellas representações, visto que "lhe querem dar este nome? Não foi senão protestar-lhe obediencia, e é o que mandam os artigos de guerra, não foram senão prestar homenagem e consideração, diz o regulamento disciplinar, e por consequencia estão no espirito das disposições da lei. E se não podiam ser censurados, visto que se conformavam com a lei, não ha duvida que o motivo que se tira d'aqui para censurar o sr. ministro, é perfeitamente fóra da hypothese, é perfeitamente fóra da lei, porque aquelles militares tinham procedido em conformidade com ella. Não foram reclamar, não iam reclamar cousa alguma, iam unicamente satisfazer a um dever de cortezia, de respeito, de homenagem, que lhes prescrevia o regulamento disciplinar (apoiados).

Quando pois, sr. presidente, n'este ponto se quer fazer uma censura ao sr. ministro, como réu de lesa disciplina, fere-se não sómente o espirito da lei, mas até a sua letra, porque aqui não ha a menor infracção de nenhuma das prescripções disciplinares, nem tão pouco dos artigos de guerra. Conhece-se isto perfeitamente, e por isso é que appellei para a ordem do dia, a que ha pouco me referi, que não tem, como demonstrei, a menor analogia com o objecto em questão.

Sr. presidente, parece-me ter demonstrado o nenhum fundamento do primeiro ponto de accusação; parece-me ter demonstrado que as reclamações prohibidas no regulamento, que é o ponto a que me propuz, não são de maneira nenhuma as representações ou felicitações de que se faz menção, porque estas não são senão actos particulares, que não têem absolutamente nada com o serviço militar. Creio tambem ter demonstrado que a ordem do dia não póde ser chamada para esta questão, e que pelas proprias disposições expressas do regulamento disciplinar não devem ser censurados os officiaes de 'artilheria, e que elles só obraram no rigor da letra d'aquelle regulamento, fazendo as demonstrações de sympathia ao seu commandante; e sendo assim, o sendo de não terem sido reprehendidos que se deduzia a culpa com que se queria censurar o illustre ministro da guerra, esse crime ou essa culpa desappareceu, porque a materia d'ella não só não é criminal, mas esta em conformidade com a lei.

Vamos portanto ao 2.° ponto.

Sr. presidente, eu não nego, antes confirmo, que o decreto de 2 de outubro de 1863 estabeleceu no artigo 6.°, depois de ter creado as medalhas, a que se refere, que um regulamento estabeleceria o modo pelo qual essas medalhas haviam de ser conferidas, e bem assim o modo ou os casos em que podiam ser concedidas. Não nego, antes confirmo \ igualmente, que em conformidade com este artigo se publicou primeiramente o regulamento de 26 de janeiro de 1864, e que depois este regulamento foi substituido pelo outro de 22 de agosto do mesmo anno, com a differença, alem de outros pontos importantes, de que no primeiro regulamento, tratando-se no artigo 2.° de dar a commissão ao supremo conselho de justiça militar, para consultar sobre o direito á medalha, segundo as regras ali estabelecidas, se acrescentava tambem que o supremo conselho de justiça militar era o unico e exclusivamente competente para a classificação das medalhas; emquanto que no artigo 2.° do regulamento de 22 de agosto, conhecendo-se melhor, com todo o fundamento, a natureza do poder executivo com relação a este objecto, e querendo-se por assim dizer condemnar o erro palmar que se tinha commettido no primeiro decreto, dando áquelle conselho attribuições que estavam em contradicção com os principios fundamentaes do nosso systema; no 2.º decreto, digo, no mesmo 2.° artigo, se estabeleceu a consulta, mas unicamente a consulta simples.

Eis-aqui esta a differença, differença que logo justificarei e demonstrarei á vista de todos; porque nem mesmo na infancia da sciencia administrativa se tinha commettido um erro como este do primeiro regulamento. Erro, comtudo, que tenho aqui visto sustentar, o realmente, não sei como se possa no parlamento portuguez, em 1860, desconhecer o que foi tratado com a maior proficiencia em 1845, por occasião da 'discussão da lei do conselho d'estado de 3 de maio de 1845, e que depois foi continuado numa discussão séria perante uma commissão, aonde estavam homens tão eminentes como o sr. cardeal patriarcha Guilherme, Rodrigo da Fonseca Magalhães, Ottolini, Felix Pereira de Magalhães, e não nomearei agora outros que ali igualmente se achavam.

