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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 10 DE FEVEREIRO DE 1858.

Presidencia do ex.mo sr. Visconde de Laborim,

vice-presidente.

Secretarios, os Srs. Conde de Mello

Visconde de Balsemão.

[Assistiram os Srs. Ministros da Marinha, Fazenda, e Guerra.)

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 28 Dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr.s Presidente aberta a sessão. Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não appareceu reclamação.

Não houve correspondencia. O Sr. Secretario Conde de Mello fez leitura de um requerimento de Antonio Caetano, em que pede ser removido de desenhador do muzeu da Ajuda para a Academia das Bellas Artes. Á commissão de petições. O Sr. Marquez de Vallada pediu a attenção do Sr. Ministro da Guerra; e disse que acabava de ser informado, que ha poucos minutos, na outra Casa do Parlamento, se dirigira uma forte censura a esta Casa, e principalmente á pessoa delle orador, ainda que o seu nome não chegou a ser pronunciado: que era escusado notar a inconveniencia de expressões de desfavor e injurias lançadas por um membro da outra Casa a outro membro desta, ou vice-versa; mas em todo o caso as de que se queixa, e contra as quaes vai reclamar, foram ditas, pretextando-se com a questão que ha dois ou tres dias se suscitou nesta Casa, sobre se o Sr. Ministro da Guerra havia de responder por escripto ou não, por occasião da interpellação, que ao mesmo Sr. Ministro tinha elle orador annunciado; e que em continuação e terminada a referida questão, levou a effeito; necessita, para honra propria e da Camara, que o Sr. Ministro da Guerra diga, se nas palavras que elle orador proferiu, se nas exigencias que fez então, tinha-se mostrado incivil; ou se de algumas dessas palavras se poderia deprehender injuria para S. Ex.ª, ou mesmo má criação, no modo de proceder delle Sr. Marquez; e pediu que a declaração de S. Ex.ª fosse consignada na acta.

O Sr. Ministro da Guerra — Não posso deixar de declarar, em virtude do que exige de mim o Digno Par o Sr. Marquez de Vallada, que estou summamente grato a S. Ex.ª, pela maneira delicada e attenciosa, com que sempre me tem tractado; como os Dignos Pares sabem, eu não posso fallar alto, e por isso outro dia, como me achava incommodado, pedi que me dispensassem de fallar, mas como não foi possivel, dei as respostas, que as minhas forças comportavam. É o que tenho a dizer.

O Sr. Marquez de Vallada — Está muito satisfeito, não esperava outra cousa de um cavalheiro tão distincto como é o Sr. Gromicho Couceiro. Ainda que esteja em divergencia com os principios da Administração, de que S. Ex.ª faz parte, separa sempre o homem politico do cavalheiro particular.

Conclue insistindo em que seja consignada na acta a declaração feita pelo Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Fazenda como membro da outra Casa do Parlamento, e como tendo assistido á discussão a que alludiu o Digno Par, cumpre-lhe dizer a S. Ex.ª, que não ouviu expressão alguma que se podesse referir ao Digno Par, nem o Sr. Presidente da Camara dos Srs. Deputados, se tivesse ouvido qualquer allusão, que podesse ferir o caracter de qualquer membro desta Camara, teria deixado de chamar á ordem o individuo que a proferisse.

O Sr. Marquez de Vallada — A declaração que acaba de fazer ao Sr. Ministro da Fazenda, com quanto honrosa para S. Ex.ª, em nada destroe o

pedido que elle orador fez. O que acabou de dizer não o ouviu elle mesmo, porém ouviu-o grande numero de Dignos Pares, que estiveram na outra Camara. Pode ser, que o Sr. Presidente da Camara electiva não ouvisse as expressões a que se referiu, por causa da confusão que talvez existisse; mas tem toda a certeza o orador, de que foram ditas em alta voz.

Por honra sua, e da Camara a que pertence, não deve o orador consentir, que o tachem assim de incivil.

Não nomea o Deputado que obrou tão inconvenientemente, porque quer mostrar que tem mais prudencia, apesar de ter menos idade; mas se continuar, elle Sr. Marquez hade tirar a mascara a esses homens, que querem ser considerados como patriotas, e que não são senão ambiciosos da peior especie.

E dá tambem os parabens aos Srs. Ministros de terem taes adversarios, porque são um peso de menos que SS. EE. teem ao seu lado; acceitem portanto os Srs. Ministros estes parabens, que são sinceros.

O Sr. Presidente — Está acabado este incidente. Passamos á

ORDEM DO DIA.

Discussão do seguinte

parecer n.º 96.

Foi presente á commissão de fazenda o projecto de lei n.º 102, vindo da Camara dos Srs. Deputados, que tem por fim approvar a proposta feita pelo Governo para ser auctorisado a dispender, pelo Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, até á somma de 30:000$000 réis, para ser empregada nos trabalhos de desobstrucção e limpeza dos canos de despejo da capital.

A commissão, convencida da urgente necessidade de empregar os meios precisos para se conseguir tão util fim, e persuadida de que a exiguidade dos meios pedidos não prejudica qualquer proposta que o Governo julgue conveniente apresentar para obter os recursos indispensaveis para melhorar as condições de salubridade da capital, e para tornar tão efficaz quanto seja possivel o serviço sanitario; é de parecer que seja approvado o referido projecto de lei.

Sala da commissão, 30 de Janeiro de 1838. = Visconde de Castro = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Francisco Simões Margiochi.

projecto de lei n.º 102.

Artigo 1.º É o Governo auctorisado a dispender, pelo Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, até á somma de 30:000$000 réis, para ser empregada nos trabalhos de desobstrucção e limpeza dos canos de despejo da capital.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 23 de Janeiro de 1837. — Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Antonio Pequito Seixas d' Andrade, Deputado Secretario.

O Sr. Marquez de Ficalho declara que vota não só os trinta contos que se pedem, mas que votaria sessenta ou cem, se se julgassem necessarios para esta obra: todavia, se não ha imprudencia da sua parte, desejaria pedir alguns esclarecimentos aos Srs. Ministros.

A limpeza dos canos está hoje entregue á municipalidade, ou é feita por conta do Governo? Parece-lhe que está entregue á municipalidade. (O Sr. Ministro da Fazenda — Sim, senhor.) O Governo perdeu, portanto, toda a ingerencia que podia ter nessa obra, ou conserva-a ainda? A razão por que faz esta pergunta, é porque lhe parece que esta obra vai mal dirigida, e morosa; e que precisava de maior desenvolvimento, e de outra direcção. Não quer de maneira alguma censurar ninguem, e por isso as suas reflexões só teem por fim pedir ao Sr. Ministro da Fazenda, que examine o estado em que vai esta limpeza; e a rapidez com que é preciso que se faça, porque estamos nos fins de Fevereiro, e o mez de Março já apresenta inconvenientes para esta limpeza. Isto é uma lembrança amigavel.

