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gmento dos ordenados. Se o projecto for approvado, claro é que fica mantida a verba de receita tal como se acha no projecto a que alludo.
Que importa pois manter ou eliminar simultaneamente da receita e da despeza uma verba igual? Poderá esta operação affectar a significação financeira do projecto, cujas disposições permanecerão incolumes ou ella se realise ou não?
Eu creio, sr. presidente, que isto se reduz a um processo de simplificação adoptado todos os dias nas operações algébricas, o qual consiste em eliminar a mesma quantidade affectada de signaes oppostos em qualquer membro da equação (apoiados).
Entendo pois que nenhum fundamento póde estorvar o adiamento que se propõe, e por estas breves mas procedentes considerações votarei contra a proposta.
O sr. Presidente: — Ninguem mais tem a palavra sobre esta questão previa. Vou por consequencia consultar a camara sobre a approvação ou rejeição do adiamento do projecto de lei que estava dado para ordem do dia.
O sr. Miguel Osorio: — Não posso deixar de pedir ainda a V. ex.ª que me conceda a palavra.
O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par.
O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, o digno par e meu illustre collega, o sr. visconde de Algés, não alterou em nada o meu modo de ver a questão. Não fallarei agora sobre a utilidade ou inutilidade dos documentos que requeri da repartição dos negocios estrangeiros, apesar do digno par dizer que elles eram mais uteis antes de apparecerem do que depois de terem apparecido, e não sei se esta apreciação se póde fazer, porque ainda não vi esses documentos nem quero interromper a discussão pedindo a sua leitura para conhecer se elles são inuteis. Eu repito á camara e ao digno par que são uteis; mas agora não sei a que vem que o orador esteja a insistir na inutilidade dos documentos, a não ser por nimio desejo de se conformar com a opinião do sr. ministro dos negocios estrangeiros, e sobre esta apreciação de utilidade ou inutilidade não direi mais nada; porque, se a insistencia sobre a inutilidade do pedido vem desfarçadamente referir-se á incapacidade de quem os pediu, eu escuso que o digno par me lembre o que sou o primeiro a reconhecer porque não venho aqui com a vaidade de illustrar a camara, nem pretendo que os documentos a illustrem, illustram-me porém a mim e esclarecem-mo a questão, ou pelo menos supponho assim.
Para isso é que peço os documentos que entendo que são necessarios para meu esclarecimento, e a camara poderá julga-los uteis ou inuteis. A minha consciencia é a unica bitola que me regula para entrar em qualquer discussão com a franqueza, com a lealdade e com o habito que tenho de não votar nenhuma medida de interesse publico sem ter pleno conhecimento d'ella, e já lhes acho merecimento pela difficuldade que o governo mostrou em os trazer e a insistencia da sua inutilidade que faz o digno par defensor do governo.
Peço desculpa a V. ex.ª e á camara de ter levantado a minha voz n'esta occasião, porque me pareceu que se lançava sobre a minha individualidade, perante um corpo respeitavel, a invectiva de inutilidade. Eu reconheço o, como já disse, e tomára que as portas d'esta casa se rasgassem para dar entrada a todas as capacidades do paiz, e que se fechassem para as inutilidades, como eu; declaro que não faria diligencia para tornar a entrar no parlamento, nem pelo suffragio nem por outro qualquer meio, pelo conhecimento que tenho de mim e pela repugnancia pela vida politica, e se não tivesse herdado esta cadeira de certo não entrava n'esta camara; já tenho repetido isto, mas o direito que tenho a vir aqui não é só uma prerogativa, é uma obrigação; procuro desempenhar-me d'ella como entendo, e se me falta muito para o poder fazer cabalmente, o que me não falta é desassombro e independencia para seguir os dictames da consciencia.
Mas, sr. presidente, disse o digno par que a operação é muito simples, que é uma questão muito facil, porque cessa a receita por outra despeza, e como ha de cessar a despeza? Ha de ser por uma lei.
