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de Mesquita. Responderei que a questão não tem paridade alguma. Aqui a oficialidade tinha marchado completamente em contravenção com o artigo 6.° do regulamento militar, cujas disposições estão hoje muito mais desenvolvidas no artigo 1.°, §§ 1.°, 2.° e 3.° d'este regulamento, emquanto que na hypothese em discussão iam inteiramente em conformidade com essas disposições do regulamento; e tanto se conheceu isto, que posteriormente este digno coronel pedindo conselho de guerra, e sendo ahi apresentada a verdade e a justiça d'este negocio, a sua conducta, á vista das provas que elle deu, foi completamente julgada illibada, como se vê da ordem do dia n.° 46, de 30 de julho de 1841, que diz assim:

«Publica-se ao exercito o seguinte:

«Sentenças proferidas pelo supremo conselho de justiça militar — Em sessão de 13 do dito mez — 3.ª secção do exercito. — Miguel Correia de Mesquita Pimentel, coronel, foi absolvido, e julgada illibada completamente a sua conducta relativamente ás arguições que lhe foram feitas na ordem do exercito n.° 31, do corrente anno.»

Eis-aqui, sr. presidente, como se vem transtornar todas as idéas, unicamente para sustentar o artigo de censura, que não póde ter o menor fundamento.

A todos os dignos pares que têem recorrido, na falta de lei, para os principios, perguntarei em primeiro logar, aonde esta esse codigo de principios para que appellam? Onde esta elle?

Eu sei, sr. presidente, que ha uma lei verdadeira, a recta rasão conforme com a natureza; que esta lei é immutavel e universal, que é feita por Deus, discutida por Deus e sanccionada por Deus, e que é a mesma em Roma e Athenas, em todos os tempos! Mas, sr. presidente, se nós nos quizessemos regular por essa lei, abstrahindo de que estamos n'uma sociedade constituida; se o grande attributo da civilisação não fosse que todos os casos sejam determinados por leis expressas, em ordem de evitar o arbitrio, o recorrer a essa lei que, embora boa para dirigir os bons é inefficaz para corrigir os maus, seria proscrever tudo quanto ha constituido na sociedade, e n'essa caso escusamos de tribunaes, de administração e de governo, e os codigos todos podem ser queimados juntos com todas as leis, e os parlamentos têem de desapparecer, porque não são creados senão para fazer as leis. Eis-aqui estão as consequencias absurdas de um tal principio. Quero sempre fazer a descripção d'essa lei com as palavras de Cicero De republica. Quer V. ex.ª, sr. presidente, saber o que elle diz a este respeito, eis-aqui tem:

«Ha uma lei verdadeira a recta rasão conforme a natureza universal, immudavel, eterna, cujas determinações convidam ao dever, cujas prohibições afastam do mal, seja que ella ordene ou prohiba; não é poderosa senão para os bons, faz-se sim escutar dos maus mas não os convence. Não póde invalidar-se por outra lei, nem seja derrogada ou abrogada. Nem o povo, nem o senado podem dispensar-se de obedecer-lhe. E interprete de si mesma. E a mesma em Roma e Athenas, e é de todos os tempos. Por toda a parte, em todos os tempos, reinará esta lei immudavel e santa e com ella Deus o Senhor do mundo, que a fez, discutiu e sanccionou. Desconhece-la é abjurar, calcar aos pés a natureza, e inflingir-se, por isso, a mais cruel punição, quando mesmo a justiça humana não impozesse outros castigos.»

Vede como a respeito da criminalidade dos factos humanos appella para as leis positivas. É para ellas que devemos tambem appellar na questão que discutimos, e sómente n'ellas poderiamos fundamentar accusações ou censuras, como aquellas que se dirigem ao illustre ministro da guerra.

Sr. presidente, acho-me summamente fatigado, por consequencia termino aqui o meu discurso mandando para a mesa uma moção; mas não é minha intenção de maneira alguma, nem o podia ser, impedir outra qualquer moção, por cuja admissão á discussão hei de votar, nem tão pouco concorrer para que esta discussão seja menos ampla, porque estou ancioso por ver brilhar os grandes talentos que ornam esta camara. Estando nós empenhados no combate da justiça e da legalidade, é bom que todos apresentem nas suas luzes no tribunal da rasão, perante o altar da patria, e a opinião publica ajuisará de que lado esta a verdade. (Apoiados — Vozes: — Muito bem.)

