154 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
Assim, pois, este acto do governo fôra destinado apenas a introduzir na provincia de Traz os Montes os primeiros elementos de viação accelerada, deixando para mais tarde continuar a rede do modo que for mais conveniente, no intuito de concorrer, quanto possivel, para o desenvolvimento da sua riqueza e da do paiz.
De certo que podia, dividir-se em tres ramos a rede dos caminhos de ferro de Traz os Montes.
O digno, par o sr. Abreu e Sousa, indicara como sendo as linhas principaes, e que deviam construir-se simultaneamente, a linha da Foz Tua a Mirandella, a linha do Poço da Regua por Villa Real a Chaves, e a do Focinhe á fronteira, ligando-o com o de Samora.
Elle, orador, não desconhecia a importancia d'essas linhas; mas, pelas rasões expostas, entendeu dever propor de preferencia a primeira, por ser a de maior utilidade, e não permittirem as nossas circumstancias financeiras construir ao mesmo tempo todos os caminhos de ferro de que carece aquella provincia.
Essa a conclusão a que fôra levado pelos estudos que fizera, apoiando-se na opinião de engenheiros distinctos, que consideram a linha proposta como sendo a principal da provincia.
Embora o trafego local de Foz Tua a Mirandella não fosse muito, embora a linha devesse seguir por um valle apertado, era certo, todavia, que o trafego que se havia de estabelecer entre as povoações que a mesma linha deveria necessariamente desenvolver, e as ulteriores ligações com outras vias ferreas, concorreriam para collocar aquelle caminho de ferro em condições de prosperidade, e tornal-o um elemento bastante fecundo do progresso economico da provincia.
Já declarara que não estava de accordo com a idéa da construcção simultanea das linhas que deviam constituir a rede dos caminhos de ferro de Traz os Montes.
Acrescentaria que muito menos podia concordar em que essa construcção fosse feita por uma só companhia.
Das tres linhas indicadas pelo digno par que o precedera, havia uma que perdera grande parte da sua importancia, desde que estava resolvida a ligação da linha do Douro e Salamanca.
Restavam, pois, as duas linhas - a do Tua a Mirandella, e a do valle do Corgo por Villa Real a Chaves; mas desde que se fosse construir estas linhas, como s. exa. desejava, o resultado seria que uma só companhia não poderia exploral-as conjunctamente.
Haveria vantagem n'essa idéa, se estas linhas tiverem entre si uma ligação do forma que o material circulante, que fosse destinado á exploração de uma d'ellas, servisse igualmente para a outra.
Mas desde que se não podia conseguir isto, desde que ficam separadas por um consideravel tracto de terreno, ora evidente que desappareciam as vantagens que resultariam de chamar para uma mesma companhia a exploração das duas linhas.
O proprio digno par fôra o primeiro a notar, que não podia haver uma linha que beneficiasse de per si só senão o districto que tivesse de atravessar.
Ora sendo assim, se a viação accelerada na provincia de Traz os Montes não podia estabelecer-se de fórma que uma linha podesse servir simultaneamente os districtos de Villa Real e Bragança, era evidente que não podia aproveitar-se com vantagem da idéa de s. exa.
Por consequencia, se fosse possivel construir as linhas ao modo que as conveniencias economicas fossem por igual attendidas, não haveria que objectar; mas de contrario não teria utilidade a adopção do alvitre indicado.
Referira-se tambem o sr. Abreu e Sousa á largura da via, e manifestára a opinião de que seria mais conveniente adoptar o typo de via larga, attendendo a pequena differença para mais na despeza que resultaria d'essa alteração.
Sem desconhecer que podia ter importancia a construccão da linha conforme esse typo, com tudo podia licença para ponderar que, por maior economia que houvesse na construcção adoptando se a via larga, a differença na despeza, comparada com aquella que resultaria da construcção da linha de via estreita, era sobremaneira sensivel.
Procurara habilitar-se com estudos para saber a quanto se elevaria a despeza por uma ou outra fórma de construcção, e o resultado a que chegára, segundo os dados fornecidos pelos homens competentes, fóra que a construccão da linha de foz do Tua a Mirandella, adoptada que fosse a via larga, poderia subir ao custo medio de 31:000$000 réis por kilometro, por mais favoraveis que fossem as condições em que a obra se realisasse, emquanto que a linha sendo de via reduzida custaria por kilometro, tambem em media, 22:000$000 réis, o que equivaleria a uma differença para menos na despeza total de uma somma superior a réis 800:000$000.
Esta differença era de certo para attender, e muito mais desde que todos os dias se estava recommendando parcimonia e prudencia na progressão que deviam ter os melhoramentos materiaes.
Mas se tinhamos de admittir para os caminhos de ferro da provincia de Traz os Montes um typo especial, esse typo devia ser o que mais facilmente podesse concorrer para se dotar aquella provincia com uma rede completa de linhas ferreas.
Parecia-lhe que a adopção do typo da via reduzida era o que melhor podia satisfazer a esse fim, e tanto mais quanto nem todos os caminhos de ferro que haveria a construir ali teriam uma importancia tal, que justificassem um tão consideravel augmento de despeza, como o que proviria da adopção do typo da via larga.
O digno par lembrára por ultimo que, se o concurso aberto para a construcção das linhas propostas não desse resultado, ellas fossem construidas por conta do governo, seguindo-se assim o mesmo pensamento que se consignara na lei relativa aos caminhos de ferro ao sul do Tejo.
Effectivamente adoptara esse alvitre com referencia ao prolongamento d’aquellas linhas, mas para isso havia, uma rasão muito especial, que se não dava com relação aos caminhos de ferro a que se referia o projecto em discussão. Essa rasão era haver ao sul do Tejo, já construida e em exploração por conta do governo, uma parte da rede, circumstancia muito para attender, que, aliás, não se dava a respeito das linhas em questão.
Se se houvesse de levar a cabo o prolongamento natural de uma rede, como ali, justificado estava propor-se o governo, á falta de concorrentes, a tomar a seu cargo as obras; porém não era esse o caso. O de que se tratava era do construir novas linhas, e n’estas condições não julgava conveniente ir estabelecer a clausula de que ficasse a cargo do governo essa construccão, na hypothese do concurso não dar resultado, facto este que, a realisar-se, obrigaria o theouro a levantar desde logo sommas importantes, talvez em condições menos vantajosas.
Devia deixar-se á iniciativa particular este commettimento, embora fosse auxiliada pelo governo; de contrario seria obrigar o estado a contrahir emprestimos que podiam affectar o credito publico.
O sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, começarei por declarar a v. exa. e à camara, que tenciono votar contra o projecto em discussão, tanto na generalidade como na especialidade.
Sobram-me os motivos para determinar n’este sentido o meu voto.
Entretanto, sr. presidente, porque não desejo cansar a camara, e porque a occasião me parece menos azada e opportuna para largas controversias technicas, limitar-me-hei a dizer o que a este respeito reputo capital, e em teclo o caso mais que o sufficiente para que o meu voto resulte cabalmente justificado.