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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 22 DE FEVEREIRO DE 1867

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE LAVRADIO

secretarios os dignos pares

Marquez de Sousa

Conde d'Alva

As duas horas e meia, estando prementes 47 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente sessão, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

(Entrou o sr. ministro das obras publicas.)

Não houve correspondencia.

O sr. Presidente: — Vae ter se na mesa um projecto de lei que foi approvado com algumas alterações. Leu-se na mesa.

Será remettido á camara dos srs. deputados.

O sr. Miguel Osorio: — Se. presidente, antes de expor a V ex.ª o motivo por que pedi a palavra, paço tenha a bondade de dizer se pela secretaria dos negocios estrangeiros já foram remettidos a esta camara os documentos estatisticos que eu pedi por um requerimento que foi auctorisado por esta camara. Eu peço isto porque V. ex.ª sabe que aqui nada se ouve a respeito do expediente da mesa, porque entre nós e a mesa ha, por assim dizer, um abysmo, nada se ouve,; -póde portanto muito bem ser que esses documentas tivessem sido lidos, mas que eu nada ouvisse.

O sr. Presidente: — O requerimento de V. ex.ª foi remettido ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, com urgencia, mas até agora ainda se não recebeu na mesa resposta alguma. E provavel que o sr. ministro compareça á sessão e s. ex.ª então explicará a V. ex.ª os motivos que o levaram a não enviar os documentos que V. ex.ª requereu. E isto o que posso informar.

O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, visto que o sr. ministro ainda não mandou resposta alguma, e como elle não está presente e não póde deixar de comparecer, visto que se trata de um objecto importante da sua repartição, parece-me conveniente que esta camara sobreesteja na resolução tomada de entrar já na discussão até que s. ex.ª compareça e declare os motivos por que estes documentos ainda não foram enviados, não podendo assim cumprir uma obrigação qu lhe impõe o direito que nós temos de pedir esclarecimentos e quaesquer explicações. Peço isto a fim de ouvir as explicações que s. ex.ª deve dar.

(Pausa.)

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas.

(Entra na sala o sr. ministro dos negocios estrangeiros.)

O Orador: — Peço perdão a V. ex.ª, eu ainda não terminei; estou apenas esperando que o sr. ministro dos negocios estrangeiros, que acaba de entrar na sala, tome o seu logar, a fim de poder ouvir o que eu tenho a dizer.

A camara desculpará que eu repita o que ha pouco acabei de dizer, visto estar presente o sr. ministro, cuja attenção peço. Tinha eu perguntado a V. ex.ª se já tinha vindo alguma resposta do ministerio dos negocios estrangeiros com relação a um pedido que fiz, a respeito de documentos estatisticos sobre consultas feitas ao procurador geral da corôa ou a quaesquer advogados; estou bem certo que s. ex.ª tem sido solicito em cumprir este dever e em satisfazer ao meu requerimento, mas como ainda não chegasse participação alguma, na ultima sessão indiquei o caminho mais proximo para se poderem obter os taes documentos, e visto s. ex.ª dizer que os registos do ministerio dos negocios estrangeiros não estavam completos, perguntarei agora a a. ex.ª — se é impossivel obter ou não esses documentos?

Eu peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para fazer algumas considerações logo que o sr. ministro se digne responder-me.

O sr. Presidente: — O digno par o sr. Miguel Osorio perguntou se o sr. ministro já tinha respondido ao pedido que s. ex.ª tinha feito. Disse eu que V. ex.ª ainda não me tinha remettido os respectivos documentos, e o digno par replicou, asseverando que se a mesa não tivesse recebido esses documentos proporia o adiamento do projecto dado para ordem do dia.

O sr. Miguel Osorio: — Para que eu possa insistir ou deixar de insistir na idéa de propor o adiamento é que eu desejo ouvir o sr. ministro, e por íbso peço a V. ex.ª que me conceda a palavra para fazer algumas considerações logo que o sr. ministro se digne responder.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Andrade Corvo): —Tinha pedido a palavra, sr. presidente, na ausencia do sr. ministro dos negocios estrangeiros; mas vi-to o meu collega achar-se presente s. ex.ª dará as explicações necessarias.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Casal Ribeiro): — Quando V. ex.ª achar que é occasião...

O sr. Presidente: — Tem o sr. ministro a palavra.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. presidente, folgo de ter ouvido ao digno par o sr. Miguel Osorio os termos cortezes e moderados com que insistiu no seu requerimento, ao qual eu vou satisfazer na parte que é possivel com o documento que mando para a mesa. Repito, folgo de ter ouvido as phrases que s. ex.ª proferiu, pois que por ellas vi que fui mal informado quando alguem me disse que na ultima sessão d'esta camara estando eu ausente, me foram por s. ex.ª dirigidas fortes censuras. Agora porém creio que as não fez, porque se o digno par as tivesse feito na minha ausencia de certo as renovaria na minha presença.

Emquanto ao documento que o digno par pediu, não o apresentei ha mais tempo porque só hontem á tarde o recebi; é uma synopse tal qual se póde obter na secretaria a meu cargo e que consta dos negocios que nos ultimos tres annos foram remettidos, para serem consultados, ao procurador geral da corôa, e digo consta, porque não posso responder pela completa exactidão d'esta estatistica visto ser ella tirada das minutas que ainda não estão completamente registadas.

Não é possivel satisfazer do mesmo modo á segunda parte do requerimento do digno par, porque consta e é certo que por varias vezes e em diversos casos têem sido consultados advogados ou fiscaes da corôa junto de outros ministerios; porem ordinariamente essas consultas têem sido vocaes, ou entregando-se os processos em mão, não existindo portanto documentos a este respeito.

Eu pela minha parte declaro que tenho ouvido muitas vezes e sobre diversos casos o ajudante do procurador geral da corôa junto ao ministerio das obras publicas, funccionario intelligente e zeloso, e que estou certo que todos que têem estado n'aquella administração reconhecerão quanto aquelle funccionario tem contribuido para estabelecer nas administrações a que corresponde regras fixas e tradições de decidir conforme ao direito e ao interesse publico.

(O sr. Ministro das Obras Publicas: — Apoiado.)

Todas as vezes que o tenho ouvido sempre tem sido vocalmente.

Por consequencia, emquanto a esta parte não se póde satisfazer, nem agora nem depois, porque é impossivel pelas

considerações que

O sr. Presidente: — Os dignos pares que desejem examinar os documentos que o sr. ministro dos negocios estrangeiros acaba de enviar para a mesa poderão faze-lo, porquanto para esse fim estão aqui patentes.

O sr. Miguel Osorio: — Folgo muito que o sr. ministro dos negocios estrangeiros tivesse occasião de me ouvir repetir na sua presença o que disse na sua ausencia. Agradeço a s. ex.ª a remessa do documento; eu muito estimo, e não duvido da promptidão e solicitude que s. ex.ª emprega nos negocios a seu cargo, estimo que chegasse esse utilissimo documento, e tambem repetirei a phrase de utilissimo, porque, se não é util para s. ex.ª, é-o para mim, e assim como s. ex.ª o póde taxar de inutilidade, eu tenho o direito de o reputar util e muito util.

Emquanto ao que disse na ultima sessão, V. ex.ª e a camara poderão attestar se me excedi, ou se pronunciei uma só palavra que podesse ser offensiva ao sr. ministro, ou a pessoa alguma. Eu não sou forte nas lutas parlamentares, faltam-me todos os recursos para entrar n'ellas; mas a camara sabe perfeitamente que eu nunca me costumo esquecer do que devo aos demais membros da camara, e do que devo ao governo, por isso mesmo que sei o que devo a mim proprio.

Eu disse, e repito agora, que sentia a ausencia do governo na sessão passada, e que portanto me via forçado a fallar na sua ausencia; isto, sr. presidente, não era uma censura, mas sim o desejo que tenho de ver presente a s. ex.ª; da minha parte era isto uma prova de deferencia cavalheiros a o não querer levantar a minha voz na ausencia do sr. ministro.