Se nós já votámos uma lei de despeza, e que os ordenados serão com essa retribuição designada; e já votámos que a despeza da secretaria será n'aquella cifra, e se já votámos que o governo estava auctorisado para adoptar as alterações que julgasse convenientes, e que não devia exceder a verba de 362:236$968 réis, eu propunha que fosse antes 362:236$960 réis para arredondar esta verba, porque este calculo de 68 réis é curioso, e se o governo não póde exceder essa quantia, ha de propor uma lei em que diga — que se diminue na despeza 5:000$000 réis que vós não quizestes approvar na sessão passada. Ora o que me parece logico é esperarmos por esses 5:000$000 réis.
Eu desde já declaro á camara, e não tenho duvida em o declarar, porque tambem estudei já a materia, e hei de votar pela lei, porque acho melhor a reforma do que a organisação que existia; mas não se segue que todos os dignos pares estejam d'esta opinião, ou pelo menos o governo injuria o parlamento em contar com o seu voto antecipadamente, ou em tentar coagi-lo depois por terem já votado esta lei. A logica está no adiamento.
Talvez que o digno par o quizesse considerar como manejo de opposição, como obstaculo que se pretendia crear ao governo.
Disse s. ex.ª que ha pouco se pediu o adiamento, allegando a falta de um documento; e permitta-me s. ex.ª que lhe diga que eu não pedi cousa alguma. Eu disse apenas que tencionava propor o adiamento, e logo que o sr. ministro appareceu pedi-lhe immediatamente que fallasse antes de fazer a minha proposta, porque previ que s. ex.ª apresentaria o documento, e não haveria necessidade de propor
o adiamento por esse motivo. Ora eu creio que quem anda com esta franqueza não póde ser taxado de opposição acintosa, porque quem a quer fazer esconde-se e as suas propostas, não as declara com tanta antecipação e não procede como eu procedi.
Não faço pois opposição acintosa nem ao projecto nem ao governo; não se trata aqui nem do governo nem da conveniencia ou inconveniencia do projecto; trata-se da regularidade dos trabalhos d'esta casa do parlamento, porque assim tornaremos cada vez mais reconhecida a necessidade da existencia d'este corpo.
Concluo dizendo que foi este o intuito com que propuz o adiamento, e não farei mais observações para não fatigar a camara, a quem agradeço a attenção que me prestou, não ao orador, que não a merece, mas ao assumpto de que fallei.
O sr. Visconde de Algés: — Direi apenas duas palavras, não para acentuar mais a minha opinião já proferida contra o adiamento, mas para estranhar que o digno par e meu antigo amigo, o sr. Miguel Osorio, se agastasse tanto com as palavras inoffensivas que proferi.
Se a palavra trahiu a minha intenção, o que me inclino todavia a não suppor, parece me que as nossas antigas relações eram penhor bastante para assegurar a innocuidade internacional com que fallei. Agora quanto a mim não posso deixar de estranhar queo digno par attribuisse ao desejo de me conformar com a opinião do sr. ministro dos negocios estrangeiros a apreciação que fiz da utilidade do documento que s. ex.ª requisitára. Se duvidei da utilidade do documento a que alludo, é porque tendo estudado a materia do projecto, a que elle se refere, e conhecendo tambem a materia do documento, parece-me que estava habilitado a apreciar a sua utilidade sem recorrer ás faculdades do sr. ministro dos negocios estrangeiros, que para mim são de grande auctoridade, mas que não supprem as minhas, porque nada as póde supprir na determinação da minha vontade com respeito á formação do meu juizo e á emissão do meu voto.
Pareceme que os precedentes da minha breve carreira politica não conferem a ninguem o direito de attribuir a manifestação de minhas opiniões a outro estimulo que não seja o juizo que fórmo do assumpto submettido á consideração dos poderes publicos (apoiados). E visto que o digno par estranhou que eu duvidasse da utilidade do seu documento, agora direi mais, não só duvido, mas tenho por certo que o documento não só é inutil mas inutilissimo, como no acto da discussão terei ensejo de demonstrar n'esta casa.
Quanto á insistencia repetida pelo adiamento, mantenho a opinião que primeiro emitti; seja qual for o exito d'esse outro projecto a que o digno par allude, as disposições do projecto que hoje deve entrar em discussão não podem soffrer a minima alteração. Não me detenho no desenvolvimento d'esta proposição, porque já disse em sua demonstração quanto é bastante para se conhecer a improcedencia das considerações com que se pretende reforçar a proposta do adiamento.
