4 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
Eu fui apostolo da villa Fernando, e ainda hoje o sou de todas as estacões como aquella. Oxalá podesse haver muitas.
Não foi como ministro das obras publicas que mandei fazer aquella obra, tratei essa questão senão ministro do reino. E não se gastaram tambem essas dezenas de contos denunciadas pelo digno par; ou não as gastei eu.
Tambem é certo que não fui eu quem fundou a escola, foi o digno par o sr. José Luciano de Castro e eu, entrando na gerencia do ministerio dos negocios do reino, fiz continuar aquellas obras, do que me não arrependo, e pelo contrario muito me ufano.
O sr. José Luciano de Castro: - Apoiado, apoiado.
O Orador: - Pouco tempo porém me demorei ali, mas aconselho o digno par a que peça todos os documentos, e falle depois.
(S. exa. não reviu as notas do seu discurso.)
O sr. José Luciano de Castro: - Sr. presidente, eu pedi a palavra unicamente para corroborar a affirmação feita pelo digno par o sr. Thomás Ribeiro, quanto ao arrendamento da propriedade de Villa Feriando, para se fundar ali a escola agricola de reforma, em virtude de uma proposta de lei que trouxe ás côrtes, e que foi convertida em lei, do que me não arrependo, pois ainda hoje me ufano de ter tomado aquella iniciativa. (Apoiados.)
Fui eu, sr. presidente, que depois de ter encarregado differentes delegados do governo, governadores civis e agronomos, de procurarem uma propriedade para o estabelecimento da escola agricola, me convenci, depois das informações recebidas, que nenhuma estava, nas condições, senão a de Villa Fernando.
Essa propriedade pertencia á casa de Bragança. Solicitei de Sua Majestade El-Rei o Senhor D. Luiz auctorisação para o arrendamento, mas Sua Magestade com aquelles escrupulos, que todos lhe conheciamos, não annuiu logo, e só depois de oito tempo, e de incessante instancias minhas, deu o seu consentimento.
Não tive solicitações nem por parte da casa real, nem por parte da administração da casa de Bragança para aquelle arrendamento. Já vê, pois, o digno par o sr. conde de Thomar que não houve idéa por parte do governo de favorecer ninguem, e por isso eu, tomando agora a palavra, fil-o simplesmente. para assumir a responsabilidade inteira d'este facto, do qual repito, longe de arrepender-me, muito me ufano.
(O digno par não reviu as notas do seu discurso.)
ORDEM DO DIA
O sr. Presidente: - Vamos entrar na ordem do dia, que a continuação da discussão do parecer n.° 131 sobre o projecto de lei n.° 73. .
Tem a palavra sobre a ordem o sr. conde de Margaride.
O sr. Conde de Margaride: - Sr. presidente, a moção de ordem que tenho a honra de mandar para a mesa é a que passo ler:
(Leu.)
Sr. presidente, estamos do habituados a ver, ainda nos casos mais graves, dispensado o parlamento, assumindo os governos a seu bello prazer funcções legislativas e ultra-legislativas, não só por diplomas publicos, senão tambem por ukases secretos, chamados "portarias surdas", que eu não possa deixar de receber, como uma graça, a permissão de interferir n'este debate. E, esperando escapar aos respectivos direitos de mercê, principiarei por protestar a minha nenhuma intenção de offender partidos ou pessoas no que a consciencia me for dictando.
Applaudo o relatorio do sr. Ministro da fazenda pela nobre fraguezia com que s. exa. expõe tristes processos que nos levaram á nossa triste situação.
Este e outros documentos mostram que nos não enfermámos só de um deficit, mas de tres: deficit de juizo, deficit de moralidade, e como consequencia, deficit de dinheiro.
Receita o sr. ministro para o ultimo, como o que no momento mais afflige o doente. Correcto e corrente. Mas cumpre não esquecer que, embora assim abafemos a moléstia ou cerremos a ferida, se deixarmos represado no organismo o principio morbido, a reincidencia virá necessariamente com igual ou maior malignidade.
Sr. presidente, é facto constante na nossa vida politica sempre que se trata de tributar, invocar-se a necessidade do equilibrio orçamental. Lançam-se os tributos e que succede depois? Apparecer o orçamento ainda mais desequilibrado!!
Com taes precedentes, a não considerarmos os fructos do trabalho e economia particulares, renascentes a cada côrte, como o ramo de que nós diz Virgilio que "uno avulso, non deficit alter", que auctoridade poderemos nós ter e que confiança inspirar para pedir novos e muito superiores sacrificios, sem uma seria garantia de que o thesouro publico cessará, de vez, de ser o tonnel impreenchivel das Danaides, a que o tinham reduzido os novos dirigentes?
A acceitação do poder em conjunctura tão erriçada de difficuldades é uma prova cabal do civismo dos actuaes ministros, e não serei eu que lhes negue a minha inteira confiança. Mas dizem nos seus negocios os lavradores do meu Minho: "ha viver e ha morrer", conceituosa phrase com que significam que não basta estar seguro o presente; importa segurar o futuro.
O actual ministerio, por mais saude que eu lhe deseje, não ha de ser eterno; e eu declaro que se me passasse pela cabeça que o gravame extraordinario, sujeito hoje á discussão, apenas nos abriria um parenthesis de vida regular, como transição para nova edição dos nossos velhos devaneios e dissolução administrativa, o meu voto não auctorisaria mais 10 réis de impostos, succedesse o que succedesse, ameaçasse-nos o que ameaçasse. Em tal caso procederia, como o poeta a cuja escolha submetteram dois péssimos sonetos sobre o mesmo assumpto. Lido o primeiro, declarou que o melhor era o ultimo. Mas como, exclamou o apresentante, se ainda sómente se leu um. É que como esse, tornou o poeta, não concebo nada tão mau. Eu tambem, pela rasão dos dois sonetos, entre a resurreição de um passado que nos poz á vista o abysmo, em que promettia precipitar-nos, e qualquer futuro, o menos esperançoso, opto pelo ultimo.
E eis porque eu reclamo uma garantia de emenda duravel, garantia que, a meu ver se cifra em bem pouco; basta a execução da carta constitucional. A carta estabelece a igualdade perante a le!; mas o fisco, ao passo que varre com penhoras a casa do desgraçado, que deve 100 réis, deixa em paz beatifica o poderoso, devedor de centenas de mil reis!! Acabem-se estes arbitrios barbaros, sempre irrelevaveis, e hoje, sobre irrelevaveis, imprudentes.
Segundo a carta ha um só personagem irresponsavel, é o Rei. Todos os mais são responsaveis, até pelo cumprimento das ordens reaes. E, comtudo, os ministros fazem e deixam de fazer o que bem lhes appetece, sem outra consequencia que não seja, quando é, a sua saida do governo! Arvorando-se em dictadores solemnemente ou á capucha, talham a seu talante sinecuras sem numero, viagens á gran seigneur, festejos offuscantes, abonos duvidosamente cobraveis; e... e findam por enviar o rol das despezas ao contribuinte, cuja bolsa é sempre o unico homisio da fugitiva, chamada "responsabilidade ministerial"!
Não discuto intenções. Sei que os povos gemem sob o resultado de dissipações que não auctorisaram, e que os auctores d'esta dissipação são os que menos soffrem.
E eis porque peço o cumprimento da carta. Responsabilidade de alto a baixo. Se não ha lei regulamentar, faça-se; se ha alguma que possa, como tal, considerar- se, cum-