Estas considerações que fiz, e que eram baseadas em factos verdadeiros, serviram para fundamentar a necessidade que tinha de usar da palavra na sua ausencia. Foi isto o que eu disse, e ahi estão os srs. tachygraphos que podem apresentar as suas notas, e pelas quaes se verá se eu estou faltando á verdade. Eu disse que sentia que o governo não estivesse presente, mas fui o primeiro a dizer que fazia a s. ex.ª a justiça de acreditar que, se me não tinham sido enviados os documentos que pedi, não era sem duvida por desprezo para com esta camara; mas o facto era que não estavam presentes os documentos nem os ministros, e que portanto me via forçado a fallar na sua ausencia.

Eu bem sei que o sr. ministro dos negocios estrangeiros reputa como inutilissimo o documento que pedi, mas esta classificação de inutilissimo, que ao documento dá s. ex.ª, não lh'a dou eu ainda hoje, nem lh'a darei emquanto o não vir.

Por essa occasião disse eu tambem o que agora repito, que tencionava propor o adiamento da questão até que chegassem os documentos que pedi; ora creio que n'isto não ha apreciação alguma desfavoravel a respeito do sr. ministro nem dos seus collegas. S. ex.ª declarou que, se não tinha comparecido, tinha sido porque a isso o obrigaram outros negocios, o mesmo fiz eu notar á camara, e se me referi ao tempo em que se accusavam os ministros por não comparecerem, foi para me felicitar de que acontecendo isso agora a camara seja mais tolerante de que o foi então, e ainda bom que já se reconhece que os srs. ministros pódem estar ausentes das suas cadeiras, sem que deixem por isso de desempenhar os seus deveres, desculpando-se lhes portanto as suas faltas. Foram estas as minhas palavras tendentes tambem a mostrar a logica com que eu, na ausencia dos ministros, de que era presidente um digno par que n'este momento vejo na sua cadeira, refiro-me ao sr. duque de Loulé, os defendia quando se levantavam questões para os aggredir na sua ausencia por não comparecerem, pretendendo-se que deixassem todos os negocios para se apresentarem n'esta camara; foi portanto alludindo a este facto, que disse que folgava de ver que a camara reconhecia que os srs. ministros podiam estar em outro local que não toste a camara, sem que deixassem por esse facto de estar desempenhando os seus deveres.

Eu pedia d'esta fórma desculpa aos srs. Ministros de fallar na sua ausencia; mas não lhes fiz a menor injuria, nem dirigi a menor censura ao governo, não porque não tenha a coragem de lh'as fazer, mas porque só as farei quando a justiça e a causa publica o exigirem; longe portanto de se queixar, o governo devia agradecer as minhas attenções.

Agora, sr. presidente, vou propor ainda o adiamento da questão que é dada para ordem do dia de hoje...

Uma voz: — Ainda se não entrou na ordem do dia.

O Orador: — Eu bem sei, meu illustre collega, que ainda sé não entrou na orlem do dia; mas parece-me esta uma questão previa, e por isso passo a propo-la antes.

O sr. Presidente: — Se V. ex.ª me dá licença observarei parecer-me regular que, quando se proclamar a entrada na ordem do dia, o digno par então peça a palavra para apresentar a sua proposta.

O Orador: — Em attenção á observação de V. ex.ª, eu pedirei então a palavra quando se passar á ordem do dia.

O sr. Presidente: — Cumpre-me dizer que na ultima sessão, quando s. ex.ª, o sr. Miguel Osorio, fallou não ouvi nenhuma expressão na qual s. ex.ª offendesse o sr. ministro dos negocios estrangeiros, porquanto, se tal expressão se proferisse, seria eu o primeiro a advertir s. ex.ª, o ora

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dor. Sei que todos os dignos pares prestam a attenção devida aos nossos collegas e aos ministros da corôa.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. presidente, eu não tenho felizmente nada, nem uma palavra, nem um ponto, nem uma virgula, a acrescentar ou a cortar ao que já esta dito. Direi unicamente, em attenção ao que V. ex.ª acaba de declarar, que eu não attribui ao digno par nenhuma expressão offensiva, disse que tinha sido informado de que houvera censura, e entre censura ao ministro e offensa ha differença grande. Tinham-me dito que o digno par me tinha censurado na ausencia, o que vejo que não é exacto, porque o diz o digno par, e logo que o digno par assim o declarou eu deixei de suppor que houvesse censura nas palavras que 8. ex.ª aqui proferiu na ultima sessão. Quanto ao adiamento, como não esta agora em discussão, não entro na apreciação d'elle.

Quanto aos documentos, reservo a sua apreciação para a discussão do projecto.

Quanto á minha presença, ou dos meus collegas na camara, comparecemos sempre que a nossa presença é reclamada, e pela minha parte tenho estado aqui em quasi todas as sessões, e se não estive presente na ultima foi porque não havia projecto algum a discutir em cuja discussão a minha presença fosse necessaria.

Quanto ás palavras que o digno par proferiu na minha ausencia, dou-me por perfeitamente satisfeito com as explicações de s. ex.ª

O sr. D. Antonio de Mello: — Sr. presidente, o digno par o sr. marquez de Sá da Bandeira encarregou-me de participar a V. ex.ª e á camara que, por incommodo de saude, não comparece á sessão de hoje.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o projecto de lei n.° 101, cuja discussão estava pendente até que s. ex.ª o sr. ministro das obras publicas fosse presente. Não me parece que a sua discussão seja mui longa.

(Leu-se.)

O sr. Presidente: — O sr. marquez de Sousa propoz que a redacção do artigo 1.° fosse alterada do modo seguinte (leu).

Portanto vou pôr á discussão, novamente, este projecto por estar presente o sr. ministro da repartição competente.

O sr. Marquez de Sousa: — Peço a V. ex.ª que proponha á camara que, em consequencia de haver objecto de mais importancia a discutir, se adie o projecto.

O sr. Costa Lobo: — Insistiu sobre as considerações, que em uma sessão anterior tinha feito, em" relação ao estado vergonhoso em que se achavam os monumentos nacionaes. A respeito do projecto em discussão, expoz as duvidas que tinha sobre a restauração do castello de Silves, segundo a traça da primitiva architectura, especialmente porque o prejecto de lei não vinha acompanhado dos competentes orçamentos e da planta do edificio.

O sr. Marquez de Sousa: — Peço a V. ex.ª que ponha á votação a minha proposta de adiamento do projecto n.° 101.

Posto á votação o adiamento, foi approvado.

O sr. Miguel Osorio: — Peço a V. ex.ª que me inscreva sobre a ordem para depois da leitura do projecto sobre a organisação da secretaria dos negocios estrangeiros apresentar uma proposta de adiamento á discussão d'este projecto.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Vae ter se o projecto n.° 130 sobre a organisação da secretaria dos negocios estrangeiros.

O sr. secretario leu e é do seguinte teor, assim como o respectivo parecer. V X PARECER N.° 126

Senhores. — As commissões reunidas dos negocios externos e de fazenda examinaram attentamente a proposição de lei, approvada na camara dos senhores deputados, pela qual o governo é auctorisado a decretar a organisação da secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, a do corpo diplomatico e a do corpo consular, em harmonia com o plano apresentado com a proposta, e sob condição expressa do, em nenhum caso, exceder a somma de 362:236$968 réis.

A necessidade de aperfeiçoar os diversos serviços dependentes do ministerio dos negocios estrangeiros não póde ser contestada uma vez que a despeza não aggrave, pelo seu augmento, o estado melindroso da fazenda publica. Suppor que um paiz, por ser pequeno, deve dispensar ou reduzir quasi a relações consulares as suas relações diplomaticas, fôra erro que, na situação actual da Europa, a experiencia cedo convenceria de funesto. A boa organisação dos serviços dependentes do ministerio dos negocios estrangeiros, a representação habil e decorosa do paiz nas missões que é obrigado a conservar para attender e zelar interesses graves e multiplicados, e a reorganisação do corpo consular concebida como o exigem a defeza e protecção do nosso commercio e da nossa dignidade, são pontos que requeriam ha muito a iniciativa dos poderes publicos, e que não podia» continuar a ser preteridos sem prejuizos avultados para a nação.