O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, eu desejava propor á camara um alvitre que satisfará, a meu ver, todas as exigencias.
Por mais esforços, que se façam para discutir o adiamento, sem se entrar no merito da reforma, a que elle se refere, parece me que será impossivel consegui-lo.
Pedia eu pois que se discutissem conjunctamente a proposta de adiamento, e o projecto dado para ordem do dia.
Quando esta discussão estiver fechada, V. ex.ª porá á votação em primeiro logar a proposta de adiamento, e em seguida o projecto, se aquella proposta for rejeitada.
Parece-me, sr. presidente, que d'esta maneira poupamos muito tempo, e a discussão será mais proficua.
As considerações, que foram apresentadas pelo digno par o sr. visconde de Algés, só podem servir para justificar a proposta de adiamento. S. ex.ª disse que, se a proposta que diz respeito aos emolumentos não for approvada, é necessario alterar o projecto que esta em discussão; já se vê que este argumento é em favor da proposta do digno par o sr. Miguel Osorio; ou então não percebi bem o que o digno par disse; mas parece-me que foi isto, pouco mais ou menos. Por consequencia, para nos não expormos a votar disposições, que tenhamos de modificar ámanhã, e não sei mesmo como o poderiamos fazer; porque, quando se fixam no projecto os ordenados dos empregados, é contando que não recebem emolumentos, mas se esse projecto que vae fazer reverter para o estado todos os emolumentos não for approvado, os empregados do ministerio dos negocios estrangeiros terão direito a perceber os ordenados que n'este projecto se fixam, e juntamente os emolumentos, o que de certo não é a intenção do sr. ministro, e julgo que de ninguem; para não nos expormos, digo, a votar o que não queremos votar, parece-me conveniente, que demos á discussão do adiamento toda a latitude; o que só se poderá conseguir entrando largamente na apreciação da reforma, a que o adiamento se refere.
Peço pois á camara que concorde em que esta proposta de adiamento entre em discussão, juntamente com o projecto; porque só depois d'essa discussão é que me parece que a camara estará habilitada a votar pro ou contra o mesmo adiamento. Se este for rejeitado, V. ex.ª porá então á votação o projecto.
O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, começarei pedindo desculpa a V. ex.ª e á camara por ter de tomar novamente a palavra sobre este assumpto, e em seguida peço tambem licença para me referir ao que acabaram de dizer os dignos pares, conde d'Avila e visconde d'Algés.
Em quanto ás expressões que me, dirigiu o digno par visconde d'Algés, direi eu que, s. ex.ª tendo explicado o sentido em que empregou as suas palavras, eu não tenho duvida em me dar por satisfeito e em declarar tambem a s. ex.ª que não foi intenção minha apreciar desfavoravelmente o caracter de s. ex.ª a quem ha muitos annos estimo e considero, dando assim por terminado este incidente com a lealdade com que se terminam entre cavalheiros.
Agora, sr. presidente, folgo muito que o digno par o sr. conde d'Avila não achasse inconveniente algum no adiamento que por mim foi proposto, e ser aliás s. ex.ª um dos membros da commissão; bom é que vozes mais auctorisadas do que a minha o venham assim confirmar; e eu para fazer a vontade aos defensores do governo estava quasi a desistir d'elle, porque principiava a acreditar que elle iria prejudicar os negocios publicos e a salvação do estado.
Como porém o digno par conde d'Avila veiu em meu auxilio, e as considerações que s. ex.ª fez são a explicação do adiamento que propuz, eu declaro que aceito a proposta do digno par, porque com ella póde continuar a discussão para o projecto ser devidamente apreciado pela camara, ao passo que elle não póde ser approvado sem que primeiro seja votado o adiamento. Por consequencia, visto queo adiamento em nada vae prejudicar o projecto, por isso que juntamente com elle vae ser discutido; visto que temos por penhor que havemos de caminhar com prudencia e cautela, para que se não altere ámanhã o que hoje votarmos; declaro que me conformo inteiramente com a proposta do digno par conde d'Avila; e antes da votação do projecto de lei hei de propor que o adiamento seja posto á votação, apesar de que esta disposição póde dar mau resultado e me não parece muito conforme com o nosso regimento.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. presidente, parecem as opiniões concordes sobre esta questão que ao principio se affigurava com aspecto grave.