Outra cousa pediu tambem ao Sr. Ministro, e é que, se ha preceitos que impôr aos proprietarios de Lisboa, é necessario que seja quanto antes.

Tem ouvido dizer, que hão de ser obrigados a fazer differentes obras; e, ha alguns proprietarios que querem fazel-as já, e por não saberem quaes são as que lhe hão de ser determinadas, por isso as não fazem. Se se não esclarecer este ponto o mais cedo possivel, não contem depois com os proprietarios, porque se, infelizmente, a molestia apparecer novamente, não os acharão na capital. Pede ao Governo que ponha esses preceitos quanto antes para evitar os inconvenientes que acabou de apontar.

O Sr. Ministro da Fazenda: sente não estar bastante habilitado para podér responder cabalmente ás perguntas do Digno Par o Sr. Marquez de Ficalho; e sente igualmente que o Sr. Ministro das Obras Publicas esteja na Camara dos Senhores Deputados preso pelas necessidades da discussão que alli corre, estando até inscripto para fallar, o que obsta a que S. Ex.ª possa vir a esta Camara satisfazer os desejos do Digno Par. Comtudo, o que póde dizer a S. Ex.ª é, que o fim deste projecto é dar ao Governo maior ingerencia na limpeza dos canos do que aquella que tem tido até agora.

Aquelles trabalhos começaram por conta da Camara municipal; mas como ella não tinha os meios necessarios, requereu ao Ministerio do Reino o auxilio de tres contos de réis semanaes, para dar a esta obra o desenvolvimento possivel, e que ella acredita estará prompto em tres mezes. O Sr. Ministro do Reino remetteu-lhe a representação da Camara, e elle Sr. Ministro fez o que podia fazer pondo á disposição de S. Ex.ª os tres contos de réis semanaes. Em consequencia disto já se tem dado maior desenvolvimento a estas obras, e com os trinta contos pedidos no projecto em discussão, dar-se-ha muito maior desenvolvimento: espera portanto que effectivamente hão de ser preenchidos os desejos do Digno Par, isto é, que as obras tomarão o maior desenvolvimento possivel, para que no fim de mez e meio estejam acabadas. Até agora tem havido algumas dificuldades provenientes da falta de braços, e o Governo tem adoptado todas as medidas possiveis a fim de augmentar o numero dos operarios, o que já se tem conseguido.

Quanto á outra recommendação toma nota della; e espera que com as providencias que o Governo apresentou na outra Camara, que se acham já em discussão, e que hão de vir aqui, se poderão remover todas as difficuldades. Mas, se apesar disso, estas medidas não forem sufficientes, o Governo está disposto a pedil-as aos corpos legislativos, e a assumir toda a responsabilidade possivel para o bom andamento deste negocio.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Sr. Presidente, para que a cidade de Lisboa volte a ser tão saudavel como era, devem-se fazer serios estudos sobre as circumstancias que então se davam, e as que se dão hoje, cumprindo que depois se empreguem todos os meios possiveis que o resultado destes estudos indicar. Eu desejo porém saber desde já se, além do que se tem aconselhado, relativamente á limpeza dos canos, ha por ventura algumas informações das auctoridades e pessoas competentes sobre outras causas da insalubridade da cidade.

Eu entendo que ha uma grande causa de insalubridade que deve ser bem estudada, embora haja grandes difficuldades para remedial-a. Refiro-me ao estado das margens do Téjo. O Téjo vai-se affastando da margem direita, formando assim uma grande restinga de lodo, ao longo da cidade, que nas vasantes das marés fica descoberta, viciando o ar pela evaporação das materias em decomposição que contém.

Eu lembro-me que haverá vinte annos, ou menos ainda, se podia desembarcar pos cács em qualquer estado da maré; mas agora ainda antes que a maré esteja inteiramente vasia, fica já uma grande extensão de terreno descoberto, que progressivamente vai augmentando, que obsta ao embarque, e onde se acummulla o Iodo e todas as imundícies que saem da cidade.

Entendo pois que é á continuada evaporação daquellas materias pútridas de toda a especie que se deve a insalubridade de Lisboa, que desde certo tempo é notada por todos os seus habitantes: portanto acho eu que o maior serviço que se poderia fazer seria o de convergirem todas as diligencias bem combinadas, para se evitar este grande mal: é verdade que somos obrigados a reconhecer que este mal é da maior difficuldade o podér remedial-o, bem considerado o ponto a que as cousas tem chegado; eu vejo que no Téjo vai acontecendo o mesmo que no Ganges, no Nilo, e no Mississipi, cujos deltas produzem uma molestia endémica, propria de cada um, que devasta as povoações. Talvez que o apparecimento da febre amarella entre nós seja um facto estranho a isto, mas não o é de certo a insalubridade em que Lisboa está ha uns poucos de annos.

Mas, pois, que não ouço fallar senão na limpeza dos canos, desejava que os Srs. Ministros me dissessem quaes as informações que teem das auctoridades competentes sobre este objecto.

Os canos realmente carecem muito de serem limpos, mas, na minha opinião, isto é a parte mais insignificante das medidas que nos cumpre tomar. Mas se chamo a attenção do Governo sobre a restinga de lodo que se tem formado ha annos ao longo da cidade, que entendo concorre mui poderosamente para tão triste resultado, observo tambem que ha outros focos de infecção além deste; refiro-me aos pantanos já existentes no Dafundo, mas agora muito mais augmentados em consequencia do aterro, para o caminho de ferro, chamado de Cintra, que só Deos sabe se lá chegará, cujo aterro tem augmentado os pantanos naquella localidade, pelo embaraço que encontram as agoas no rio para saírem para o mar.

Em consequencia dos aterros para o caminho de ferro para Santarem, principalmente nas visinhanças da Azambuja, outros pantanos se teem formado, ou augmentado os já existentes, em consequencia das construcções imprudentes que se teem feito, que cada vez mais embaraçam a saída das agoas para o Téjo, acontecendo que além das causas naturaes que fazem doentias aquellas localidades, as construcções da arte muito mais doentias as tem feito pelo embaraço que oppõe ao escoamento das agoas.