As commissões reunidas, porem, por maiores vantagens futuras que a reforma afiançasse, nunca se decidiriam a propo-la á approvação da camara se entendessem que ella vinha influir por qualquer modo no desequilibrio da fazenda; mas o exame severo a que procederam, e as explicações do governo provaram-lhes que o augmento de réis 129:518$000, que resulta da proposta, é supprido por uma receita, embora eventual, que não póde merecer menos confiança, do que muitas receitas inscriptas no orçamento do estado e abonadas até pelo progresso do rendimento. A verba de 74:189$672 réis, em que estão calculados os emolumentos actuaes dos consulados, longe de ser exagerada em presença das informações obtidas, promette crescer gradualmente, e a sua fiscalisação é exequivel. Ácerca das outras verbas dá-se o mesmo em grande parte. De algumas dir-se-ía mesmo que foram orçadas com extrema circumspecção.

Alcançado pelas commissões reunidas o convencimento de que o projecto deixa intacta a questão de fazenda, e não altera as condições do problema financeiro, ao passo que substitue a regra legal ao arbitrio, que melhora os serviços e que encerra valiosas economias futuras, sendo fielmente executado, não hesitam ellas em vos propor a sua approvação com as modificações, que o governo aceitou e não alteram essencialmente nenhuma disposição essencial, antes tendem a desenvolver e aperfeiçoar algumas.

As alterações propostas recaem sobre os artigos 9.° § 2.°, 24.°, 25.°, 32.° § 1.° e 33.°

O § 2.° do artigo 9.° fica redigido da maneira seguinte:

«Poderá haver igualmente addidos ás missões de 1.ª classe com obrigação de residencia e serviço, não excedendo a tres em cada missão.»

O artigo 24.° é alterado por este modo:

«Os amanuenses da secretaria d'estado, os addidos ás legações e os chancelleres dos consulados serão admittidos mediante concurso documental, e provarão praticamente conhecimentos de instrucção primaria e de algumas linguas vivas, pelo menos da franceza.

«§ unico. Um decreto especial regulará as condições do concurso.»

O artigo 25.° é modificado nos termos seguintes:

«Os logares de segundos officiaes da secretaria d'estado, e bem assim os de segundos secretarios de legação e dos consules de 1.* classe serão providos por meio de concurso, com habilitações litterarias e provai praticas.

«§ 1.° As habilitações, de que trata este artigo, alem do conhecimento das linguas vivas, pelo menos da franceza ou da ingleza, são, quanto aos officiaes das direcções politica e commercial, secretarios de legação e consules:

«1.° Formatura em direito, ou carta de curso administrativo pela universidade de Coimbra; ou

«2.° Carta ou certificado de qualquer curso superior de sciencias pela universidade de Coimbra, pelas escolas superiores do reino, ou por qualquer universidade ou escola estrangeira; ou

«3.° Publicações importantes relativas a assumptos diplomaticos ou consulares, ou sobre questões de interesse internacional ou de commercio externo.

«§ 2.° Quanto aos officiaes da repartição central, exigir-se-ha, alem do conhecimento das linguas vivas, pelo menos da franceza, certidão de approvação nas disciplinas das seis cadeiras communs a todos os lyceus.

8§ 3.° Quanto aos officiaes da repartição de contabilidade, alem do conhecimento das linguas vivas, pelo menos da franceza, exigir-se-ha o curso completo das escolas do commercio, ou attestado de bom serviço e capacidade em repartições publicas de contabilidade ou de fazenda.

«§ 4.° Decretos especiaes regularão estes concursos segundo as especialidades a que se destinam os concorrentes.»

O artigo 32.° § 1.° é addicionado pela seguinte fórma:

«Não terão direito a vencimento algum, quando contarem menos de cinco annos de serviço effectivo, ou de dois annos, tendo entrado por concurso.»

Finalmente o artigo 33.° é tambem additado, acrescentando-se depois da phrase — postos em disponibilidade — as palavras — «pelo pedirem».

Sala da commissão, em 15 de fevereiro de 1867. = Duque de Loulé = Conde de Castro = Conde de Thomar = Conde da Ponte = José Augusto Braamcamp (vencido) = Conde d'Avila = José Lourenço da Luz = Alberto Antonio de Moraes Carvalho (vencido) = Francisco Simões Margiochi (vencido) = José Bernardo da Silva Cabral (vencido) = Luiz Augusto Rebello da Silva, relator.

PROJECTO DE LEI N.° 130

Artigo 1.° E o governo auctorisado a decretar a organisação da secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, do corpo diplomatico e do corpo consular, em conformidade do plano annexo á presente lei, e que d'ella faz parte.

§ 1.° No primeiro anno economico, em que for decretada a organisação de que trata esta artigo, é igualmente auctorisado o governo a introduzir na tabella da despeza do ministerio dos negocios estrangeiros as alterações que forem necessarias em virtude da nova organisação.

§ 2.° Para o caso de que trata o § antecedente, a importancia total da despeza do ministerio dos negocios estrangeiros não poder á exceder a somma de 362:236$968 réis, não comprehendendo n'esta somma a quo possa resultar de vencimentos de disponibilidade e aposentação, ordenados em conformidade das disposições da nova organisação.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 11 de fevereiro de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

(Vide Diario n.° 12, de 16 de janeiro proximo passado, respectivamente ao plano da organisação da secretaria d'estado dos negocios estrangeiros.)

O sr. Presidente: — Devo ter á camara o § 1.º do artigo 46.° do nosso regimento (leu).

Agora tem a palavra sobre a ordem, o digno par, o sr. Miguel Osorio.

O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, a minha moção de ordem, que considero como questão previa, é o adiamento d'este projecto, que proponho com um fundamento que me parece justo e que a camara apreciará.

Eu não tenho outra cousa em vista mais do que a regularidade dos trabalhos, e se a camara julgar que é completamente desnecessario o meu adiamento, ficarei muito satisfeito, porque o meu desejo não é demorar qualquer discussão, o meu desejo é unicamente, como disse, que se regulem os trabalhos da camara e que se tratem os negocios com verdadeiro conhecimento de causa para beneficio do paiz e honra do parlamento.

Parece-me, sr. presidente, que este projecto não póde entrar em discussão sem que primeiro nos occupemos do projecto que reforma o methodo de percepção dos emolumentos das secretarias d'estado; no relatorio com que o sr. ministro dos estrangeiros precede este projecto de organisação da secretaria, reconhecendo s. ex.ª que elle traz augmento de despeza, procura attenuar essa despeza da seguinte fórma (leu).

Ha portanto um augmento de despeza de 129:518$000 réis. A este augmento porém corresponde na receita geral do estado outro, que não deve reputar-se menos equivalente, e provém primeiro do producto de treze quinhões de emolumentos que actualmente se distribuem por outros tantos empregados da secretaria e passam a formar receita publica, calculados a 386$000, 5:018$000 réis. Já se vê que uma das bases da receita depende de uma lei que ainda o não é porque ainda a não approvámos; isto é tanto mais importante que o governo reconhece que devemos sempre ter em vista o principio de que nunca se auctorise uma despeza sem ter a par a receita que lhe póde fazer face; se um tal principio tão regular em administração foi mesmo reconhecido pelo proprio sr. ministro dos negocios estrangeiros, apresentando-o n'um dos considerandos do seu relatorio, parece que a conclusão não póde ser outra senão a de que a logica não permitte que entremos n'esta discussão, sem que primeiramente se trate do que ha de formar a base da receita com que se ha de executar esta lei.