Não ha duvida que em certas disposições da lei o projecto tem relação com outro que está pendente. É difficil que esta circumstancia se não repita em quasi todos os projectos de lei que devem ser submettidos ao parlamento. Para não succeder assim, era necessario proscrever a logica, proscrever a synthese, proscrever o nexo na legislação. Se adiássemos por taes motivos, adiariamos hoje este por causa do outro, ámanhã o outro por causa d'este.
Sr. presidente, a rasão que se apresentou não é motivo para adiamento. Eu concordo com a moção do meu digno amigo, o sr. conde d'Avila, para que se discuta conjunctamente cora o adiamento o projecto.
Mas o que era logico era que se propozesse quando se votasse este projecto, na parte em que se ligam os dois projectos, que é apenas nos vencimentos dos officiaes de secretaria, que ficasse subordinada esta unica parte á approvação do outro projecto.
A logica é boa, sr. presidente, mas ha tambem uma logica politica que é necessario não esquecer. O governo não têm empenho algum em que este projecto seja approvado antes de outro qualquer, e eu declaro, por parte do governo, que, se a camara se julgar habilitada desde já a entrar na discussão do parecer que foi mandado para a mesa pelo sr. Braamcamp, não me opporei. O que me parece inconveniente é o adiamento permanente, o adiamento por todos os pretextos, é a perda de tempo que a camara precisa dispender na resolução de negocios graves.
Entremos por uma vez nas discussões serias, porque não é possivel adiar um dia o projecto, interpretando largamente as disposições do regimento para que se espere tantos dias depois de distribuido; adiar depois porque tal disposição prende com outro projecto; adiar ainda este porque o parecer não esta impresso. Não é util á causa publica que os negocios pendentes e que são de gravidade sejam adiados com pretextos taes. Perderíamos assim tempo sem fazer nada, e o tempo é precioso e devemo-lo ao paiz, que aprecia estes methodos dilatorios e comprehende o que significam. Não os aceita o governo.
O governo esta prompto a discutir o projecto. O governo esta ancioso pela discussão. O governo empenha-se em que comecem a desfilar esses exercitos numerosos de objecções que hão de fulminar esta desgraçada proposta.
O governo não recua diante da discussão; provoca-a porque não deseja vencer pelos votos apenas, mas pela rasão que esta do seu lado, que ha de provar-se á luz da evidencia. Não teme quem de si esta seguro. Venha pois a discussão, e venha ampla, franca, clara, prompta.
O sr. Presidente: — Não sei o que hei de pôr á discussão.
O sr. conde d'Avila lembrou, e o auctor da proposta de adiamento conveiu, que ficasse em discussão o adiamento conjunctamente com o projecto dado para ordem do dia.
Parece-me que não sairei das minhas attribuições, dizendo que póde acontecer que, continuando a discussão do adiamento conjunctamente com o projecto, leve esta discussão muitos dias terminando então pelo adiamento da materia proposta.
O sr. Conde d'Avila: — Se V. ex.ª me dá licença, eu explico a minha proposta.
O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu peço a V. ex.ª que mande ter a proposta do sr. conde d'Avila, porque a não ouvi.
O sr. Presidente: — O sr. conde d'Avila não mandou a proposta por escripto, e sim offereceu o alvitre de que se discutisse conjunctamente com o projecto o adiamento proposto pelo sr. Miguel Osorio.
O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, a proposta, que eu tive a honra de fazer á camara, de se discutir conjunctamente o adiamento proposto pelo digno par, o sr. Miguel Osorio, com a reforma a que elle diz respeito, tem sido adoptada em casos analogos, e sempre com vantagem, na outra casa do parlamento, onde tive a honra de ter assento durante vinte e sete annos. Parece-me que o mesmo tem tido já logar n'esta camara com feliz resultado.
O sr. ministro dos negocios estrangeiros manifestou o de