Sei que as agoas ahi estão reprezas, sei que no verão houveram immensas molestias, e grande mortalidade naquellas povoações. (Entrou o Sr. Ministro da Marinha.) É preciso, pois, que o Governo tenha a maior vigilancia em que os aterros dos caminhos de ferro não continuem a embaraçar o livre curso das agoas, cumprindo-lhe igualmente evitar os males já feitos com estas obras, melhorando-se mesmo o estado anterior a ellas, visto que já esse não era favoravel á salubridade publica. Verdade é que já ha uma Portaria, da qual não sei se terá lembrança o Sr. Ministro da Fazenda (OS. Ministro da Fazenda — Agora não me recordo); é expedida pelo Sr. Ministro das Obras Publicas ao Inspector das obras do Téjo, para que se façam todos os esforços para dar saída aquellas agoas, cujo resultado porém ignoro. É necessario, pois, que não nos limitemos agora sómente á limpeza dos canos da cidade; é necessario vêr tambem como se hão de evitar estes grandes focos de molestia que existem nas proximidades de Lisboa, e junto ás margens do Téjo.

Eu pedia, repito, ao Sr. Ministro da Fazenda, que me dissesse se já tinha algumas informações das auctoridades competentes sobre os damnos que causa á cidade a restinga de que fallei, e que me parece ser a verdadeira causa da insalubridade de Lisboa; não me refiro á febre amarella que se pôde ter desenvolvido por outras causas, refiro-me porém ao estado sanitario em geral da cidade, que era antigamente uma das mais saudáveis da Europa, e que tão doentia está (apoiados). Eu sei que a obra necessaria para melhorar este estado é importantissima; sei que não é obra a fazer instantaneamente, mas tambem sei que a salubridade de Lisboa merece que se façam todos os esforços para que se não perca, e se não torne uma cidade infecta, sujeita a diversas epidemias, como nestes ultimos annos tem desgraçadamente acontecido.

O Sr. Conde de Thomar não pediu a palavra para impugnar este projecto, mas para dizer que sente, como o Sr. Marquez de Ficalho, que O Governo não tivesse desde logo pedido uma somma maior para estes trabalhos. Parece-lhe que nesse tempo o Governo não tinha encarado bem a questão; e tanto é assim, que lhe consta que está na outra casa uma proposta, em que pede uma quantia muito maior do que esta para esses trabalhos. Considera este pedido um negocio de expediente para se poderem começar os trabalhos, e por isso ninguem se recusará a approvar este projecto (apoiados).

Tomando em consideração o que já se disse nesta discussão, pede ao Sr. Ministro da Fazenda que tenha a bondade de lhe dizer, se na legislação existente acha meios de compellir os habitantes de Lisboa a fazerem algumas obras, com as que fizer a Camara municipal de accôrdo com o Governo (porque não ha duvida que estas obras hão de andar a par) para poderem ser proveitosas; e para isso ha de de ser necessario obrigar os proprietarios a fazerem as mencionadas obras. Parece-lhe que o Sr. Ministro da Fazenda, na resposta que deu ao Sr. Marquez de Ficalho, disse que o Governo ha de fazer todos os esforços para levar a fim com brevidade estas obras, e que se tiver de exorbitar não terá duvida de vir pedir ao corpo legislativo um bill de indemnidade por saír fóra das attribuições do podér executivo.

Comtudo intende o orador que o Governo devia primeiro que tudo examinar este negocio por si, ou por pessoas competentes, para vêr se com effeito na legislação existente ha meios para coagir os proprietarios a fazerem as obras a que já alludiu, com as que estão a cargo da Camara municipal e do Governo; e se visse que essa legislação não era sufficiente, devia propôr as medidas que fossem necessarias para aquelle fim, porque não acha muito conveniente, que, estando as côrtes abertas, o Governo diga — que fará quanto estiver ao seu alcance para o desenvolvimento destes trabalhos; mas que se fôr preciso, ha de exorbitar das suas atribuições, e virá pedir ao Parlamento um bill de indemnidade.

Não será mais rasoavel e até mais constitucional, que o Governo examine se tem meios na legislação para este objecto, e se os não tiver vir pedi-los, do que deixar passar o tempo, e depois forçado pelas circumstancias exorbitar, e pedir um bill de indemnidade? E se os proprietarios resistirem, como é que ha de obriga-los em falta de lei? (Apoiados.)

Diz isto para obstar aos grandes inconvenientes que podem seguir-se, e para evitar que o Governo representativo seja uma ficção; porque não póde approvar que o Governo peça sempre votos de confiança para tudo (apoiados). E não falla só deste Governo (refere-se a todos), que tem estado ha muito tempo em dictadura (apoiados).

O orador deseja que este systema acabe por uma vez; e pede ao Sr. Ministro que mande examinar este negocio, para vêr se tem na legislação existente os meios necessarios, e proceder depois ás obras (apoiados): e do contrario, para pedir esses meios.

Em quanto a estas obras: se ellas não se desenvolverem com brevidade, como disse o Sr. Marquez de Ficalho, hão de apparecer de certo graves inconvenientes até para a saude publica nesta capital. (O Sr. Marquez de Ficalho — Muito grandes.) Crê que não ha de ser por falta de meios nem de braços, porque esta é a época de os achar com mais facilidade, e dar á Camara municipal os meios para isso, e o Governo tambem pela sua parte fazer a diligencia possivel. O que era necessario, é que houvesse pessoa muito intendida nesta materia, que dirigisse aquelles trabalhos como convem (apoiados], pois que por ora não tem sido assim.

Que cousa é esta de começar um cano n'uma rua pela parte do norte e do sul, e tornando a rua intransitavel, não só ás carroagens (apoiados), mas tambem ás pessoas que andam a pé (apoiados). Porque se não ha de começar esta obra de um lado e acabar do outro? Mas de ambos simultaneamente, é tornar impossivel o transito das ruas (apoiados). Voltando á questão, repete que não tem duvida em approvar o projecto, sentindo só que o Governo não pedisse uma somma maior, porque assim como a Camara vota esta, votaria tambem outra (apoiados).

O Sr. Ministro da Fazenda não foi bem intendido quando disse — que o Governo não teria difficuldade no caso de ter de adoptar alguma providencia fóra das suas attribuições, de vir pedir ao Parlamento que lhe desculpasse este desvio: — no que se referia ao Ministerio da Fazenda, e em quanto á despeza feita agora com a limpeza dos canos da capital; que era possivel que o Governo dispendesse alguma somma maior do que a votada, por ser indispensavel; e nesse caso disse o Sr. Ministro que o Governo não teria difficuldade em dispender, mesmo em presença do Parlamento, e vir depois pedir o bill para a verba que excedesse. O pensamento que teve em vista não foi outro.