Ora supponha-se, sr. presidente, que esta proposta de lei era agora aqui approvada, e que ámanhã, tratando-se da outra, que é a base d'esta, a sorte era differente, dava em resultado a rejeição implicita d'esta já votada; em que circumstancias ficava este negocio? Parece-me que os resultados são faceis de prever, e até de primeira intuição. Se não tivessemos de proceder a uma revogação completa da medida de que ora nos occupâmos, tinhamos pelo menos que tomar algumas providencias para a alterar convenientemente; ou aliás o outro remedio, unico possivel, era crear uma outra e nova receita. Não creio que se possa combater esta argumentação que, a meu ver, é concludente para todas as intelligencias; entretanto, uma vez que a camara ache estas minhas considerações completamente inuteis, ou se se persuadir que o governo já deve estar ao facto da consciencia das suas maiorias para contar com a approvação certa de todas estas medidas, n'esse caso tudo isto será inutil; mas, em todo o caso, eu de que trato é do cumprimento do meu dever, e por isso mando para a mesa a minha proposta, para ser considerada como questão previa.

Leu-se na mesa, e foi admittida a seguinte

PROPOSTA

Proponho o adiamento do parecer n.° 126 até se discutir n'esta casa o projecto de lei que converte em receita do estado os emolumentos das secretarias d'estado.

Sala das sessões, 22 de fevereiro de 1867. = Miguel Osorio Cabral e Castro.

O sr. J. A. Braamcamp (sobre a ordem): — Pedi unicamente a palavra para mandar para a mesa o parecer das duas commissões reunidas — de fazenda e de administração publica, relativamente ao projecto de lei vindo da camara dos senhores deputados, em que se trata da reforma sobre os emolumentos que se pagam nas secretarias d'estado.

Leu se na mesa para se mandar imprimir.

O sr. Presidente: — Estava inscripto para fallar depois do sr. Miguel Osorio o digno par o sr. visconde de Algés, mas não sei se s. ex.ª quer fallar sobre o projecto, ou propriamente sobre a proposta de adiamento.

O sr. Visconde de Algés: — Por emquanto é só sobre o adiamento.

O sr. Presidente: — N'esse caso tem V. ex.ª a palavra sobre o adiamento.

O sr. Visconde d'Algés: — Sr. presidente, até aqui propunha-se o adiamento com o fundamento de que não tinham ainda chegado os documentos pedidos pelo digno par e meu nobre amigo, o sr. Miguel Osorio, esses documentos referiam-se ao numero de processos em que tinha sido consultado o procurador geral da corôa ou qualquer dos advogados d'esta capital, em materia respeitante á competencia do ministerio dos negocios estrangeiros; chegaram os documentos que o sr. ministro acabou de qualificar de inutilissimos, e que o digno par considera como importantissimos. Caducou portanto o fundamento, era mister que outro se deparasse para de novo se insistir na proposta do adiamento.

Quanto aos documentos eu não sei se elles são inutilissimos, como os qualificou o sr. ministro dos negocios estrangeiros, ou se são importantissimos, como os considerou o digno par, parece-me todavia que elles eram mais uteis emquanto não appareciam do que depois de terem apparecido; ha entidades assim, a ausencia avoluma-lhes desproporções que a presença reduz a dimensões mais que modestas. Quanto ao novo fundamento, em que se pretende assentar a proposta do adiamento, é meu parecer que não procede tambem. Porque este projecto conta como verba de receita o producto de treze quinhões de emolumentos, que só devem constituir receita publica quando for approvado o projecto que manda entrar nos cofres publicos o valor dos emolumentos que até agora percebiam os officiaes das secretarias d'estado, não me parece que devamos suspender a discussão da materia objecto da ordem do dia da presente sessão.

Qualquer que seja a sorte que este projecto tenha de correr na discussão e votação d'esta casa, as disposiçoes do projecto reformador do ministerio dos negocios estrangeiros permanecerão inalteraveis. Se pela rejeição do projecto desapparecer da receita a verba dos emolumentos, tambem desapparecerá da despeza a verba correspondente do au-

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gmento dos ordenados. Se o projecto for approvado, claro é que fica mantida a verba de receita tal como se acha no projecto a que alludo.

Que importa pois manter ou eliminar simultaneamente da receita e da despeza uma verba igual? Poderá esta operação affectar a significação financeira do projecto, cujas disposições permanecerão incolumes ou ella se realise ou não?

Eu creio, sr. presidente, que isto se reduz a um processo de simplificação adoptado todos os dias nas operações algébricas, o qual consiste em eliminar a mesma quantidade affectada de signaes oppostos em qualquer membro da equação (apoiados).

Entendo pois que nenhum fundamento póde estorvar o adiamento que se propõe, e por estas breves mas procedentes considerações votarei contra a proposta.

O sr. Presidente: — Ninguem mais tem a palavra sobre esta questão previa. Vou por consequencia consultar a camara sobre a approvação ou rejeição do adiamento do projecto de lei que estava dado para ordem do dia.

O sr. Miguel Osorio: — Não posso deixar de pedir ainda a V. ex.ª que me conceda a palavra.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par.

O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, o digno par e meu illustre collega, o sr. visconde de Algés, não alterou em nada o meu modo de ver a questão. Não fallarei agora sobre a utilidade ou inutilidade dos documentos que requeri da repartição dos negocios estrangeiros, apesar do digno par dizer que elles eram mais uteis antes de apparecerem do que depois de terem apparecido, e não sei se esta apreciação se póde fazer, porque ainda não vi esses documentos nem quero interromper a discussão pedindo a sua leitura para conhecer se elles são inuteis. Eu repito á camara e ao digno par que são uteis; mas agora não sei a que vem que o orador esteja a insistir na inutilidade dos documentos, a não ser por nimio desejo de se conformar com a opinião do sr. ministro dos negocios estrangeiros, e sobre esta apreciação de utilidade ou inutilidade não direi mais nada; porque, se a insistencia sobre a inutilidade do pedido vem desfarçadamente referir-se á incapacidade de quem os pediu, eu escuso que o digno par me lembre o que sou o primeiro a reconhecer porque não venho aqui com a vaidade de illustrar a camara, nem pretendo que os documentos a illustrem, illustram-me porém a mim e esclarecem-mo a questão, ou pelo menos supponho assim.

Para isso é que peço os documentos que entendo que são necessarios para meu esclarecimento, e a camara poderá julga-los uteis ou inuteis. A minha consciencia é a unica bitola que me regula para entrar em qualquer discussão com a franqueza, com a lealdade e com o habito que tenho de não votar nenhuma medida de interesse publico sem ter pleno conhecimento d'ella, e já lhes acho merecimento pela difficuldade que o governo mostrou em os trazer e a insistencia da sua inutilidade que faz o digno par defensor do governo.

Peço desculpa a V. ex.ª e á camara de ter levantado a minha voz n'esta occasião, porque me pareceu que se lançava sobre a minha individualidade, perante um corpo respeitavel, a invectiva de inutilidade. Eu reconheço o, como já disse, e tomára que as portas d'esta casa se rasgassem para dar entrada a todas as capacidades do paiz, e que se fechassem para as inutilidades, como eu; declaro que não faria diligencia para tornar a entrar no parlamento, nem pelo suffragio nem por outro qualquer meio, pelo conhecimento que tenho de mim e pela repugnancia pela vida politica, e se não tivesse herdado esta cadeira de certo não entrava n'esta camara; já tenho repetido isto, mas o direito que tenho a vir aqui não é só uma prerogativa, é uma obrigação; procuro desempenhar-me d'ella como entendo, e se me falta muito para o poder fazer cabalmente, o que me não falta é desassombro e independencia para seguir os dictames da consciencia.

Mas, sr. presidente, disse o digno par que a operação é muito simples, que é uma questão muito facil, porque cessa a receita por outra despeza, e como ha de cessar a despeza? Ha de ser por uma lei.

