SESSÃO N.° 20 DE 22 DE JUNHO DE 1908 15
no fornecimento da população indigena mineira para a Africa do Sul.
Como é sabido, exercem a sua actividaden as minas do Transvaal cerca de 150:000 indigenas portugueses a quem não é permittido o uso de bebidas, sob pena de rigorosas penalidades.
Parece-me que no Transvaal se podem collocar annualmente cêrca de 30:000 pipas de vinho de pasto, uma vez quê no modus vivendi relativo á emigração portuguesa se preceitue a obrigação de, no contrato dos indigenas, dar diariamente a ração de 4 decilitros de vinho português, fornecido directamente pelo Mercado Central de Productos Agricolas á Curadoria Portuguesa de Johannesburg, que, pela sua parte, venderia ás minas mediante requisições officiaes.
Temos ainda o recurso do preparo de uva para mesa, para consumo interno e embarque, fabrico de passa, ramos estes que representam uma industria importante na vizinha Espanha, computada num movimento annual de réis 3.500:000$000 a 4.000:000$000 réis.
Entre nós essa industria quasi não existe, sendo até Portugal tributario de Espanha na importação de uvas de mesa durante todo o anno. Julgo que o meio mais facil, mais economico e mais pratico de fomentar esta industria é de estabelecer, em apropriados centros viticolas, estações technicas de preparo de uva segundo os usos commerciaes, contratando praticos estrangeiros devidamente habilitados.
Ainda como meio de alargar mais o consumo interno, entendo mais uma vez insistir que ao exercito seja dada uma ração normal de vinho, fornecido aos conselhos administrativos dos regimentos e unidades militares do continente e do ultramar, por intermedio do Mercado Central de Productos Agricolas ou pelas delegações.
E este alvitre é valioso, pois que, havendo em media uma effectividade de 20:000 praças, pode assegurar-se um consumo de 10:000 pipas de vinho.
Referindo-me agora ao que particularmente diz respeito á região duriense, centro dos afamados vinhos generosos do Porto, entendo que a adopção das diversas demarcações estabelecidas, quer a decretada pelo Marquês do Pombal e a esboçada pelo Barão de Forester, quer ainda a determinada por lei ditatorial de, 16 de maio de 1907, não conduzem a nenhum resultado pratico sob o ponto de vista, a meu ver essencial, de se attribuir o valor merecido aos autenticos e legitimos vinhos generosos superiores do Douro e Porto.
Todos sabem, e os proprios viticultores reconhecem e confessam, que na chamada região duriense se produzem vinhos generosos de diversas categorias.
São de 1.ª ordem os vinhos colhidos de castas especiaes em terrenos abruptos de difficil e dispendiosa cultura e amanho, que na verdade representam os verdadeiros typos do nobre vinho do Porto. Vêem depois, para 2.ª ordem ou categoria, os vinhos licorosos derivados de terras menos ingratas, e cuja percentagem de producção proporcionalmente á plantação de vinhedo representa um determinado interesse cultural e logicamente um abaixamento de valorização. E constituirão os vinhos de 3.ª categoria os produzidos de cepas plantadas em terrenos baixos ou de alluvião, de que ha longos tratos na chamada região duriense.
Por aqui se conclue que não importa, para o caso que estamos estudando, que a demarcação seja a de Pombal, a de Forester ou a de 1907, devendo manter-se a ultima.
O que importa apreciar, especialmente, são as diversas qualidades de vinhos licorosos que se preparam no Douro, classificando-os por categorias e distribuindo respectivamente e com toda a equidade a somma de auxilies e o contingente de protecção por parte do Estado.
Posta assim a questão, vejamos quaes os remedios a applicar aos males de que enferma a inditosa região duriense.
Em primeiro logar, tem que se effectuar annualmente a classificação dos vinhos licorosos ou generosos da região. Dividir-se-hão em tres categorias.
Para tal effeito, o Governo nomeará, todos os annos, uma commissão classificadora dos vinhos do Douro, constituida por dois delegados do Estado e reconhecidos oenotechnicos, e por dois representantes dos viticultores do Douro, sendo esta commissão presidida pelo director geral da agricultura, ou por pessoa de reconhecida competencia, a fim de poder realizar-se a pretendida classificação, com a justeza e imparcialidade que tal exame reclama.
Aos vinhos que a commissão desse a classificação de primeira categoria seriam passados certificados especiaes, não só assinados pelos membros d'essa commissão, como pelo titular da pasta da Agricultura e Commercio, certificados esses que receberiam a chancella do director da Alfandega do Porto, quando esses vinhos fossem exportados.
Evidentemente que a commissão estipularia o preço de venda para os vinhos de primeira categoria, em harmonia com o seu valor intrinseco.
Se o portador do certificado não puder obter no mercado do Porto, ou no estrangeiro, preço superior áquelle que a commissão estabeleceu pelo seu vinho, o Estado o adquirirá e o pagará pela cotação attribuida. Para tal fim, o Estado terá armazens especiaes no Pinhão ou na Régua, onde recolherá os vinhos de primeira categoria que tiver de comprar, constituindo propriedade d'esses armazens os respectivos certificados de classificação.
E o Estado, por sua vez, collocará esses vinhos generosos na Inglaterra, abrindo, se necessario for, um mercado português em Londres, a fim de convenientemente valorizar esses stocks de autenticos vinhos do Porto.
Não é de crer que o Estado tenha de arcar com quaesquer prejuizos nestas operações, pois que paga os vinhos em papel-moeda e realiza as vendas dos mesmos em ouro, e concomitantemente os interesses naturaes a aproveitar da excellencia dos productos que exhibe á venda.
Mas se, apesar d'isso, fosse necessario cobrir qualquer deficit, ir-se-hia buscar a respectiva compensação ao fundi o do fomento commercial ou ás receitas ao Mercado Central de Productos Agricolas.
Em segundo logar, deixar-se-hia campo de acção livre ao commercio exportador dos vinhos do Douro ou Porto, para adquirir os chamados vinhos de segunda e terceira categorias, que não receberão nem certificados nem valorização por parte da commissão nomeada.
Mas, em compensação, o commercio exportador de vinhos licorosos pela barra do Douro, ou pelo porto de Leixões, ficará obrigado a satisfazer um imposto de exportação de 5 réis por litro de vinho generoso encascado.
É intituitivo que este imposto não pode recair sobre o vinho do Douro que exhiba certificado de qualidade. Mas, sobre os demais, a receita d'esta contribuição deverá attingir uma importancia entre 50 a 80 contos de réis.
Metade d'esta receita destinar-se-hia ao fundo do fomento commercial, e a outra parte restante seria distribuida em rateio e proporcionalmente pelos viticultores do Douro, cujos vinhos tivessem merecido a classificação de 2.ª categoria. Seria tambem medida acertada a reducção nas actuaes tarifas das linhas ferreas do Estado, especialmente nos ramaes do Douro e Villa Real, para os transportes de vinhos da região duriense, e até mesmo um abatimento de vulto aos direitos de consumo na cidade do Porto aos vinhos procedentes d'aquella região.
Esta ultima concessão deve ser feita nos prazos limitados em cada anno. Quanto á isenção de contribuições no Douro, entendo que essa isenção deve manter-se por prazo determinado, mas sem por forma alguma desfalcar as receitas que pertençam ás camaras municipaes e juntas de parochias. E como