O Sr. Ministro já disse na outra Camara que tinha grande repugnancia em pedir votos de confiança, e repetia-o aqui — que quando os pede 6 porque são absolutamente indispensaveis; e quando o Parlamento vota alguma auctorisação ao Governo é porque é necessaria (apoiados). S. Ex.ª disse que não gostava das dictaduras, porque impõe uma responsabilidade a quem se vê obrigado a usar dellas.

Accrescentou, que o facto exposto pelo Sr. Conde de Thomar, de ser apresentada pelo Governo na outra Camara, uma proposta pedindo a auctorisação para o, levantamento de 1.000:000000 réis, não é só para a limpeza dos canos, é tambem para outras obras mais vastas. O Governo reconhe-

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ceu neste simples pedido a necessidade de adoptar medidas n'uma escala maior, e como a salubridade da capital exige, porque toda a mesquinhez neste objecto, seria um verdadeiro disperdicio em linguagem financeira (apoiados).

É necessario dar-se a esta capital tudo quanto carece, e muito mais para a sua salubridade (apoiados). Portanto, a intenção do Governo e dos Dignos Pares que fallaram sobre o assumpto, e de todos os portuguezes, e não só destes, mas de todas as pessoas que teem sentimentos de humanidade e conhecem a calamidade que havia vir da repetição do flagello, que tanto nos atormentou; é de procurar todos os meios para evitar a repetição daquella epidemia (apoiados).

Ainda que elle Sr. Ministro não está habilitado para dar todas as explicações que se exigem, porque este assumpto pertence a dois Ministérios a que é estranho, comtudo sabe que o Governo tem-se aconselhado com o Conselho de Saude, e tem mandado reunir todas as informações, para podér adoptar com conhecimento de causa todas as providencias necessarias para a salubridade publica; e satisfazer deste modo aos desejos dá Camara, e de todos os portuguezes (apoiados).

O Sr. Conde de Thomar satisfizeram-n'o as explicações que deu o Sr. Ministro da Fazenda, sobre a expressão de que se serviu, e como S. Ex.ª entende que isto se refere só ao dinheiro, que seja necessario dar para o bom andamento destes 'trabalhos, não tem o orador que dizer, ainda que estimaria antes que as cousas seguissem mais regularmente, vindo o Governo pedir previamente essa auctorisação ao Parlamento. Em quanto ao que disse sobre o interesse dos proprietarios da capital, observou que elles podiam recalcitrar por falta de legislação a este respeito; mas como da resposta do Sr. Ministro se conclue, que o Governo, se fôr necessario, ha de apresentar as Côrtes as propostas convenientes, tambem nesta parte se dá por satisfeito.

Agora no que não póde dar-se por satisfeito, é sobre a desculpa que S. Ex.ª dá, de não podér responder a este respeito, por ser um objecto alheio da sua repartição, e que pertence a dois Ministérios a que é extranho. O Sr. Ministro tem muita razão no que disse, porque um Ministro de uma repartição não póde responder pelas outras; mas então e necessario acabar com este máo systema (apoiados), tem havido muita complacencia com o Governo, não exigindo a comparencia de alguns Ministros sobre objectos que pertencem aos seus Ministérios (apoiados); mas agora (como já antes de hontem se disse aqui alguma cousa a este respeito), é preciso que o Sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino, que deve ter o pensamento do Ministerio, e tem pendentes nesta casa medidas, que são da sua iniciativa, não entenda que a Camara ha de discutir sempre na ausencia de S. Ex.ª (muitos apoiados). Porque, se por ventura quizer faltar constantemente ás sessões, e lançar para os seus collegas a responsabilidade que lhe compete, elles tem sempre esta solida razão: que não podem dar esclarecimentos, porque o objecto de que se tracta não é da sua repartição; o que comtudo não póde continuar a ser admittido pela Camara (apoiados). Pede portanto venia, para declarar que é necessario cessar este costume ou systema (apoiados), e pede aos Srs. Ministros, que estão presentes, que façam saber ao Sr. Presidente do Conselho e Ministro dos Negocios do Reino, que esta Camara espera que S. Ex.ª venha aqui dar conta dos objectos da sua repartição, e de muitos outros que estão annunciados.

O orador observa, que é necessario que se comece a prevenir já no principio desta sessão, para que não sejam os membros do Parlamento censurados como foram por occasião do encerramento da sessão passada (apoiados), Porque effectivamente foi censurado o Corpo legislativo por não ter tractado de um objecto importante; censura esta que devia recaír sobre o Governo, porque não tinha tomado a iniciativa nelle, que era o da instrucção publica, a qual é com razão considerada como uma das primeiras necessidades do paiz (apoiados), apesar de que até agora não lhe consta que o Governo apresentasse na outra Camara alguma proposta; o que diz por decoro desta Camara, e para que o Parlamento fique fóra de uma nova censura (apoiados).

O Sr. Ministro da Fazenda — É particularmente ao seu collega da Repartição das Obras Publicas a quem pertence responder sobre esta materia; S. Ex.ª, porém, não póde vir aqui, porque, como já disse, está inscripto para fallar hoje na Camara dos Senhores Deputados, e por essa razão é que elle Sr. Ministro vem em seu logar; e está prompto para vir aqui, sempre que seja necessario, porque sempre teve e tem toda a deferencia para com a Camara dos Dignos Pares.

Accrescentou por esta occasião que o Sr. Presidente do Conselho não julgou, talvez, que era precisa agora aqui a sua presença, aliás viria, está certo disso, e pede á Camara que lhe faça essa justiça. S. Ex.ª tem estado muito occupado estes ultimos dias, não só na Repartição dos Estrangeiros, mas tambem na do Reino, á qual ultimamente teem affluido muitos negocios, e hoje é dia de paquete, e por isso precisado a occupar-se dos trabalhos convenientes na Secretaria dos Estrangeiros. S. Ex.ª virá aqui logo que possa, porque não quer fugir a responder pelos seus actos. Pelo que respeita, porém, aos projectos de que fallou o Digno Par o Sr. Conde de Thomar, sabe que o seu collega tem esse assumpto em muita consideração, e em breve o apresentará no Parlamento.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada — O assumpto sobre que recáe o projecto apresentado na outra Camara, é de tanta magnitude, que me parece „ que todo o Governo devia estar inteiramente ao facto das circumstancias que o revestem, e que não era preciso vir aqui responder sobre elle o Sr. Ministro da repartição competente. Se SS. Ex.ªs combinaram em que eram precisos 1:000 contos de réis para as obras relativas á salubridade publica, deviam tambem ter combinado sobre o seu plano, e devia estar o Sr. Ministro da Fazenda mais habilitado para responder ao que se lhe perguntasse.