Se nós já votámos uma lei de despeza, e que os ordenados serão com essa retribuição designada; e já votámos que a despeza da secretaria será n'aquella cifra, e se já votámos que o governo estava auctorisado para adoptar as alterações que julgasse convenientes, e que não devia exceder a verba de 362:236$968 réis, eu propunha que fosse antes 362:236$960 réis para arredondar esta verba, porque este calculo de 68 réis é curioso, e se o governo não póde exceder essa quantia, ha de propor uma lei em que diga — que se diminue na despeza 5:000$000 réis que vós não quizestes approvar na sessão passada. Ora o que me parece logico é esperarmos por esses 5:000$000 réis.

Eu desde já declaro á camara, e não tenho duvida em o declarar, porque tambem estudei já a materia, e hei de votar pela lei, porque acho melhor a reforma do que a organisação que existia; mas não se segue que todos os dignos pares estejam d'esta opinião, ou pelo menos o governo injuria o parlamento em contar com o seu voto antecipadamente, ou em tentar coagi-lo depois por terem já votado esta lei. A logica está no adiamento.

Talvez que o digno par o quizesse considerar como manejo de opposição, como obstaculo que se pretendia crear ao governo.

Disse s. ex.ª que ha pouco se pediu o adiamento, allegando a falta de um documento; e permitta-me s. ex.ª que lhe diga que eu não pedi cousa alguma. Eu disse apenas que tencionava propor o adiamento, e logo que o sr. ministro appareceu pedi-lhe immediatamente que fallasse antes de fazer a minha proposta, porque previ que s. ex.ª apresentaria o documento, e não haveria necessidade de propor

o adiamento por esse motivo. Ora eu creio que quem anda com esta franqueza não póde ser taxado de opposição acintosa, porque quem a quer fazer esconde-se e as suas propostas, não as declara com tanta antecipação e não procede como eu procedi.

Não faço pois opposição acintosa nem ao projecto nem ao governo; não se trata aqui nem do governo nem da conveniencia ou inconveniencia do projecto; trata-se da regularidade dos trabalhos d'esta casa do parlamento, porque assim tornaremos cada vez mais reconhecida a necessidade da existencia d'este corpo.

Concluo dizendo que foi este o intuito com que propuz o adiamento, e não farei mais observações para não fatigar a camara, a quem agradeço a attenção que me prestou, não ao orador, que não a merece, mas ao assumpto de que fallei.

O sr. Visconde de Algés: — Direi apenas duas palavras, não para acentuar mais a minha opinião já proferida contra o adiamento, mas para estranhar que o digno par e meu antigo amigo, o sr. Miguel Osorio, se agastasse tanto com as palavras inoffensivas que proferi.

Se a palavra trahiu a minha intenção, o que me inclino todavia a não suppor, parece me que as nossas antigas relações eram penhor bastante para assegurar a innocuidade internacional com que fallei. Agora quanto a mim não posso deixar de estranhar queo digno par attribuisse ao desejo de me conformar com a opinião do sr. ministro dos negocios estrangeiros a apreciação que fiz da utilidade do documento que s. ex.ª requisitára. Se duvidei da utilidade do documento a que alludo, é porque tendo estudado a materia do projecto, a que elle se refere, e conhecendo tambem a materia do documento, parece-me que estava habilitado a apreciar a sua utilidade sem recorrer ás faculdades do sr. ministro dos negocios estrangeiros, que para mim são de grande auctoridade, mas que não supprem as minhas, porque nada as póde supprir na determinação da minha vontade com respeito á formação do meu juizo e á emissão do meu voto.

Pareceme que os precedentes da minha breve carreira politica não conferem a ninguem o direito de attribuir a manifestação de minhas opiniões a outro estimulo que não seja o juizo que fórmo do assumpto submettido á consideração dos poderes publicos (apoiados). E visto que o digno par estranhou que eu duvidasse da utilidade do seu documento, agora direi mais, não só duvido, mas tenho por certo que o documento não só é inutil mas inutilissimo, como no acto da discussão terei ensejo de demonstrar n'esta casa.

Quanto á insistencia repetida pelo adiamento, mantenho a opinião que primeiro emitti; seja qual for o exito d'esse outro projecto a que o digno par allude, as disposições do projecto que hoje deve entrar em discussão não podem soffrer a minima alteração. Não me detenho no desenvolvimento d'esta proposição, porque já disse em sua demonstração quanto é bastante para se conhecer a improcedencia das considerações com que se pretende reforçar a proposta do adiamento.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, eu desejava propor á camara um alvitre que satisfará, a meu ver, todas as exigencias.

Por mais esforços, que se façam para discutir o adiamento, sem se entrar no merito da reforma, a que elle se refere, parece me que será impossivel consegui-lo.

Pedia eu pois que se discutissem conjunctamente a proposta de adiamento, e o projecto dado para ordem do dia.

Quando esta discussão estiver fechada, V. ex.ª porá á votação em primeiro logar a proposta de adiamento, e em seguida o projecto, se aquella proposta for rejeitada.

Parece-me, sr. presidente, que d'esta maneira poupamos muito tempo, e a discussão será mais proficua.

As considerações, que foram apresentadas pelo digno par o sr. visconde de Algés, só podem servir para justificar a proposta de adiamento. S. ex.ª disse que, se a proposta que diz respeito aos emolumentos não for approvada, é necessario alterar o projecto que esta em discussão; já se vê que este argumento é em favor da proposta do digno par o sr. Miguel Osorio; ou então não percebi bem o que o digno par disse; mas parece-me que foi isto, pouco mais ou menos. Por consequencia, para nos não expormos a votar disposições, que tenhamos de modificar ámanhã, e não sei mesmo como o poderiamos fazer; porque, quando se fixam no projecto os ordenados dos empregados, é contando que não recebem emolumentos, mas se esse projecto que vae fazer reverter para o estado todos os emolumentos não for approvado, os empregados do ministerio dos negocios estrangeiros terão direito a perceber os ordenados que n'este projecto se fixam, e juntamente os emolumentos, o que de certo não é a intenção do sr. ministro, e julgo que de ninguem; para não nos expormos, digo, a votar o que não queremos votar, parece-me conveniente, que demos á discussão do adiamento toda a latitude; o que só se poderá conseguir entrando largamente na apreciação da reforma, a que o adiamento se refere.

Peço pois á camara que concorde em que esta proposta de adiamento entre em discussão, juntamente com o projecto; porque só depois d'essa discussão é que me parece que a camara estará habilitada a votar pro ou contra o mesmo adiamento. Se este for rejeitado, V. ex.ª porá então á votação o projecto.

O sr. Miguel Osorio: — Sr. presidente, começarei pedindo desculpa a V. ex.ª e á camara por ter de tomar novamente a palavra sobre este assumpto, e em seguida peço tambem licença para me referir ao que acabaram de dizer os dignos pares, conde d'Avila e visconde d'Algés.

Em quanto ás expressões que me, dirigiu o digno par visconde d'Algés, direi eu que, s. ex.ª tendo explicado o sentido em que empregou as suas palavras, eu não tenho duvida em me dar por satisfeito e em declarar tambem a s. ex.ª que não foi intenção minha apreciar desfavoravelmente o caracter de s. ex.ª a quem ha muitos annos estimo e considero, dando assim por terminado este incidente com a lealdade com que se terminam entre cavalheiros.

Agora, sr. presidente, folgo muito que o digno par o sr. conde d'Avila não achasse inconveniente algum no adiamento que por mim foi proposto, e ser aliás s. ex.ª um dos membros da commissão; bom é que vozes mais auctorisadas do que a minha o venham assim confirmar; e eu para fazer a vontade aos defensores do governo estava quasi a desistir d'elle, porque principiava a acreditar que elle iria prejudicar os negocios publicos e a salvação do estado.

