SESSÃO DE 31 DE MAIO DE 1887 311
O negro não aprende, ou só muito difficultosamente póde aprender.
Tem havido alguns homens em Africa que têem tido uma certa instrucção, mas são excepções á regra geral. E as excepções confirmam a regra geral.
Ainda não soou no relogio da Providencia Divina, que tudo governa, a hora da sincera conversão ao christianismo e da verdadeira civilisação da Africa. Comtudo, ella já foi a parte do mundo mais enrista, mais civilisada e onde a religião catholica teve mais ascendentes 5 mas hoje não.
Os concilios que ali se celebraram, e os africanos a quem a igreja catholica tem decretado o culto devido aos seus heroes são a prova d'esta verdade.
Qual é a rasão, sr. presidente, porque na China, depois da saída dos nossos missionarios, nunca mais o christianismo póde ali conservar-se florescente? No tempo d'elles floresceu e floresceu muito.
Foram elles que fundaram as duas dioceses de Pekin e Nankim que hoje já nos não pertencem.
O proprio S. Francisco Xavier pretendeu sempre entrar na China, mas não tinha ainda chegado a hora que a Providencia tinha marcado para se introduzir o christianismo n'este tão vasto imperio, e S. Francisco Xavier morreu ás portas da China, na ilha de Sanchão, defronte de Singapura, mas não conseguiu lá entrar.
Estou um pouco fatigado, sr. presidente, e vou terminar o meu discurso pedindo a v. exa. e á camara que, neste negocio importantissimo para a honra e decoro dá nação portugueza, para o seu prestigio no oriente e salvação de tantas almas, não haja politica. (Apoiados.)
A chamada fidelidade ou lealdade partidaria não deve ter logar na resolução d'esta questão, (Apoiados} que não é politica, nem o deve ser, (Apoiados) e não é como qualquer outro negocio publico que depois se possa emendar. (Apoiados.)
O padroado portuguez está no terrivel leito de Precusto!
Sim, sr. presidente, se nós não valermos ao padroado, se esta camara que tem dado tantas provas de independencia, e que ainda é a representante da aristocracia, e que conta entre os seus membros muitos dignos pares, cujos antepassados ganharam na Asia, no territorio do padroado as suas esporas de ouro; se esta camara se não lembrar d'isso, e que as ossadas de muitos dos seus maiores guardadas nas igrejas fundadas pelos portuguezes vão ser calcadas aos pés do estrangeiro; então, Ai do padroado!!! (Apoiados.)
Porque, nós como muito bem disse o digno par o sr. Thomás Ribeiro, estamos assistindo ás exequias do padroado. (Muitos apoiados.)
As exequias, porém, não são solemnes, nem o podem ser, porque como disse o digno par só aqui está um bispo para tomar parte n'ellas. È disse bem, porque eu pobre sacerdote, o solitario de Cabanas, nem já sirvo para resar uma missa de defunctos.
Quasi que não tenho voz que me permitta supplicar para ser attendido. Fui abandonado, mas tenho a firme convicção de ter prestado alguns serviços ao meu paiz.
Vim a esta camara para advogar a causa do padroado portuguez e não para me queixar. Nem tão pouco pretendo arguir ou censurar ninguem.
Quando arcebispo de Braga tive necessidade de consultar a Sé Apostolica, por escrupulos de consciencia motivados pela transmissão da minha jurisdicção espiritual. Pedi a costumada licença para o fazer, que me foi negada pelo governo, apesar de sempre eu ter procurado conciliar os interesses da Igreja com os do estado. Como era meu dever, e consequencia da minha fé religiosa offereci a minha resignação e acceitaram-na...
E eu... Eu vivo contente, porque a minha terra amei e a minha gente.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi cumprimentado por muitos dignos pares de ambas os lados da camara.)
Leu-se na mesa a moção do mesmo arcebispo resignatario, que, por votação da camara, foi admittida á discussão.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Sr. presidente, não é sem um sentimento de profunda reluctancia que me levanto n'este momento, não porque não me animem o respeito e consideração pelo digno par que acaba de fallar, de que já na semana passada lhe dei testemunho, ou porque me faltar a vontade de responder-lhe; mas porque tenho usado, n'esta camara e na outra, tantas vezes da palavra na defeza d'este acto do governo, que receio importunar a camara com a repetição do que já tive occasião de dizer na outra casa do parlamento.
Obriga-me comtudo a usar da palavra a nova feição que o digno par que acaba de fallar imprimiu ao seu discurso, pois que esteja se não apresenta, com o caracter de querer apenas levantar um brado auctorisado em favor de muito poucas christanciades da India que ficarão fóra do padroado.
Eu sinto que s exa. se desviasse do caminho seguido quando da primeira vez discursou n'esta camara, e viesse atacar directamente o governo e convidal-o nos termos mais colorosos a apresentar á camara a concordata, naturalmente para a poder ainda alterar, visto que s. exa. a combate.
Ora, sendo eu o unico membro do governo que está presente, não podia deixar de pedir a palavra para dizer que tendo nós, compromettido n'esta negociação o nome de Portugal, perante uma entidade que, se não é uma potencia, está revestida de attributos taes, que nós tratámos com ella como de igual para igual, não poderiamos acceitar essa doutrina, e se a vissemos adoptada pela camara, teriamos de desapparecer dos bancos do poder.
O governo aqui está e acatará o veredictum que á camara, na sua inteira liberdadade de acção, aprouver intimar-lhe; mas, repito, deixará o poder se tal doutrina for acceita.
Se a camara, na sua perfeita independencia entender que deve condemnar o governo, o governo acceitará com magua essa resolução " seguirá o caminho que as praxes constitucionaes lhe indicam.
Repito, pois, que o governo ficaria compromettido se se procedesse dessa forma, visto que se modificava e alterava um tratado que está já produzindo os seus effeitos, que já deu a nomeação dos bispos e a bulla "Humanae, salutis.
Desde o momento que esta camara entendesse que esse tratado podia ser discutido no parlamento, o governo não ficaria em boa posição, e creio que a nação não ficaria melhor.
Mas, sr. presidente, vejamos agora primeiro que tudo se o acto que o governo praticou foi ou não constitucional.
O digno par sr. Ornellas já aqui apresentou muito em resumo alguns argumentos, que a meu ver são ponderosissimos, para mostrar a perfeita constitucionalidade do acto que o governo praticou.
Eu tambem na outra camara fiz ver que o governo tinha andado constitucionalmente n'esta questão.
O digno par, sr. arcebispo resignatario de Braga, disse que o governo tinha prescindido de um direito valioso, de um direito que era da corôa e do paiz, e isto sem annuencia das côrtes.
Perguntava s. exa. como é que o governo póde renunciar, sem consultar o parlamento, a um direito tão valioso, tão singular, um direito que nos dava uma situação tão excepcional, amesquinhando assim o seu paiz perante as nações estrangeiras?
Ora, sr. presidente, nos termos em que o digno par fallou, o governo é réu do crime de ter concluido uma con-