Sr. Presidente, eu que julgo que esta Camara está resolvida a votar todos os meios quantos forem necessarios, para evitar a repetição dos males por que já passámos, acho que tem direito a exigir dos Srs. Ministros que nos digam quaes as obras que são indispensaveis fazerem-se, em presença da opinião dos peritos; e entenda-se que, com quanto eu esteja prompto para votar as sommas que disserem são precisas para um tão justo fim, não quero votar nada mais; e é por isso que hei de exigir se apresente a opinião dos peritos, e orçamento das obras, para, em presença de tudo isso, com conhecimento de causa se vêr o que se deve fazer. Sendo assim não tenho duvida nenhuma em votar os meios precisos.

Em quanto, porém, ao projecto de lei em discussão, esse ninguem combate, com quanto reconheçam todos que esta somma é insignificante para as obras que convem fazer; quando, porém, se tractar do projecto dos 1:000 contos de réis, então é que convem avaliar as obras em que essa quantia se ha de despender.

O Sr. Marquez de Ficalho sente vêr-se precisado a fallar outra vez, e só o faz por vêr que o Sr. Ministro da Fazenda não respondeu á ultima parte do seu discurso, que tinha referencia ás objecções que os proprietarios podem fazer sobre os preceitos, que se lhes pretenderem impôr para beneficiarem os seus predios.

Passou a fazer algumas considerações, confiado em pessoas da profissão, e de provada intelligencia. Disseram-lhe ellas, que se fossem obrigadas a limpar os canos agora, e as casas daqui a dois annos, preferiam o limpar hoje as casas, guardando os canos para depois. Disseram-lhe tambem que a razão de não haver salubridade em muitas casas, foi o motivo da maior mortandade. Se, pois, ha alguma cousa na mente do Governo, para determinar que os proprietarios façam obras, obriguem-se, e quanto antes, porque o tempo corre, e já Fevereiro vai em meio. E se não ha lei que abranja o caso presente, faça-se. Pede, pois, ao Sr. Ministro a bondade de responder-lhe; se, porém, S. Ex.ª não o podér fazer, ficarão estas observações na lembrança do Sr. Ministro, para as ter na consideração que entender merecerem.

O Sr. Marquez de Vallada — Se esta questão podesse ser tractada agora em terreno mais largo, teria muito que dizer; mas abstem-se disso, e limita-se a declarar que não tem o menor escrupulo em approvar o projecto em discussão.

Aproveita a occasião para dizer, que tambem lamenta que o Chefe do Gabinete não compareça aqui nunca. E em presença do que disse o Sr. Ministro da Fazenda, ficou convencido de que é necessario propôr algumas reformas nas Secretarias de Estado, porque se vê que não convem a accumulação, pelos muitos trabalhos que S. Ex.ª disse tinha o seu collega nas Repartições do Reino, e Estrangeiros: e talvez se apodere de todos os espiritos a convicção de que é preciso separar daquelle Ministerio a Repartição de instrucção publica.

O Sr. Conde de Thomar alludiu a uma passagem do discurso do Throno, proferido por occasião do encerramento da ultima sessão. Se o orador bem se lembra, parece-lhe que as palavras foram estas: «é preciso arreigar por um systema de educação a nossa organisação politica.» Esta phrase é de certo do Sr. Ministro do Reino; sem duvida foi elle que a fez escrever no discurso do Throno. Ora, como S. Ex.ª está compenetrado desta verdade, parece-lhe pouco proprio que S. Ex.ª viesse reprehender-se a si mesmo, porque em geral estes grandes projectos partem sempre da iniciativa do Governo, como succede em todos os paizes, assim na França, e assim na Belgica, quando se tractou dessa grande questão, mas o Sr. Ministro da Fazenda veio socegal-o a esse respeito, quando disse que o Sr. Marquez de Loulé se occupava com toda a assiduidade e ardor dessa grave questão da instrucção publica. O orador ficou satisfeito com isto, e vai mais socegado para casa, porque estava gravemente compenetrado da grande necessidade da refórma da instrucção publica; mas como o Sr. Marquez de Loulé se occupa della com todo o ardor, e por isso talvez não vem aqui, é de esperar que tenhamos um bom projecto de refórma; e desde já assegura ao Sr. Ministro da Fazenda, para o fazer presente ao Sr. Marquez de Loulé, que ha de occupar algum tempo a S. Ex.ª com observações sobre esse negocio; ha de perguntar-lhe qual é seu pensamento sobre a instrucção primaria, secundaria e superior, e a relação que tem a educação com a instrucção publica.

Passando ao projecto que está em discussão disse, que não tinha duvida em o approvar, mas que pedia aos Srs. Ministros, que quando trouxerem a esta Camara votos de confiança, por bem do paiz, por honra sua e do systema representativo, os façam acompanhar de relatorios, porque ha certos negocios graves que precisam de ser desenvolvidos e explicados; e quando assim o não fizerem, elle Sr. Marquez não está resolvido a dar o seu voto, porque não quer concorrer para que o systema representativo morra, e ha de appellar para esta Camara, por isso que é conservadora e liberal. Já tem dito e repetido por vezes, que não reconhece a conservação sem a justa liberdade; e quando esta Camara estiver todos os dias cedendo dos seus direitos politicos, enceta um caminho perigoso, que póde ser nocivo aos interesses publicos, e vai contra o interesse nacional, contra o interesse da monarchia, da conservação e da ordem. Sem a verdadeira e justa liberdade não póde o paiz caminhar. Tem constantemente combatido as demasias revolucionarias, e ha de continuar a combatel-as, venham ellas donde vierem; porque ha cathegorias o classes de revolucionarios, aquelles que querem acabar com o systema representativo n'um sentido são tão revolucionarios como os que o querem acabar n'outro; e aquelles que preparam as revoluções.

Posto a votos o parecer, foi approvado, e bem assim a mesma redacção.