Como porém o digno par conde d'Avila veiu em meu auxilio, e as considerações que s. ex.ª fez são a explicação do adiamento que propuz, eu declaro que aceito a proposta do digno par, porque com ella póde continuar a discussão para o projecto ser devidamente apreciado pela camara, ao passo que elle não póde ser approvado sem que primeiro seja votado o adiamento. Por consequencia, visto queo adiamento em nada vae prejudicar o projecto, por isso que juntamente com elle vae ser discutido; visto que temos por penhor que havemos de caminhar com prudencia e cautela, para que se não altere ámanhã o que hoje votarmos; declaro que me conformo inteiramente com a proposta do digno par conde d'Avila; e antes da votação do projecto de lei hei de propor que o adiamento seja posto á votação, apesar de que esta disposição póde dar mau resultado e me não parece muito conforme com o nosso regimento.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. presidente, parecem as opiniões concordes sobre esta questão que ao principio se affigurava com aspecto grave.

Não ha duvida que em certas disposições da lei o projecto tem relação com outro que está pendente. É difficil que esta circumstancia se não repita em quasi todos os projectos de lei que devem ser submettidos ao parlamento. Para não succeder assim, era necessario proscrever a logica, proscrever a synthese, proscrever o nexo na legislação. Se adiássemos por taes motivos, adiariamos hoje este por causa do outro, ámanhã o outro por causa d'este.

Sr. presidente, a rasão que se apresentou não é motivo para adiamento. Eu concordo com a moção do meu digno amigo, o sr. conde d'Avila, para que se discuta conjunctamente cora o adiamento o projecto.

Mas o que era logico era que se propozesse quando se votasse este projecto, na parte em que se ligam os dois projectos, que é apenas nos vencimentos dos officiaes de secretaria, que ficasse subordinada esta unica parte á approvação do outro projecto.

A logica é boa, sr. presidente, mas ha tambem uma logica politica que é necessario não esquecer. O governo não têm empenho algum em que este projecto seja approvado antes de outro qualquer, e eu declaro, por parte do governo, que, se a camara se julgar habilitada desde já a entrar na discussão do parecer que foi mandado para a mesa pelo sr. Braamcamp, não me opporei. O que me parece inconveniente é o adiamento permanente, o adiamento por todos os pretextos, é a perda de tempo que a camara precisa dispender na resolução de negocios graves.

Entremos por uma vez nas discussões serias, porque não é possivel adiar um dia o projecto, interpretando largamente as disposições do regimento para que se espere tantos dias depois de distribuido; adiar depois porque tal disposição prende com outro projecto; adiar ainda este porque o parecer não esta impresso. Não é util á causa publica que os negocios pendentes e que são de gravidade sejam adiados com pretextos taes. Perderíamos assim tempo sem fazer nada, e o tempo é precioso e devemo-lo ao paiz, que aprecia estes methodos dilatorios e comprehende o que significam. Não os aceita o governo.

O governo esta prompto a discutir o projecto. O governo esta ancioso pela discussão. O governo empenha-se em que comecem a desfilar esses exercitos numerosos de objecções que hão de fulminar esta desgraçada proposta.

O governo não recua diante da discussão; provoca-a porque não deseja vencer pelos votos apenas, mas pela rasão que esta do seu lado, que ha de provar-se á luz da evidencia. Não teme quem de si esta seguro. Venha pois a discussão, e venha ampla, franca, clara, prompta.

O sr. Presidente: — Não sei o que hei de pôr á discussão.

O sr. conde d'Avila lembrou, e o auctor da proposta de adiamento conveiu, que ficasse em discussão o adiamento conjunctamente com o projecto dado para ordem do dia.

Parece-me que não sairei das minhas attribuições, dizendo que póde acontecer que, continuando a discussão do adiamento conjunctamente com o projecto, leve esta discussão muitos dias terminando então pelo adiamento da materia proposta.

O sr. Conde d'Avila: — Se V. ex.ª me dá licença, eu explico a minha proposta.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu peço a V. ex.ª que mande ter a proposta do sr. conde d'Avila, porque a não ouvi.

O sr. Presidente: — O sr. conde d'Avila não mandou a proposta por escripto, e sim offereceu o alvitre de que se discutisse conjunctamente com o projecto o adiamento proposto pelo sr. Miguel Osorio.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, a proposta, que eu tive a honra de fazer á camara, de se discutir conjunctamente o adiamento proposto pelo digno par, o sr. Miguel Osorio, com a reforma a que elle diz respeito, tem sido adoptada em casos analogos, e sempre com vantagem, na outra casa do parlamento, onde tive a honra de ter assento durante vinte e sete annos. Parece-me que o mesmo tem tido já logar n'esta camara com feliz resultado.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros manifestou o de

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aejo de se entrar franca e lealmente na discussão da sua reforma, e eu entendo que s. ex.ª tem rasão, e que é este tambem, o melhor meio de apreciar a conveniencia e a opportunidade do adiamento. Discutamos pois conjunctamente ambas as propostas, e, repito, só no fim d'essa discussão estará a camara habilitada a approvar ou a rejeitar o adiamento.

Eu não sou suspeito, porque approvo a reforma e approvo o projecto a que se referiu o sr. Miguel Osorio. A minha assignatura esta em ambos; mas o que eu julgo é que a camara não esta agora tão habilitada para votar a proposta do sr. Miguel Osorio, como o estará depois de ouvir a discussão do projecto do governo; e acredito que o proprio auctor do adiamento reconhecerá elle mesmo a necessidade de entrar na apreciação d'aquelle projecto para justificar a sua proposta, e por consequencia reconhecerá tambem a conveniencia de se discutirem conjunctamente ambos os assumptos.

O sr. Presidente: — Eu, na qualidade de presidente, não faço mais do que o meu dever pondo á votação a proposta do digno par.

Foi approvada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu pedia a palavra a V. ex.ª sobre o modo de propor.

O sr. Presidente: —O que quer V. ex.ª que eu proponha agora?

Vozes: — Já está votado; está votado.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a V. ex.ª que me deixe fazer uma reflexão. As condições d'esta camara são terriveis: a mim mesmo tem-me já acontecido estar muitas vezes em duvida sobre o que se esta tratando, porque se não ouve, e dizerem-me depois que já esta votado aquillo sobre que eu queria fallar. E para isto se gastaram aqui trezentos e tantos contos, ou perto d'elles!

O sr. Presidente: — E certo que mal se ouve; mas eu não podia pôr á votação de outro modo. Esta questão não póde continuar.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu pedi a palavra sobre o modo de propor á votação, e é este um pedido que sempre se concede: entretanto votou-se, porque y. ex.ª tambem não me ouviu a tempo.

O sr. Presidente: — Esta em discussão o projecto n.° 130. Os dignos pares que pedirem a palavra, torno a repetir, devem declarar se querem fallar pró ou contra o projecto.

O sr. Silva Cabral: — Peço a palavra, sr. presidente.

O sr. Presidente: — Pró ou contral?

O sr. Silva Cabral: — Contra.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Silva Cabral contra o projecto.

O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, sob a desagradavel impressão da sentença de Terencio «beneficium amicos, veritas odium parit» venho tomar parte n'este debate com o mais vivo pezar e profundo sentimento.

E quer V. ex.ª e a camara saber a rasão d'isto? É porque conhecendo, como desgraçadamente conheço, o estado de atonia do espirito publico no que respeita ás vitaes e essenciaes condições do governo representativo; observando a indifferença, quasi geral, pelo predominio dos verdadeiros e salutares principios da liberdade, apesar do entono com que, em antiphonas alti-sonantes, é apregoado e victoriado o contrario; vendo subordinada á influencia do sentimento estreme utilitario a vida politica da maior parte, não havendo em duvida de offerecer em holocausto a um egoismo sem exemplo os mais caros interesses da patria; e notando emfim, ajudado pelo farol da historia, o signal distinctivo da decadencia dos imperios pela transformação do vicio em virtude, em que é tão arteira e destra a hypocrisia ou malicia partidaria (apoiados), não posso deixar de presentir, sr. presidente, quanto deve ver-se desacompanhado de favor todo aquelle que commetter o acto audaz de erguer a voz da rasão e da verdade, para que não sejam prejudicados os grandes interesses da patria.