Mando para a mesa a minha moção de ordem, que é como se segue (leu).

Foi lida na mesa, e admittida á discussão.

O sr. Presidente: — Na ordem da inscripção segue-se o sr. Moraes Carvalho, mas ha alguns dignos pares que pediram a palavra sobre a ordem, e não sei se desistem da palavra...

O sr. Conde d'Avila: — Eu não posso desistir.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. conde d'Avila, que é quem primeiro pediu a palavra sobre a ordem.

O sr. Conde d'Avila (sobre a ordem): — Sr. presidente, não foi porque não tivesse muito gosto de ouvir o sr. Moraes Carvalho, que não desisti da palavra, pois tenho muita satisfação de ouvir novamente a s. ex.ª, a quem darei a mesma attenção que lhe dei a primeira vez que fallou, e até me parece, que s. ex.ª tem necessidade de tornar a usar da palavra, visto que algumas das proposições que sustentou, não foram bem interpretadas: insisto porém em ter a palavra, porque tambem tenho de mandar para a mesa uma moção de ordem, que não tem igualmente por fim encerrar o debate, e começarei por lê-la á camara (leu).

Esta moção é uma especie de adiamento, e por consequencia, sr. presidente, peço a V. ex.ª, que quando tratar de pôr á votação as diversas moções que estão sobre a mesa, dê a preferencia a esta, que tem, como disse, a natureza de adiamento.

E agora peço licença para dizer duas palavras, a fim de justificar até um certo ponto esta moção.

Parece-me que depois de uma discussão tão prolongada, não póde ter logar o mandar este negocio a uma commissão, mas as rasões que vou apresentar á camara, demonstrarão que no estado em que se acha o debate não ha outra solução mais conveniente para a camara, até em vista de uma resolução, que já tomou, do que esta, que tenho a honra de propor.

Quando esta discussão começou, comprehendi logo que era impossivel que se podesse votar sobre ella, porque me pareceu que a camara não estava sufficientemente illustrada para o fazer. Os documentos sobre que versava a interpellação, ou sobre que versavam as censuras feitas ao sr. ministro da guerra, se se lhes quizer dar este nome, não eram bem conhecidos da camara; parece-me que só os tinha visto o digno par interpellante, que depois os passou ao sr. Moraes Carvalho. Eu não os tinha examinado, e só de corrida os vi depois. Creio que a maior parte dos dignos pares, ou quasi todos, os não viram ainda. O proprio "sr. ministro da guerra confirmou antehontem esta minha idéa, quando pediu que todos os documentos relativos a esta questão fossem publicados na folha official, requerimento que a camara approvou.

Ora, qual podia ser o alcance do requerimento do nobre ministro? Não podia ser outro senão o de manifestar que s. ex.ª estava convencido de que esses documentos provavam a regularidade do seu procedimento, e o nenhum fundamento que havia para as accusações que lhe eram feitas. Mas esses documentos ainda não foram publicados; tenho-os procurado na folha official e ainda os não vi lá. Logo a camara ainda não tem presente a justificação a que recorreu o nobre ministro, e não póde por consequencia votar. O mesmo digo com relação á proposta ou moção do sr. Silva Cabral. Permitta-me s. ex.ª que lhe diga, que a sua moção não póde ser approvada, e o primeiro a quem ella não convem é ao proprio sr. ministro...

O sr. Silva Cabral: — Peço a V. ex.ª que note uma cousa, e vem a ser — que a minha moção foi mandada para a mesa antes de V. ex.ª mandar a sua; mas se se quer mandar este negocio a uma commissão para o examinar, eu de fórma alguma me opponho.

O sr. Conde d'Avila (continuando): — Muito bem.

Sr. presidente, eu não proponho que esta commissão examine unicamente os documentos que hão de ser publicados no Diario; proponho que ella dê tambem parecer, emitta a sua opinião sobre alguns pontos, que reputo muito graves, e sobretudo agora, depois das observações que aqui se têem produzido a respeito d'elles. Já se vê que fallo das manifestações collectivas dos officiaes do exercito e de revogação de decretos por portarias.