Interrompeu-se a ordem do dia para ter logar a pergunta annunciada já, pelo Sr. Marques de Vallada ao Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Marques de Vallada disse, ha muitos dias tinha pedido, que se fizesse saber ao Sr. Ministro da Fazenda, que desejava dirigir a S. Ex.ª uma pergunta; agora que S. Ex.ª está presente, pede a sua attenção, e espera que lhe responderá com aquella lealdade e cavalheirismo que lhe é tão proprio.

Leu no Diario do Governo, na parte que tracta das sessões da outra Camara, que o Sr. Ministro da Fazenda, o Sr. Avila, dissera naquella casa: — «Como Ministro, e como Deputado, hei de fazer tudo quanto em mim couber para desvincular a terra» — e com isto ficou entendendo, que o Sr. Ministro da Fazenda queria desde já apresentar um projecto de lei para a extincção completa dos vinculos; e agora, pelas palavras que S. Ex.ª disse tambem que o Sr. Marquez de Loulé se occupava de graves questões deixou-se possuir do roteio, de que o Sr. Marquez de Loulé se occupasse desse negocio, que é altamente grave, pois vai mudar completamente a nossa maneira de ser; e de muitos administradores de vinculos sabe o orador, que se inquietaram com o que S. Ex.ª disse. O Sr. Ministro póde ter essa opinião, assim como muitos homens ha que a tem; mas desejava o Digno Par que S. Ex.ª lhe dissesse, se está na firme resolução de acabar com os vinculos em Portugal, porque taes foram as apprehensões que suscitaram as palavras do nobre Ministro.

O Sr. Ministro da Fazenda, se o Digno Par quer dar a este negocio as proporções de uma interpellação, pede elle Sr. Ministro o beneficio do regimento; se S. Ex.ª porém se contenta com uma simples resposta.... (O Sr. Marquez de Vallada — De certo.) dirá francamente a S. Ex.ª que, apezar de não ter a menor idéa de que era esta a pergunta que S. Ex.ª queria fazer, comtudo, na occasião em que disse aquellas palavras na Camara dos Srs. Deputados referiu-se unicamente aos projectos apresentados naquella Camara, e não a nenhum projecto a respeito de vinculos.

Disse, que tinha apresentado na Camara dos Srs. Deputados um projecto, em virtude do qual se facultava ás Camaras municipaes e aos estabelecimentos de piedade e de caridade a venda de suas propriedades, e compra de inscripções com o producto desta venda; tinha igualmente apresentado alli um outro projecto, por virtude do qual era permittido o pagamento das contribuições directas por encontro dos juros das inscripções. Entendeu que estas duas medidas se auxiliavam reciprocamente, e que a segunda sobre tudo, junta com outra que adoptara, e que não carece de lei o pagamento do juro das inscripções nas capitães de districto haviam de convencer aquellas corporações de que lhes era muito mais util, e muito mais vantajoso, em logar de administrarem propriedades com um rendimento variavel, com uma administração complicada, ter titulos de divida fundada, cujos juros recebiam com muita facilidade, visto que se pagavam já nas capitães de districto; e por consequencia administravam uma receita, que não era sujeita á contingencia dos rendimentos de que se acham actualmente de posse. Foi unicamente neste sentido que pronunciou essas expressões: não se referia a nenhum projecto tendente á abolição dos vinculos. Sobre este objecto tem o Sr. Ministro uma opinião, mas não lhe parece que S. Ex.ª careça de a saber agora, nem isso importa á pergunta que lhe dirigiu. S. Ex.ª o que quer saber é, se exprimindo-se então pelo modo que diz, tinha em vista a abolição dos vinculos; declara a S. Ex.ª que esta, idéa não lhe occorreu, e que não se referiu senão a estes projectos de que acaba de fazer menção.

O Sr. Marquez de Vallada a opinião que o Sr. Ministro da Fazenda tinha ha certo tempo, bem sabe qual era, (O Sr. Ministro da Fazenda — É ainda a mesma.) não carecia perguntar, porque de cavalheiro a cavalheiro S. Ex.ª a tinha já dito, e não sabe se lhe fosse possivel dizel-a agora. (O Sr. Ministro da Fazenda — Sem duvida, póde.) S. Ex.ª por duas vezes, antes de entrar para o Ministerio, disse — «Eu sou de opinião que os vinculos devem subsistir, embora se lhes façam quaesquer reformas; (O Sr. Ministro da Fazenda - apoiado.) por tanto, a declaração que fez agora o Sr. Ministro, pareceu-lhe muito leal; e folga de que, depois de ter dirigido algumas censuras quando acabou de fallar, tenha agora de dizer, que tanto o Sr. Ministro da Guerra, como o Sr. Ministro da Fazenda, lhe deram hoje provas de muita lealdade e cavalheirismo. Fica pois satisfeito com a declaração que acaba de fazer o nobre Ministro da Fazenda — que não teve em vista alludir a um projecto de lei qualquer que tivesse por fim a abolição dos vinculos, e certo da sua opinião, pela declaração que S. Ex.ª acaba de fazer, e licença que lhe deu para manifestar a sua opinião. Póde-se pois contar com o Ministerio para auxiliar a Camara n'uma justa e prudente refórma em beneficio dos mesmos vinculos, cuja refórma o orador deseja mais que ninguem, mas que de maneira nenhuma hajam de acabar A sua pergunta foi util e salutar; e espera que todas as pessoas que mais se inquietaram com o que S. Ex.ª disse na Camara dos Srs. Deputados hão de ficar agora tranquillas e satisfeitas.

Tendo terminado este incidente passou-se á discussão do seguinte

PARECER N.° 84.

A commissão de fazenda tendo examinado o projecto n.° 92, vindo da Camara dos Srs. Deputados, a fim de ser auctorisado o Governo a conceder a Joaquim Candido de Moraes um titulo de renda vitalícia pela importancia do rendimento do officio de Escrivão do extincto tribunal da Relação do Porto, é de parecer, que pelos ponderosos motivos em que se fundou a commissão de fazenda daquella Camara, deve o referido projecto ser approvado, para ser convertido em Lai, obtendo a Sancção Real.

Sala da commissão, 10 de Julho de 1838.«= Visconde de Castro = Visconde de Algés = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Barão de Chancelleiros.

PROJECTO DE LEI N.° 92.