Deus me livre, sr. presidente, de commetter o attentado, ou incorrer no sacrilegio politico de fazer a mais remota applicação do que venho de descrever e dizer, a esta assembléa veneranda, em que aliás reconheço que sobram luzes, independencia e patriotismo; mas nem por isso o ligeiro esboço que acabo de traçar do estado moral da sociedade, deixa de ter abundante materia na caterva de tantos e tão innumeraveis que, campeando em sentimentos da mais desavisada intolerancia, não acham nas opiniões adversas senão motivos de desconsideração e ataque pessoal (apoiados).

Recuar diante de similhante estratagema seria cobardia tão censuravel, como fôra improprio do cidadão livre desanimar no sagrado empenho de cumprir o seu dever. Espero que não hei de provocar, da parte illustrada e sensata, este desairoso anathema contra a minha resolução.

Tenho adoptado, sr. presidente, como regra ou norma do meu procedimento politico, marchar ao lado do governo, auxiliando-o, quanto cabe em minhas faculdades e recursos, em todos os assumptos dependentes da minha cooperação. No cumprimento dos meus deveres não tenho visto, nem espero ver, amigos ou adversarios; a paixão ou odio nunca, com o auxilio da Divina Graça, offuscarão meu espirito, ou entibiarão meu animo, apartando-me da regra geral a que acima me referi.

Mas não ha regra sem excepção; est modus in rebus. A consciencia e o sentimento moral e intimo com que o Creador dotou o homem, não lhe foram dados para lhe servir de instrumento de baixeza ou de escravidão, mas para regula-lo nos actos da vida segundo os preceitos da rasão; contrariar a significação d'este importantissimo dom do Creador é adulterar a sua obra, e passar da. classe de livre á de servo (muitos apoiados).

Sr. presidente, presto ao illustre ministro dos negocios estrangeiros os mais largos encomios pela coragem com que, nas difficilimas circumstancias da fazenda publica, veiu apresentar ao parlamento a reforma, importantissima da secretaria dos negocios estrangeiros, do prestantissimo corpo diplomatico, e do utilissimo corpo consular. A independencia e autonomia do paiz, o seu progresso agricola, commercial e industrial no caminho da moderna civilisação, h sua tranquillidade e segurança interna, e por ultimo a sua indispensavel importancia no grande areópago das nações, tudo ficaria reduzido a zero, não acudindo incessantemente com o heroico remedio da reforma, á pavorosa catastrophe que, sem o sabermos, estava prestes a rebentar, fazendo-nos riscar do catalogo das nações livres e independentes! (Apoiados.)

Provavelmente, como devo acreditar, foram estes e não outros (relativos á propria celebridade pessoal), os fortes incentivos, que actuaram no engenho previdente do illustre ministro, para antepor a todas as medidas de administração publica, até mesmo ás de fazenda, embora deva ser a resolução d'estas a idéa mãe, e como tal preferente a todas as demais, a sua predilecta reforma da secretaria dos negocios estrangeiros e dependencias correlativas, esquecendo talvez por esse sentimento de predilecção, de que em occasião igualmente notavel e similhante á nossa, o barão Luiz pronunciou a grande verdade — dae-me boas finanças que eu vos farei boa politica (apoiados).

Sou todavia obrigado a dizer que, salva a mais sincera sympathia pelas suas eminentes qualidades, me parece, que nunca, como na presente occasião, teve mais appropriada applicação o quando que bonus dormitai Humerus.

Sr. presidente, se o illustre ministro não quizer admittir o predominio do sentimento de paternidade do projecto em discussão, e era vez d'isso empregar os seus nobres dotes, fazendo estudo serio e detido da situação do paiz, e em especial considerar a necessidade impreterivel e a imperiosa obrigação de não annullar o justo e efficaz pensamento do reformas e economias, solemnemente proclamado pelo ministerio, adoptado como base da sua politica, e universalmente aceito pela opinião publica. Conscio do nosso difficilimo estado (apoiados) ha de ser obrigado a reconhecer que abraçou a nuvem por Juno, e que subordinando a sua vasta sciencia á phantasia de um melhoramento fastuoso, veiu exigir a approvação de uma medida, que alem de inopportuna, tem o defeito de contrariar o proprio pensamento governamental — o senso ou opinião publica, e as mais elementares noções de sciencia economica (apoiados).

Sr. presidente, não avento estas idéas com o minimo proposito de apartar-me da rainha linha de proceder supramencionada, e menos com animo hostil ao ministerio: estou muito longe d'este sentimento, e antes lhe apeteço longa e prospera vida, ainda sem me lembrar da resposta da velha de Syracusa a um dos seus tyrannos ou réis (riso), mas sim e unicamente com o desejo de mostrar á camara e ao paiz os graves motivos, que influiram em meu animo para fazer excepção á regra do meu procedimento.

Qualificando, como disse, de inopportunos, e, por outros motivos já especificados, de inadmissiveis o projecto e plano em discussão, não pareça á camara que pretendo para mim a patente da invenção. Não, sr. presidente, o que eu pretendo é sim mostrar que sou rigorosamente logico, deduzindo dos proprios factos, promessas e principios solemnes do ministerio, as conclusões legitimas que d'elles dimanam, e que póde negar o espirito partidario, mas que a rasão altamente approvará (apoiados).

Com effeito, sr. presidente, não ouviu a camara, não presenciou o paiz inteiro as consoladoras palavras, com que o ministerio, inaugurando a sua politica, não se reconheceu a necessidade, mas se comprometteu á mais severa economia e reforma, attento o estado precario do thesouro publico?... (Apoiados.)

Não escreveu o ministerio no relatorio da fazenda do anno passado as seguintes notaveis palavras? Não é difficil conseguir o equilibrio das nossas finanças sem vexar o contribuinte nem gravar consideravelmente as gerações futuras, mas para alcançar este importante fim são indispensaveis duas condições impreteriveis (indispensaveis e impreteriveis, note a camara) (apoiados): a primeira consiste (continua o relatorio) em não pretender aniquilar de repente o deficit, que vem accumulado de muitos annos por causas de todos conhecidas, e que é inutil repetir agora; a segunda depende da perseverança dos poderes publicos em introduzir a todo o custo a mais severa e bem entendida economia nas despezas dos diversos ramos do serviço do estado. (Vozes: — Muito bem.)

Não é ainda no mesmo relatorio, que se lêem as não menos notaveis palavras, (que são ainda a explicação pratica do pensamento governamental (só uma serie de providencias calculadas todas debaixo do mesmo pensamento, e inspiradas pela mesma tendencia podem attingir o fim a que nos propomos

Se passarmos, sr. presidente, do relatorio da fazenda do anno passado para o que precede o orçamento do corrente anno, não lemos tambem as seguintes? Tanto na ordem moral, como na ordem material, carecemos de reformas que o governo terá a honra de submetter-vos... É preciso fazer economias sensiveis; e serão de certo (NB.) as que temos de submetter á vossa consideração. (Vozes: — Muito bem).

Não vemos aqui expressado em frases incisivas, e que não admittem duas interpretações, o valioso e salvador pensamento ha muito radicado na opinião geral, de que é indispensavel e urgente desinfectar a sociedade d'essa ardente febre = da empregomania = (apoiados) peste desgraçada dos estados, como! lhe chama o eminente economista Bastiat, e que infelizmente corroe em larga e medonha escala as entranhas e coração da patria? (Muitos apoiados).

Não é ainda sob a influencia de verdades tão palpaveis, como unanimemente reconhecidas, por todos aquelles que não preferirem o estomago ao presente e futuro do paiz, que. no relatorio de 8 de fevereiro corrente se escreveu: Em vão se appella para o augmento progressivo dos rendimentos publicos, a despeza augmenta mais do que elles, e a situação do thesouro é cada vez mais precaria? =

Não se lê por ultimo n'esse mesmo relatorio em dois dos seus periodos o que vou apresentar á attenção da camara = É indispensavel reduzir a despeza do orçamento quanto for compativel com o bom serviço publico... o estado não deve ter senão o numero de empregados absolutamente indispensavel? = (Apoiados). Que justa, santa e economica doutrina, unica que satisfaz, e póde satisfazer ás exigencias da sociedade, e unica que faz, que se não subtraiam aos principaes elementos e fontes da fortuna publica, os braços e serviços indispensaveis para o prosperar e progredir da nação! (Apoiados).