Sr. presidente, os dignos pares que combateram os argumentos firmados na ordem do dia de 1811 e no regulamento disciplinar de 1856, devem lembrar-se de que a carta constitucional, que é para nós todos de maior auctoridade do que esses dois diplomas, diz n'um dos seus artigos, o artigo 115.°, muito expressamente, que a força militar é essencialmente obediente.

Logo, só lhe cumpre obedecer aos seus superiores, e não póde discutir nem as nomeações d'elles, nem as suas qualidades. Desde o momento em que se lhe permitta discutir a favor, ha de permittir-se-lhe discutir contra (apoiados). O digno par fallou em pontos de honra, e disse que estes eram exceptuados; mas esta proposição na bôca de um homem tão auctorisado, póde dar logar a muito grandes abusos (apoiados), é por isso que entendo que é necessario firmar por uma vez o verdadeiro direito a este respeito para evitar os abusos.

O regulamento disciplinar de 1856 diz que todas as reclamações collectivas são expressamente prohibidas. Se se admitte o principio do digno par, isto é, que ficam exceptuados os pontos de honra, a que ficará reduzida aquella disposição? Quem é que ha de declarar aonde começam os pontos de honra, e aonde acabam? (Apoiados.) Hão de ser os reclamantes?

O digno par não quer por certo as consequencias que se podem deduzir das observações feitas por ss. ex.ªs; é por isso, repito, que julgo indispensavel que a camara se pronuncie da maneira a mais explicita sobre a verdadeira doutrina. O digno par, bem como o meu amigo o sr. Moraes Carvalho, procuraram repellir as censuras feitas ao nobre ministro; mas não me parece que para isto seja necessario mais do que a observação feita pelo sr. general Baldy, de que as manifestações a que se tem alludido estavam em uso, e eram por consequencia toleradas. Pois muito bem, deixemos o passado; mas evitemos que para o futuro se repitam taes actos, que não posso deixar de considerar como verdadeiras infracções da disciplina do exercito.

A questão das portarias tambem me parece que precisa ser tratada (apoiados). O digno par o sr. Moraes Carvalho, a quem ouvi com toda a attenção, effectivamente não sustentou, que portarias podiam revogar decretos, v. ex.ª tem a palavra, e eu desejei fallar antes do digno par, para que me corrija se não for exacto. O que eu ouvi dizer a s. ex.ª, foi que a portaria de 28 de outubro, modificou sem duvida o decreto de 22 de agosto de 1864; mas que s. ex.ª tinha visto outras portarias modificarem decretos, e até que havia uma portaria que revogava' uma lei. Emquanto a esta portaria, visto que o cavalheiro a que s. ex.ª se referiu, não tem assento n'esta casa, direi que estou de accordo em todos os elogios que o digno par fez a esse cavalheiro, e na justiça que fez ás suas brilhantes qualidades; mas é força confessar tambem, que essa portaria foi feita n'uma situação muito diversa d'aquella em que se promulgou a portaria de 28 de outubro de 1864. O nobre ex-ministro tinha apresentado na camara electiva uma proposta para a prorogação do praso para a troca e giro das moedas de oiro e prata mandadas retirar da circulação pela lei de 1854.

Esta proposta foi apresentada em novembro de 1859; mas a camara foi dissolvida poucos dias depois, e foi convocada nova camara que se devia reunir a 26 de janeiro do seguinte anno, e o praso da lei votada para a troca e giro das referidas moedas findava a 31 do mesmo mez. Já se vê por consequencia que a proposta cuja iniciativa o ministro declarava que ía renovar, não podia ser convertida em lei antes de 31 de janeiro; e o que fez então o illustre ministro? Ordenou que em todos os cofres do thesouro, em que entravam as contribuições publicas se recebessem essas moedas. Aquella situação era pois uma situação excepcional, e a medida adoptada era a unica que se podia tomar em taes circumstancias. O nobre ministro assumindo a responsabilidade d'ella fez pois um muito bom serviço ao paiz.

Mas a portaria de que se tem fallado, é um documento que modificou um decreto referendado por dois ministros, e que o modificou em circumstancias ordinarias, em que nada era mais facil do que publicar outro decreto com as mesmas solemnidades. Era principio que nunca ninguem se lembrou de contestar, que um decreto não póde ser revogado senão por outro decreto (apoiados), e um decreto que foi referendado por dois ministros não póde ser modificado senão por outro que tenha exactamente as duas referendas (apoiados). Mas desde que esta doutrina parece ter sido posta em duvida é necessario que a camara se pronuncie a respeito d'ella (apoiados).