Artigo 1.º É o Governo auctorisado a conceder a Joaquim Candido de Moraes um titulo de renda vitalicia, pela importancia do rendimento legalmente provado, do officio de Escrivão do extincto tribunal da Relação do Porto, na proporção marcada no artigo 2.º do Decreto de 16 de Janeiro de 1834, e nos termos da Lei de 22 de Julho de 1833.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 10 de Julho de 1837. = Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario.

O Sr. Conde de Thomar este projecto concede, uma indemnisação pela perda do officio de escrivão do extincto Tribunal da Relação do Porto, e como existem muitos casos da mesma natureza, antes de dar a sua opinião sobre elle, deseja que o Governo ¦ informe a Camara dos motivos especiaes que teve para fazer uma excepção a respeito deste individuo, deixando de apresentar uma proposta de lei, que abrangesse todos os casos identicos.

Depois de certo tempo para cá Icem vindo a esta Camara projectos de favor individual, havendo, aliás, pessoas e classes inteiras, que se acham nas mesmas circumstancias, e de que se não faz caso: alguns destes projectos teem passado sem discussão, mas é preciso, de uma vez para sempre, fazer justiça a todos, ou a nenhum: é preciso que o Governo apresente, quanto antes uma lei sobre este objecto, porque não se podem estar a conceder estas indemnisações individuaes, que vão com offensa da equidade sobrecarregar o Thesouro.

Na especie actual deseja que o Governo informe a Camara dos motivos especiaes que teve para fazer esta excepção; sem o que entende que se não póde fazer este favor.

O Sr. Ministro da Fazenda este projecto não é, que elle saiba, da iniciativa do Governo; nem lhe parece que a commissão desta Camara tivesse ouvido o Governo a este respeito. Não póde deixar de dizer que as observações do Digno Par são fundadas nos mais solidos principios: esse homem, segundo lhe consta, acha-se nas circumstancias mais lamentaveis, e foi esta razão que levou a commissão respectiva da Camara dos Srs. Deputados a apresentar o parecer que serviu de base a este projecto. Como não tem idéa de ter assistido a esta discussão, por isso não póde dar mais explicações a esta Camara.

O Sr. Conde de Thomar — Em consequencia de que o Sr. Ministro não póde dar os esclarecimentos que pediu, não póde o orador de maneira alguma votar, quer seja approvando, quer rejeitando o projecto, porque não se acha habilitado nem para uma, nem para outra cousa. E como o Governo não foi ouvido sobre este objecto, pediria que voltasse á commissão respectiva, para que esta, de accôrdo com o Governo, e tendo em vista os motivos especiaes que hajam para esta excepção, dê novamente o seu parecer.

O Sr. Barão de Porto de Mos — Mal pensava que havia hoje de usar da palavra sobre este projecto, que tinha em vista havia muito tempo.

Este projecto em si parece pequeno, mas é de uma grande magnitude, porque é uma grande injustiça, e esta é sempre grande! O orador não é da opinião do Sr. Conde de Thomar; a sua é de ¦ que não são precisos esclarecimentos para rejeitar este projecto, porque, se bem se lembra, ha a Lei de 28 de Janeiro de 1834, que providenceia sobre este ponto, e diz: todos os que tinham officios poderão obter reformas, achando-se em taes ou taes circumstancias; ora, se o homem se acha nas circumstancias especificadas na Lei, não tinha mais do que requerer, e fazer-se-lhe a applicação della. Mas não se fez isto; e, em logar de se seguir a Lei estabelecida, procura-se, fazer excepções a favor de um homem, que não tem mais direito do que muitos que ha em identicas circumstancias.

Não se diga que vem contestar a justiça deste homem pela perda que elle diz ter soffrido de um officio que era seu; o que vem é fazer lembrar a disposição da Lei que diz, que só teem direito a ser contemplados para a" indemnisação aquelles que recebiam ordenados. O que quer dizer vir agora, depois de tantos annos decorridos, formar uma Lei especial para um unico individuo? Ou este homem não carece desta Lei para ser indemnisado, porque já existe uma que lhe é applicavel; ou se precisa de Lei nova, segue-se que os outros, nas mesmas circumstancias, tambem precisam. Se passar esta Lei o que ha de dizer o Sr. Ministro aos outros escrivães, que lhe forem pedir que faça passar outra Lei a seu favor?

Tem o orador a profunda convicção de que este projecto deve ser rejeitado, e ainda é feliz em acreditar que esta Camara não se conformará com este projecto.

O Sr. Conde de Thomar ordinariamente está sempre de accôrdo com o seu nobre amigo o Sr. Barão de Porto de Moz, mas agora não lhe acontece o mesmo, pela razão que vai dar. Se a Lei é tão clara como diz o Digno Par, admira realmente que este parecer fosse assignado por tres Dignos Pares, que são seguramente tres dos mais habeis jurisconsultos desta Camara, os Srs. Visconde de Algés. Ferrão, e Barão de Chancelleiros. Já se vê que a disposição da Lei não é tão clara como se apresenta; é necessario que a commissão que se julgou habilitada a dar um parecer exactamente contra os termos da Lei, venha desenvolver este negocio, dizendo que confirma a sua opinião, ou que a refórma: e, além disto, como o Governo diz que não foi ouvido, é necessario que vá á commissão declarar quaes as cir-

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cumstancias especiaes que ha para se fazer uma excepção para este individuo.

Se o Sr. Ministro da Fazenda não póde dar a razão que ha para se fazer esta excepção, o que se perde em adiar este projecto para que vá á commissão e decidir-se mais convenientemente? Além disto vê que este projecto foi approvado na outra Camara, e esta circumstancia devo influir para se ter em consideração este negocio.

Não ignora que a opinião do Sr. Barão de Porto de Moz póde ser sustentada, sendo certo que a Lei a que elle se refere contém as provisões apontadas por S. Ex.ª; mas não lhe parece que o negocio seja tão claro como S. Ex.ª julga; e que é preciso examinal-o attenciosamente, mesmo por consideração para com assignaturas tão respeitaveis como as que se acham exaradas no parecer. Taes são os motivos porque entende que a Camara o não deve rejeitar in limine, sem saber se a opinião da commissão se conforma com os esclarecimentos que os Srs. Ministros apresentarem.

O Sr. Barão de Porto de Mo: não suppõe que estejam divergentes em opinião, o orador com o Sr. Conde de Thomar. S. Ex.ª é um pouco mais prudente do que elle orador; isso é natural: quer mais esclarecimentos, o orador já se satisfazia com os que tem, mas de certo não ha de deixar de convir na sua opinião, porque desde que um Digno Par, tão esclarecido como S. Ex.ª é, e tão superior, acaba de dizer que ainda não está bem esclarecido, seria vaidade da sua parte o suppôr-se mais esclarecido; e falta de cortezia não querer que se esperasse que S. Ex.ª se esclarecesse como lhe convinha.