Quid dicam amplius? Se tudo isto resume eloquentemente não só o lastimoso quadro do thesouro, mas o reconhecimento solemne da parte do ministerio da instante e indispensavel necessidade das reformas economicas: como é que o illustre ministro dos negocios estrangeiros, fascinado pela alta magia da diplomacia, veiu annullar tantas esperanças, apresentando uma medida, que é redonda anthitese de tudo o que se prometteu e se considerou não só indispensavel, mas impreterivel, e que alem d'isto a opinião geral altamente reclama? (Muitos apoiados.)

Sr. presidente, não é minha intenção, nem meu desejo apresentar em contradição, ou pôr em conflicto os supremos gerentes das diversas provincias da administração publica: o meu empenho é sinceramente o contrario, a saber: que conservem entre si a mais cordial união, persuadido como estou da verdade = que só a união faz a força =; mas não entendo, que apesar d'estes meus sentimentos, esteja vedado de fazer o contraste entre alguns dos ministros para tornar patente á camara por argumento à fortiori a rasão fundamental do meu procedimento. (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, se o illustre ministro da fazenda, fiel ao pensamento do ministerio, depois de se prevenir por algumas cautelosa» expressões contra qualquer aberração de seus collegas, fallando do seu proprio procedimento, escreveu no referido relatorio: Pela minha parte, senhores, espero poder mostrar vos, que procurei reduzir, quanto possivel e por todos os modos, as despezas da repartição a meu cargo; se o illustre ministro não só assim o prometteu, mas o cumpriu, reduzindo, como disse, a despeza do seu ministerio e repartições d'elle dependentes, e economisando réis 800:000$000: não aconselharia a coherencia e a propria cordura do illustre ministro dos estrangeiros, que seguisse o exemplo do, seu nobre collega, colhendo n'esta occasião as vélas á sua impaciencia, e cooperando com os seus actos para sustentar a feliz esperança, de que eram reaes os propositos do ministerio, para levar ao cabo, pelos meios convenientes, a reforma da fazenda? (Apoiados.)

Se eu mui espontaneamente presto, n'este capitulo, os meus mais sinceros louvores ao illustre ministro da fazenda pelo modo como cumpriu as suas promessas, não o faria com igual justiça e sinceridade ao illustre ministro dos negocios estrangeiros, se em vez de uma organisação apparatosa, incompativel com o nosso estado, nos viesse dar o alegrão de economias e reformas, e não a mais completa negação do programma ministerial? (Apoiados.)

Sr. presidente, se as aspirações á celebridade, a que o illustre ministro por tantos e tão elevados titulos tem direito, o levaram a dar este passo irreflectido, parece-me que não aproveitou os melhores exemplos. Franklin, o homem celebre, o cidadão prestante, que. de simples operario da imprensa chegou a presidente da republica dos Estados Unidos da America, não foi só pelas, sciencias e philanthropia que mereceu de Turgot o seguinte verso: Eripuit ccelo fulmen sceptrumque tyrannis; mas pelo systema de ordem e economia que soube manter firme e com a maior severidade. Eis o meu desideratum, a minha idéa fixa, e. por isso não podia deixar de me alegrar vendo o ministro n'essa estrada. O projecto e plano, a que me tenho referido, vieram arrefecer o meu enthusiasmo.

E evidente, segundo o orçamento ultimamente apresentado á camara, que a despeza da secretaria, corpo diplomatico e corpo consular, estava fixada unicamente na quantia de 231:368$976 réis. É igualmente innegavel que a despeza ostensiva, agora proposta pelo novo projecto e plano, sóbe a 362:246$968 réis, havendo portanto, á primeira vista, a differença para maia de 129:518$000 réis, conforme no mesmo projecto ou relatorio se declara.

São estas verdades claramente comprovadas pelos instrumentos ou peças officiaes apresentadas ao parlamento, mas que, em minha humilde opinião, não significam a realidade do facto.

Primeiramente, quanto ao orçamento anterior, deve advertir se que ali vem incluidas verbas que não representam a despeza normal e legal do ministerio, mas contém, despeza extra legal e extraordinaria. Quasi todo o artigo 29.º do orçamento está n'este caso. Ali vemos a titulo de despeza extraordinaria e fóra da auctorisação legal; a saber: para a embaixada de Londres fornecidos 2:333$335 réis; para a de Madrid 1:176$000 réis; para a de Roma 22:751$330 réis; para a do Rio de Janeiro. 7:433$335 réis; para a da S. Petersburgo 204$000; para a de Washington 1:500$000 réis; Bruxellas 720$000 réis; Vienna 1:200$000 réis; Berlim 1:200$000 réis; e Stokolmo 400$000 réis, o que somma 38:918$000 réis. Ora, devendo nós considerar a despeza não no estado anormal mas legal e normal, segue-se que o augmento da despeza pelo novo plano não é simplesmente de 129:269$976 réis, o que produziria contra a fazenda, admittidas as compensações offerecidas, a pequena

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e insignificante differença de 248$080 réis, mas em realidade a de 168:785$993 réis.

Em segundo logar o documento, que se apresenta para attenuar a má impressão de um tão inconveniente augmento de despeza, nada significa, ou significa muito pouco, porque ainda quando admittamos a receita dos emolumentos dos consulados tal qual vem declarada em 74:184$672 réis, todas as mais addições, que se encontram na casa das observações, são problemáticas e fundadas em calculos muito remotos, e que não podem offerecer compensação á certeza do pagamento da despeza que o paiz tem de fazer; e por ultimo, sr. presidente, dado e não concedido que se podiam encontrar alguns meios de receita nos emolumentos dos consulados, e augmento dos direitos, como vem notado na tabella, era mais conseqüente applica-lo para attenuar um deficit tão importante, como temos,.do que para augmentar a burocracia (apoiados), senão se quer ver representada no procedimento do ministerio a torre de Babel que tambem se fez em nome da união. (Vozes: — Muito bem.)

O sr. Presidente: — Tenho a observar a V. ex.ª que já deu a hora.

O Orador: — Desejava antes concluir hoje as minhas observações, mas vista a advertencia, que V. ex.ª teve a bondade de fazer, não duvido ficar com a palavra reservada para a sessão de ámanhã (apoiados).

(O orador foi procurado no seu logar por muitos dignos pares, e por elles comprimentado.)

(Durante este discurso entraram os srs. ministros do reino e da marinha.)

O sr. Presidente: A ordem do dia para amanhã é a continuação da de hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 22 de fevereiro de 1867

Os ex.mos srs. Condes, de Lavradio e de Castro; Duques, de, Loulé e de Palmella; Marquezes, de Alvito, de Ficalho, de Niza, de Pombal, de Sabugosa, de Sousa, de Vallada, de Vianna, e de Fronteira; Condes, de Alva, das Alcaçovas, d'Avila, d'Avilez, da Azinhaga, de Cavalleiros, do Farrobo, de Fonte Nova, de Fornos, de Louzã, de Paraty, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, do Sobral e de Thomar; Viscondes, de Algés, de Benagazil, de Chancelleiros, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Monforte, de Ovar, de Seabra, da Silva Carvalho, de Soares Franco e de Villa Maior; Barões, de S. Pedro e de Villa Nova da Foscôa; Moraes Carvalho, Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Pereira Coutinho, Costa Lobo, Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Margiochi, Moraes Pessanha, Braamcamp, Silva Cabral, Izidoro Guedes, Reis e Vasconcellos, Eugenio de Almeida, Casal Ribeiro, Rebello da Silva, Castro Guimarães, Canto e Castro, Miguel Osorio, Menezes Pita, Fernandes Thomás, Ferrer, Lourenço da Luz, Silva Ferrão e José da Costa Pinto Basto.

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