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SESSÃO DE 31 DE MAIO DE 1887 313

estavam formulados de modo a auctorisar interpretação do governo, o que decerto não succederá outra vez.

Disse o digno par o sr. arcebispo resignatario de Braga que o governo não tinha necessidade de proceder com precipitação.

Pois não estava o nosso embaixador declarando a necessidade instante que havia de resolver o assumpto?

S. exa. lançou mão de um meio vulgar nas discussões politicas, isto é, apresentou ou leu a parte dos documentos que serviam para a sua argumentação, mas absteve-se cuidadosamente de apresentar aquelles que justificam o acto do governo ou as rasões que determinaram o modo por que eu procedi.

O nosso embaixador escrevia para Lisboa o seguinte:

(Leu.)

Quero eu dizer com a leitura d'estes dois trechos que declino a responsabilidade da resolução do governo sobre o nosso embaixador?

De modo algum. A responsabilidade é toda do governo e só d'elle.

O digno par o sr. arcebispo resignatario de Braga, analysou-nos aqui o artigo de um jornal e disse que pela concordata de 1886 tinha havido perdas e lucros.

Ainda bem que houve perdas e vantagens.

S. exa. revma. leu-nos una trecho no qual se dizia que em certo bispado se tinham perdido tantas almas, mas que em outro bispado se tinham ganho tantas.

Por ahi se vê que houve compensações, e compensações de natureza tal que uma foi de nada menos de 22:000 fieis. Esse jornal é estrangeiro, e portanto, é um testemunho insuspeito, embora s. exa. revma. diga que elle é mais ou menos inspirado pela Santa Sé, o que para s. exa. parece ser um motivo de suspeita. E n'estas circumstancias s. exa. notou á camara que se diz n'elle que o principal fim que a Santa Sé tivera com a concordata de 1886 fora acabar com a concordata de 1857.

Ora, sr. presidente, eu quero crer que esse fosse o pensamento do articulista, mas não o da Santa Sé! E sabe v. exa. porque?

Vou citar a esse proposito um documento que póde ser contestado por todos, menos por um arcebispo da igreja catholica apostolica romana.

Refiro-me á carta de Leão XIII; Sua Santidade na carta que escreveu a El-Rei de Portugal no começo das negociações, e quando ainda se não tinham obtido todas estas vantagens que mais tarde se alcançaram com as igrejas de Bombaim, Madrasta, Calcutá e Syngapura, n'essa carta escripta ao Senhor D. Luiz por occasião do fallecimento do seu augusto pae, o senhor D. Fernando, dizia, repito, o Santo Padre que na proposta que a Santa Sé fazia a Portugal ficava substancialmente resalvada a propria concordata de 1857.

(O orador folheando o Livro branco.)

Tenho pena de não encontrar n'este momento as palavras textuaes do Santo Padre.

(O orador continuando a folhear o Livro branco.)

Não encontro agora as palavras, mas é este o sentido d'ellas: "por fórma que na proposta que a Santa Sé dirige a Vossa Magestade até a propria concordata de 1807, se póde dizer que está substancialmente conservada".

Ora francamente eu acredito mais no que diz a Santa Sé em documento tão solemne, firmado pelo proprio Pontifice do que na opinião do tal individuo anonymo que em França escreveu o artigo a que s. exa. alludiu e que por minha parte eu conhecia e tinha lido no jornal em que primeiro appareceu.

S. exa. revma. disse que appellava para a camara, e que ella não poderia consentir que se rasgasse a constituição do estado, e disse mais o digno par que o governo não podia invadir ás attribuições do poder legislativo e que esperava do patriotismo d'esta camara que obrigaria o governo a cumprir com o seu dever.

Sr. presidente, s. exa. contestou que a attitude do soberano territorial da India n'esta questão fosse a que eu tinha dito.

Eu não contesto, nem sequer um momento que tanto s. exa. como os outros prelados fossem o alvo das maiores attenções e de manifestação de respeito pela auctoridade britannica; foi o v. exa., foi-o- o sr. arcebispo D. Ayres de Ornellas e tem-o sido o actual bispo D. Antonio, mas o que é certo é que o soberano territorial tem uma opinião formada sobro esta questão, e se em face d'ella nós podemos ainda assim sustentar os nossos direitos, não podemos comtudo desatender as considerações que em Roma nos têem sido feitas e que se lêem em largas correspondencias de Londres desde tempos muito antigos até hoje.

Sr. presidente, disse s. exa. que as missões na Africa eram uma illusão e que os habitantes d'esse vasto continente eram demasiado boçaes para acceitar a luz do christianismo. Eu fiquei espantado que da boca de um prelado catholico saísse uma tal condem nação sobre tantos milhões de nossos irmãos, segundo a lei de Christo.

As condições particulares em que se encontram as raças africanas explicam em verdade o ser impossivel espalhar ali a methaphysica elevadissima, que constitue a ampla base da doutrina christã, mas o facto é que se não encontramos hoje na igreja de Africa homens como Origenes, Lactando e S. Gypriano, ahi vemos um cardeal Lavigerie, ahi vemos tambem os missionarios, com que todas as nações da Europa, quer protestantes, quer catholicas, procuram desenvolver a fé christã n'essas regiões de Africa, onde a vida é dura, onde as circumstancias do missionario são precarias, onde se exige muita fé e grande abnegação para sacrificar inteiramente todas as vantagens, grandezas e commodidades da vida civilisada.

Vemos hoje a França, Hespanha e por igual fórma a Allemanha e outras nações catholicas e não catholicas, conseguir brilhantes resultados.

E vemos tambem portuguezes que conseguem isto, e o seu trabalho tem tanto mais merecimento, quanto é certo que não provem de obrigação que lhes impozesse a obediencia.

Nós vemos ali o padre Barroso, nós vemos o padre Antunes procurando explicar os principios rudimentares da fé, lançar as primeiras sementes da moral christã, constituir a familia indigena, e excitar em o negro o amor do trabalho.

Ali vemos um padre Antunes agarrando n'esses pequenos africanos, segregando-os de todo o convivio com os representantes da sua raça, ensinando-lhes a lavrar a terra, a usar dos instrumentos de trabalho, a aprender emfim da moral christã tudo que é compativel com o seu estado intellectual, mas que já dá margem a assegurar a felicidade do homem e o engrandecimento da sua raça.

Nós vemos tudo isto exercido por um sacerdote portuguez; e eu não esperava ouvir um prelado portuguez dizer que em Africa se não podia missionar.

Sr. presidente, que a Africa representa o nosso futuro, não é uma phrase de rhetorica. (Apoiados.)

Talvez que eu ainda hoje no ministerio da marinha tivesse colhido a prova contraria do que se tem dito n'esta amara em desfavor das missões na Africa.

Pois com aquelle dom que os europeus têem na Africa de alastrarem o seu nome por uma região vastissima, pelos seus emprehendimentos, pela superioridade do engenho que tudo domina, se esse europeu for um missionario que, pela sua vida evangelica, mais respeito conquista n'aquella região, porque a sua acção se achará desligada de todas essas pequenas fraquezas e miserias moraes que acompanham a humanidade, esse homem alcançará ahi um tal renome, que muito mais se alargará a sua influencia, e com ha a influencia da civilisação europêa.

Se em geral a influencia do europeu é grande em Africa, a do missionario ainda é maior; e tanto isto é reco-