O anno passado apresentou-se n'esta casa uma moção em que se qualificavam os actos praticados em um districto do reino, por occasião de eleições, como illegaes e attentatorios da liberdade da uma, e pedia-se a nomeação de uma commissão para examinar até que ponto o governo era responsavel por esses actos. O governo aceitou a proposta, e votou por ella. Eu rejeitei-a, não por não querer a commissão, mas pelos termos em que a proposta estava redigida.

Mas o governo, como disse, aceitou a proposta, e o resultado justificou essa resolução, porque da nomeação da commissão resultou proclamar-se um bom principio, que, afigura-se-me, foi muito bem recebido no paiz, e muito honrou esta camara. Esse principio foi, que as suspeições politicas eram contrarias á carta. Este principio passou; e pro-cedendo-se poucos mezes depois ás eleições geraes de deputados não houve ninguem que ousasse invocar taes suspeições para viciar a uma. Ora eu proponho que façamos o mesmo agora em relação ás duas questões que tenho indicado. Peço á camara que se pronuncie sobre ellas, até pela obrigação, que tem de velar pela guarda da constituição e dos principios fundamentaes do systema que nos rege (apoiados). É neste sentido que mando esta proposta para a mesa. Se a camara me honrar admittindo-a á discussão pedia que ella fosse votada com preferencia; se a camara porém julgar que se acha já esclarecida a este respeito, e que deve rejeitar a minha proposta, eu declaro já que não posso approvar tambem a proposta do sr. Silva Cabral. Esta proposta votada seccamente, permitta-me s. ex.ª a expressão, que me parece não póde ferir a sua susceptibilidade...

O sr. Silva Cabral: — De modo nenhum.

O Orador: — Esta proposta votada simplesmente ha de ter por commentarios o discurso do digno par, e o do sr. Moraes Carvalho, dos quaes póde alguem inferir: 1.°, que são permittidas as manifestações collectivas dos officiaes do exercito a respeito dos actos dos seus superiores; 2.°, que portarias podem modificar decretos. Eu não quero a responsabilidade de taes doutrinas, por isso hei de rejeitar a moção do sr. Silva Cabral, e hei de votar qualquer proposta redigida em conformidade com os principios que acabo de indicar. E se durante o debate não se apresentar proposta alguma n'este sentido, eu terei de a mandar para a mesa, porque é minha opinião firme e inabalavel, torno a dizer, que as manifestações collectivas dos officiaes militares a respeito dos 'actos dos seus superiores, approvando-os ou censurando-os, são inteiramente contrarias á disciplina do exercito, e á letra e espirito da carta (apoiados); e que leis não podem ser revogadas senão por leis, e decretos por decretos (apoiados).

Mando para a mesa a minha moção:

«Requeiro que uma commissão especial eleita por esta camara, dê com urgencia o seu parecer sobre os documentos mandados imprimir no Diario de Lisboa, na sessão de 13 do corrente, a requerimento do sr. ministro da guerra, e alem d'isto sobre as questões seguintes:

«1.ª Se as manifestações collectivas dos officiaes militares, a respeito dos actos dos seus superiores podem ser permittidas, sem quebra da disciplina do exercito;

«2.ª Se as disposições do decreto de 22 de agosto de 1864, que regulou a concessão da medalha militar, creada pelo decreto de 2 de outubro de 1863, podiam ser alteradas ou modificadas por portarias; se foram expedidas algumas portarias para este fim, porque ministerios e sobre que assumptos;

«3.ª Finalmente, se o citado decreto de 22 de agosto, é cumprido da mesma maneira pelo ministerio da guerra e da marinha e ultramar.»

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta do digno par, o sr. conde dAvila.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que admittem a proposta tenham a bondade de se levantar. Foi admittida.

O sr. Rebello da Silva: — Mandou para a mesa a seguinte moção de ordem, declarando que n'esta completava a que foi apresentada pelo digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho:

«A camara, considerando que leis e decretos não são revogáveis, nem podem ser alterados por portarias;

«Considerando que a designação da especie na medalha