Vá pois á commissão o projecto; volte lá para depois voltar aqui; mas o orador se cá estiver, conta que ha de rejeitar aquillo mesmo que hoje rejeitaria, e que faria a diligencia para que effectivamente fosse rejeitado; não in limine, porque nunca se rejeita in limine um projecto que tem um parecer de commissão.

A Lei tem providenciado sobre as indemnisações de prejuisos, em perda de officio, sabe-se, ainda que não seja pela lettra della, mas pelo reflexo que vem de todas as cousas, que deve estar providenciado a este respeito. A Lei, crê que de 16 de Maio de 1832, intendia com esta materia; mas já dá de barato que não exista Lei nenhuma a este respeito; mas então, se não existe, faça-se uma geral, e não seja para um caso unico; porque isto que se vê aqui é de prejuizo, injustiça, e talvez injuria; é a injuria misturada com a injustiça, é a injuria a todos os direitos perdidos em igualdade de circumstancias. E não se ha de fazer caso, vendo um só erguer-se de entre este grupo immenso de prejudicados! Por que motivo se ha de fazer assim uma Lei especial; é pela belleza dos olhos, como se costuma dizer? Não ha injustiça nenhuma, por pequena que seja, no meio da sociedade, que não tenha um immenso alcance.

Nesta Camara quasi todos são velhos, salvo alguns que tem a ventura de terem entrado ultimamente por direito de successão, avaliem todos bem as considerações que acaba de fazer, e digam se isto é justiça; se este projecto deve aqui passar. Vá pois o projecto outra vez para a commissão, visto que se quer que elle tenha dois pareceres; seja assim, quando mais não seja, para que menos fundamento haja para se podér dizer' que o projecto foi rejeitado in limine.

O Sr. Presidente — Devo, como satisfação á Camara, dizer, que não propuz logo á votação admittir-se o adiamento, visto que era o que se estava já discutindo conjunctamente com a materia; e como ninguem mais pedia a palavra, e ninguem mais a tem, vou agora pôr á votação o adiamento, isto é, a proposta de adiamento para este projecto voltar á commissão.

Posto a votos o adiamento foi approvado.

O Sr. Presidente — Não sei se a Camara quererá continuar com os trabalhos tendo já dado as quatro horas, mas observo que nós começámos mais tarde do que deviamos (apoiados). Então passa-se ao parecer n.º 100 que está dado para ordem do dia.

Entrou em discussão o parecer (n.° 100).

A commissão de instrucção publica examinou com a devida attenção o projecto de lei n.º 98, vindo da Camara dos Senhores Deputados, e que tem por fim incorporar na Escóla polytechnica o museu de historia natural da Academia Real das Sciencias de Lisboa.

Á commissão, conformando-se com as razões e fundamentos exarados no relatorio que precedeu a proposta do Governo, em parte adoptada pela commissão de instrucção publica da outra casa, os quaes não reproduz por brevidade:

É de parecer que o projecto de lei n.º 98 seja approvado e convertido em lei para ser submettido á Sancção Real.

Sala da commissão, 8 de Fevereiro de 1838. = Conde de Thomar = Joaquim Antonio de Aguiar = Marques de Vallada.

PROJECTO DE LEI N.° 98.

Artigo 1.° O museu de historia natural, que foi, por Decreto de 27 de Agosto de 1836, transferido para a Academia Real das Sciencias de Lisboa, passa para a Escóla polytechnica.

§ 1.° As collecções de zoologia e mineralogia, e todos os demais objectos pertencentes ao mencionado museu, são incorporados nos gabinetes de zoologia e mineralogia da mesma Escóla.

§ 2.° Estes dois gabinetes ficam constituindo as duas secções do museu.

Art. 2.° A direcção scientifica e a administração economica do museu ficam a cargo dos lentes proprietarios da sétima e oitava cadeiras da Escóla polytechnica, debaixo da inspecção e fiscalisação do Conselho escolar e Junta administrativa.

Art. 3.° A quantia de 1:869$000 réis, em que importa a despeza do museu, que actualmente se acha auctorisada, terá a seguinte applicação:

A cada um dos Directores a gratificação annual de 200$000 réis;

A um preparador de mineralogia, que servirá ao mesmo tempo de conservador do museu, o ordenado de 300$000 réis annuaes;

A um preparador de zoologia o ordenado annual de 200$000 réis;

Para a acquisição de exemplares, conservação das collecções, e outras despezas do museu réis 969$000 annuaes.

Art. 4.° O provimento dos logares de preparadores, que actualmente compete ao Conselho administrativo da Academia, será feito pelo Conselho da Escóla polytechnica sobre proposta dos Directores.

Os outros serviços do museu serão regulados e retribuidos pelo modo que os mesmos Directores julgarem mais conveniente, debaixo da fiscalisação da Junta administrativa da Escóla.

§ unico. As pessoas actualmente empregadas no museu, que estiverem prestando bom e effectivo serviço, serão preferidas em igualdade de circumstancias pela nova Administração deste estabelecimento.

Art. 8.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 12 de Janeiro de 1858. = Joaquim Filippe de Soure, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = D. Antonio da Costa, Deputado Secretario.

Foi approvado sem discussão, e depois o projecto e a mesma redacção.

O Sr. Presidente — A ordem do dia para sexta-feira proxima (12 do corrente), será a apresentação de pareceres, para o que se devem reunir ámanhã as commissões; e além disso terão logar as interpellações annunciadas, estando presentes os Srs. Ministros, para o que se lhes ha de fazer o respectivo aviso pela Secretaria desta Camara. Está levantada a sessão

Eram quatro horas e meia da tarde.

Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 10 de Fevereiro de 1858.

Os Srs. Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, do Pombal, da Ribeira Grande, e de Vallada; Condes: das Alcaçovas, dos Arcos, da Azinhaga, de Fonte Nova, de Mello, de Paraty, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Sobral, e de Thomar; Viscondes: de Balsemão, de Benagazil, de Campanhã, de Fonte Arcada, de Ovar, de Sá da Bandeira, e de Ourem; Barões: de Pernes, de Porto de Moz; Mello e Saldanha, Sequeira Pinto, Ferrão, Margiochi, Silva Carvalho, Aguiar, Larcher, Silva Sanches, e Brito do Rio.

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