114 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
nhecido, que o congresso de Berlim inseriu entre as suas resoluções uma disposição para que as missões religiosas na Africa mantenham o direito de livre expansão.
Ora depois de tudo isto vir o nobre arcebispo affirmar o que disse, não é crivel. Os trabalhos lá são. rudes, mas a messe é promettedora.
Voltando, porém, á concordata, sr. presidente, ou antes á inconstitucionalidade do acto do governo, se eu conseguir percorrendo artigo por artigo a concordata de 1857 demonstrar que n'ella se contem em germen todas as disposições da de 1886, terei destruido pela base essa tão repetida accusação. Ora o artigo 1.° é o que estabelece a continuação do padroado na India e China, mas como e onde? Dil-o o artigo 2.°, continuará emquanto á India nas diiceses de Goa, Cranganor, Cochim, Meliapor e Malaca. Ora eu já disse á camara que se nós não temos hoje um bispo de Cranganor é porque as condições de Cranganor o não permittem, e não por causa da concordata de 1886. Não foi a concordata que matou aquelle bispado, elle tinha morrido, por si.
Mas, temos Cochim, Meliapor e Malaca, embora ligada a Macau, o que é materia da circumscripção. Vamos agora ao artigo 3.° Diz-se ahi que emquanto á China o padroado continúa na igreja de Macau. Os artigos 4.°, 5,° e 6.° se referem todos á China. Segue o artigo 7.°; é o que estabelece que pela grandeza da diocese de Goa, esta deveria sor dividida em duas. Foi o que se fez creando-se a diocese de Damão que conserva ligada a si a maior parte da cidade dó Bombaim. O artigo 8.° referia-se á ilha Pulo Penang na China, nada tem com o caso. Pelo artigo 9.° Singapura ficaria ligada a Malaca, é o que succede, ficando Singapura e Malaca ligados a Macau. Vejamos agora os artigos 10.° e 11.° São importantissimos, pois n'elles se contem a auctorisação para proceder, em acto addicional ou regulamento, é tal é precisamente a actual concordata, á circumscripção das dioceses, fixando-se tambem as bases ou principios em que essa circumscripção deverá conter-se. Vanios ao artigo 10.°; refere-se este ás bases para o governo poder organisar as dioceses.
No artigo 11.° diz-se que por parte do Summo Pontifice e de Sua Magestade Fidelissima se tem decidido pôr um termo ás difficuldades levantadas na India e acrescenta-se o seguinte:
(Leu.)
Nos termos do artigo antecedente. E quaes são os termos do artigo antecendente? São os que devem regular para a circumscripção convencionada entre as duas altas partes contratantes, e aquellas ficam auctorisadas a realisar.
Resta o artigo 12.°
(Leu.)
Foi o que succedeu, tanto nas bulias dos bispos como na geral, assim se procedeu.
Artigo 13.° Diz respeito aos commissarios.
(Leu.)
Sabe a camara quem foram actualmente estes commissarios? Foram o ha pouco fallecido cardeal Jacobini e o embaixador de Portugal, não sendo preciso ir á India proceder á circumscripção sobre o terreno, porque para aquella delimitação bastavam entre outros os trabalhos do digno par o exmo. arcebispo resignatario de Braga, quando arcebispo de Goa.
Resta o artigo 14.° que constitue a grande difficuldade que se me oppõe, pois por elle se mantinha o padroado em toda a India Ingleza.
Ora a este respeito eu vou repetir uma demonstração já feita na outra camara e tambem já aqui resumida pelo digno par o sr. Agostinho de Ornellas.
O sr. arcebispo de Goa, nas suas acres accusações contra o governo, quer que seja acceita pela camara a doutrina de que o governo exorbitou as suas attribuições, avocando a si a faculdade de ratificar esta concordata, negociação, ajuste, regulamento ou como queiram chamar-lhe, por ter sacrificado o direito que lhe dava este artigo 14.°, que s. exa. aliás classificára em tempo de méra ostentação, e clausula sem valor pratico. O que me vale porém, é que opinião de s. exa. de hoje eu tenho a contrapor, não direi a minha, que não teria a necessaria auctoridade, nem a do sr. Mártens Ferrão, cuja competencia aliás ninguem poderia contestar, mas a que eu não me reporto porque sendo esta negociação sua e tendo-lhe s. exa. o affecto que um pae tem a um filho seu, poderia ser taxada de suspeita; mas sim a opinião do sr. Vicente Ferrer, que até saiu do ministerio para poder continuar a combater a doutrina que se firmára com concordata de 1857.
Não lerei á camara todos os trechos do parecer do sr. Ferrer, escripto em 1859, como membro da commissão dos negocios ecclesiasticos da camara dos senhores deputados; no emtanto ouça a camara o que entre outras cousas elle dizia:
"O real padroado da Índia fica com as cinco dioceses de Goa, Cranganor, Cochim, Meliapor e Malaca (artigo 9.° da concordata), e os limites dos bispados já mencionados hão de ser circumscriptos, e o seu territorio ter tal extensão, que n'elle se não difficulte o prompto e proficuo exercicio de jurisdicção episcopal (são palavras do artigo 10.° da concordata). Já se vê que os perimetros das dioceses hão de ser infinitamente pequenos em comparação das que actualmente têem, comprehendendo cinco bispados actualmente as immensas regiões da India."
Ora é n'este ponto que está a differença capital entre as consequencias a que o sr. Ferrer julgava que dentro da concordata se podia chegar, e aquellas a que chegámos, na realidade.
As actuaes dioceses foram reduzidas, mas ficaram como deviam ser e como se suppunha que pela concordata de 1857 necessariamente deviam ficar, isto é, com a extensão necessaria para se não difficultar n'ellas o proficuo exercicio da jurisdicção episcopal.
Continuára depois o sr. Ferrer: "Feita a circumscripção que ha de ser reduzida a um acto addicional (artigo 11.° da concordada) e a actual concordada equivale a este acto addicional, hão de erigir-se nas immensas regiões, que ficaram de fóra d'aquellas dioceses, novos bispados, e para todos se exigem as mesmas formalidades (artigo 14.° da concordata)" e aqui estamos com o famoso artigo 14;° a contas, e por isso eu peço para o que vou ler, toda a attenção da camara.
"Logo, todos estes novos bispados devem de ter um territorio que não difficulte o prompto e proficuo exercicio da jurisdicção episcopal. E quantos bispados novos terão de erigir-se n'estas terras? A commissão confessa que não póde calcular com exactidão o numero, mas olhando para a carta geographica da India ingleza, parece-lhe que não será excessivo o numero de cincoenta. E póde o governo portuguez edificar tantos seminarios, catedraes, paços episcopaes, crear tantos cabidos e dotar todos estes estabelecimentos em seis annos, em regiões remotissimas, como as da India ingleza, e onde não tem poder temporal?
"Á commissão parece impossivel."
Não se está vendo aqui antecipadamente descripto artigo por artigo a concordata de 1886?
Depois d'isto pergunto eu qual havia de ser o juiz da necessidade da creação d'essas cincoenta dioceses?
Havia de ser Portugal?
Havia de ser a Inglaterra, que nada quer saber do que diz respeito á jurisdicção ecclesiastica e catholica da India?
Evidentemente não.
A Santa Sé era o unico juiz.
A Santa Sé dirigindo-se ao Rei de Portugal dir-lhe-ia pois:
"Vós sois o padroeiro e careceis de crear tantas dioce