Sr. presidente, ha uma perfeita equivocação no modo de avaliar esta questão, e é preciso portanto que se entre mais de espaço na materia, para se conhecer qual é a verdadeira natureza do poder executivo com relação a este assumpto, e se elle porventura tinha o direito, que aqui já se negou, de poder fazer aquelle decreto. O que significa aquelle decreto? Até onde se póde estender a acção do governo? Como será applicavel o que, o orador que acabou de fallar, expendeu com a auctoridade da doutrina de Borges Carneiro? O digno par verá a condemnação do que affirmou com esta auctoridade, no proprio auctor que leu.

Sr. presidente, o poder executivo tem attribuições as quaes nenhum poder ordinario lhe póde coarctar. Póde o poder constituinte modifica-las, mas o poder legislativo ordinario não tem nada com ellas. E preciso que se cumpram na sua letra, e o poder executivo, obrando dentro da sua esphera, não tem que dar conta a póder algum, salvo o caso de abuso, sujeito ao principio da responsabilidade.

O artigo 75.°, § 11.°...

O sr. Ferrão: — Peço a palavra.

O Orador: — Peço tambem a palavra.

O sr. Aguiar: — Tambem peço a palavra. I O sr. Rebello da Silva: — Peço a palavra sobre a materia.

O Orador (proseguindo): — O artigo 75.° e o § 11.° diz: «E attribuição do poder executivo conceder titulos, honras, ordens militares e distincções em recompensas de serviços feitos ao estado.» Esta attribuição seria illusoria se porventura estivesse separada ou se podesse separar da idéa da instituição ou creação. Mas pela lei e pela carta se demonstra á evidencia que o podér executivo não só póde conceder estas distincções, mas até crealas, porque n'aquella palavra se envolve uma e outra idéa, o que vou demonstrar pela mesma carta de uma maneira clarissima.

O citado artigo 75.°, § 11.0, diz: «Conceder titulos, honras, etc...»

Até aqui não temos a menor coarctada ao exercicio da attribuição do poder executivo. Quando é que estabelece essa coarctada? Nas palavras seguintes: «Dependendo as mercês pecuniarias da approvação das côrtes, quando não estiverem já designadas ou taxadas por lei. »

Só quando se tratar das mercês pecuniarias, é então que, em consequencia, do grande principio de que o parlamento é o fiscal da bolsa do povo, não se póde de maneira nenhuma deixar de ir buscar a sancção do parlamento, e isto é tanto assim, que quando a carta, com relação ao poder executivo, quer coarctar algumas attribuições, designa-as expressamente: tal é o que se acha no § 10.°: «Conceder cartas de naturalisação na fórma da lei. »

Aqui é que não póde deixar de se seguir o que esta determinado na lei, mas fóra d'este caso, e tem todas as outras attribuições, esta o poder executivo na plenitude das suas funcções.

Ainda ha mais disposições que esclarecem o objecto. São os §§ 8.° e 14.° do mesmo artigo com relação aos tratados e convenções. Ao poder executivo competia até ao acto addicional esta attribuição, visto que não era limitada por lei em toda a sua amplidão, menos se se tratasse de alienação de territorio, e foi preciso que viesse o acto addicional, no artigo 10.°; para coarctar esta attribuição, que não podia ser coarctada senão pelo poder constituinte. Assim coarctou, não sómente o que estava determinado no § 8.°; mas igualmente o que estava no § 14.°, que tinha relação com as convenções ecclesiasticas, bulas, etc... Vemos portanto, que é da primeira evidencia que o poder executivo concedendo honras, distincções e titulos, esta exactamente na plenitude dos seus direitos, e sómente quando se tratar de mercês pecuniarias é que entra a prohibição, pelos principios que indiquei. Disse-se aqui = que o poder executivo não tinha esse poder =, e até se negou a auctoridade ao decreto, e foi-se para isso buscar, saíndo -da propria letra do artigo 75.° § 11.0 da carta, a disposição do artigo 145.° §§ 12.° e 26.° da mesma carta.

Sr. presidente, não é necessario mais para responder ao digno par que fallou sobre esta materia do que dizer que aquelles dois §§ estão debaixo da epigraphe dos direitos civis, individuaes e politicos, e não têem absolutamente relação com as attribuições dos poderes, politicos, que giram em esphera differente. Emquanto áquelles effectivamente ninguem póde ir requerer qualquer distincção a que não te-